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Categoria: Ciência

10 de Janeiro, 2008 Carlos Esperança

Andar aos gambozinos

Na minha infância soía enganar os pacóvios com um animal imaginário que habitava os campos das aldeias. Havia sempre um pateta disponível para segurar um saco junto de um buraco de qualquer parede, enquanto os foliões iam tocar os gambozinos que viriam parar ao saco que o idiota segurava e logo fecharia quando os ditos entrassem.

Era a chacota que o esperava quando, farto da demora, desistia e voltava á aldeia. Não sei como uma ideia tão próxima da de Deus não deu origem a uma cadeira universitária, a Gambozinologia, tão próxima da teologia, uma ciência sem objecto.

Se a ideia lograsse o êxito da invenção de deus, teríamos hoje gambozinólogos de muito prestígio que nada ficariam a dever aos santos doutores da Igreja e aos eruditos teólogos que fazem a exegese de textos pouco recomendáveis onde os instintos mais primários dos homens contaminaram o deus que inventaram.

Certamente que, à semelhança de Agostinho, o santo que inventou o Limbo para as almas das crianças não baptizadas, teríamos gambozinólogos a estudarem a vida dos gambozinos, filhos de virgens, espetados em cruzetas para salvação dos outros, que se fingiam mortos durante algum tempo e ressuscitariam ao terceiro dia.

Hoje, quando perguntassem a uma criança, quem fez o mundo ela responderia com a maior convicção: foram os gambozinos que ao 7.º dia descansaram.

28 de Dezembro, 2007 ricardo s carvalho

“o homem”: criação especial de deus…ou não?! (2)

«[…] Os macacos sabem fazer contas de somar de cabeça tão bem como qualquer estudante universitário – é a conclusão de um estudo de Elizabeth Brannon e Jessica Cantlon, da Universidade de Duke (nos EUA), publicado na revista online “PLoS Biology” […]

Se os macacos tocassem na caixa com a soma correcta, eram recompensados. Já em relação aos estudantes, foi-lhes pedido que escolhessem a soma correcta sem contar os pontos individualmente. Os humanos acertaram em 94 por cento das vezes, contra 76 por cento nos macacos, mas o tempo de resposta foi idêntico em ambas as espécies (cerca de um segundo).

Já se sabia que humanos e animais partilhavam a capacidade de representar mentalmente números e de os comparar, mas desconhecia-se se os animais também sabiam fazer operações mentais de aritmética. Quais são as origens evolutivas da aritmética? […]»

(PÚBLICO.PT -- 18.12.2007)

28 de Dezembro, 2007 Ricardo Alves

Sam Harris lança o «Projecto Razão»

Sam Harris, depois do sucesso do seu primeiro livro e da publicação de um segundo, prepara-se para lançar uma fundação («The Reason Project») dedicada a «difundir o conhecimento científico e os valores laicos» na sociedade, com o propósito de contribuir para a «erosão (…) do dogmatismo, superstição e fanatismo». A fundação contará, no seu conselho consultivo, com figuras como Richard Dawkins, Daniel Dennett, Rebecca Goldstein, Ayaan Hirsi Ali, Steven Pinker, Ibn Warraq e Steven Weinberg, e promoverá conferências, produzirá filmes e fornecerá bolsas.

Em muitos casos, o ateísmo militante é uma porta de entrada para a militância laicista ou para a divulgação científica. Em Setembro, na conferência da Atheist Alliance (aqui referida pelo Ricardo Silvestre e pelo Helder Sanches), Sam Harris mostrara já ter compreendido que a religião não vai desaparecer, talvez nem no século 4º da era iluminista, e que os ateus, de facto, têm pouca apetência para «converter» crentes. Efectivamente, não existem, em todo o mundo, muitas organizações ateístas. Os ateus que decidem associar-se optam ou pela intervenção política laicista, ou pela difusão do pensamento crítico e céptico (nalguns casos, pelos dois caminhos), em ambas as situações misturados com outros que não são ateus ou não se definem nesses termos. Em Portugal, temos a Associação República e Laicidade e a Associação Cépticos de Portugal.

6 de Outubro, 2007 Ricardo Alves

A ciência explicará a religião

Todos imaginamos o nosso corpo, e carregamos connosco uma imagem dele. Há pessoas que já descreveram situações em que se «sentiram» fora do próprio corpo e o «observaram». Algumas dessas situações são patológicas (epilepsia, acidentes vasculares cerebrais), outras induzidas por substâncias alucinogéneas, outras acontecem na sequência de acidentes.

Recentemente, alguns cientistas tentaram induzir essas experiências em pessoas, utilizando técnicas de realidade virtual. Os resultados indicam que a sensação de estar fora do próprio corpo pode ser induzida por um «conflito multi-sensorial» entre a informação que chega ao cérebro.

