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Carlos Esperança

27 de Março, 2005 Carlos Esperança

O estado de saúde do senhor Rainier do Mónaco

Tal como no bacalhau, onde a qualidade que se compra depende das bolsas, também nas bênçãos papais acontece o mesmo.
Nas grandes superfícies, além do normal e do especial, é possível comprar bacalhau miúdo, corrente e crescido. Do armazém da fé católica podem chegar bênçãos colectivas ou individuais, correntes ou especiais, particulares ou gerais.

O Príncipe Rainier, virtual soberano do Mónaco, um Estado a fingir, que tem uma concordata com outro Estado a fingir mas com imenso poder – o Vaticano -, recebeu ontem uma «particular bênção apostólica» de JP2 que mais valera reservá-la para si próprio. Aliás, estas bênçãos especiais costumam prenunciar o fim do destinatário. Ainda há pouco, no dia em que recebeu a bênção de JP2, acompanhada do desejo de melhoras, finou-se a Irmã Lúcia. O senhor Rainier III, após receber uma mensagem com a bênção especial do Papa, confiada à «intercessão» da Virgem Maria (factor de risco acrescido) não pode sobreviver muito tempo a tão agressivos cuidados.

Na procissão da «Sexta-Feira Santa», uma deambulação litúrgica que faz parte dos hábitos católicos, os monegascos participantes rezaram pelo príncipe o que augura os piores prognósticos. Assim, a declaração do luto nacional* está para breve.

* Chama-se luto nacional porque os residentes no Mónaco julgam que o principado é uma nação. Os trabalhadores costumam pernoitar no estrangeiro. Dormem em França. Obs.: O Vaticano e o Mónaco são dois Paraísos… fiscais, mais santo o primeiro.

27 de Março, 2005 Carlos Esperança

A ICAR nos EUA e a pena de morte

Hoje não é a fábula de Deus que me inspira, é a identidade de uma posição dos bispos católicos dos EUA com as minhas convicções e os meus desejos mais profundos. Deus não passa a existir por isso, a religião não se torna menos perniciosa, mas os bispos da ICAR, nos EUA, passam a defender uma atitude justa, digna e de grande humanismo – a luta contra a pena de morte.

Num país onde o fundamentalismo metodista atinge desvarios intoleráveis, onde o ódio e a violência contra a civilização trazem a marca genética de um cristianismo arcaico e rancoroso, a condenação da pena de morte, lançada pelos bispos católicos, é uma lufada de ar fresco que os ateus saúdam e aplaudem.

Sabemos dos erros judiciários que levaram inúmeras vítimas à cadeira eléctrica, estamos convictos da falsidade do carácter dissuasor da pena de morte em relação ao crime, aflige-nos a crueldade das execuções e o espírito vingativo subjacente. Uma campanha contra a pena de morte, venha donde vier, é um acto de profundo humanismo contra uma prática bárbara que urge erradicar.

Ao solidarizar-me com os bispos americanos, manifesto os melhores votos no êxito dos seus esforços e espero que a maldade de Deus deixe de repercutir-se nos que andam pelo mundo a espalhar a fábula e a promover o pior desse indivíduo que os homens criaram quando o atraso, a ignorância e a crueldade eram apanágio da época.

26 de Março, 2005 Carlos Esperança

Timor – Um protectorado do Vaticano

Quem julga que o desatino místico é um exclusivo dos mullahs, arredado dos hábitos católicos, ou pensa que a violência religiosa é um impulso dos ayatollahs de que os bispos católicos se curaram, crê que só o islão cria talibans e esquece a abominável máquina do Vaticano onde medram parasitas da fé e inquisidores fanáticos.

O ar civilizado que os bispos e padres ostentam na Europa que se emancipou dos desvarios papais não aparece na América do Sul ou em países cujo nível de desenvolvimento consente a prepotência eclesiástica e o fundamentalismo da fé.

Em Timor Leste a decisão do Ministério da Educação de passar a disciplina de Religião de obrigatória a facultativa, com carácter experimental, em 32 escolas, sofreu duras críticas dos bispos católicos. Alberto Ricardo, de Dili, e de Basílio do Nascimento, de Baucau, acusaram o Governo de «falta de sensibilidade e preconceito» e exigem a Religião como cadeira obrigatória na escola.

Por sua vez, o núncio apostólico, Malcolm Raanjif, que se deslocou a Timor para presidir à cerimónia do Domingo de Ramos, afirmou que a decisão ia contra os interesses do povo timorense. Mas este déspota foi ainda mais longe ao encorajar os autóctones a «confrontarem os que tentam destruir a Igreja». Pretenderá uma guerra religiosa ou o assassinato dos governantes?

