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Mês: Julho 2006

14 de Julho, 2006 Ricardo Alves

Blair entrega o sistema de ensino a fanáticos religiosos

O sistema de ensino do Reino Unido sempre segregou os alunos segundo a religião. As consequências são conhecidas: na Irlanda do Norte, por exemplo, a existência de escolas separadas para filhos de pais protestantes e filhos de pais católicos tem ajudado a perpetuar uma hostilidade comunitária que poderia ser atenuada se as crianças frequentassem escolas laicas, independentemente da confissão religiosa dos pais. Não contente com a situação que encontrou, o Governo clericalista de Tony Blair, que gosta de lidar com os britânicos de origem muçulmana através de líderes religiosos não eleitos (de preferência a desvalorizar as suas pertenças religiosas no trato político), tem incentivado a abertura ou integração estatal de escolas anglicanas, católicas, muçulmanas, judaicas e sikhs, generosamente financiadas pelo Estado. Não admira portanto que, segundo uma sondagem recente, 81% dos britânicos muçulmanos se considerem mais muçulmanos do que britânicos, enquanto apenas 7% se consideram mais britânicos do que muçulmanos. (Entre os britânicos cristãos, as percentagens correspondentes são de 24% e 59%, respectivamente.)

O sistema de ensino britânico permite aliás que algumas escolas, embora subsidiadas pelo Estado, seleccionem os alunos à entrada em função da religião. Alguns pais, para garantirem a admissão dos filhos nessas escolas (que até podem ser as únicas na localidade em que vivem) vêem-se constrangidos a frequentarem a igreja local, mesmo sendo ateus. Muitas desta escolas religiosas aproveitam para negar a inscrição aos alunos mais pobres, o que lhes permite garantir melhores resultados nos exames finais, e manter a segregação de classe tão típica da Inglaterra.

O governo de Blair não hesita sequer em financiar escolas muçulmanas que separam os alunos segundo o sexo, ou escolas católicas que obrigam à participação em cerimónias religiosas. No último caso, há relatos de alunos obrigados a participar em procissões com a «Virgem Maria», sessões obrigatórias de doutrinação anti-aborto com imagens terroristas de fetos, e expulsões da escola para quem faltar à missa. O secretário de Estado da Educação garantiu, numa resposta à National Secular Society, que o governo clericalista a que pertence tenciona continuar a apoiar as escolas com «oração colectiva obrigatória», porque tal actividade recreativa «desenvolve o espírito de comunidade».

Como se não fosse suficiente, existem também escolas financiadas pelo Estado em que o criacionismo evangélico é quase matéria obrigatória, e em que cada criança recebeu uma Bíblia, para desespero dos encarregados de educação que acham (veja-se lá o descaramento…) que há matéria mais importante para aprender.

Só uma escola pública laica, aberta a todos os alunos independentemente das suas opções em matéria religiosa, e que faça uma distinção clara entre conhecimentos universais e crenças particulares, poderá superar as divisões culturais de origem e preparar os alunos para a vida moderna.
14 de Julho, 2006 jvasco

Sacrificar um inocente para ilibar um culpado, é errado

Esta afirmação não choca ninguém.
Pelo contrário, dificilmente encontrarei quem dela discorde.

Os valores vão evoluindo com os tempos. Muitas vezes para melhor. Hoje parecer-nos-ia absurdo que os tribunais aceitassem, por exemplo, prender a Srª Constança porque o seu filho Pedro matou alguém, mesmo que fosse esta a vontade expressa da Srª Constança (ser presa em lugar dele).

Claro que nem sempre foi assim. Diferentes culturas consideravam aceitável que as culpas passassem de geração em geração, por exemplo (que as acções de alguém fossem tão graves, que, além do criminoso, os seus descendentes fossem também punidos ao longo de várias gerações). Chegou mesmo a existir, em certas sociedades, o costume de sacrificar animais inocentes a Deus, esperando que o sacrifício de animais inocentes fizesse Deus perdoar os camponeses pelas suas falhas.

Curioso é pensar que esta moral absurda é a base do Cristianismo. A crença fundamental do Cristianismo é que Jesus deu a vida pelos nossos pecados (deu mesmo?) e ressuscitou três dias depois. O ponto fundamental do Cristianismo parte do princípio que é legítimo e justo que um inocente se sacrifique pelos culpados, e que um ser supostamente infinitamente justo (Deus Pai) teria aceite esse ímpio sacrifício.

