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Mês: Março 2010

8 de Março, 2010 Carlos Esperança

Considerações sobre as religiões

Não podemos deixar-nos iludir pelo aparente carácter benigno do cristianismo actual, confiantes de que a luta contra a tirania eclesiástica e os seus interditos foi ganha pelo Iluminismo, pela Revolução Francesa e pela secularização em curso na Europa. Não há vitórias definitivas. O Deuteronómio, que inspirou os inquisidores e não foi revogado, ordena explicitamente aos fiéis que matem qualquer pessoa que professe simpatia por deuses estrangeiros e exige ainda que as pessoas demasiado susceptíveis para tomar parte nas chacinas religiosas devem, também elas, ser mortas. (Ob. Citada 17:12-13).

A raiva e frustração árabe contra o Ocidente, que está na origem do terrorismo suicida e assassino, bem como do seu atraso económico, social e político, é consequência dos versículos do Corão que intoxicam e enlouquecem os crentes. Ler esse plágio grosseiro dos versículos bíblicos, imune à influência da cultura grega e do direito romano, mostra  a escassez da compaixão em detrimento da violência, a submissão humana à vontade do deus – o clemente – que um profeta analfabeto imaginou.

As páginas do Corão apelam constantemente à destruição dos infiéis, da sua cultura e civilização, bem como dos judeus e cristãos (por esta ordem) em nome do mesmo Deus misericordioso que alimenta a imensa legião de clérigos e hordas de terroristas.

Como entender que haja quem creia, e, pior, quem aceite impor a tolice criacionista nas escolas e que a Terra, apenas a Terra, nasceu no Sábado, 22 de Outubro de 4004 A.C., às seis horas da tarde – como infantilmente calculou o famoso arcebispo James Ussher de Armagh –, num universo que terá começado há cerca de 12 mil milhões de anos?

Com que cara fitaria hoje, cada um de nós, homens civilizados, a nossa mãe, a mulher, as nossas filhas ou as irmãs, se cumpríssemos a recomendação do Talmude – manual de maus costumes, como diria Saramago –, o livro sagrado mais antigo, em uso contínuo, que ordena ao crente que agradeça todos os dias ao criador por não o ter feito mulher?

É essa misoginia que observamos em Paulo de Tarso, judeu de cuja dissidência nasceu o cristianismo, quando expressava medo e desprezo pelas mulheres, que o A.T. afirmava terem sido criadas para uso e consolo do homem. Que demência pode justificar o medo primitivo de que metade da raça humana fosse simultaneamente suja e impura como atestam os textos religiosos?

Se os funcionários de deus não tentassem inculcar a religião de forma coerciva, não teríamos necessidade de uma vigilância contínua e de autodefesa, mas estamos longe do arrefecimento do entusiasmo prosélito e do totalitarismo das religiões que disputam o mercado da fé. Santo Agostinho continua a ser uma referência ética da Igreja católica, o santo doutor que argumentava que se a tortura era adequada para aqueles que violavam as leis dos homens era-o ainda mais para aqueles que violavam a lei de Deus. (O Fim da Fé, Sam Harris, pág. 94)

7 de Março, 2010 Carlos Esperança

Ratisbona – calcanhar de Aquiles de B16

“Os abusos sexuais de menores por parte de responsáveis do clero são actos criminosos, vergonhosos, pecados mortais inadmissíveis”, disse ao diário italiano La Repubblica o cardeal Walter Kasper.

O clérigo alemão, próximo colaborador do Papa Bento XVI, reagiu assim com indignação aos recentes escândalos sexuais que têm abalado a Igreja Católica.

O mais recente envolve o coro de Ratisbona, na época em que era dirigido pelo arcebispo Georg Ratzinger, irmão do Papa.

7 de Março, 2010 Carlos Esperança

Razões para ser ateu (3)

As religiões foram algumas vezes perseguidas, sempre por razões políticas, mas as suas perseguições foram motivadas por crenças. Ninguém combate os talibãs por acreditarem que deus é grande ou que Maomé seja o seu profeta, nem por rezarem cinco vezes ao dia ou por jejuarem, mas sim  pelos atentados que perpetram, pela guerra santa (jihad) que promovem e pelos actos terroristas que praticam. O terrorismo pio invoca a vontade divina e é motivado pelo ódio aos infiéis e pela ânsia da conquista do Paraíso.

O que terá levado o Vaticano, o arcebispo de Cantuária e o rabino supremo de Israel a tomarem uma posição favorável ao aiatola Khomeini quando, na sua pia demência, condenou à morte Salman Rushdie pelo abominável crime de…ter escrito um livro?

