Sem maniqueísmo, facilmente se admira o atual Papa e desculpa o passado nebuloso do cardeal Bergoglio, benevolente com o ditador Videla e hostil à presidente Kirchner, em sintonia com os Papas de turno, e a presente sujeição ao Opus Dei na convocação de defuntos para alimentar a indústria dos milagres e a criação de beatos e santos.
A vida de figuras públicas tem zonas claras e escuras, e as circunstâncias moldam mais os homens do que estes as circunstâncias. O Papa Francisco é, no conjunto da sua vida, um homem respeitável e, quiçá, o mais estimável dos líderes religiosos mundiais. Não merecia a catadupa de problemas que desabam sobre ele. O futuro dirá se foi o homem certo na hora errada ou o homem errado que chegou na hora certa ao Vaticano.
Ao receber a tiara, o solidéu branco, a romeira, os sapatos vermelhos, a infalibilidade e a diocese de Roma, que vagara porque o antecessor trocou a santidade pela vida, estaria longe de imaginar as desgraças que desabariam sobre ele.
São do domínio público as ligações do Vaticano à Máfia, que Francisco teve a coragem de cortar, a lavagem de dinheiro no IOR, pseudónimo do banco do Vaticano, a que pôs cobro, e a tentativa de acertar o passo com a modernidade e a ética, numa manifestação de coragem que o nobilita.
Não vale a pena escarafunchar os escândalos que envolvem o clero católico, verdadeiros e infamantes, habilmente aproveitados pela concorrência, mais perigosa e assustadora.
Só quem tem a noção dos séculos de impunidade da Cúria Romana pode apreciar a luta deste jesuíta determinado e corajoso, perante um antro de reacionários e dissolutos.
A ousadia de quebrar a moral da Idade do Bronze, quando o Deus de Abraão foi criado por patriarcas tribais, valeu-lhe a aversão da tralha beata, que se confunde com os mulás e sonha com as Cruzadas e à Inquisição. As suas manifestações de humanismo cativam crentes e livres-pensadores, os que defendem a modernidade e se reveem na civilização herdada do Iluminismo e da Revolução Francesa.
Quando alterou o parágrafo do catecismo da Igreja católica sobre a Pena de morte, que considerou “inadmissível” e fez a rutura com a doutrina tradicional, era de admitir que o avanço civilizacional, que incentivava a abolição em países de influência católica, fosse acolhido pelo clero como um momento alto da história milenar do cristianismo e tivesse o consenso de todo o clero, ressarcido das nódoas que o atingem por um ato que honra a Igreja e, por extensão, a clerezia apostólica romana.
Foi uma ingenuidade, não certamente do Papa, que conhece a Santa Máfia que o rodeia, mas dos incréus que ainda aguardavam o contributo do Vaticano para um mundo mais humanista e alinhado com a modernidade.
Enquanto livres-pensadores saudaram a posição do Papa, agitaram-se as sotainas e, do antro do Vaticano e de sucursais reacionárias, surgiram urros de trogloditas que acusam o Papa de adulterar a palavra do Deus deles, que continua aquele velhaco e cavernícola, à imagem e semelhança dos trogloditas para quem a pena de morte é exigência divina.
A repressão sexual, comum aos monoteísmos, foi sempre um instrumento de domínio do clero sobre a sociedade e do homem sobre a mulher.
O judaísmo, com menos de 20 milhões de judeus, muitos deles agnósticos e ateus, é o monoteísmo cuja primeira cisão com êxito originou o cristianismo. É hoje irrelevante no número de crentes, contrariamente ao poder político, militar e financeiro, e não erradica os escândalos sexuais dos muftis, rabinos e judeus de trancinhas à Dama das Camélias.
O islamismo, plágio tosco do judaísmo e cristianismo, é implacável na misoginia e em outras perversões que o misericordioso Profeta, analfabeto e amoral, introduziu com a violência do guerreiro e a demência do prosélito. Mas é a sexualidade que ora importa e, nesse aspeto, a violência contra a mulher e a pedofilia são direitos masculinos exercidos em casamentos sem consentimento da mulher, na lapidação por adultério e casamentos com crianças de 9 anos. Mais do que religião, o islamismo é um fascismo inconciliável com a liberdade, os direitos humanos e a civilização.
