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Categoria: Cristianismo

14 de Maio, 2010 Fernandes

Venha a nós o vosso reino

– «Enfrentamos um dilema, se damos a impressão de sermos demasiado ricos, o povo não nos “apoia”; se parecemos pobres de mais, perdemos o seu respeito»; confidencia um cardeal milionário no livro de Nino lo Bello: O Empório do Vaticano. Quiçá uma das expressões menos lisonjeiras, ouvidas em Roma; utilizada por católicos e usada há pelo menos cinco séculos para descrever os negócios papais, seja: – La Bottega del Papa, ou La Santa Bottega-, “A loja do Papa”. Eles referem-se não apenas aos interiores dourados das igrejas e santuários mas também às riquezas do Papa. Quando os italianos discutem o Vaticano, acabam quase sempre por encolher os ombros e lembrar-nos que “l`oro non fa odore”.

Os leigos obedecem e não questionam a sua religião ou os elementos dedicados que a ministram, com assuntos práticos e terra-a-terra, como dinheiro e economia. A maioria dos católicos não pensa no Vaticano como uma empresa financeira, ou seja, como um centro nervoso da alta finança, organização interessada em lucros, activo e passivo com receitas e despesas. A noção de que o Papa é multimilionário, e que a sua Igreja não é apenas uma instituição religiosa mas essencialmente um gigantesco império financeiro, passa despercebido à maioria dos fiéis.

O estado do Vaticano é a comunidade mais singular do mundo, ao contrário das outras nações, não dispõe de indústria válida, agricultura ou recursos naturais, no entanto, enfileira ao lado dos países mais ricos do planeta. A riqueza ostensiva do enclave de 108,7 acres, dentro das sólidas Muralhas Leoninas, – igrejas magnificentes, muitos milhares de tesouros artísticos e manuscritos preciosos -, apenas servem de cume visível ao “icebergue” financeiro, já que a parte mais vultosa jaz abaixo da superfície num secretismo total.

Único Estado soberano que jamais publica um orçamento. Os estádios financeiros da actividade do Vaticano mantêm-se rodeados pelo segredo. O Vaticano é a única religião organizada a guardar estritamente para si os seus negócios venais. Quanto à fortuna do Papa, nem ele nem nós sabemos exactamente o valor. Sabemos apenas que o Vaticano é uma das maiores organizações financeiras do planeta, ocultando as suas operações financeiras cuidadosamente sob um véu de obscuridade e divulgando constantemente uma imagem de falsa pobreza, fazendo passar a ideia de que tem fracos rendimentos e enormes despesas.

O não pagamento de impostos na maior parte dos países onde a igreja católica se instala, a sua total liberdade de acção (que faz a inveja de qualquer homem de negócios) e o secretismo a par da ausência de relatórios de contas ou fiscalização, a que se juntam os contactos diplomáticos e a informação privilegiada, permitem-lhe toda a vantagem sobre os concorrentes, sendo que, no Vaticano, a soma de dois mais dois nunca dá quarto ou vinte e dois, mas centenas de milhares de dólares.

Os quase 90 milhões de dólares pagos por Mussolini ao Papa, resultantes do Tratado de Latrão, rapidamente se transformaram em 550 milhões, pelas mãos de Bernardino Nogara que gastou 26,8 milhões para adquirir ouro aos Estados Unidos, parte desse ouro foi posteriormente revendido aos mesmos, ficando o Vaticano com um lucro líquido final de 21,8 milhões de dólares. A manobra implicou contas do Vaticano em bancos suíços. Pediam ao banco suíço que depositasse dinheiro do Vaticano em Nova Iorque, mas em nome do próprio banco. Seguidamente, providenciavam no sentido de o banco suíço ordenar ao banco americano recipiente que emprestasse dólares a uma firma italiana propriedade do Vaticano. A firma italiana a quem pertencia o dinheiro em primeiro lugar, debitava-se a si própria na conta suíça pelo juro que estava a ser pago na América. Deste modo, o dinheiro do Papa era investido em segurança, e segredo, ao abrigo de qualquer interferência por parte das autoridades italianas, e isto durante um período em que o estado impunha severas restrições cambiais.

– Jamais esquecerei a primeira vez que estive no Banco da cidade do Vaticano; escreve Nino lo Bello no seu livro; – ao observar os caixas a receberem freiras, jesuítas, missionários e bispos. Num momento de acalmia, disse a um dos caixas: – suponho que alguns dos seus clientes, na qualidade de religiosos, não perceberão muito de dinheiros. O jovem deu a resposta correcta à minha demonstração de ingenuidade, comentando com a precisão de uma calculadora: – A minha experiência diz-me que todos eles sabem muito, mas mesmo muito, de dinheiros.

