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  • 3 de Dezembro, 2013
  • Por Carlos Esperança
  • Política

O risível senhor Duarte Pio e os seus defensores

Surpreende-me que alguém, com formação democrática, defenda direitos vitalícios e hereditários que julgava reservados às moléstias, como a sífilis ou a esquizofrenia. Não aceito que se retire a qualquer cidadão o direito de ocupar o mais alto cargo do País, e repudio quem o atinja sem escrutínio popular, ou nele se perpetue, e se atribua o direito de o transmitir. Todos os homens nascem livres e iguais.

Sei que há cidadãos e vassalos. Há quem renuncie aos direitos de cidadania e à própria liberdade. Não é com esses que se constrói o futuro ou se conquista a liberdade. Os que renunciam aos seus direitos podem fazê-lo, não podem é confiscar os direitos alheios e opor-se ao princípio republicano de que os cargos públicos não são vitalícios nem transmissíveis.

Dado que a monarquia portuguesa esteve sempre ligada à Igreja católica e que esta era a religião oficial do país, há quem, por opção pia ou astenia democrática, insista na defesa de um anacronismo que exigiria descobrir um primeiro rei para ser o último.

Perante o folclore em volta de um figurante das revistas mundanas, aqui ficam algumas considerações para reflexão.

Os súbditos conhecem-no por Duarte Pio João Miguel Gabriel Rafael de Bragança. Parece um catálogo de nomes e, afinal, é um rol com que o titular enfeita as penas da descendência miguelista. Legalmente, é apenas Duarte Pio de Bragança, tendo deixado cair o João e três arcanjos com que se ornavam os príncipes da Casa de Bragança.

O Sr. Duarte é descendente de família pouco recomendável, de que a própria monarquia se libertou, por higiene política, quando D. Miguel I foi derrotado, exilado e banido do País, assim como os seus descendentes, entre os quais o especialista em milagres e autor de um opúsculo sobre S. Nuno Álvares cuja santidade foi obtida no ramo oftalmológico com a cura do olho esquerdo de D. Guilhermina de Jesus, queimado com salpicos de óleo fervente de fritar peixe.

Quando o Sr. Duarte Pio nasceu, ainda sob a lei do banimento, foi logo batizado, tendo como padrinho da cerimónia católica, o Papa Pio XII, por procuração, pois o Papa de Hitler, como ficou conhecido, era mais dedicado ao nazismo e às Concordatas do que à família de seu pai, Sr. Duarte Nuno, banida de Portugal.

Duarte Nuno Fernando Maria Miguel Gabriel Rafael Francisco Xavier Raimundo António de Bragança era o nome do pai, imigrante que veio para Portugal em 1953, três anos após a Assembleia Nacional ter revogado a lei do banimento, por ordem do ditador e intervenção dos monárquicos fascistas. Foi-lhe atribuída uma residência, cedida pela Fundação da Casa de Bragança, com autorização do déspota de serviço, monárquico por convicção e ditador por decisão própria.

Tamanho nome recruta vassalos para o regime que expirou, para a família extinta e para um candidato a rei, que existe pela fé de dezenas de candidatos a súbditos. Com nomes tão extensos, bastaria referir duas gerações de primos e tios para, em vez do opúsculo, ter o Sr. Duarte matéria para um tratado, ainda que lhe faltasse o método e o objeto para o transformar em ciência.
O Sr. Duarte, mulher e filhos são, conforme o sexo, cavaleiros ou damas da «Soberana Ordem Militar de S. João de Jerusalém, de Rodes e Malta», locais onde os desconhecem e ninguém os reclama.

Se os portugueses ensandecessem ainda voltariam a ter, pela graça de Deus e desgraça nossa, um Rei de Portugal e dos Algarves d’Aquém e d’Além Mar em África, Senhor da Guiné e do Comércio, da Conquista e da Navegação da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia, Senhor Fidelíssimo, etc..

Estes títulos e a varíola foram erradicados e da sereníssima Casa de Bragança resta uma fundação. No passado foi uma instituição de geometria variável que começou a encolher com D. João II, que escusava ter degolado o seu 3.º duque, e que tem sofrido, ao longo da História, as vicissitudes políticas de quem detém o poder.