É a Rádio Vaticano, uma emissora ao serviço da última ditadura europeia, que afirma, sem vergonha, que o episcopado timorense exige o ensino obrigatório da religião na escola pública. Que diz a isto o clero português? A vocação totalitária devora os católicos, o ódio à liberdade alimenta-os, a gula desenfreada assalta-os na defesa de um monopólio que fere os mais elementares direitos humanos e ataca um Governo democraticamente eleito.

Bem sabemos que para os padres só Deus conta e eles andaram a estudar a vontade de Deus durante numerosos anos de seminário e de recalcamento sexual. São agentes comerciais do seu Deus e não abdicam do regime de monopólio. Alguém tem de os travar.

25 de Março, 2005 Carlos Esperança

Diário Ateísta – 100 mil visitas

Em 30 de Novembro de 2003 alguns ateus lançámo-nos na aventura de um diário, num espaço sem a censura de Deus e dos seus lacaios – a blogosfera. Estávamos longe de prever o futuro embora soubéssemos, como disse um poeta espanhol, que «o caminho se faz caminhando».

Menos de 16 meses volvidos foram muitos os que desprezaram as penas do Inferno para fruírem o nosso convívio enquanto alguns (poucos) vieram insultar-nos na convicção de ganhar indulgências fáceis e outros chegaram para nos estimular com o seu apoio e solidariedade. Ao todo são já cem mil as visitas que o Diário Ateísta vai hoje registar, quase sempre de visitantes emancipados do divino, sem temerem a Deus ou ao Diabo, sem acreditarem na Igreja ou nos seus padres.

Só Deus se abstém de visitar-nos, por não existir, enquanto alguns beatos se inquietam com a nossa persistência. As religiões continuam a sua acção deletéria na sociedade, multiplicam números de ilusionismo para convencer os incautos e aumentam a repressão para segurar a clientela; fazem guerras na disputa do mercado da fé, inventam milagres para convencer os simples e perpetuam o embrutecimento colectivo onde medra a superstição e o medo; combatem o progresso, sabotam os direitos humanos e lutam contra a democracia.

O Diário Ateísta está, e continuará, ao lado das causas que promovem o progresso, a liberdade e a emancipação da humanidade. Defendemos a democracia, batemo-nos pela aplicação da Declaração Universal dos Direitos Humanos, combatemos o racismo, a xenofobia, as teocracias, a homofobia, as ditaduras e o poder clerical. Combatemos no campo das ideias, só nesse, Deus por não existir e os seus padres por existirem, sem pôr em causa o direito de ter e o de não ter religião.

A vitória final, estamos certos, é a do ateísmo. É a vitória da ciência contra a fé, o triunfo do progresso contra o obscurantismo, o êxito da laicidade contra o poder clerical.

As Igrejas pensam que iluminam a humanidade com a luz mortiça das velas, o cheiro enjoativo do incenso e o torpor das orações. As religiões confundem a claridade do crepúsculo com o fulgor da aurora.

Viva o ateísmo.

25 de Março, 2005 Carlos Esperança

Blasfémia – pecado ou crime?

O Supremo Tribunal de Justiça do País Basco absolveu Arnaldo Otegi, porta-voz da ilegalizada Batasuna, por ter chamado a Juan Carlos, rei de Espanha, «chefe dos torturadores.
O tribunal considerou tais declarações «reprováveis, ofensivas, impróprias, injustas, motivo de opróbrio e alheias à realidade», mas absolveu o autor com base no facto de a crítica a uma instituição constitucional não estar excluída do direito à liberdade de expressão.

Entretanto, na Grécia, o cartoonista alemão Gerhard Haderer foi condenado a uma pena suspensa de seis meses de prisão, por um tribunal grego, devido ao «carácter blasfemo» do seu livro de cartoons «A vida de Jesus». Segundo o «Público» de hoje (site indisponível) os desenho de Jesus como um bêbado amigo de Jimi Hendrix e a fazer surf nu após fumar cannabis causaram agitação na Grécia e o artista, que foi condenado à revelia, poderá ver a sua pena aumentada até dois anos se o seu apelo for rejeitado.

Haderer é o primeiro artista a ser apanhado pela lei de mandado de captura europeu, instituída em Junho de 2002 e esta questão levanta graves questões de liberdade artística na Comunidade Europeia – ainda segundo o «Público».

Em 20 anos, foi o primeiro livro a ser banido na Grécia. Dado que não consta que JC se tenha queixado ou sentido ofendido, espero ler em breve a «A Vida de Jesus» de Gerhard Haderer com quem o Diário Ateísta, desde já, se solidariza.

Apostila – Este assunto já deixou o João Vasco de boca aberta, como revelou no seu artigo «Blasfémia – vejo-me grego para entender isto». Volto ao assunto por entender que a blasfémia é um crime de ofensas pessoais e só o próprio (Deus, Jesus, Maomé ou outro espécime do mesmo bando) tem legitimidade para propor a acção nos tribunais.

