30 de Junho, 2025 Onofre Varela
COMO SERÁ O FUTURO?
Quando entramos no ano 2000, por ser uma data redonda e emblemática para os vaticinadores do futuro e da desgraça, ouvi e li opiniões de crentes – de um qualquer credo religioso – afirmando que “este século será religioso, ou não será”. A frase é ambígua. Desde logo importa saber o que se quer dizer com o termo “religioso”. Pode-se ser religioso e não ter fé numa divindade. Se quisermos ver assim, a Ciência também pode ser entendida como religião… no sentido de “procura”, que não no de “adoração”. No latim, o termo “religio” tem um significado amplo, englobando a ideia de um sentimento de respeito, dever moral e reverêncial, não apenas em relação à divindade, mas também noutros contextos como no de “procurar a verdade”. E depois… o “não será”, significa o quê? Que o século poderá não ser religioso… ou não será século?!…
Nas conjunturas sociais graves é comum os povos mais crentes recorrerem ao guarda-chuva da fé para apaziguarem o espírito. É nesse sentido que a rotineira “volta a Deus” acaba por aparecer como tábua de salvação sob uma forma ideológica gerada pelos indivíduos com menos raciocínio lógico e científico, encontrando no conceito de Deus algum sentimento de segurança e consolo. É uma característica do pensamento de quem “vive por procuração” com a mente cativa de uma entidade divina, impedindo-o de alcançar um raciocínio de “mente ilustrada”… isto é, uma mente mais racional e científica, dispensadora do divino.
Nesse sentido concordo com Gonzalo Puente Ojea (advogado, diplomata e escritor cubano, falecido em Espanha em 2017 com 93 anos) quando disse ser “o ateísmo a situação intelectual mais coerente com a actualidade, porque recusa as atitudes de fidelidade a um deus que viola as exigências de discernimento da consciência, impedindo que o ser humano tome posse de si mesmo” (no livro: “Ateísmo y Religiosidad. Reflexiones sobre un debate”. Siglo Veintiuno de España Editores. 2ª Edição corrigida. Madrid, 2001).

Na esteira da tentativa de adivinhação do futuro, também já se afirmou que o Islão irá dominar o mundo; que os árabes refugiados das guerras do Médio Oriente e da miséria dos países islâmicos africanos, invadiriam a Europa miscigenando-se connosco, e o futuro do mundo será islâmico (esperem aí um bocadinho… só vou ali dar uma gargalhada e já volto!…).
Miscigenados já nós estamos há milénios, desde que os Homo sapiens saíram de África e se espalharam pelo mundo! Não há “raças puras” (nem impuras… as “raças” humanas não existem. O que existe é o “Homo sapiens sapiens”, um antropoide igual em todo o mundo e que faz da espécie humana uma “raça” única, com indivíduos apresentando diferenças faciais, de estatura e cor de pele, por imposição do meio em que vivem há milhares de anos).
Eu não faço nenhuma ideia do que será o futuro… e os vaticinadores da desgraça, também não! Cada um pensa um futuro à sua medida… e eu gosto de pensar que a Humanidade trilha o caminho da perfeição possível, que será cada vez menos seguidora de religiões e mais ateia, respeitadora do próximo e do ambiente… se calhar, mais espiritual, mas dispensando a figura do Deus das religiões.
Quando afirmo este gosto parece que estou a colocar-me ao nível dos religiosos e a assumir a minha “costela de fé” ao “crer” num futuro positivo. Admito que sim… porém trata-se de “uma fé” alicerçada na História e não na Mitologia.
A nossa espécie já foi bem mais religiosa e belicosa do que é hoje. Depois da Revolução Francesa mudou-se o estado de graça da Religião e o seu paradigma. As repúblicas e as monarquias ocidentais modernas são laicas, e muitos conflitos já são resolvidos com a palavra, evitando-se recorrer à violência do confronto físico ou através de máquinas de guerra (o que não impede a existência simultânea de ditadores e malfeitores que contrariam esta minha premissa de pacifista e adoram invadir, destruir, matar, anexar e facturar; como fazem Putin, Netanyahu e Tramp).
Gosto de pensar que estes três casos provam o nosso primitivismo… mas que, felizmente, não retratam a maioria de nós.