Além do “seu pessoal”, o Vaticano serve-se ainda dos seus uomini di fiducia (homens de confiança) que “cuidam” dos interesses do Vaticano, como laicos. O círculo é restrito e cabe-lhes “dar a cara” no mundo exterior dos negócios. Os nomes do conselho de administração numa determinada empresa ou companhia, constituem normalmente uma indicação sobre se o Vaticano a penetrou.

As empresas industriais e companhias, revelam amiúde o interesse da Igreja nelas, ao incluírem, em qualquer nível, os nomes de “agentes” conhecidos do Vaticano. “Agentes,” não será porventura a palavra mais feliz para descrever os membros do círculo laico interior, mas dá uma ideia precisa dos interesses que estes servem. Sempre que um “nome do Vaticano” aparece no conselho de administração de um serviço público, uma investigação apurará quase invariavelmente, o facto de este possuir interesses minoritários ou maioritários nessa organização.

Estes agentes, no mundo empresarial são conhecidos como os “cães de guarda do Vaticano”. Em Portugal até se atropelam na vil tentativa de subir na escala de interesses e influência, nos mais variados cargos de empresas públicas e privadas. Todos os dias desfilam na comunicação social. Eles têm poder suficiente para “vergar” o país aos interesses que representam, e para tal não olham a meios, e atingem os fins. Esta semana, em que todo o país quase parou, é o exemplo.

Não é difícil perceber como é descaradamente provocatório ao garantir os seus interesses financeiros. O Vaticano não se entrega unicamente ao comércio de Deus; a sua empresa vai muito além Dele.

7 de Abril, 2010 Fernandes

Jesus esse ilustre desconhecido (2)

As referências a Jesus, fora da Bíblia, são pouco credíveis para um filho de Deus. Vamos agora ver dentro desta.

Relativamente ao nascimento, Mateus escreve que «nasceu em Belém, região da Judeia, no tempo em que Herodes era o rei do país…», enquanto Lucas escreve que «por aquele tempo o imperador Augusto ordenou que se fizesse um recenseamento em todo o mundo. Este primeiro recenseamento foi feito, sendo Cirenio governador de Síria». Uma vez que Herodes morreu no ano 4 antes da Nossa Era, os relatos são temporalmente contraditórios. Nesse período não se registou nenhum fenómeno atmosférico que possa ser interpretado como a estrela dos reis magos, nenhuma matança de crianças, nem nenhum recenseamento romano. Este último, pelo simples facto de que naquele tempo a Judeia não estava debaixo do domínio romano. Assim sendo, estes relatos não correspondem à verdade.

Nos quatro evangelhos Jesus é chamado de Nazareno, mas só nos capítulos iniciais de Mateus e Lucas se conta o seu nascimento e se situa em Belém, sem nunca referirem o boi (ou vaca) e o burro que aparecem nos presépios. Tal como no nascimento, também da morte de Jesus não dispomos de relatos credíveis. O único dado que sabemos é que aconteceu “sob Pôncio Pilatos”, entre o ano 26 e 36 depois da Nossa Era. Não há registo dos dificilmente esquecidos prodígios que acompanharam a sua morte. É certamente falso que «desde o meio dia e até às três da tarde, toda aquela terra ficou às escuras», não poderia haver um eclipse do sol de três minutos  e muito menos de três horas, durante o plenilúnio. Surpreendentemente, nenhum historiador da época parece ter-se apercebido que naquele momento «o céu se rasgou em dois de alto a baixo, a terra tremeu, as rochas se partiram, os túmulos se abriram e muitos homens de Deus que estavam mortos ressuscitaram».