23 de Março, 2005 Carlos Esperança

Sobre o Diário Ateísta

O Diário Ateísta (DA) não é um pasquim virtual de uma paróquia onde os óbitos são participados na secção «À sombra da Cruz» e os dislates visam a salvação da alma e o torpor da inteligência. Sabem-no os que nos visitam com frequência, benzem-se os que tropeçam nos nossos textos por erro de navegação. Não é o proselitismo que nos anima mas o combate ao obscurantismo, a denúncia da indústria milagreira, o desprezo pelos santos e o pasmo com os sinais cabalísticos e a água benta que mixordeiros impingem com pureza duvidosa e virtudes por comprovar.

Acontece que o DA refere com mais frequência a ICAR do que outras religiões. Trata-se, apenas, de uma questão de proximidade. É a mais perniciosa em Portugal. Não é o seu Deus que é mais falso do que o das outras religiões, não é a sua fé que é mais irracional, não é o seu livro sagrado que é mais pueril do que os outros livros sagrados. As religiões são todas falsas, como qualquer uma confirma a respeito das outras, e o clero é sempre perigoso porque Deus é uma tragédia, seja qual for o mensageiro, qualquer que seja a mensagem.

Deus é uma criação humana, com os piores defeitos, e os milagres uma mistificação. As religiões não se transformam, de projectos políticos que são, em associações beneméritas, mas os parasitas de Deus promovem este como a fonte do bem e usam-no para os piores fins. Mas, nem por isso, o ateísmo deixa de bater-se pela liberdade religiosa.

Qualquer pessoa deve ter o direito de professar a religião que desejar, sair e entrar quando quiser, crer ou não crer, difundir ou combater qualquer uma ou todas. As religiões são uma fonte de atraso, superstição e ignorância; são um atentado à convivência pacífica entre as pessoas, as nações e as diversas etnias, mas devem respeitar-se os crentes.

A arma dos ateus é a palavra. Deixamos a lapidação, as fogueiras, as decapitações e várias formas de tortura para as religiões cujo proselitismo não dispensa estes instrumentos suplementares de argumentação. E, com a mesma determinação e empenho com que combatemos as religiões, defendemos o direito à sua prática. Apenas exigimos a subordinação e o respeito ao ordenamento jurídico das sociedades laicas e democráticas.

21 de Março, 2005 Carlos Esperança

A violência da ICAR na Argentina

A Argentina é um país frequentemente vítima de uma dupla tirania – dos militares e da Igreja católica. Agora, que generais recolheram as garras, assanharam-se as da ICAR. O bispo das Forças Armadas, António Baseotto, um pio almocreve da fé, explodiu em ódio beato contra o ministro da Saúde por este defender a despenalização do aborto e o uso do preservativo, como assinalou a Palmira no artigo «Bispo católico despedido».

Para o asinino prelado são intoleráveis tão medonhas heresias e defendeu que o ministro da Saúde, Ginès Gonzalez Garcia, merecia «ser atirado ao mar com uma pedra de moinho ao pescoço». Esta era, aliás, uma prática corrente na ditadura militar, em que se atiravam ao mar, a partir dos aviões navais, os presos políticos , perante o silêncio cúmplice da ICAR cuja simpatia pelos generais fascistas era mútua e recíproca.

A democracia rompeu esse equilíbrio perfeito entre o altar e o poder, entre os bispos e a ditadura, entre a fé a disciplina. Os militares impunham a ordem e os bons costumes e o clero combatia o demo e a democracia. Antigamente a Igreja católica purificava pelo fogo da inquisição, hoje opta pela água do mar onde pretende afogar os ministros que se conformam com o aborto e defendem o preservativo.

O presidente da República argentina pediu à Santa Sé para substituir, na chefia do clero das Forças Armadas, um bispo que evocou os tristemente célebres «voos da morte» que levaram o luto, a revolta e a indignação ao povo argentino e que, de algum modo, o bispo queria perpetuar indicando como vítima o ministro da Saúde.

Quando se esperava que das alfurjas do Vaticano viesse uma advertência ao bispo, um anti-semita violento que já levou a comunidade judaica a pedir também a sua remoção, assistiu-se ao seguinte:

– O porta-voz do Vaticano, Joaquin Navarro Valls, declarou que se tratava de uma violação da liberdade religiosa impedir o bispo de exercer o seu múnus;
– Os bispos argentinos, reunidos no sábado passado, qualificaram a decisão do Presidente da República, de pedir a substituição da santa cavalgadura, de «apressada e unilateral»
– O porta-voz do Episcopado, Jorge Oesterheld, declarou à comunicação social que a remoção do bispo Baseotto era «um passo para a discriminação e um atropelo à liberdade religiosa».