Para as horrendas criaturas estava em causa um crime hediondo – a blasfémia –, um crime de sabor medieval que é um direito cívico de liberdade de expressão e o dever de abandonar uma religião – apostasia –, religião que no seu implacável proselitismo ameaça vergar o mundo, pela guerra, à vontade de Maomé. Os dignitários admitiram os assassinatos cometidos para cumprir a fatwa, e a vida dos tradutores, editores, livreiros e do próprio autor foram irrelevantes perante a fúria demente de quem julga ter rios de mel e dezenas de virgens, a título perpétuo, pela prática de um crime.

É perigoso deixarmos iludir-nos pelo carácter aparentemente benigno do cristianismo actual, confiantes de que a luta contra a tirania eclesiástica e os seus interditos foi ganha pelo Iiluminismo, a Revolução Francesa e a secularização em curso na Europa. Não há vitórias definitivas. O Deuteronómio, que inspirou os inquisidores e não foi revogado, ordena explicitamente aos fiéis que matem qualquer pessoa que professe simpatia por deuses estrangeiros e exige ainda que as pessoas demasiado susceptíveis para tomar parte nas chacinas religiosas devem, também elas, ser mortas. (Ob. Citada 17:12-13).

6 de Março, 2010 Ludwig Krippahl

Treta da semana: a mediocridade do colunismo.

O Henrique Raposo, colunista do Expresso, escreveu esta semana sobre o Christopher Hitchens (1). Ou talvez tenha sido sobre o ateísmo. Ou sobre a «família de esquerdistas que deixou de pensar quando o fascismo e o nacionalismo acabaram na Europa.» Ou, se calhar, foi sobre outra coisa qualquer. Apesar de curto, mérito que lhe reconheço, o texto do Henrique anda por muitos lados sem chegar a parte nenhuma.

O título diz ser sobre a mediocridade do ateísmo mas o texto alega que Hitchens só ataca a religião porque é de esquerda, explica que Hitchens é zangado é preguiçoso e remata dizendo que Hitchens deve tudo a Deus. Não percebo como isso tornaria o ateísmo mais medíocre mesmo que fosse verdade. Não sei o que o Henrique julga que é o ateísmo, mas o meu não se torna medíocre por causa do Hitchens. Isto para mim não é pertencer a um clube de futebol ou a uma seita religiosa. O meu ateísmo é uma opinião minha, pelas minhas razões e se for medíocre a culpa é minha e não do Hitchens.

É irónico que o Henrique chame preguiçoso ao Hitchens quando «compara, de forma leviana, a religião ao fascismo» sem lembrar o «papel essencial da religião na luta contra os totalitarismos do século XX». É o típico exagero do protagonismo “da religião” (como se só houvesse uma). O que derrotou os totalitarismos do século XX foi a industria dos EUA e URSS nos anos 40 e a economia do ocidente nas décadas seguintes. Esses foram os factores mais importantes. Não foram os segredos de Fátima que derrubaram o muro de Berlim nem as forças armadas do Vaticano que tiraram Hitler do poder. E na entrevista que o Henrique refere, Hitchens apenas afirmou que «Nos anos 30 e 40 do século XX, diria que a mais perigosa era o catolicismo romano porque estava relacionado com o fascismo»(2). O apoio do Vaticano a Mussolini é um dado histórico bem estabelecido.

A acusação de preguiça é irónica porque basta um pouco de atenção para ver que várias seitas religiosas fundamentalistas, cristãs, muçulmanas e outras, adoptam elementos do fascismo. O nacionalismo, as formas de liderança, a revitalização pela violência e outros. E o próprio fascismo começou pela mistura de política e religião. Segundo Mussolini, o fascismo é «uma concepção religiosa na qual o homem é visto na sua relação imanente com uma lei superior e com uma Vontade objectiva que transcende o indivíduo e o eleva à participação consciente numa sociedade espiritual»(3). Isto e as milícias armadas dos fundamentalistas cristãos nos EUA, ou organizações como al Qaeda, mostram que a relação de certas religiões com o fascismo não é um capricho preguiçoso nem leviano do Hitchens. É uma tendência preocupante.

No fim, o Henrique Raposo remata com «nunca digo que sou ateu. Sou agnóstico. E, como agnóstico, digo que é mais fácil falar com um crente do que com um ateu. Aliás, é impossível dialogar com um ateu.» E pronto. Não explica o quê, nem porquê, nem como ser impossível dialogar com um ateu faz com que o Henrique já não saiba se existe ou não existe Deus.

O texto do Henrique é uma baralhada incoerente de alegações. Não se percebe se é por estar zangado ou por ser de esquerda que o Hitchens deixa de ter razão. Não explica o que os problemas do Hitchens possam ter que ver com a mediocridade do ateísmo. E ainda menos como é que o Henrique ficou agnóstico por causa disso. Reforça também a ideia que se deve ser agnóstico para não incomodar os crentes. Deus não existe, mas vamos todos dizer ah, não sei, a ver se ninguém se aborrece. E quanto a ser impossível dialogar com ateus, talvez fosse boa ideia experimentar primeiro. Isso, e pensar no que quer dizer antes de escrever e carregar em “publish”.