As explícitas raízes judias do nascimento e morte de Jesus, revelam semelhanças flagrantes com os mitos religiosos de outras civilizações: os egípcios Horus e Osíris, o persa Mitra, os gregos Hércules e Dionísio, inclusivamente com o asteca Quetzalcoatl. O nascimento a partir de uma virgem com a morte e posterior ressurreição, constituem óbvios arquétipos universais partilhados pelas mitologias de várias culturas. Mas a cópia mais ou menos propositada não fica por aqui: o dia 25 de Dezembro dia do nascimento de Jesus é um plágio da festa do “Sol Invictus” o Deus Sol, que o imperador romano Heliogábalo importou da Síria no ano 218. O imperador Aureliano instaurou o seu culto no ano 270 consagrando-lhe um templo a 25 de Dezembro do ano 274, durante a festa do “Natal do Deus Sol”, dia do solstício de Inverno segundo o calendário juliano. E em 17 de Março de 312 o imperador Constantino estabeleceu o “Dies Solis” (que ainda hoje se chama Sunday em inglês) dia de descanso romano. A substituição do culto ao “Deus Sol” pelo culto ao Deus-Cristo “eu sou a luz do mundo”, foi oficializada em 350 pelo papa Júlio I, com a imposição do dia 25 de Dezembro como nascimento de Jesus. Mas este culto não conseguiu eliminar facilmente o culto ao “Deus Sol”, como demonstra o Sermão de Natal do papa Leão Magno em 460: «É tão estimada esta religião do Deus Sol que alguns cristãos antes de entrarem na basílica de São Pedro, dedicada ao único Deus vivo e verdadeiro, viram-se para o sol e inclinam a cabeça em honra do astro fulgente. Este acto lamentável, que é repetido em parte por ignorância e em parte por mentalidade pagã, angustia-nos».

No evangelho de João, Jesus aparece como uma reencarnação de Moisés e das passagens do Êxodo. O primeiro milagre de Jesus, a transformação da água em vinho, é uma cópia da primeira praga do Egipto; a transformação do Nilo em sangue. A multiplicação dos pães, é uma adaptação do episódio do maná no deserto. A caminhada sobre as águas corresponde à divisão das águas do Mar Vermelho. A ressurreição de Lázaro; à libertação do Egipto, etc. Trata-se de compilações mais ou menos fiéis e livres dos vários trabalhos anteriores. O próprio Lucas o afirma: «muitos trataram de escrever a história dos factos sucedidos tal como nos ensinaram[…] também a mim me pareceu oportuno escrever estas coisas para que comproves a verdade de tudo quanto te ensinaram». Ou seja; são relatos mais ou menos fiéis e livres, de ensinamentos orais mas não necessariamente de Jesus. Já na primeira metade do séc. II, as “Interpretações dos ditos do Senhor” da autoria de Papías, assinalavam que Marcos se remetia aos sermões de Pedro, mas que estes haviam tido um fim catequista e não historiográfico: havia-se “inspirado” indirectamente nos sermões de Cristo mas não os havia reproduzido literalmente. Os livros de Papías que pretendiam remeter os ditos dos apóstolos para uma tradição oral; foram classificados pela “História Eclesiástica” de Eusébio, como um conjunto de «estranhas palavras e ensinamentos do Salvador, e outras coisas mais míticas».

Está claro desde o início, que os evangelhos não são obras históricas mas sim vocacionais, que falam de um personagem mais ou menos idealizado e mitificado, quando não, simplesmente inventado. A credibilidade dos evangelhos é tal, que apenas quatro são considerados canónicos e todos os outros apócrifos e rejeitados pela Igreja como autênticos. Naturalmente em questões de cânon (regra) tudo é relativo, por exemplo; nos livros do Antigo Testamento, os Macabeus, que actualmente a Igreja Católica considera canónicos, são considerados não canónicos pelos próprios judeus e apócrifos pelos protestantes, e a decisão definitiva sobre o cânon católico do Antigo Testamento não vai além de 1546 quando o Concílio de Trento estabeleceu a lista actual e declarou «anátema sobre quem não admita como sagrados e canónicos estes livros completos, com todas as suas partes, tal como são lidos na Igreja Católica». Tal facto não impede que a igreja Etíope admita ainda mais três livros como canónicos. Muitos dos evangelhos considerados apócrifos perderam-se, mas outros se conservaram e narram episódios completamente diferentes da vida de Jesus, da Virgem e dos apóstolos. Aqui a posição da Igreja varia entre uma clara aceitação de alguns documentos como oficiosos, e uma explícita recusa de outros como oficialmente heréticos.

Não deixa de ser curioso que o evangelho de Pedro parcialmente encontrado em 1886 descreva a “paixão” de Cristo de maneira análoga à dos sinópticos, mas desde uma perspectiva política diversa, anti-judia e pró-Pilatos.

