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Mês: Agosto 2008

31 de Agosto, 2008 Carlos Esperança

Viagem de fim de férias (Crónica)

Com o céu enevoado e as nuvens a anunciarem borrasca, no penúltimo dia de Agosto, dei um passeio por velhas aldeias que neste mês voltaram à vida, sobretudo nos dias de festas canónicas, e já se encontram de novo desertas.

Saí de Almeida para comprar umas bolas de carne, na Reigada, para enfeitar a mesa no dia da Feira Nova, em 1 de Setembro, destinadas a parentes e amigos que ainda vêm. O forno estava alugado aos de Vilar Formoso para confeccionar doces para a festa do dia seguinte. Não faz mal, amanhã é domingo e coze o que hoje devia, o Inferno foi extinto, é preciso ganhar o pão de cada dia, ficaram as bolas encomendadas.

Passei por Vilar Torpim onde não enxerguei vivalma. A aldeia tinha o ar de ter sido habitada em época recente mas estariam os autóctones fechados em casa, quiçá receosos ainda das lutas liberais.

Tomei café em Figueira de Castelo Rodrigo. Havia afinal gente nos restaurantes, jovens nas esplanadas dos cafés e repuxos a esguichar num lago que há-de ter surgido para um autarca ganhar eleições. Havia vida na sede de concelho, até crianças a quem os pais hesitaram entre o gelado e o tabefe acabando por aceder ao pedido e abdicar do desejo. As vilas ainda se mantêm graças à hemorragia das aldeias e aos empregos municipais.

Passei pelo convento de Santa Maria de Aguiar, por Nave Redonda, que me pareceu fechada e parei junto à barragem de Santa Maria de Aguiar um razoável lençol de água vulgar apesar da santidade do nome que não lhe evita a conversão em charco ou a seca em estios mais cálidos.

Em Almofala, fiel a um velho hábito, entrei na igreja onde duas piedosas mulheres que mudavam as flores aos santos me acenderam as luzes e dois homens desmanchavam os andores de uma festa recente para os despacharem para a sacristia. Não cuidei da destruição castelhana em Outubro de 1642 e passei por Escarigo cujo martírio na Guerra da Restauração foi maior sem me deter na igreja matriz cujo tecto e talha dourada valem a viagem. Foi José Saramago, em «Viagem a Portugal», que me alertou para essas jóias da arte sacra numa aldeia que guarda memórias e afectos da minha juventude.

Apenas me compadeci de uma velhinha de olhos vagos, com a pele curtida de muitos sóis, absorta, indiferente à passagem do automóvel, perscrutando no horizonte o futuro que lhe resta ou recordando o passado que lhe coube. Estava só, na soleira da porta, sem raios de sol que a aquecessem, sentada, com o céu pesado de nuvens.

Alguns quilómetros depois, atravessei a Vermiosa. Apenas um velho, também só, via o tempo passar do banco de pedra onde jazia a bengala que, decerto, lhe serviria de amparo na volta. Mais à frente estava um cão escanzelado, imóvel, indiferente às pulgas e carraças, se acaso as tinha, e milagre era não tê-las, resignado, deitado na terra.

Dos dois seres vivos que encontrei na aldeia, outrora pejada de gente, o cão, pequeno rafeiro sofredor, foi a mais eloquente metáfora dos que teimam em ficar nas aldeias que outrora foram um alfobre de gente e são hoje um cemitério de recordações.

Nem dei por passar em Malpartida no regresso à casa. Espero pela Feira Nova que ainda há-de juntar gente e partirei logo.

31 de Agosto, 2008 Carlos Esperança

O Papa repesca Martinho Lutero sem pedir perdão!

O Papa deseja reabilitar Martinho Lutero (Martin Luther), um teólogo alemão que viveu de 1483 a 1546 e é considerado o pai da Reforma Protestante. Martinho Lutero acreditava piamente na Bíblia, foi educado num mosteiro e graduou-se Doutor em Teologia que, como se sabe, não é Ciência. Foi professor, pregador e confessor.

Lutero, em vida, tentou ser mais papista que o Papa e lançou corajosas críticas à Igreja Católica, apontando a distorção de várias verdades do Cristianismo ensinadas na Bíblia, repudiou o sistema das indulgências, que permitia às pessoas pagarem o perdão dos seus “pecados”, com entregas pecuniárias à Igreja. Condenou a avareza e o paganismo da Igreja como um abuso. Questionou a autoridade do Papa para conceder tais indulgências. Também declarava que o papado não formava parte da essência imutável da Igreja original. Negou que a salvação pertencesse à Igreja Católica ocidental sob a autoridade do Papa, mas que esta se mantinha na Igreja Ortodoxa, do Oriente. Propôs uma série de reformas, entre as quais se incluíam a abolição das rendas do Papa, o reconhecimento do governo secular, a revogação do celibato do clero e outras.