13 de Julho, 2006 Carlos Esperança

A alma, essa desconhecida

A alma é um furúnculo etéreo que afecta o corpo dos crentes. É um vírus que resiste à morte e tem direito a transporte gratuito para o domicílio que os padres lhe destinam.

A alma é um bem mobiliário que paga imposto canónico e, à semelhança das acções de empresas, hoje igualmente desmaterializadas, paga avença pela «guarda de títulos».

No mercado mobiliário as acções são transmissíveis e negociáveis. Apesar das fraudes sabe-se que correspondem a avos do capital social de uma empresa. A sua duplicação é burla e conduz à cadeia, salvo quando o Vaticano está implicado e impede a extradição do criminoso, como sucedeu com o arcebispo Marcinkus que JP2 protegeu, após a falência fraudulenta do Banco Ambrosiano.

Quanto à alma, há suspeitas de haver um número ilimitado em armazém, o que exaspera os clérigos, encarregados do negócio, com o planeamento familiar. Não se sabe bem se a alma vai no sémen, se está no óvulo ou se surge através da cópula, um método pouco digno para tão precioso e imaculado bem.

Os almófilos andam de joelhos e põem-se de rastos sem saber se a alma se esconde nas mitocôndrias, nas membranas celulares, no retículo endoplasmático ou no núcleo e nos cromossomas, sem nunca aceitarem que seja o produto de reacções enzimáticas.

Não sabem se é alguma coisa de jeito no ovo, no embrião em fase de mórula ou no blastocito. Juram que aparece no princípio, sem saberem bem quando e onde está o alfa, ou quando aparece Deus a espreitar pelo buraco da fechadura e a arremessar aos fluidos a alma que escusa o entusiasmo de quem ama.

Após o aparecimento dos rudimentos da crista neural, só às 12 semanas o processo de gestação dá origem ao feto e falta provar que a alma, embora de qualidade sofrível, se encontra num anencéfalo ou que é de boa qualidade a que Deus distribui ao fruto de uma violação ou do incesto.

12 de Julho, 2006 Palmira Silva

Ataque terrorista na Índia

Mais de 180 pessoas foram mortas e cerca de 700 ficaram feridas na sequência de um ataque terrorista coordenado a comboios suburbanos que transportavam trabalhadores para a cidade de Bombaim.

A polícia indiana investiga o bárbaro atentado, que ainda não foi reinvidicado. As primeiras suspeitas cairam sobre grupos separatistas (da Caxemira indiana) ligados ao Paquistão Lashkar-e Toiba (LeT) e Jaish-e-Mohammad (JeM), cujos líderes negam qualquer envolvimento com o caso.

O grau de sofisticação do atentado e as semelhança com os que se verificaram em Madrid e Londres proporcionam algumas especulações sobre o envolvimento da Al-Qaeda nos mesmos.

12 de Julho, 2006 Palmira Silva

O verdadeiro ecumenismo: actualização

A tolerância ecuménica atingiu o seu zénite com a distribuição de panfletos nos bairros ortodoxos de Israel em que são prometidos 20 mil shekels novos (3.700 euros) a quem matar homossexuais e lésbicas que participem na Parada Internacional do Orgulho Gay.

Os métodos recomendados são os preconizados no livro «sagrado», o apedrejamento, ou em alternativa, uma concessão aos tempos modernos, cocktails molotov que o panfleto ensina a fazer em casa.

Os protestos inconvincentes à polícia dos líderes ortodoxos sobre a sua inocência na autoria do panfleto, que atribuem … à comunidade gay (?!), são negados pelo aviso dos rabis ultra-ortodoxos de Jerusalém sobre o banho de sangue que a realização do evento significaria. Uma declaração oficial contra o evento, assinado por estes dignitários exorta «Todos os com capacidade para tal, têm o dever de fazer tudo ao seu alcance para esmagar as mandíbulas do mal de qualquer forma que consigam».

De igual forma, o sheik Ibrahim Sarsur, deputado do Knesset, avisou o mundo que «se os gays se atreverem a aproximar o monte do Templo durante a parada fá-lo-ão por cima dos nossos cadáveres».