A demência não é um apanágio do islão, está inscrita no código genético das religiões reveladas e dos sicários de Deus.

18 de Março, 2005 Carlos Esperança

Numa paróquia de Lisboa


Imagem: origem desconhecida. Texto: padre Serras Pereira.
Adenda: A imagem, segundo informação recebida, é do cartoonista do «Avante» a quem felicito.

16 de Março, 2005 Carlos Esperança

A ICAR actualiza o Índex


O Vaticano há muito que deixou de actualizar a lista dos livros proibidos. Condena, para não perder a vocação censória, desaconselha, para fingir autoridade, uiva, para impressionar os espíritos mais timoratos.
A Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, submetida ao pulso férreo do cardeal Joseph Ratzinger, piedoso inquisidor que se esforça para que o progresso e a liberdade não façam perigar o destino das almas, é uma pálida amostra do Santo Ofício, que a precedeu.

Agora, deu-lhe para embirrar com o «Código Da Vinci» do escritor Dan Brown, e inclui o interessante romance policial, que pisca o olho aos eruditos, na lista das obras a «não ler, nem comprar». O apelo foi feito pelo cardeal Tarcísio Bertone, aos microfones do Radio Vaticano, uma emissora do bairro com potência para ser ouvida através do planeta, mas cujas vozes não chegam ao Céu.

O que incomoda este santo cardeal, além das manipulações da ICAR que o romance desmascara, é a possibilidade de Jesus Cristo ter sido pai de uma filha de Maria Madalena, o que pressupõe o pecado da fornicação cometido pelo impoluto e casto fundador da ICAR.

Assim, ainda que a execração do livro e a proibição da compra contribuam para a sua difusão, a Cúria não pode deixar de actualizar o Índex dos livros interditos sob pena de conferir ao acto sexual a dignidade que a prática divina lhe outorgava. Deste modo, o «Index librorum prohibitorum» da Igreja Católica fica enriquecido com um novo título e a sexualidade de novo anatematizada.

16 de Março, 2005 Carlos Esperança

Momento Zen da Segunda

O sexo dos anjos e dos outros

Deixando o Domingo para o inefável padre Lereno Dias, o casto sacerdote que despreza a Constituição da República e adverte os fiéis sobre os partidos em que os católicos devem votar, João César das Neves (JCN) voltou às homilias da segunda-feira no seu artigo «o sexo dos anjos e o dos outros» – D. N de 13-03-05.

Apesar do título, não se deteve no sexo dos primeiros, quiçá por respeito, nem sobre as eventuais orgias em que possam envolver-se no espaço celestial. Foi sobre o «sexo dos outros» que concentrou o seu beato horror e manifestou a repugnância que lhe merece, salvo se o destino for a prossecução da espécie com activo repúdio do prazer ou qualquer manifestação de carácter libidinoso. Ele julga que Deus fica de mau humor sempre que os seres humanos procuram outro êxtase para além do místico.

JCN mereceria a simpatia dos espécimes em vias de extinção se o fanatismo não o tornasse tão abominável. Afirma que a Igreja é desprezada, o que é verdade e merece, mas acrescenta que é perseguida, quando, através da história, as grandes perseguições foram sempre entre bandos de fanáticos que se reclamam do mesmo Deus ou outros que acham o seu mais verdadeiro que o alheio.

JCN arremessa-nos com os evangelhos, os salmos, as epístolas, os profetas e demais fontes de idoneidade duvidosa para nos convencer do sofrimento da sua igreja e da bondade dos seus ensinamentos. Diz que a ICAR é acusada de ter sobre o sexo uma posição extremista e doentia o que, no seu piedoso entendimento, é injusto. Ora a posição da ICAR é abertamente demente e terrorista como o comprova à saciedade a sua posição em relação à contracepção, à SIDA, à homossexualidade, ao aborto e, inclusive, em relação a quaisquer relações sexuais onde o sacramento do matrimónio e a intenção reprodutora estejam ausentes.

JCN odeia o prazer, vê-o como pecado e toma-o como ofensa a Deus. Socorre-se da escritura, do catecismo, dos documentos pontifícios e de outras fontes, igualmente suspeitas e pouco recomendáveis, para provar a bondade da intolerância que exibe, a santidade da abstinência que recomenda, a superioridade moral do cristianismo que prega.

JCN talvez não saiba o que é amar. Se um dia sentir a divina consolação de um orgasmo, talvez abandone o proselitismo e se dedique à realização sexual sem a qual nunca mais o abandona esse rancor que lhe tolda a inteligência e embota a sensibilidade. Nesse dia deixará de importar-se com as pessoas da Santíssima Trindade, com o destino da alma e com as susceptibilidades do troglodita do seu Deus.