Em 1520 o Papa Leão X advertiu Lutero e ameaçou-o de excomunhão, a menos que este renunciasse às suas ideias. Lutero recusou a submissão ao ultimato do Papa e acabou por ser excomungado em 1521 e condenado por heresia.

Passados quase 500 anos, o período habitual para a ICAR tomar consciência das asneiras que faz, o Papa Bento XVI quer agora reabilitar Martinho Lutero. Vai dizer-nos que ele até era um tipo porreiro, nada herético. A final, quem estaria errado era o Papa Leão X. Esta acção de repescagem do morto Lutero pode entender-se pela tentativa de aproximação e integração com as Igrejas Protestantes, sob a égide da ICAR.

 a)  kavkaz (leitor habitual do DA)

30 de Agosto, 2008 Carlos Esperança

Homossexuais e católicos? -Opinião de um leitor

O “Correio da Manhã” online de hoje noticia que “para quebrar preconceitos” o líder da Juventude Socialista vai participar no I Encontro Ibérico de  Gays Católicos.

Ora, como bom ateu que tento ser, entendo que toda a gente tem direito a ter uma religião – ou a não ter nenhuma. Mas não consigo entender como pode, uma pessoa (e, aqui, incluo as mulheres) professar uma religião que, manifestamente e sem o mínimo pudor, a despreza. Como pode um “gay” (eu ainda prefiro a palavra homossexual. Gay significa alegre, e eu duvido que haja alegria nessa situação. Mas já tenho ouvido e lido acerca de dramas…) como pode, pois, um homossexual professar uma religião (curiosamente, acho que qualquer religião) que o condena, aprioristicamente, às ditas “chamas do inferno” (algumas até os/as condenam à morte, liminarmente. No Irão, por exemplo, “não há homossexuais”. Pois não…)?

Com a ironia que o caso merece, acho que está na hora de os homossexuais criarem a sua própria religião. Parece que não custa muito, a julgar pela parafernália existente…

Ou então, tornem-se ateus. Pelo menos, terão solidariedade, tolerância e compreensão.

a) José Moreira

30 de Agosto, 2008 Carlos Esperança

O céu fica interdito por causa do Papa

Um decreto oficial divulgado nesta Sexta-feira proíbe sobrevoos, de 11 a 15 de Setembro a região de Lourdes pela visita de Bento XVI.

O Papa B16 vai visitar uma das mais lucrativas agências de milagres do catolicismo. A burla de Lourdes é antiga e continua a atrair multidões de pessoas que sofrem e vão em peregrinação a pedir a Deus um milagre que podia ser feito ao domicílio, um alívio que dispensasse a excursão, uma cura que se tornaria desnecessária se o deus de B16 não tivesse enviado a doença.

A ICAR tem o monopólio dos milagres e do ridículo, a propriedade dos locais e templos onde deus montou o escritório, para ouvir os pedidos dos créus, e a propriedade da água que os peregrinos levam em embalagens de vários tamanhos, consoante as posses.

Se uma religião nova aparece a explorar a credulidade das pessoas simples, é uma seita; se uma cigana se propõe fazer um milagre para caçar uns euros, para dar de comer aos filhos, é intrujona; se a ICAR alimenta a ingenuidade das pessoas e recolhe o óbolo, presta assistência espiritual.

Nos milhões de anos que o mundo leva de existência foi preciso que uma virgem parisse um deus (truque que já era velho à época) para que nascesse uma religião verdadeira. E há quem se preste a explorar a ingenuidade, a fomentar a superstição e a viver à custa da aldrabice.

Surpreende a comédia que rodeia o ditador do Vaticano. Enquanto adeja os paramentos pela cidade de Lourdes, B16 tem o direito de ver o Céu interditado à circulação aérea. É porque não acredita em anjos. Doutro modo não permitiria que o Estado laico francês, embargando a circulação aérea, impedisse que o arcanjo Gabriel ou o Espírito Santo, duas aves de longo curso, voassem sobre o palco dos espectáculos pios. Durante quatro dias.

E o Papa, sem o Espírito Santo, não passa de um primata de vestidos exóticos e ditador vitalício de um bairro de 44 hectares – o Vaticano.

29 de Agosto, 2008 Carlos Esperança

Fisco vende Capela de Nossa Senhora das Dores “ao preço da uva mijona”!

