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  • 21 de Outubro, 2009
  • Por Carlos Esperança
  • Religiões

Caim – 181 páginas de prazer

caim

Caim é um livro estimulante e divertido onde se confunde o génio literário de Saramago e a imaginação prodigiosa que nos faz viajar pelos mitos do Antigo Testamento e pelas maldades dos homens daquele tempo em que inventaram deus.

Desde a saída de Adão e Eva do Paraíso até à viagem na arca de Noé, a narrativa prende o leitor aos mitos bíblicos e deleita-o com a prosa admirável do mais notável ficcionista português.

Caim, depois de matar Abel por vontade de quem tudo pode, viaja no tempo e extasia-se com o vigor da sua juventude na cama de Lillith a quem faz o filho que a incompetência do marido não logra. Deixa-a prenha e consolada, e há-de voltar para encontrar o filho sem que este reconheça o pai biológico.

Saramago não perdoa a deus que brinque com a demência religiosa de Abraão, capaz de lhe sacrificar o seu único filho Isaac, e põe Caim a segurar o braço do infanticida antes de chegarem dois anjos que o impediriam mas que o trânsito fez chegar atrasados.

Caim é também o ponto de partida para o confronto dialéctico entre a civilização actual e a barbárie dos tempos bíblicos, entre o Estado de direito e o julgamento sumário onde  as mulheres e crianças pagaram pelo delírio homofóbico do supremo juiz que destruiu Sodoma e Gomorra com chuva de fogo e enxofre que não puniu apenas os homens.

O leitor é um garimpeiro que penetra nos livros e devora páginas para encontrar numa frase a pepita de ouro que persegue. Em Saramago é vasto e inesgotável o filão. Não é preciso procurar as pepitas, o ouro vem já com os quilates da lei.