Já o arcebispo Antonio Franco, o embaixador do Vaticano em Israel, foi mais moderado nos termos em que condenou o evento, que para o dignitário católico, que não faz a mínima ideia do que significa pluralismo, democracia e tolerância -palavras ausente do léxico das religiões do livro- corresponde à «imposição da vontade de alguns sobre a maioria».

Considerando o que se passou na Polónia em que os homofóbicos (e anti-semitas) membros do partido ultra-nacionalista – muito apoiados pela Igreja católica – ameaçaram esperar os gays participantes na parada local com clavas, e o que se passou recentemente em Moscovo na mesma iniciativa, não é extemporâneo pensar que alguns fundamentalistas cristãos se juntariam aos seus análogos das outras religiões do livro para punir «adequadamente» os «pecadores».

12 de Julho, 2006 Palmira Silva

O verdadeiro ecumenismo

O grande Rabi de Israel, Shlomo Amar (sefardita), enviou uma carta a Bento XVI pedindo a condenação da Parada Internacional do Orgulho Gay, programada para 10 de Agosto, em Jerusalém. Segundo diversas fontes, na carta Amar pede ao Papa que «condene de forma inequívoca e enérgica este terrível fenómeno, com a esperança de despertar um protesto geral por parte de diferentes dignitários religiosos». O Rabi pede ainda a Bento XVI: «Ajude-nos a impedir a Parada Mundial Gay, programada para o mês de Agosto, em Jerusalém, pois ela ‘viola e humilha’ a Cidade Santa».

Na realidade os dignitários de todas as religiões do livro e suas variantes são uníssonos na condenação do evento, como seria apenas expectável. Os muçulmanos de Israel esqueceram o conflito israelo-árabe e juntaram as suas às vozes judaicas e cristãs de diferentes denominações -incluindo a Igreja Ortodoxa – que exigem do Parlamento a proibição do desfile.

O núncio apostólico em Jerusalém, monsenhor Pietro Sambi, advertiu que a Parada Gay «não seria apenas uma ofensa, mas uma provocação para os judeus, cristãos e muçulmanos de Jerusalém e do mundo inteiro».

Já o sheik Abed Al Salam Menasra, adjunto do mufti de Jerusalém, pediu para que não provoquem «a cólera com uma celebração ímpia e profanadora», que pode levar «à perda da cidade santa».

A «imundície», nas palavras de Nissim Zeev, deputado do Partido ultra-ortodoxo Shas, conseguiu algo inaudito na história do Knesset: representantes muçulmanos e das alas judaicas mais à direita (isto é, religiosas) uniram-se em torno de uma causa comum: a imposição a todos dos preconceitos neolíticos sobre sexualidade do «livro».

Até de Moscovo vieram vozes de protesto: Yona Metzger, o Rabi-chefe aschenazi, que participa do encontro inter-religioso promovido pelo Patriarcado Ortodoxo, pede que se «cancele a parada gay na Cidade Santa de Jerusalém» justificando:

«Como todos sabem Jerusalém é o berço no qual nasceram as três religiões monoteístas. Devemos estar unidos para preservar sua histórica santidade, e os valores de pureza e moralidade que a caracterizam».

No encontro, que inclui representantes de 40 países, incluindo a Síria, Irão e Arábia Saudita, Metzger afirmou que se deviam esquecer as disputas políticas e que «todos os países dever-se-iam unir em torno da sua crença num Deus único».

Ou seja, para o rabi os fundamentalistas das respectivas religiões dever-se-iam unir contra não só os que não acreditam em resquícios neolíticos da evolução humana, mantidos anacronicamente pela imiscuição religião-estado que obriga ou permite a doutrinação religiosa desde o berço, como contra os que não seguem os ditames, muito semelhantes, das religiões do Livro. De facto, todas elas são contra a abominação que constituem os direitos do homem, principalmente a liberdade de opinião e expressão, e especialmente são contra a abominação mor que é a igualdade de direitos para as mulheres. Todas elas reclamam que o Direito dos países respectivos deve ser regido por esses ditames!

As últimas notícias indicam que esta união inédita de políticos e dignitários de todas as religiões do livro já deu resultados: é quase certo que a Parada Mundial Gay se realizará não em Jerusalém mas sim em Tel Aviv, por razões de segurança.