A vida não está fácil e nem “Nosso Senhor”, nem “Nossa Senhora” ajudam! Que o diga um amante de arquitectura sacra a quem as Finanças penhoraram a Capela de Nossa Senhora das Dores, situada na freguesia de Friões, concelho de Valpaços, distrito de Vila Real.

 O preço base da venda é de 9,40 euros. Não podiam arranjar um preço mais decente para vender uma capela de deuses? Valem tão pouco… menos do que a mudança do óleo no meu automóvel!

 a)  kavkaz (leitor habitual do DA)

29 de Agosto, 2008 Carlos Esperança

Diário Ateísta

Os colaboradores e os leitores habituais do Diário Ateísta sabem que os textos aqui publicados comprometem exclusivamente os autores que, por isso, se identificam ou são do conhecimento do colaborador que edita os textos e por eles se responsabiliza.

Não há censura no Diário Ateísta, nem para os autores nem para os comentadores. Não se espera naturalmente que os dignitários das religiões que afligem o mundo gozem aqui de particular consideração mas nunca se apelou, nem apelará, ao ódio, à xenofobia ou ao racismo.

Claro que denunciamos, e denunciaremos, as ridículas curas obradas por intercessão de cadáveres com séculos de apodrecimento e o aproveitamento comercial dessas burlas pias. Igualmente combatemos os pregadores do ódio que nas mesquitas, sinagogas ou igrejas se esforçam por vender o único deus verdadeiro – o deles –, mas não deixaremos de defender o direito dos crentes ao logro, aos jejuns e aos ralis de joelhos.

 Independentemente de funções que eventualmente qualquer colaborador tenha na única Associação Ateísta Portuguesa, as opiniões aqui emitidas apenas comprometem quem as emite, sem que os órgãos legítimos da referida Associação tenham que concordar ou não.

Cada um é ateu à sua maneira e ninguém tem de lhe dizer como o deve ser. As religiões são todas falsas e os parasitas que vivem à sua custa nem sempre se dão conta de que são agentes da mentira e propagandistas de mitos. É por isso que combatemos crenças e respeitamos os crentes.

No entanto, quem visita o Diário Ateísta sabe que não vem encontrar quem defenda que o vinho é o corpo de Cristo, depois de passar pelo processo alquímico das benzeduras; que a água benta é diferente da outra; que um demente que morre pela sua fé, matando outros, fica com o crédito de setenta virgens e uma assoalhada no Paraíso; que um judeu de trancinhas às cabeçadas no Muro das Lamentações nos merece mais consideração do que a pena que nos causam os estragos no muro.

O anticlericalismo e a blasfémia são direitos que custaram muito sangue a conquistar. A liberdade é um direito democrático conquistado pelos livres-pensadores, pelos herdeiros do Iluminismo, pelos democratas cujas raízes remontam à Revolução Francesa.

Não é o espírito totalitário das religiões nem o dos cúmplices que se fingem ateus que impedirão a liberdade de expressão no Diário Ateísta.

O Diário Ateísta é um lugar onde portugueses e brasileiros convivem e se riem de Deus e dos seus empregados, dos anjos e das virgens, dos clérigos e dos seus paramentos, dos milagres e dos seus embusteiros, do Papa, dos bispos e dos clérigos de todas as crenças. Nem que para isso tenhamos de suportar as citações execráveis da Bíblia, do Corão ou da Tora, feitas pelos beatos de turno nas caixas de comentários.

29 de Agosto, 2008 Carlos Esperança

A rã da discórdia

 
A rã crucificada do escultor Martin Kippenberg
Foto: REUTERS

Tal como os muçulmanos reagiram às caricaturas de Maomé, também os católicos reagiram à crucificação da rã.

29 de Agosto, 2008 Carlos Esperança

O corpo e a alma (Crónica)

Criticado por ter proposto uma competição que pretendia eleger a freira mais bonita, via internet, um padre italiano voltou atrás e suspendeu tudo.

