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Categoria: Ateísmo

10 de Julho, 2011 João Vasco Gama

Milagres – I

Há dois tipos de crenças em relação aos milagres. Existe quem acredita que podem envolver uma violação das leis naturais, e existe quem não acredita em tal coisa.

Quando se justifica acreditar na ocorrência de um determinado milagre? David Hume dá uma excelente resposta a essa questão:

«Nenhum testemunho é suficiente para estabelecer um milagre, a menos que o testemunho seja de tal tipo que sua falsidade seria mais miraculosa que o fato que ele tenta estabelecer»

Por outras palavras, devemos sempre acreditar na hipótese mais plausível. Podemos olhar para esta máxima do ponto de vista do conhecimento que temos hoje sobre probabilidades. Sejam A e B dois acontecimentos, a probabilidade de A dado B é dada por:


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Assim, se A for o milagre, e B for a existência do conjunto de evidências que temos para esse milagre (testemunhos, etc.) podemos encarar B como a união do conjunto dos diferentes acontecimentos possíveis que poderiam dar origem a essas evidências – a autenticidade do milagre (A), a falsidade dos testemunhos, equívoco, ou outras, a que chamaremos C. Tendo em conta que são conjuntos disjuntos, e que a intersecção de dois conjuntos não pode ser superior a qualquer deles, a expressão anterior implica:


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Aqui temos: se a falsidade das evidências for mais miraculosa que o milagre que se pretende estabelecer (P(C) < P(A)), é razoável acreditar que o milagre ocorreu (P(A|B) > 0.5). Mas se acontece o contrário, não faz sentido acreditar que o milagre tenha ocorrido (P(~A|B)>0.5).

Um exemplo ilustrativo: o Gustavo, grande amigo meu, diz que morreu e passados dois dias ressuscitou, e descreve a experiência em grande detalhe, com enorme seriedade. O acontecimento A é a ressurreição do Gustavo, o acontecimento B é o seu testemunho. Para simplificar, vamos supor neste caso que não existe nenhuma outra explicação para o seu testemunho além da autenticidade do milagre e da mentira deliberada (não é possível que seja um equívoco, etc..). Como o Gustavo é extremamente honesto, eu diria que a probabilidade dele mentir é uma num milhão (P(C)=0.000001). Ninguém discordará que a probabilidade de alguém ressuscitar passados dois dias é muito inferior a um em mil milhões (P(A)<0.000000001). Assim, qual é a probabilidade de que o milagre descrito pelo Gustavo seja autêntico? É inferior a um em 1000 - aquilo que é muito mais plausível é que Gustavo, apesar da sua honestidade, esteja a mentir deliberadamente (P(C|B)>0.999).

E se considerarmos que é possível que Gustavo esteja equivocado? Como a sua descrição parece detalhada, e a sua convicção inabalável, parece difícil imaginar que tal equívoco seja possível, mas isso é ignorância sobre a natureza humana, equívocos deste tipo acontecem a pessoas saudáveis com mais frequência do que imaginaríamos. Suponhamos que a probabilidade de equívoco a priori é de um em dez mil (P(D)=0.0001). Neste caso, temos que a probabilidade de que Gustavo esteja equivocado (P(D|B)) é cerca de 99%. Neste caso a probabilidade de mentira deliberada (P(C|B)) passa a ser próxima de 1%. Por fim, considerando a possibilidade de equívoco nestes moldes, a probabilidade do milagre ser autêntico (P(A|B)) passa a ser ainda menor (inferior a um em cem mil).

Como é natural, no que diz respeito a milagres que implicam violação das leis naturais, a sua probabilidade a priori é extremamente reduzida, pois de outra forma tais leis não teriam sido estabelecidas. Assim, para que fosse razoável acreditar neles face às evidências disponíveis seria necessário que a autenticidade destas merecesse mais crédito que as próprias leis naturais que teriam sido violadas – o que é manifestamente difícil…

Já no que diz respeito a milagres que não implicam violação das leis naturais, creio que o próprio conceito é absurdo. No próximo texto sobre este assunto procurarei explicar porquê.

6 de Julho, 2011 Eduardo Patriota

Primeira campanha ateísta do Brasil é lançada em Porto Alegre

Porto Alegre se tornou nesta terça-feira (5) a primeira capital brasileira a exibir outdoors de uma campanha de mídia sobre ateísmo. A iniciativa é da Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos e já havia sido recusada no final do ano passado pelas companhias de ônibus de São Paulo, Salvador, Florianópolis e Porto Alegre.