1- Expresso, A mediocridade do ateísmo. Obrigado a todos que me enviaram isto por email. O Raul Pereira também comentou isto neste post.
2- I, “A religião envenena tudo e não acaba porque somos egocêntricos”
3- Wikipedia, Neo-fascism and religion

Também no Que Treta!.

6 de Março, 2010 Carlos Esperança

Razões para ser ateu (2)

É difícil provar a inexistência do que quer que seja. Não é possível demonstrar que não existem, por exemplo, o abominável Homem das Neves, o monstro de Loch Ness ou as Sereias, ainda que destas últimas haja testemunhos numerosos e, alguns, de pessoas tão respeitáveis como Cristóvão Colombo que referiu, por escrito, tê-las avistado na costa da América, mas não nos esqueçamos de que o ónus da prova cabe a quem afirma a existência de deus e, sobretudo, a quem vive à sua custa. Se as religiões continuassem a dominar as mentes, a busca da verdade e a investigação científica teriam sofrido um atraso grave.

Como Bertrand Russell, estou tão firmemente convencido da nocividade das religiões como estou da sua falsidade (in Porque não sou cristão – Brasília Editora – Porto).

B. R. previu que “a condenação, pelo catolicismo, do controlo da natalidade, caso viesse a impor-se – como aconteceu –, tornaria impossível a supressão progressiva da miséria e a abolição das guerras”. Denunciou igualmente o sofrimento inútil causado pelas crenças hindus sobre o carácter sagrado da vaca e a suposta imoralidade da viúva que se casa de novo. E não lhe passaram despercebidas as várias abominações provocadas pela crença comunista na ditadura de uma minoria de verdadeiros crentes. (id, ibidem).

Não resisto a registar esta ironia certeira de Russel: « os protestantes gostam de ser bons e inventaram a teologia para que se conservassem assim, enquanto os católicos gostam de ser maus e inventaram a teologia a fim de fazer com que os seus vizinhos se conservem bons» (id. Ibidem).

5 de Março, 2010 Carlos Esperança

Os outros milagres são verdadeiros?

Imprensa polaca questiona milagre atribuído a João Paulo II

Freira foi inexplicavelmente curada do Mal de Parkinson após rezar para papa; Vaticano rebate questionamento.

Processo de beatificação de João Paulo II pode ser concluído ainda neste ano (Reuters)

CIDADE DO VATICANO – Um jornal polaco questionou nesta quinta-feira, 4, a veracidade do milagre atribuído a João Paulo II, ressaltando assim que o processo de beatificação do pontífice, em andamento no Vaticano, poderia sofrer atrasos, o que foi negado por autoridades da Santa Sé.

5 de Março, 2010 Carlos Esperança

Razões para ser ateu

Não há a mais leve suspeita ou o menor indício de que deus exista, nem ele, alguma vez, fez prova de vida. Não há qualquer evidência de que exista o ser que os homens criaram à sua imagem e semelhança, onde se notam traços evidentes das tribos patriarcais que há cerca de seis mil anos o inventaram.

Há razões intelectuais para descrer de um deus de que não existe qualquer prova, apesar dos risíveis milagres que lhe atribuem para perpetuar uma crença inculcada, quase sempre na infância, e alimentada pelos constrangimentos sociais e na perpetuação dos medos como mecanismos de manutenção do poder.

São razões morais as mais fortes para que o ateísmo não se transforme numa convicção pessoal silenciosa, pois jamais alguém matou ou foi morto por duvidar do movimento de rotação da Terra ou da lei da gravidade, mas diariamente se mata e morre em nome de um deus verdadeiro que cada crente julga ser o seu. Não há lapidações, fogueiras ou decapitações para quem não acredite numa lei da física ou numa teoria da biologia mas corre perigo quem manifesta dúvidas sobre a sanidade mental dos profetas ou sobre os ensinamentos que cada religião propaga.

Não podemos conformar-nos com o ódio que os sunitas sentem pelos xiitas, os cristãos pelos judeus, os muçulmanos pelos hindus e, todos, por quem não acredita nos poderes invisíveis que controlam o universo.

Temos de ter presente que as religiões monoteístas, cheias de interditos, são herdeiras e guardiãs dos preconceitos morais de uma época mais cruel e intolerante do que hoje. Há, pois, razões morais para nos opormos à vingança, crueldade, violência, espírito misógino e homofobia que as religiões propagam e às relações de poder que desejam perpetuar, nomeadamente à subordinação a que querem submeter a mulher.