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Carlos Esperança

3 de Março, 2005 Carlos Esperança

O padre Serras Pereira

O anúncio pago (1386 euros) do padre Nuno Serras Pereira já fez correr imensa tinta e, tão cedo, não se apagarão os ecos da devota catequese do santo asno franciscano. Os dislates eram canónicos, a intolerância obedecia à mais sã tradição católica, a ignorância era adequada ao múnus e a intenção era pia.

Então o que levou alguns meios eclesiásticos a reagir com incómodo e fingida vergonha a um texto cuja ortodoxia é inatacável e que faria as delícias do Papa JP2? Não foi o português rudimentar em que se exprimiu, a pontuação anárquica que usou ou a ignorância de quem chama «crio perseveração» à «crio-preservação». Também não foi certamente o ataque às leis da República quando a ICAR aconselha os seus membros a revoltarem-se contra a democracia sempre que esta desobedeça à lei de Deus, seja isso o que for.

O que exasperou a hierarquia eclesiástica foi o facto de semelhantes despautérios serem um direito episcopal, usurpado por um simples padre, a publicidade escrita substituir o que se deve dizer nos confessionários e nas missas, na ausência da comunicação social, e o exagero da retractação pública pelas mulheres que tomam a pílula, usam DIU ou praticam a contracepção. Não que lhes não desse gozo ver as mulheres humilharem-se em público, não que não fosse uma prática com excelentes tradições católicas, não que os não excitasse, sob o manto da sotaina, a confissão pública dos pecados e a sua descrição pormenorizada. O problema de tal prática é o efeito contraproducente e o estímulo sexual que produz em vez da castidade que pretende.

Com a eucaristia em queda, as legítimas exigências canónicas podem tornar-se um prejuízo para o negócio e afastar a clientela. É por isso que, nos próximos dias, vamos assistir à suavização da doutrina e à insinuação de que o padre Serras Pereira vai ser admoestado.

A ICAR está disposta a sacrificar algumas verdades com receio de fechar as portas.

2 de Março, 2005 Carlos Esperança

Da parte de «Nosso Senhor JC»

PARTICIPAÇÃO AOS INTERESSADOS

Na impossibilidade de contactar pessoalmente as pessoas envolvidas o padre Nuno Serras Pereira, sacerdote católico, vem por este meio dar público conhecimento que, em virtude do que estabelece o cânone 915 do Código de Direito Canónico,

está impedido de dar a sagrada comunhão eucarística a todos aqueles católicos que manifestamente têm perseverado em advogar, contribuir para, ou promover a morte de seres humanos inocentes

quer através de diversas pílulas, do DIU, da pílula do dia seguinte – ou outras substâncias que para além do efeito contraceptivo possam ter também um efeito letal no recém concebido; quer por meio das técnicas de fecundação extra-corpórea, da selecção embrionária, da crio perseveração (sic), da experimentação em embriões, da investigação em células estaminais embrionárias, da redução fetal, da clonagem…; quer através da legalização do aborto (votar ou participar em campanhas a seu favor), o que inclui a aceitação ou concordância com a actual «lei» em vigor (6/84 e seus acrescentos); quer ainda pela eutanásia.

O respeito pelo culto e pela reverência devida a Deus e a Seu Filho sacramentado, o cuidado pelo bem espiritual dos próprios, a necessidade de evitar escândalo, e a preocupação pelos sinais educativos e pedagógicos para com o povo cristão e para com todos são razões ponderosas que, seguramente, ajudarão a compreender a razão de ser deste grave dever que o cânone 915, vinculando a consciência, exige dos ministros da Eucaristia.

Da parte de Nosso Senhor Jesus Cristo convida todos ao arrependimento e à retractação pública, para que refeita a comunhão com Deus e a Sua Igreja possam receber digna e frutuosamente o Corpo do Senhor.

a)_________________________
Pe Nuno Serras Pereira

Nota: Anúncio do «Público», de hoje, pg. 16

28 de Fevereiro, 2005 Carlos Esperança

«Memória e Identidade»

As preocupações do Diário Ateísta com a ofensiva reaccionária e antidemocrática dos meios religiosos começam a ser partilhadas por diversos cidadãos que já se deram conta do perigo do proselitismo exacerbado, da defesa de valores anacrónicos e da exaltação dos próceres eclesiásticos. Está em curso uma escalada clerical de forma metódica e concertada.

Surpreendentemente, até hoje, não houve da parte do Vaticano uma condenação do fascismo islâmico (não há outro nome para definir as teocracias árabes) pela pena de morte contra Salman Rushdie ou pela criminosa aplicação da charia. No entanto, grasna e crocita contra o laicismo e as decisões democráticas dos países livres.