No cristianismo, onde a Reforma foi uma lufada de ar fresco, coube à Igreja romana ser a guardiã dos valores mais retrógrados, que a Contrarreforma defendeu com a violência da alegada ortodoxia. O direito romano foi-lhe introduzindo a componente civilista e as democracias impuseram-lhe a laicidade. Hoje, com o fundamentalismo a contaminar as Igrejas evangélicas, o catolicismo romano tornou-se a versão mais tolerante e civilizada dos monoteísmos, mas não conseguiu libertar-se da imposição do celibato ao clero nem da discriminação da mulher.
Penso que reside nestas duas aberrações, aliadas à obsessão da castidade, a que se junta o livre escrutínio que só as democracias permitem, a sucessão de escândalos sexuais que a comunicação social e a justiça terrena têm investigado, divulgado e punido.
Nestes últimos dias o Vaticano sofreu a vergonha do maior escândalo sexual de sempre, com a divulgação do abuso de mais de mil crianças, por mais de 300 padres da diocese da Pensilvânia, EUA, durante sete décadas, com a conivência de bispos e, desde 1963, o conhecimento e tolerância do Vaticano. É uma desgraça para a Igreja e a ruína da fé.
A quebra ética de uma Igreja cuja dissimulação permitiu ocultar durante séculos os seus crimes, não deixará de ser usada pela concorrência, hoje muito mais reacionária e perigosa. É irónico que os escândalos de que foram cúmplices numerosos papas, muitos já canonizados, desabem sobre o primeiro que lhes quis pôr termo e a quem escasseiam apoios para abrir as portas do sacerdócio às mulheres e as do casamento ao clero.
Curiosamente, enquanto a ICAR* lambe feridas e suporta a vergonha e as decisões dos tribunais, Xuecheng, o abade do famoso templo de Longquan, demitiu-se da presidência da Associação Budista** da China, por assédio e violação das monjas. As hormonas apearam o principal líder espiritual chinês, que atingiu o mais alto cargo em 2015, antes dos 50 anos, com assento na Conferência Consultiva Política do Povo Chinês, órgão de assessoria do Governo, de que igualmente se demitiu na última quarta-feira. Sic transit gloria mundi 😊
* ICAR – Igreja Católica Apostólica Romana; ** O budismo não é um teísmo, mas é considerado religião. 
Antes da guerra de 1939/45
O Presidente da Eslováquia era um monsenhor cruel da Igreja católica, um fascista implacável.
Engana-se quem pensa que a Senhora de Fátima é apenas um dos avatares da Virgem Maria, personagem mítica com mais heterónimos do que Fernando Pessoa.
A Senhora de Fátima foi a criação clerical de um instrumento contra a República e uma imagem de marca do povo que a monarquia legou beato, analfabeto e supersticioso, um epifenómeno contra a laicidade, a democracia e o secularismo.
A «Senhora mais brilhante do que o Sol» iniciou a carreira de pitonisa na Cova da Iria, depois de vários fracassos em locais mais instruídos e urbanizados. Foi em 13 de maio de 1917 que apareceu, pela primeira vez, no ermo que a promoção pia transformou num dos mais concorridos destinos turísticos.
A Senhora começou por atrair a atenção de três pastorinhos, sendo a Lúcia a que ouvia e via, a Jacinta a que só ouvia e o Francisco que não ouvia nem via. Os rapazes são lentos a despertar os sentidos. Começou por dizer-lhes que Deus se encontrava muito zangado, que queria toda a gente a rezar o terço, e anunciou-lhes, em exclusivo, um imprevisível acontecimento, o fim da guerra em curso, como se o que tem início jamais tivesse fim.