Donde vem este ódio ao corpo feminino, a fúria misógina, o ranger de dentes, perante a forma de um corpo, as curvas do desejo e a beleza da mulher?
Paulo de Tarso, um místico desequilibrado, rotulou o cabelo e a voz das mulheres como coisas obscenas e Agostinho de Hipona entrava em desvario por não poder resistir-lhes. E ambos foram santos na infância dos milagres, quando a produção em série estava por inventar e a Igreja católica era avara na produção de taumaturgos.
Mas que obsessão é essa dos que lhes querem cobrir o corpo, seja com o hábito, alvo, de freira ou com a negrura da burca, lhes escondem as formas, porque temem a beleza, e as reduzem a um corpo sem feitio porque lhe adivinham a inteligência da alma?
Não, não é dessa alma que falo, da criação ontológica que alimenta um deus sedento no Olimpo de todos os medos, da metafísica dos negócios pios, do pretexto para a renúncia à vida e ao sortilégio do amor. Falo da alma com que as mulheres cantam, riem, choram e gritam, da alma com que animam a vida, da alma com que amam e procriam, da força que lhes vem dos séculos de tirania e humilhação.
Quem oprime as mulheres são doentes de desejos reprimidos, inquietos com a perda do poder, célibes que temem o amor e o escândalo, maníacos da castidade que a educação e o múnus castram e que, no êxtase de fantasias sórdidas, se entretêm a inventar castigos.
Quando homens e mulheres descobrirem que a liberdade é feminina, dar-se-ão conta de que a igualdade não é uma utopia e que a discriminação dos livros pios é a afronta que se perpetua para gáudio de homens sós e eterna perdição da felicidade humana na vida que não se repete.

29 de Agosto, 2008 Carlos Esperança

No rescaldo da guerra do Cáucaso

Terminaram os combates entre os “irmãos” cristãos do Cáucaso. A paz ainda terá de ser consolidada. São dias muito difíceis para a população da Geórgia, Ossétia do Sul, Abcásia e para os familiares dos soldados russos que caíram em combate. Há cidades e aldeias destruídas, muitos mortos, populações deslocadas, famílias destroçadas. Falta água, comida, habitações e electricidade.

Do meu ponto de vista ateu o resultado desta “guerra dos cinco dias” diz-nos que a religião cristã-ortodoxa sofreu um grande desaire, pois estavam em conflito os “irmãos ortodoxos” do Cáucaso. Tanto a Igreja Ortodoxa Russa, como a Igreja Ortodoxa da Geórgia foram impotentes para travar esta guerra, conduzida pelos seus dirigentes políticos cristãos. Devo dizer, em abono da verdade, que as grandes hostilidades foram iniciadas pelo cristão Saakachvili, Presidente da Geórgia, uma pessoa “muito crente” que ordenou bombardear, durante a noite de 7 para 8 de Agosto, a capital da Ossétia do Sul, Tskhinvali, fazendo mais de 1600 mortos. A partir daí a guerra já só parou com a derrota do agressor.

O resultado começa a ser conhecido: os habitantes da Ossétia e da Abcásia sentem um profundo ódio à Geórgia. Contra todos eles. É o resultado dos bombardeamentos da sua região pelas tropas georgianas. Por outro lado, os georgianos, pessoas muito orgulhosas e combativas, continuam a dizer que as terras da Ossétia do Sul e da Abcásia fazem parte do seu território, mesmo sabendo que os habitantes não aceitarão esse vínculo à Geórgia.

O Patriarca da Geórgia, Iliá II, que surgia frequentemente ao lado de Saakachvili publicamente, pede aos crentes georgianos para rezarem a “Deus” pela reunificação do território. Diz que o “inimigo” não quebrará o espírito do povo georgiano. Diz aquilo que os georgianos desejam ouvir, mas os adversários repelem.

Os muçulmanos do Cáucaso espreitam a oportunidade e podem tornar-se bem mais influentes na Abcásia e Ossétia do Sul. Apoiaram a intervenção da Rússia em defesa das regiões agredidas.

Pode-se concluir que a “irmandade cristã” poderá existir com alguns bons resultados em tempos de paz. Mas começando a guerra “estala o verniz” da “irmandade” e as Igrejas ficam incapacitadas de travar a violência e o caos entre os cristãos. E a “Santíssima Trindade” onde estava? Esta, tal como a Igreja, nada fez. Porque não existe!

 a)  kavkaz (leitor habitual do DA)

29 de Agosto, 2008 Carlos Esperança

México – Pesada derrota para a Igreja católica

Lei do aborto considerada constitucional

O Supremo Tribunal de Justiça do México determinou sem fundamento o pedido de inconstitucionalidade contra as reformas na Lei da Saúde e no Código Penal do México em Abril de 2007.

Estas reformas decidiram a despenalização do aborto durante as primeiras 12 semanas de gestação.

O veredicto, com 8 votos contra 3, favorável à decisão, considerou infundada a acção apresentada pelo ministro Sérgio Aguirre.

O Tribunal assinala que a Constituição e os tratados internacionais subscritos pelo México não contemplam o chamado «direito à vida desde o momento da concepção».

Trata-se de uma derrota pesada para as forças conservadoras.