O livro «Memória e Identidade», atribuído a JP2, é um vómito contra a liberdade expelido pela Cúria romana, um labéu contra o laicismo e um convite à revolta dos crentes contra as democracias laicas e liberais.

O Editorial do «Público» de hoje, assinado por Manuel Carvalho, com o título «O Papa e a Democracia» é um libelo acusatório contra o fundamentalismo católico e uma denúncia implacável das posições ideológicas do livro papal e do desejo manifesto de provocar um retrocesso civilizacional na sociedade.

O mundo confundiu o anticomunismo de João Paulo II com espírito democrático e o seu sorriso com bondade. Hoje, a popularidade do déspota é uma arma contra a liberdade. A beatificação de Pio IX e outros algozes que nos remetem para o passado negro da ICAR devia ter-nos alertado para as alfurjas do mal que medram no Vaticano.

27 de Fevereiro, 2005 Carlos Esperança

A Cúria não tem cura

A Cúria romana merece a credibilidade dos milagres que autentica e o respeito que ela própria nutre pelas instituições democráticas dos países onde a ICAR desfruta de poder. Não tenho, pois, a mais leve consideração ou respeito pela corte papal, responsável por decisões anacrónicas, quiçá criminosas, no que diz respeito ao controlo da natalidade, à prevenção da SIDA, à prática da sexualidade ou à investigação científica.

Podia, pelo menos, esperar-se dos gerontes que acolitam o Papa alguma humanidade e um mínimo de respeito pela lenta e penosa agonia de um doente terminal. Nada disso. Ontem fizeram constar à comunicação social que JP2 tinha sido proibido pelos médicos de chegar à janela, para hoje o exibirem e explorarem perante uma pequena multidão de devotos, postos em delírio por técnicas de manipulação psicológica através dos órgãos de comunicação social. Sem pudor e sem piedade, exploram a dor e o sofrimento de um inválido, posto a render no mercado da emoção.

Prisioneiro da sua invalidez, incapaz de falar ou de ter vida autónoma, JP2 – segundo a Cúria – escreve mensagens. É através delas que governa a ICAR enquanto a morte não chega ou não lha chegam. Neste jogo de mentiras não se sabe se os médicos proibiram, de facto, que o Papa fosse à janela – como afirma a Cúria – ou se o levaram, contra a indicação clínica, para o aliviarem do sofrimento.

Na mensagem que lhe atribuem, lida aos fiéis pelo arcebispo Leonardo Sandri, na Praça de S. Pedro, em Roma, JP2 pede que rezem por ele o que leva a crer que, tendo perdido a fé em Deus, implora aos crentes para que intercedam, redobrando o fervor e multiplicando as orações.

Um cardeal espanhol, especialista em questões jurídicas do Vaticano afirmou hoje à agência France Press que João Paulo II não vai renunciar ao cargo porque a Igreja Católica «não é a Coca-Cola ou a General Motors» – diz a SIC Online. Pelos vistos, não está nos projectos da ICAR dedicar-se ao fabrico de refrigerantes ou automóveis.

25 de Fevereiro, 2005 Carlos Esperança

O Papa sem direito a reforma

O Papa não tem o dom a ubiquidade mas tem enorme tendência para a omnipotência. Em plena debilidade das moléstias que o atormentam, num torpor indisfarçável, JP2 publicou uma carta apostólica sobre os meios de comunicação, abriu um congresso pontifício sobre a ética da saúde (neste caso, fazendo-se representar) e pôs à venda o seu 5.º livro «Memória e Identidade», sem contar com uma mensagem à irmã Lúcia em que lhe desejava as melhoras momentos antes de morrer.

Para além desta vasta actividade pastoral e epistolar, obriga-se a dizer a missa diária, recita as orações de que mais gosta e condena o sentido democrático para que se orienta o mundo, ressentido com a sociedade que respeita mais a decisão de um parlamento livremente eleito do que a vontade do Deus de que ele tem o segredo.

A máquina do Vaticano está bem oleada e embora o Papa tenha o aspecto de quem lhe é indiferente que as pessoas da Santíssima Trindade sejam três ou trezentas, a luta contra o preservativo não esmorece, a batalha contra a despenalização do aborto aumenta de intensidade e o ressentimento implacável contra a manipulação genética das células embrionárias atinge o paroxismo.