Estas «experiências extra-corpóreas» poderão explicar uma boa parte da religião, particularmente a ideia (recorrente em muitas tradições religiosas) de que o «eu» (a corrente de consciência que o nosso cérebro produz continuamente) é, de alguma forma, separável do corpo. Concorrem, com o medo da morte, para explicar a obsessão com a «alma». E banalizam as experiências místicas reportadas por monges budistas, as «revelações» alegadas por Paulo de Tarso e Maomé, ou a «meditação transcendental».

Um dia, a ciência explicará a totalidade da religião.

31 de Julho, 2007 Ricardo Alves

Qual conflito, amigo?

Há quem se preocupe muito com um hipotético conflito entre a ciência e a religião. Fazem mal, porque na realidade não há conflito algum. Nunca houve. A história do relacionamento entre a ciência e a religião é a história da correcção da segunda pela primeira. Ou melhor, do recuo da religião perante o avanço da ciência.

Houve um tempo em que a religião pretendia saber a correcta ordem cosmológica, especificamente que era o Sol que rodava em torno da Terra. Depois de umas altercações que não evidenciaram muito «amor cristão» do lado eclesial (que repetidamente proclama ter uma «sabedoria» especial em matéria de «amor»), a ICAR recuou.

Até ao final do século 19, o cristianismo pretendia que as espécies se tinham mantido fixas ao longo do tempo, que não tinham evoluído, e que muito menos se tinham diferenciado a partir de antepassados comuns. O cristianismo não tinha razão.

Ainda recentemente, insistiam que os continentes tinham sido criados por um «dilúvio». Errado outra vez.

Por mais que procuremos, não se encontra um único assunto no pretenso «conflito» entre ciência e religião em que a segunda tenha marcado um ponto contra a primeira. Isto não é um conflito, é um massacre.

Senhores religiosos: do fundo da minha amizade anti-cristã (e portanto porventura mais ampla do que a cristã), sugiro-vos uma solução fácil e eficaz para que deixeis de sentir que existe um «conflito» onde há apenas uma goleada de baliza aberta. E a solução é: deixai de fazer alegações sobre o mundo sensível. Renunciai à «criação» do universo, abandonai a crença na «ressurreição», aceitai que a «alma» é um nome pretensioso para um conjunto de funções biológicas, e vereis que deixareis de sentir que existe um «conflito». Dedicai-vos à ética e nada mais. Sei que aí também não concordamos, mas esse é um conflito genuíno sobre possibilidades reais. Esquecei tudo o resto, inclusivé aquela treta da mulher a aparecer em cima das azinheiras.

Certo, amigos?

30 de Abril, 2007 fburnay

Blasfemar em Ciência é bom

Aqui está um bom exemplo para desdizer os que afirmam que a Ciência é dogmática.

Existe um problema em Física que não foi resolvido. Como é sabido, a intensidade da força gravítica F sentida por dois corpos é proporcional às suas massas, m1 e m2 e inversamente proporcional ao quadrado da distância r entre elas.

Quando mais afastadas estão as massas, mais fraca é a força. É a força da gravidade que mantém a coesão da galáxia e por isso a distância entre as estrelas dita a força que mantém a galáxia unida.

Quando David roda a sua funda para atingir Golias, está a exercer uma força na pedra. Quanto maior for a força com que o faz, mais rapidamente a pedra vai rodar e maior velocidade atinge. O mesmo se passa com a Terra e o Sol e com as estrelas na orla das galáxias – é a força da gravidade que mantém a Terra a rodar à volta do Sol e que mantém as estrelas a girar em torno da galáxia.

Mas, como disse, há um problema. É que as estrelas na orla da galáxia estão a rodar mais depressa do que deviam, a julgar pela força gravítica a que estão sujeitas. Conhecendo a luminosidade das estrelas, os astrónomos conhecem a sua massa. Medindo a sua paralaxe, conhecem a sua distância. Conhecendo as distâncias e as massas conhece-se a força gravítica e por estranho que pareça, esta parece ser insuficiente para pôr as estrelas a rodar à velocidade a que estão.

Propôs-se então que talvez exista uma forma de matéria entre as estrelas que fornece a força extra – matéria que, ao contrário das estrelas, não emite radiação tendo sido assim apelidada de matéria escura. Apesar de não ser possivel observá-la directamente pode-se detectar a sua presença porque o seu campo gravítico distorce o espaço-tempo e isso altera a trajectória da luz das estrelas no fundo estelar.

No entanto, há outra possibilidade que alguns físicos tentaram explorar – talvez não seja a massa que está em falta, mas sim a 2ª lei de Newton.