De facto, considerando que os fundamentalistas das religiões do livro não são exactamente conhecidos pela tolerância mas mais pela violência «veemência» com que protestam os insultos à sua fé – dos quais o insulto máximo é o facto de o Direito não obrigar todos a seguirem os seus ditames anacrónicos – a Polícia de Jerusalém, que tem de lidar com a possibilidade de atentados bombistas suicidas numa base diária, considera difícil garantir a segurança dos participantes no evento!

Acho deveras significativo que todos estes piedosos dignitários religiosos, que rapidamente se uniram nesta «causa» comum – como se uniram no passado para condenar o reconhecimento dos direitos da mulher – sejam incapazes de se unir numa causa essa sim meritória: um apelo à paz, emitido com a mesma veemência com que debitaram este, apelo à paz que na nossa época é equivalente a um apelo ao fim da violência em nome de Deus!

11 de Julho, 2006 Carlos Esperança

Ainda o protocolo de Estado

PS e PSD acertaram lista do protocolo – D.N. ontem, pág. 7 (sítio indisponível)

O que está em causa, na discussão do protocolo de Estado, é mais o lugar das Igrejas na democracia do que a dimensão e o sítio em que se arruma um cadeirão para o cardeal da Igreja católica.

A relevância dos dignitários católicos é apenas um pretexto para justificar a manutenção de privilégios ancestrais e uma manobra para caçar votos à custa da influência religiosa nas opções políticas dos portugueses, discriminando as outras religiões.

O que incomoda alguns fundamentalistas é a incompetência do Estado laico em matéria religiosa, a sua incapacidade para se pronunciar sobre verdades divinas e o impedimento para decidir sobre a vontade de Deus. De resto, a separação Igreja/Estado só favorece as duas instituições e evita a promiscuidade que foi apanágio da ditadura.

Ninguém duvida da liberdade religiosa em Portugal a menos que entenda por liberdade o direito hegemónico de uma religião particular, incompatível com a Constituição e a sociedade plural em que vivemos.

Um cadeirão destinado a um prelado numa cerimónia de Estado é tão aberrante como a reciprocidade nas cerimónias litúrgicas para os detentores de altos cargos da República.

Já a exótica manifestação da vontade de incluir um descendente da família de Bragança nas cerimónias oficiais (um delírio do CDS) é ignorar que a República se ergueu contra a Monarquia e que semelhante privilégio não é concedido a nenhum descendente dos presidentes da República.

No fundo é pôr em causa o fundamento do poder e a sua origem, aceitar ou não o voto secreto e universal para cargos transitórios ou regressar ao direito divino para funções vitalícias e hereditárias.

11 de Julho, 2006 lrodrigues

Como um ateu vê um crente

Acho que uma pessoa que crê em Deus, chame-lhe Jesus Cristo, Alá ou qualquer outra coisa parecida, ou o sinta somente como uma «força superior inexplicável», não se apercebe verdadeiramente do que pensa um ateu sobre a crença numa qualquer divindade.

Ainda há poucos dias um piedoso seguidor das virtudes místicas do Papa Bento XVI me declarou, e muito convictamente, que não acreditava que nenhum ser humano poderia, por natureza, ser verdadeira e inteiramente ateu.
Vai para o Céu, coitado…

Mas talvez o consiga explicar através desta singela história:

Durante a 2ª Guerra Mundial os americanos ocuparam uma pequena ilha do Pacífico para ali instalarem uma base militar de abastecimentos.
A ilha era habitada por uma pequena tribo que vivia praticamente ainda na Idade da Pedra.

Mal chegaram, os americanos construíram uma pista de aviação, uma torre de controle, alojamentos, e instalaram toda a parafernália de equipamentos que é possível imaginar.
Como é de calcular, os habitantes da ilha conheceram com os americanos uma inesperada época de prosperidade e abundância.

Quando terminou a guerra, os americanos embalaram a trouxa e foram-se embora.
E lá terminou a Coca-cola e a abundância para aquela gente, novamente isolada do resto do mundo.

Meia dúzia de anos mais tarde, alguém regressou à ilha e constatou uma realidade curiosíssima:

Os nativos da ilha tinham desenvolvido um culto religioso a um Deus a que chamavam «Cágau» uma corruptela de «Cargo» ou carga, em inglês.
Mantinham a velha pista de aviação limpa, construíram uma espécie de torre de controle em canas e tinham criado uma casta de sacerdotes e uma complexa mitologia que explicava que um dia haveriam de descer dos céus uns messias, uns deuses de pele branca que viriam novamente trazer grande prosperidade ao povo.
E diariamente realizavam cerimónias religiosas conduzidas por sacerdotes na pista de aviação, em que apelavam à descida à terra daqueles entes misteriosos, supremos e omnipotentes.