As peças são polêmicas e falam sobre fé, moralidade e ateísmo. Uma delas exibe as fotos de Charles Chaplin, que era ateu, e Adolf Hitler, que não era ateu, com os dizeres “religião não define caráter”. Outra afirma “Somos todos ateus com os deuses dos outros”, e traz imagens de uma divindade hindu, uma divindade egípcia e de Jesus de Nazaré, com as legendas “mito hidu”, “mito egípcio” e “mito palestino”. Uma terceira diz que “A fé não dá respostas, só impede perguntas”. Os cartazes devem ser exibidos ao longo de um mês.

Conforme pesquisa realizada pela Fundação Perseu Abramo, os ateus são as pessoas mais detestadas no país, merecendo repulsa, ódio ou antipatia de 42% da população. Para o presidente da entidade, Daniel Sottomaior, o propósito da campanha é aproximar o ateísmo do dia-a-dia da sociedade e assim ajudar a diminuir o preconceito que existe contra ateus.

(Fonte: Sul 21, via Paulopes)

5 de Julho, 2011 Eduardo Patriota

No RJ, biblioteca sem bíblia passará a ser multada

Um triste golpe no laicismo que permite que as diversas religiões convivam pacificamente num mesmo país. Quem lê a nova lei, fútil e inútil, promulgada no Rio de Janeiro, pensa até que não há problemas de verdade para resolver por lá.

O governador Sérgio Cabral (PMDB) sancionou lei de autoria do deputado evangélico Edson Albertassi (PMDB), 42, que obriga as bibliotecas do Estado a terem Bíblia. A biblioteca que descumprir a lei será multada em R$ 2.130 e, no caso de reincidência, em R$ 4.260.

A lei é polêmica porque o Estado, por ser laico, não pode fazer imposições de cunho religioso, ainda mais em se tratando de uma determinação que beneficia uma única denominação, no caso a cristã. A lei deixa de fora, por exemplo, livros espíritos, ao Corão e ao Torá.

O mesmo deputado apresentou projeto de lei para cada uma destas propostas: instituição do ensino religioso obrigatório, leitura da Bíblia antes do começo das aulas, isenção de IPVA às igrejas e de ICMS na compra de automóveis e a inscrição da frase “Deus seja Louvado” nas contas das concessionárias de serviços públicos. Albertassi é diácono da Assembleia de Deus de um templo da cidade de Volta Redonda.

22 de Junho, 2011 João Vasco Gama

Razões para não acreditar

Alguns deístas apresentam Deus como uma abstracção infalsificável.
No que diz respeito a tal abstracção, tenho boas razões para nela não acreditar, com esta exposta por Bertrand Russel:

«Da minha parte, poderia sugerir que entre a Terra e Marte há um pote de chá de porcelana girando em torno do Sol numa órbita elíptica, e ninguém seria capaz de refutar minha asserção, sendo que teria o cuidado de acrescentar que o pote de chá é pequeno demais para ser observado mesmo pelos nossos telescópios mais poderosos.
Mas se afirmasse que, devido à minha asserção não poder ser refutada, seria uma presunção intolerável da razão humana duvidar dela, com toda a razão pensariam que estou a dizer tolices.
»

Não obstante, no que diz respeito a várias religiões teístas, em particular o cristianismo, tenho razões muito mais fortes não acreditar nas alegações feitas – a sua própria inconsistência interna, a incoerência entre as várias alegações associadas a cada uma destas religiões.

O video que se segue explica de forma muito clara e competente algumas das principais.
Tive muito prazer em vê-lo e quero por isso partilha-lo com todos:

Texto também publicado no Esquerda Republicana.

3 de Junho, 2011 Eduardo Patriota

Congresso Mundial Ateísta começa hoje na Irlanda

Cerca de 350 delegados internacionais são esperados para participar neste fim de semana da Primeira Convenção Mundial de Ateus, em Dublin, Irlanda.

Organizado pela Atheist Ireland, o evento que vai de 3 a 5 de junho marcará também o lançamento de um grupo que pretende reunir  ateus do mundo inteiro, a Atheist Alliance International. Seu primeiro presidente será Tanya Smith, da Fundação Ateísta da Austrália.

Participarão do encontro delegados vindos dos EUA, da Europa, da América do Sul e da Oceania. A convenção será dirigida pelo professor britânico Richard Dawkins, a neurobióloga dinamarquesa Lone Frank, a consultora inglesa Paula Kirby e o autor indiano Aroup Chaterjee.