O sofrimento do Papa, cuja exploração demonstra a insensibilidade e morbidez da Cúria romana, é uma atitude que confrange e choca as pessoas sensíveis. Quem é capaz de exibir o martírio de um papa moribundo não pode sentir piedade pelo calvário do seu Deus.

24 de Fevereiro, 2005 Carlos Esperança

O Papa do aborto

O assunto já foi tratado pela Palmira F. da Silva em «A verdadeira Ideologia do Mal» e «O Papa ensandeceu» mas é útil insistir no livro «Memória e Identidade» cuja autoria lhe é adjudicada com a mesma honestidade com que os chamados Mandamentos da Lei de Deus foram atribuídos a Moisés, que os teria recebido do autor no Monte Sinai.

Todos sabemos que o Papa não está em condições de brandir o hissope quanto mais de escrever um livro. Todavia os saprófitas de serviço usam o nome do moribundo para a cruzada reaccionária que porfiam desde o tempo de Constantino. A Cúria romana é uma Sociedade Anónima, de objectivos tortuosos, que se acoita sob a tiara pontifícia.

Portanto, neste texto, Papa significa o bando que publica dislates sob o pseudónimo de João Paulo II. Papa é aqui um substantivo colectivo que nutre um ódio fanático pela democracia, um ressentimento mórbido pela liberdade, uma animosidade patológica aos direitos humanos. Até a chegada de Hitler ao poder, cuja cumplicidade do Vaticano é uma evidência, serve para pôr em causa a democracia formal que esteve na sua origem.

A obsessão pelo aborto é a tara que faz esquecer ao Vaticano a ameaça de excomunhão a quem denunciasse as práticas pedófilas dos seus padres, talvez porque o aborto é o único dos «pecados» ao abrigo do qual se encontra o seu clero. Eventualmente só a Papisa Joana sofreu as dores e a humilhação.

Os proxenetas de Deus que se acoitam no Vaticano admoestam os parlamentos democraticamente eleitos por entrarem «em conflito aberto com a lei de Deus e a lei da natureza». Mesmo sem explicarem o que isso seja, deviam ter em conta que Deus não se encontra recenseado nem votou para os parlamentos cuja legitimidade é bem maior do que a dos clérigos que passeiam as sotainas no último Estado totalitário da Europa – o Vaticano.

Equiparar o aborto ao Holocausto é o mesmo que comparar células embrionárias com os judeus, bruxas e apóstatas que, com zelo apostólico, a ICAR conduzia às fogueiras do Santo Ofício.

«Memória e Identidade», ontem posto à venda em Itália por 16 euros, de que já se prevêem 14 edições em 11 línguas – segundo o «Público» de hoje – é um livro de propaganda da ICAR, a opinião dos cardeais mais anacrónicos, onde não será difícil encontrar o pensamento do cardeal Joseph Ratzinger, prefeito para a Doutrina da Fé, eminência parda do Vaticano.

O livro não revela quem esteve por trás do turco Ali Agca, autor do atentado contra JP2, que a ICAR pretendeu associar aos comunistas e que, para desolação do Vaticano, se veio a saber que estava ligado a um grupo de extrema-direita que, na altura, talvez desconhecesse que a vítima estava longe de ser um adversário.

Da conversa que ambos tiveram na prisão, da bênção que JP2 deu ao enigmático turco e dos motivos do atentado, o livro nada refere. Trata-se de papel impresso com diatribes contra a despenalização do aborto e as instituições democráticas.

23 de Fevereiro, 2005 Carlos Esperança

A canonização de Nuno Álvares Pereira

Como o Diário Ateísta tinha previsto, e escrito, estava encomendado o milagre para elevar o beato Nuno Álvares Pereira à santidade. Desta vez não é de borla, precedente aberto para com os pastorinhos de Fátima, mas será fácil ressarcir a Igreja portuguesa do numerário esportulado por tão boa causa com a venda de artigos religiosos. O novo santo, não sendo conhecido no ramo, é todavia muito popular, como herói, nos manuais escolares do ensino básico.

Em rigor, segundo afirmou o patriarca Policarpo, que tem muito mais confiança nos santos cuja vida se esqueceu, do que naqueles cujas patifarias ainda estão frescas, Nuno Álvares Pereira não precisava de obrar nenhum milagre, pois já é considerado santo pelo povo português há mais de 200 anos, o que lhe permitiria a elevação administrativa.

Mas sabe-se como a ICAR é exigente nesta questão dos milagres. Ou há milagre a sério ou vai-se a santidade. Neste caso apareceram em pouco tempo sete milagres, ramo a que o Beato Nuno nunca se tinha dedicado. Durante séculos esteve a apodrecer inutilmente sem aliviar um desgraçado de uma moléstia para se redimir dos castelhanos que matou sem zelo religioso, na defesa de vários condados e numerosas mordomias que a vitória em Aljubarrota lhe granjeou.