Posto isto,
Que pensa desta história um qualquer cristão, muçulmano ou judeu?
Que pensará desta história, por exemplo, um católico?

Presumo, em primeiro lugar, que não lhe passará pela cabeça proibir os nativos da ilha de praticarem livremente o seu culto ao Deus «Cágau».
Aqui há uns anos atava-os a uns postes e deitava-lhes fogo. Mas (Deus o livre) agora não.
Quanto muito, pensará em enviar para o local meia dúzia de missionários para os evangelizar, mas isso é outra história.

Decerto olhará para aqueles nativos, antes de mais, simplesmente como uma interessante curiosidade antropológica.
Decerto os olhará, não com sobranceria ou superioridade, mas com um sensação mista de “diferenciação” intelectual e pessoal pelo curioso primitivismo daquela “pobre gente” da Idade da Pedra.
Terá até alguma pena pelo desperdício de tempo gasto com o culto a um Deus inexistente, como é o Deus «Cágau» (que toda a gente sabe que não existe).
E terá também pena pela certeza absoluta da inutilidade dos ritos religiosos que, por mais sentidos que sejam, que por muita fé e fervor que revelem por parte dos «fiéis», não trarão nunca de volta a prosperidade dos deuses de pele branca.
E terá também assim uma espécie, e sem qualquer conotação pejorativa, de sensação de quase… ridículo.
Estou até convencido que quando pensa na infantilidade daquela “pobre gente” esboça até um sorriso…

Pois bem:
Façam-me o favor de considerar que é precisamente assim que um ateu vê um cristão, um muçulmano, um judeu ou qualquer outro teísta, tenha ou não a sua fé uma designação atribuída, chame-lhe ou não «uma força superior inexplicável».

Vê-o exactamente, não com superioridade ou sobranceria, mas como uma mera e simples curiosidade antropológica, tão primitiva que é até oriunda da Idade da Pedra.
Vê os ritos e os cultos que o crente pratica como um lamentável desperdício de tempo e tem até pena daquela “pobre gente” pela infantilidade e completa inutilidade dessa prática.
Lamenta até as vidas humanas completamente perdidas e desperdiçadas em oração, em contemplação, em auto-amesquinhamento e em louvor do “Senhor” quando, de facto, não há “Senhor”, não há Deus «Cágau» nenhum.

É assim, tão simples como isso!

Nem sequer são necessárias quaisquer considerações filosóficas ou explicações muito elaboradas.
Como nem sequer são precisas teologias, teosofias, teodiceias e outras coisas começadas por “teo”, ao fim e ao cabo completamente inúteis, porque sob a capa de grandes lucubrações intelectuais, e até com alguma graça, diga-se, procuram unicamente justificar e explicar a existência de algo… que não existe.

Simplesmente porque o ateu vê a religião que o crente pratica, a «fé» que orgulhosamente exibe e os ensinamentos de Deus que apregoa, assim como uma espécie (e sem qualquer conotação pejorativa) de sensação de quase… ridículo.

E quando pensa nisso, e na infantilidade daquela “pobre gente”, o ateu muitas vezes esboça até um sorriso.

Mas não por muito tempo:
Porque pensar nos milhões de pessoas que ao longo dos tempos foram mortas em nome desse patético conto de fadas, desse culto ao nada, dessa mera curiosidade antropológica, inútil, mesmo infantil e até um pouco ridícula, não dá vontade de rir realmente nenhuma…

(Publicado simultaneamente no «Random Precision»)

11 de Julho, 2006 jvasco

Agnosticismo e Ateísmo: o esclarecimento impõe-se

A definição de ateísmo e agnosticismo não é consensual. Diferentes autores usam diferentes topologias para descrever as possíveis crenças pessoais, muitas delas contraditórias entre si.
Embora seja comum as pesoas pensarem que o agnosticismo e o ateísmo são posições incompatíveis entre si, muita literatura sobre o assunto não considera essas posições como sendo mutuamente exclusivas.

Para que não existam mal-entendidos de futuro, explico neste artigo qual a terminologia que geralmente uso quando me refiro a estes termos.

