Loading
  • 24 de Novembro, 2012
  • Por Carlos Esperança
  • Ateísmo

Ateus, crentes e livre-pensamento

Os ateus não reivindicam superioridade moral. Não é a crença que faz alguém melhor nem o ateísmo que torna qualquer um pior. A influência do meio ambiente, a educação recebida, a instrução que se adquire e a matriz genética, fazem os homens. Os homens são eles próprios e a sua circunstância, como disse Ortega y Gasset.

Há crentes que visitam o Diário de uns Ateus e que demonstram tolerância, espírito de diálogo, sentido crítico e respeito pelos valores humanos. Mas isso não faz respeitável a sua religião nem universais os seus valores e, muito menos, prova a existência de Deus. Apenas faz deles cidadãos respeitáveis ou mesmo exemplares.

O Diário de uns Ateus procura preservar alguns valores que as religiões combatem – a liberdade individual, a laicidade do Estado e tratamento igual para todos os cidadãos, independentemente do sexo, da religião e da raça. É surpreendente que os crentes se não interroguem sobre a geografia das religiões e não reflitam sobre como se distribuem os credos pelo planeta e à custa de quanto sangue.

Outro aspeto inquietante é o facto de todas as religiões defenderem tratamento igual quando são minoritárias e afirmarem que «não de deve tratar de forma igual o que é desigual» quando são maioritárias – argumento usado até à náusea em Portugal, pela ICAR, na negociação da Concordata.

A religião só não é mais repressiva porque não tem força suficiente. A cada conquista exige sempre mais. Não dispensa o batismo de crianças de tenra idade, não desiste de tornar obrigatório o ensino religioso na escola oficial, interfere através das associações que domina nos conteúdos e programas escolares e no comportamento social dos que não são crentes. Condiciona o aparelho de Estado e influencia as leis.

A possibilidade do divórcio entre casais que contraíram matrimónio católico só foi possível depois do saudoso ministro da Justiça Salgado Zenha ter ameaçado com a denúncia da Concordata. As Escolas do Magistério Primário, até ao 25 de Abril, tinham uma cadeira de Religião Católica, igual a qualquer outra, que exigia nota positiva para a obtenção do diploma de professor. Ninguém era dispensado da missa de consagração do curso, da bênção da pasta e da fotografia com o bispo da diocese. Ninguém podia ser professor sem praticar a religião católica, embora a lei não fosse clara a esse respeito.

A admissão em Escolas de Enfermagem exigia um certificado de batismo católico e o atestado de bom comportamento passado pelo padre da paróquia de nascimento. Eram documentos necessários. E, no fim do curso, lá vinha a bênção, a missa da consagração e outras pias violências a que tinha de se sujeitar quem precisava de ganhar a vida.

Para conter a violência clerical é preciso uma vigilância constante. O combate às religiões e o direito à blasfémia são necessários para a preservação da liberdade de pensamento que as igrejas se esforçam por erradicar.