4 de Abril, 2010 Fernandes

Jesus esse ilustre desconhecido (1)

No Antigo Testamento aparecem uma série de personagens e acontecimentos que fazendo parte da mitologia se vão misturando gradualmente com a história. Actualmente só os fundamentalistas recusam admitir a não existência de Abraão, Isaac, Jacob, Moisés, Josué, David e Salomão, assim como a veracidade do êxodo, a conquista da terra prometida e por aí adiante; senão na sua totalidade pelo menos nos detalhes com que a Bíblia os descreve. Estas dúvidas foram inclusivamente admitidas em 2002 pelos tradicionalistas das Sinagogas Unidas do Judaísmo Conservador, que representam um milhão e meio de judeus nos estados unidos.

Mas, ao chegarmos ao Novo Testamento, até o simples facto de questionarmos a existência de Jesus e seus pretensos milagres ou a veracidade dos evangelhos, se converte numa ofensa para os cristãos e num insulto à religião. No entanto nem a arqueologia nem a história nem o Antigo Testamento contêm uma única referência ao personagem Jesus. Apenas o Novo Testamento.

As primeiras notícias sobre Jesus, são anteriores aos evangelhos, aparecem em meados do séc. I, nas cartas de Paulo, um personagem que nunca viu Cristo. Nos documentos históricos contemporâneos ou posteriores à época de Jesus, “nunca” se fala  d`Ele, e apenas quatro historiadores o referem:

Flávio Josefo: “Naquele tempo viveu Jesus, um homem sábio, pode chamar-se homem, porque realizou obras extraordinárias…” após análise criteriosa dos seus restantes escritos, conclui-se facilmente, ser uma falsificação grosseira, uma tentativa de “colar” o nome do historiador à prova existencial do suposto Jesus, e nem Orígenes que viveu no séc. III o refere, queixando-se que Flávio Josefo “não aceitava Jesus como Cristo”, enquanto Clemente de Alexandria questionava que “não dizia nada sobre as coisas maravilhosas que o Senhor havia feito”. Plínio o Jovem faz referência numa carta a Trajano em que fala vagamente, que os cristãos, “afirmavam que as culpas ou erros se redimiam no facto de encontrar o dia esperado antes da alba para cantar um hino a Cristo como se fora um deus…”.

Seutónio (referindo-se a alguém que no ano 45, estava em Roma): “ uma vez que os judeus fomentavam contínuos distúrbios instigados por Crestos, [Claudio] expulsou-os de Roma”. Crestos é a tradução do original latino Chrestus; nome derivado do grego Chrestos, que quer dizer – Bom, Valente -. Mais do que um erro de transcrição de Christus, este era um nome comum na altura. Tácito cita algumas vezes os cristãos nos seus “Annales”, dizendo que estavam em Roma no tempo de Nero, entre 54 e 65, escrevendo que “Cristo foi condenado à morte por Pôncio Pilatos, durante o reinado de Tibério”.

Estas são as passagens “não cristãs”, da antiguidade, que de alguma maneira referem Jesus . Demasiado vagas para se poderem considerar uma prova convincente da sua existência. O que não significa que não tenha existido. Houve inúmeros personagens reais, que não deixaram rasto na história oficial. Mas isso não significa que para provar a existência de Jesus só possamos confiar nas fontes do Novo Testamento, porque então o Mahabharata ou a Ilíada provariam a existência de divindades que nenhum cristão estaria disposto a aceitar como reais.

Além disso, as eventuais coincidências nos evangelhos com factos objectivos, não constituem prova alguma da veracidade dos seus personagens. A descrição dos factos na Ilíada é tão “real” que, baseando-se nela, Heinrich Schlieman conseguiu localizar em 1873 as ruínas de Troia; mas isso não nos autoriza a confirmar a veracidade do relato da batalha ou a existência dos heróis e deuses homéricos.

29 de Março, 2010 Carlos Esperança

Cristo era gay?

Pedofilia pia

Deus criou pessoas e para elas não definiu orientação sexual. Portanto, todas devem poder casar-se, se assim o desejarem, diz a teóloga feminista Myra Poole que, porém, vai mais longe: “Acredito que Cristo era gay.”

4 de Janeiro, 2010 Ricardo Alves

«Deus» é uma questão estética?

O Alfredo Dinis, como anunciara, resolveu dedicar-se aos «Grandes equívocos do ateísmo contemporâneo». O que é de saudar.

Comete um equívoco de base quando caracteriza a posição ateísta de uma forma em que muitos de nós não se revêem:

  • «Se uma afirmação é digna de crédito, então ela pode ser formulada como uma hipótese empiricamente testável pela metodologia científica. A existência de Deus não é formulável como uma hipótese empiricamente testável pela metodologia científica. Logo, a afirmação da existência de Deus não é digna de crédito».