Serão discutidos vários temas na convenção, como “Ciência estranha versus religião estranha”, a educação secular e os direitos humanos. Haverá debates sobre as leis da blasfêmia, as mulheres ativistas ateias, aceitação ou confrontação das religiões, comunicando o ateísmo e a construção de alianças ateistas. Serão votados também os termos da “Declaração de Dublin sobre religião e vida pública”.

(Fonte: Pavablog)

29 de Abril, 2011 Ricardo Alves

O estado mundial da crença

Segundo uma sondagem IPSOS, 51% da população mundial acreditará numa «entidade divina», enquanto 18% serão ateus e 17% agnósticos. 51-35 não é um mau resultado, se tivermos em conta que a sondagem incluiu apenas 23 países. Aliás, é significativo que os Estados com maiores percentagens de crentes sejam a Indonésia (93%), a Turquia (91%), o Brasil (84%), a África do Sul (83%) e o México (78%), enquanto os Estados com maior percentagem de ateus são a França (39%), a Suécia (37%), a Bélgica (36%), o Reino Unido (34%), o Japão (33%) e a Alemanha (31%). O ateísmo aparece correlacionado com a literacia, o conforto social e níveis baixos de violência e criminalidade. (O Extremo Oriente, curiosamente, parece ser um bastião do agnosticismo, com percentagens de 54% no Japão, 52% na China e 50% na Coreia do Sul; uma cultura indiferente à «crença»?)

A mesma sondagem aponta maior percentagem de evolucionistas do que criacionistas: 41%-28% (31% «não sabem»).

12 de Abril, 2011 Ricardo Alves

Ateísmo: o último tabu?

Em Madrid podem realizar-se manifestações fascistas e paradas do orgulho gay. Parece que não pode é realizar-se uma «procissão ateia» (um nome que é um raio de um oxímoro, mas enfim). Ou só pode se não for na quinta-feira que é «santa» para os católicos. A Arábia Saudita afinal é já aqui ao lado?

10 de Março, 2011 Ricardo Alves

Censo de 2011: quantos infiéis somos?

Está na rua o Censo de 2011. Como ateu consciente e cidadão atento à evolução do fenómeno religioso, interessa-me a última pergunta do questionário individual: a delicada «qual é a sua religião». A situação é conhecida: o grupo em que me incluo, os «sem religião», é a maior minoria, e também a que mais cresceu entre 1991 e 2001.

O censo é a única operação oficial de contagem dos residentes em Portugal por critério de religião. Felizmente a única, porque o Estado não deve meter o nariz no que é matéria de convicção pessoal. E assim a Constituição nos garante, como deve, o direito de nem responder à questão.

As respostas registam sempre um número elevadíssimo de católicos, quase quatro vezes superior aos que se encontram na missa em qualquer domingo. O que acontece, em primeiro lugar, porque muitas pessoas entendem a pergunta «qual é a sua religião» como uma questão sobre se foram baptizados ou não. Mas não é disso que se trata.

Não ajuda que a pergunta do censo mencione, logo em primeiro lugar, a resposta «católica». Em mais nenhuma pergunta se seguiu, como a da religião aparenta, o critério da maioria (esperada) das respostas para as ordenar. Por exemplo: as respostas para o país de nascimento (quando no estrangeiro, questão oito) seguem a ordem alfabética. E as respostas à pergunta «como se desloca para o trabalho» (questão 21) começam com «a pé», e não «de carro» ou «de autocarro». No mínimo, o ordenamento é capcioso.

Também não ajuda que as categorias não católicas que se oferecem como resposta tenham designações tão estranhas que dificultam a identificação. «Ortodoxa» é um modo de viver a religião, não é uma religião. Seria melhor usar «católica romana» e «católica ortodoxa». «Protestante» será adequado para luteranos ou anglicanos, mas não para a maior minoria religiosa não católica, os que se designam a si próprios como «cristãos evangélicos». «Judaica» levanta outra questão: porquê incluir uma comunidade religiosa tão diminuta (quatro locais de culto no país inteiro) quando o Censo ignora as Testemunhas de Jeová (650 c0ngregações em Portugal, dizem eles) ou a IURD (que chegam a usar estádios de futebol)? Parece, sejamos claros, discriminatório. Porque, das duas, uma: ou o critério aqui deveria ser o número, e as opções seriam outras, ou a lista deveria ser exaustiva, e seria muito mais longa (ou com uma opção em aberto para se acrescentar «ateu», «agnóstico», «pagão», «satânico» ou «cavaleiro de Jedi»).

Seja qual for a opção, nada melhor do que escolhê-la esclarecidamente.

[Diário Ateísta/Esquerda Republicana]