O ateísmo e a crença:
Vários indivíduos acreditam num Deus particular (ou em vários Deuses), pelo que são crentes. Chamo ateu a qualquer indivíduo que não seja crente.

Assim sendo, esquematicamente, a sociedade pode ser dividida da seguinte forma:

Vários ateísmos:
Muitas das pessoas que se dizem agnósticas, fazem-no para efectuar uma distinção entre diferentes formas possíveis de ateísmo. Existem duas distinções essenciais: ateísmo implícito e explícito; e ateísmo forte e fraco.

A diferença entre ateísmo implícito e explícito é a seguinte: enquanto que o ateu explícito acredita positivamente que Deus não existe, o ateu implícito, embora não acredite em Deus, também não acredita necessariamente na sua inexistência.

A diferença entre ateísmo fraco e forte é outra: enquanto que o ateu fraco admite a possibilidade de, perante certos indícios ou provas, deixar de ser ateu, o ateu forte acredita que tais provas ou indícios são simplesmente impossíveis de surgir.

Naturalmente um ateu forte só poderá ser um ateu explícito, embora muitos ateus explícitos possam ser ateus fracos.

Completando o esquema anterior vamos obter:

O agnosticismo:
É agnóstico aquele que afirma não saber se Deus existe.

Assim sendo, um crente pode ser agnóstico se não tiver a certeza que Deus existe. Qualquer ateu fraco (que inclui todos os ateus implícitos e muitos ateus explícitos) será também agnóstico. Ser agnóstico e ateu é portanto compatível.

O esquema que se segue divide a sociedade entre os que são agnósticos e os que não são. A cinzento escuro estão os agnósticos:



Agnosticismo fraco e forte:

Enquanto que o agnóstico fraco, não tendo actualmente a certeza acerca da existência de Deus, encara a possibilidade de vir a conhecer a resposta frente às provas ou indícios apropriados, o agnóstico forte crê que a existência de Deus é um problema intrinsecamente impossível de resolver, e que nunca se poderá saber se Deus existe ou não.

O esquema pode portanto ser completado, representando a cinzento escuro os agnósticos fracos, e a preto os agnósticos fortes:

Neste caso, o pontinho amarelo representa a minha posição pessoal. Em última análise não acredito que se possa saber nada com certeza (a não ser que existo enquanto ser pensante, já dizia o outro), embora enquanto empirista considere que os indícios tornam certas hipóteses mais plausíveis que outras, e é mero bom senso acreditar nas hipóteses mais plausíveis.

Assim sendo, da mesma forma que não sei se a força da gravidade existe, mas acho mais plausível que exista do que uma gigantesca coincidência ter feito biliões de partículas movendo-se ao acaso terem-se portado até agora, por coincidência, como se existisse – e então acredito na força da gravidade – sou um agnóstico forte, mas acredito positivamente que Deus não existe. É a mera escolha da hipótese mais plausível dados os indícios e provas a que tenho acesso.

10 de Julho, 2006 Carlos Esperança

B16 – O inveterado celibatário

O jurássico pastor alemão é um apóstolo da violência. Impõe o celibato indissolúvel ao clero e exige a indissolubilidade do matrimónio aos leigos, embora nunca fosse difícil dissolver um matrimónio canónico para quem tivesse dinheiro e influência.

O Vaticano não é um tribunal, é a casa de alterne onde se negoceia o direito canónico.

Quando o arcebispo Emmanuel Milingo se casou, sob os auspícios do reverendo Moon, o Vaticano envidou esforços para que o prelado zambiano rompesse o matrimónio com a esposa, María Sung, e regressasse ao múnus e à obediência a Roma. E conseguiu.

A coerência não é uma virtude apostólica mas a intolerância e a violência são apanágio da fé e o paradigma das religiões.

B16, na pouco gloriosa ofensiva prosélita em Espanha, que ainda julgava protectorado da ICAR, fingiu que foi proteger «a maravilhosa realidade do matrimónio indissolúvel entre homem e mulher, a origem da família», mas foi defender os interesses do Vaticano e o poder do clero espanhol, cooperando com a missa em comícios conjuntos do PP e do Opus Dei.

Este ataque à liberdade individual, em especial ao divórcio, é uma obsessão demente que o actual Papa interiorizou do seu predecessor. Os fanáticos das penas perpétuas não compreendem que a liberdade é um bem superior aos seus preconceitos.