Assim, no próximo mês de Março, dos «sete possíveis milagres» vai ser enviado o que a Congregação para as Causas dos Santos escolheu, por ser mais fácil de provar. Trata-se do processo de cura do olho esquerdo (se fosse o direito tinha o mesmo valor) de uma mulher residente em Ourém, que ficou queimado com óleo que saltou de uma frigideira a ferver. Já existem vários documentos médicos que confirmam a doença e a cura, «inexplicável segundo a ciência», de acordo com o descaramento da ICAR.

Apostila 1 – A Ordem dos Médicos e o Ministério Público não investigarão eventuais falsas declarações.

Apostila 2 – A Associação de Produtores, Exportadores e Vendedores de Azeite (APEVA), apesar do azedume por o milagre ter tido origem com óleo, desiste de reivindicar a queimadura com azeite, para não atrasar a elevação do Condestável à santidade.

21 de Fevereiro, 2005 Carlos Esperança

Paulo Portas fala com Deus

«Pedi a Deus que me fizesse ver o tempo em que devia sair».
(Declarações de Paulo Portas no rescaldo da derrota eleitoral de ontem, em que anunciou a sua demissão de presidente do CDS/PP)

Nada disse sobre quando, como e onde teve a referida conversa.

Presume-se que terá sido durante a missa privada à irmã Lúcia ou na missa em que participou entre o acto de votar e o anúncio dos resultados eleitorais.

Fica por explicar por que motivo não falou com Deus antes de ter ido para o Governo.

21 de Fevereiro, 2005 Carlos Esperança

O embuste de Fátima

Vale a pena ler o artigo do «Público», de Luís Filipe Torgal, sobre os depoimentos contraditórios da irmã Lúcia sobre as «aparições de Fátima».
A canhestra montagem dos milagres é demasiado vulnerável mas a farsa precisa de ser desmascarada. É uma obrigação cívica e o contributo necessário para a erradicação da superstição, do atraso cultural e da exploração de populações crédulas pela cupidez da Igreja católica.

20 de Fevereiro, 2005 Carlos Esperança

A dança da chuva no Santuário

Com eficácia superior às danças dos índios, a ICAR, atenta à calamidade da seca, já tomou a decisão de resolver o problema. Um crucifixo em bom estado de conservação, um turíbulo experimentado, velas de tamanho adequado e uma oração com provas dadas são garantia do êxito que um dia virá.
Para que os créus que nos visitam possam aumentar a eficácia das manobras em curso no Santuário de Fátima, aqui deixamos a «Oração para pedir chuva» esperando que Deus, perante tamanha devoção, não exagere a graça e prejudique ainda mais a difícil situação.

Oração para pedir a chuva – no final do Rosário no Santuário de Fátima:
«Como o nosso país está a viver um período de seca prolongada, o Santuário de Fátima decidiu passar a rezar uma oração para pedir a bênção da chuva para o país. A prece será feita no final de cada recitação do Rosário neste santuário mariano.
Será rezada a oração do Papa Paulo VI, composta em 1976, quando se abateu sobre o continente europeu um período de seca prolongada.

Oração
Deus, nosso Pai, Senhor do Céu e da terra
Tu és para nós existência, energia e vida.
Criaste o homem à Tua imagem
a fim de que com o seu trabalho ele faça frutificar
as riquezas da terra
colaborando assim na Tua criação.

Temos consciência da nossa miséria e fraqueza:
nada podemos fazer sem Ti.
Tu, Pai bondoso, que sobre todos fazes brilhar o sol
e fazes cair a chuva,
tem compaixão de todos os que sofrem duramente
pela seca que nos ameaça nestes dias.
Escuta com bondade as orações que Te são dirigidas
com confiança pela Tua Igreja,
como satisfizeste as súplicas do profeta Elias
que intercedia em favor do Teu povo.

Faz cair do céu sobre a terra árida
a chuva desejada
a fim de que renasçam os frutos
e sejam salvos homens e animais.

Que a chuva seja para nós o sinal
da Tua graça e da Tua bênção:
assim, reconfortados pela Tua misericórdia,
dar-te-emos graças por todos os dons da terra e do céu,
com os quais o Teu Espírito satisfaz a nossa sede.

Por Jesus Cristo, Teu Filho,
que nos revelou o Teu amor,
fonte de água viva, que brota para a vida eterna.
Amen».