Esta lei diz que uma força aplicada a um corpo vai resultar numa aceleração proporcional à massa desse corpo:

F = m·a

Assim, um corpo parado está sujeito a uma força total nula, um corpo com 1 kg sujeito a uma aceleração de 1 m/s2 estará sujeito a uma força de 1 N, um corpo de 1 kg sujeito a uma aceleração de 2 m/s2 a uma força de 2 N, etc. Portanto, uma função linear.

Esta lei é uma das mais importantes em Física. Já foi posta em causa pela Mecânica Quântica à escala atómica e pela Relatividade nas velocidades próximas da luz e para campos gravíticos muito grandes. Portanto, questionar esta lei foi sinónimo de uma grande revolução na Física. Mas à nossa escala mantém-se perfeitamente válida – sendo que a sua perfeição é a sua adequação à realidade.

Então para quê questioná-la? Para quê questionar aquilo que é tão perfeito? Porque nos apetece. Só se os dados nos derem razão é que temos razões para dar valor à nossa teimosia. E foi isso que alguns cientistas pensaram.

A proposta é que talvez a lei de Newton não seja linear para acelerações muito pequenas. Ou seja, um corpo de massa 0,001 kg sujeito a uma aceleração de 0,000001 m/s2 não resultaria numa força de 0,000000001 N mas numa força superior. Como a aceleração gravítica diminui com a distância isso significaria que as distâncias maiores estariam sujeitas a uma distorção na força que seria suficiente para manter as estrelas a rodar à velocidade observada.

Essa hipótese já foi testada. Mas a 2ª lei de Newton não foi violada… Além desta hipótese não ter dados a suportá-la, a hipótese da matéria escura já tem indícios muito fortes a seu favor. A 2ª lei de Newton resistiu assim a uma tentativa de falsificação.

Publicado também no Banqueiro Anarquista

17 de Abril, 2007 Helder Sanches

Ratzinger: 80 anos de (senil)idade


Ratzinger fez ontem 80 anos. Felizmente, poderemos dizê-lo, porque não se deseja o mal a ninguém.

Fruto do percurso normal da vida, é natural que os próximos anos de Ratzinger venham a ser duros: doenças, enfraquecimento, perca de lucidez, por aí fora… Pergunto-me: a quem recorrerá Ratzinger quando tiver que diminuir a dor, baixar a tensão arterial, controlar a taquicardia ou a incontinência? Ao seu deus todo-poderoso, através de umas rezas e orações? Ou recorrerá aos químicos e aos métodos estudados pela ciência à qual passa um atestado de incompetência noutras matérias?

Desculpem-me a curiosidade…

(Diário Ateísta / Penso, logo, sou ateu)

2 de Abril, 2007 Ricardo Alves

«Ciência Hoje» recua (felizmente!)

O portal Ciência Hoje, que faz um trabalho globalmente meritório de notícias sobre ciência e tecnologia, publicou ontem (1/4) o seguinte editorial:
  • «Recentemente, Ciência Hoje publicou um artigo de opinião «Paradigma naturalista» que recebeu um coro de incriminações e críticas que acabaram por visar – e, por vezes, de forma menos elegante – a própria publicação. Trata-se de um artigo de opinião – e Ciência Hoje sempre pretendeu ser uma coluna livre – que arrastou uma discussão muito longe do que se pretendia. Porque o prolongar da discussão nos termos em que se tem desenvolvido não parece levar a lado nenhum, pedindo desculpa ao autor e aos leitores, Ciência Hoje decidiu que o artigo não permanecesse mais on-line. A partir de hoje, CH privilegiará a opinião solicitada!»

O texto referido («Paradigma Naturalista») era da autoria do criacionista Jónatas Machado e consistia num ataque violento e primário à ciência e ao conhecimento comprovável, no habitual estilo truculento deste professor de direito em Coimbra e fervoroso crente evangélico. Fora publicado no dia 29 de Março, e provocara protestos imediatos da comunidade científica, na caixa de comentários respectiva e em blogues, tendo o matemático do IST Jorge Buescu pedido mesmo a sua demissão do Conselho Científico do Ciência Hoje.

Felizmente, o incidente foi resolvido da melhor forma (o texto já não está disponível), mas a política de edição do principal portal de notícias, em português, sobre ciência e tecnologia, merece ser questionada (será que existe avaliação dos textos de opinião pelo conselho científico?). Anteriormente, segundo Jorge Buescu, terão sido publicados outros textos pseudo-científicos, que afectam a credibilidade deste portal ao conferi-la àqueles que pretendem justamente atacar a ciência. A disponibilidade de astrólogos, acupunctores e criacionistas para entrarem em espaços reservados à ciência é apenas um sinal da sua necessidade de credibilizarem os seus «produtos» duvidosos. Dar-lhes entrada é dar-lhes credibilidade.

[Diário Ateísta/Esquerda Republicana]