Em 13 de outubro, perante vasta assistência, a Senhora de Fátima, excelente trepadora de azinheiras, fez um número privativo, só replicado nos jardins do Vaticano, à mesma hora, para conhecimento especial do Papa: pôs o Sol a rodopiar em tons de prata fosca, um episódio acrobático que assombrou a assistência.
Após 1926, consolidada a ditadura, e com o enviado da Providência no Governo, como a Lúcia havia de dizer ao cardeal Cerejeira, referindo-se a Salazar, a Senhora de Fátima dedicou-se à Rússia, que confundia com a URSS, cuja conversão rogava, através da reza do terço, e à defesa do regime, no plano interno, com a mesma prescrição e posologia.
Desistiu então de surgir aos pastorinhos e dedicou-se a visitar comunistas arrependidos, sobretudo os que não aguentaram torturas da Pide e entregaram camaradas. Conseguiu libertá-los da prisão e arranjar empregos, mimos que os conversos retribuíam com velas acesas à janela nos dias 13 de maio e de outubro de cada ano.
A Senhora de Fátima, entrava nas celas de presos políticos que tinham confessado tudo, a confissão é um alívio, e dizia-lhes que tinham sido enganados e deviam arrepender-se. Foi assim que o pai de um conhecido advogado, rico e prestigiado, abjurou as ideias falsas, como alguns outros, e substituiu a foice e o martelo pelo terço e a cruz, a Internacional pelo Ave e a clandestinidade pelo sossego do lar.
A Senhora de Fátima pode ter sido clonada em outras latitudes de hegemonia católica, mas a legítima, a original, com toque rural e determinação prosélita, é 100% nacional.
A AR, por reverência às maratonas pias que soem fazer-se ao santuário, resolveu criar, em 27 de junho de 2014, o Dia Nacional do Peregrino, devoção do PSD/CDS, ofuscada pela abstenção dos deputados do PCP, BE, 26 do PS e esconjurada com 4 votos contra do PS. O parlamento, que recusara o Dia Nacional do Cão, meritória iniciativa do PSD, elegeu então, por larga maioria, o dia 13 de outubro, desobrigados os deputados pios de votarem de joelhos e mãos postas.
Exultaram as sacristias e o santuário, com devotos comovidos com os votos da AR. 
O arcebispo de Toledo, Braulio Rodríguez, está no centro de controvérsia em Espanha por ter feito declarações sobre violência doméstica durante uma missa, nas quais culpa em parte as mulheres por serem agredidas pelos maridos. A maior parte dos casos de violência doméstica, disse Rodríguez, acontece porque os maridos “as rejeitam por não acatarem as exigências deles”, ou porque “ela pediu a separação”.
As declarações, feitas numa missa celebrada a 27 de dezembro na catedral de Toledo, foram registadas pelo boletim da diocese e divulgadas pelos meios de comunicação locais, até chegarem esta semana a jornais nacionais como o El País.»
D1A – A notícia é de 2016, mas o troglodita continua a ser arcebispo de Toledo.
«Representante da Federação das Associações Muçulmanas do Brasil (FAMBRAS), Mohsin Ben Moussa apresentou o posicionamento do islamismo em relação à descriminalização do aborto. Durante a audiência pública sobre o tema, realizada nesta segunda-feira (6) no Supremo Tribunal Federal (STF), o presidente do Centro Islâmico de Estudos Acadêmicos afirmou que, conforme as normas islâmicas, o aborto é permitido nos primeiros seis dias de gestação, por se considerar que nesse período ainda não há vida.»
O Diário de uns ateus é o blogue de uma comunidade de ateus e ateias portugueses fundadores da Associação Ateísta Portuguesa. O primeiro domínio foi o ateismo.net, que deu origem ao Diário Ateísta, um dos primeiros blogues portugueses. Hoje, este é um espaço de divulgação de opinião e comentário pessoal daqueles que aqui colaboram. Todos os textos publicados neste espaço são da exclusiva responsabilidade dos autores e não representam necessariamente as posições da Associação Ateísta Portuguesa.