O ateu que há em mim não se revê em nenhuma das duas premissas, embora concorde com a conclusão.

Mas a segunda premissa é a que me interessa mais refutar (embora seja totalmente ignorada no texto que refiro).

Anti-premissa#2: a existência de deuses é formulável como uma hipótese empiricamente testável pela metodologia científica. É necessário é saber de que deuses estamos a falar. Porque os cristãos (e outros) supostamente acreditam num «Deus» interventor no nosso mundo, e portanto passível de ser observado pela ciência, como «um campo gravitacional ou uma galáxia». Exemplos: um «Deus» que opera uma ressurreição; um «Deus» que faz parar a Terra; um «Deus» que criou o universo; um «Deus» que criou a espécie humana (tendo ou não criado o universo). Se em cada um destes exemplos «Deus» é uma entidade auto-consciente e interventora no universo em que existimos, as acções referidas são comprovadamente falsas porque impossíveis. Refutar as acções não é refutar a entidade em si, claro: pode existir sem actuar. Mas, nesse caso, não teria relação com o «Deus» dos mitos judeo-cristãos.

O que nos leva à primeira premissa.

Anti-premissa#1: há afirmações dignas de crédito que não podem, por enquanto ou talvez não, ser formuladas como hipóteses empiricamente testáveis. Aqui, é necessário saber muito bem de que afirmações estamos a falar. O Alfredo passa boa parte do seu texto a argumentar que há experiências fora do âmbito da ciência. Por exemplo, experiências estéticas (a arte…) ou afectivas (o amor filial) e… o «testemunho» dos primeiros cristãos. Devo confessar que não estou convencido de que a ciência não possa, um dia, explicar porque preferimos certos padrões estéticos ou cromáticos a outros, ou porque nos sentimos mais atraídos por umas pessoas e não por outras. A ciência já explicou muita coisa que parecia incompreensível ou fora do seu âmbito. Até explica como é possível que algumas pessoas delirem e vejam pessoas que não existem, ou «testemunhem» fenómenos impossíveis.

E sim, é verdade que nos conduzimos, em grande parte das nossas decisões diárias, por decisões emocionais que nada têm de científico. Tomar uma limonada em vez de uma sumo de laranja. Ou ler isto e não aquilo. Mas também é verdade que tentamos tomar decisões baseados em expectativas realistas, e não em impossibilidades. E, se em muitos aspectos da nossa vida confiamos nas informações e conselhos de outros, geralmente perdemos a confiança nesses outros quando descobrimos que fomos enganados, deliberadamente ou não.

Concluindo com o «testemunho» dos cristãos: um facto cientificamente refutável, se for transmitido por pessoas bem intencionadas durante milénios, não se torna mais credível (mas retira credibilidade a quem o repete). E mesmo que todos os cristãos da História tivessem sido pessoas bondosas (e não foram, embora isso agora não venha ao caso), a «ressurreição» não se torna mais possível.

31 de Dezembro, 2009 Ricardo Alves

Ricardo Araújo Pereira sobre a mensagem de Policarpo

O ateu Ricardo Araújo Pereira escreveu na Visão sobre a mensagem de José Policarpo. A não perder.

  • «O Natal é tempo de paz, tempo de amor, tempo de lamentar a existência de pessoas como eu. Não admira que seja uma época que toda a gente aprecia. No dia que assinala o nascimento do salvador, o cardeal-patriarca não resistiu a lembrar que há quem não tenha salvação possível. (…) O ateísmo tem sido, para mim e para tantos outros incréus, a luz que me tem conduzido na vida. Às vezes fraquejo, em momentos de obscuridade e de dúvida, mas, mesmo sendo incapaz de provar a inexistência de Deus, tenho conseguido manter a fé – uma fé íntima fundada numa peregrinação que tem a grandeza e a humildade da longa caminhada da vida – em que Ele não exista. Todos os dias busco a não-existência do Senhor com renovada crença, ciente de que a Sua inexistência é misteriosa demais para que eu a tenha inventado. (…) Acreditar que Deus existe é uma convicção profunda, mas acreditar que não existe, curiosamente, não o é. Alguém, munido de um aparelho próprio, mediu a profundidade das convicções e deliberou que as do crente são mais fundas que as do ateu. Quando alguém diz acreditar em Deus, está a exprimir legitimamente a sua fé; quando um ateu ousa afirmar que não acredita, está a agredir as convicções dos crentes. Ser crente é merecedor de respeito, ser ateu é um crime contra a humanidade. (…)»