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Mês: Dezembro 2005

27 de Dezembro, 2005 Palmira Silva

A sétima dimensão

A criação, basílica de São Marcos, Veneza, Itália.

«Pois eu vou ver os limites da Terra fecunda, e o Oceano, origem dos deuses, e Tétis, sua Mãe» Homero, Ilíada.

Segundo Teilhard de Chardin nada é inteligível fora do seu lugar histórico, assim a compreensão das sociedades actuais é inseparável da história da religião, da filosofia e da ciência e podemos acompanhar a evolução das religiões prevalecentes analisando a conjuntura cultural em que surgiram e como se desenvolveram. De facto, desde que os acasos da evolução permitiram ao Homem o desenvolvimento de um complexo sistema neuronal os seres humanos apresentam uma apetência inata por explicações. Esta é certamente uma das razões que explica porque a religião tem acompanhado o Homem ao longo da História, uma vez que as religiões se reclamam detentoras da verdade absoluta, global, completa, tanto no que respeita à natureza como ao homem.

Desde a Renascença que a Cristandade, a supremacia da religião sobre todos os aspectos da vida, está em declínio no Ocidente. O Humanismo, o traço dominante do Renascimento, venceu o teocentrismo medieval, com a sua redescoberta do homem, confiante no seu intelecto, poder e valor, em contraste com a Idade Média, que apenas considerara o homem como um ser pecaminoso e sem valor intrínseco. Libertação do homem renascentista bem representada no discurso «Da dignidade do homem» (Hominis Dignitate) de Picco della Mirandola.

A dignificação do homem traduz-se igualmente numa dignificação da vida: o homem medieval que morria para fazer viver Deus deu lugar ao homem da Renascença que ao viver plenamente a vida, não mais apenas uma passagem para outro mundo mas uma vida com valor intrinseco, deixa de olhar para o céu em mistícas contemplações divinas mas passa a escrutinar o seu mundo que descobre natural e sujeito apenas a leis naturais. O resultado último do naturalismo do renascimento é, pois, a ciência.

Ciência que contrapõe às «verdades absolutas» reveladas por um Deus criador um modelo da realidade, parcial, em permanente construção e no qual o homem não é mais do que um elemento da natureza, de que é o produto. Ou seja, para além da sua ambição comum de fornecerem uma leitura coerente do mundo sensível, a religião e a ciência ocupam o mesmo espaço: o do pensamento humano. Durante séculos, a religião manteve uma posição de preponderância, oferecendo aos homens uma verdade inquestionável e indispensável. Hoje verificamos exactamente o inverso e, apesar das tentativas IDiotas de recuperação desta hegemonia integrista, são poucos os que buscam na religião as respostas ao mundo sensível que estas durante milénios ofereceram ao Homem.

O argumento que a religião e a ciência operam em dimensões diversas e que estão preocupadas com questões diferentes, do mundo «espiritual» e do mundo material, não colhe, já que as religiões surgem e desenvolvem-se para preencher o papel hoje ocupado pela ciência. E por outro lado a ciência, mais concretamente as neurociências, negam a necessidade de invocar qualquer transcendência para explicar a «espiritualidade» humana.

Para uma ateísta como eu, para quem a mera concepção de um qualquer ser transcendente é absurda, a religião é completamente desnecessária e toda a minha «ligação» para além da física, isto é, a minha metafísica, se reduz à sua definição por William James, «apenas um esforço extraordinariamente obstinado para pensar com clareza», isto é, sem arbitrariedade nem dogmatismo. Assim a minha hipótese metafísica, a natureza fundamental da realidade, assenta em quatro pontos que resumidamente são:

1) Ontologia,(a natureza da realidade ou do ser) O Universo é auto-suficiente na sua existência e rege-se por leis naturais que determinam a natureza do ser de todos os seus componentes. A introdução de uma qualquer entidade externa que o criou e de que é dependente é completamente absurda e desnecessária.

2) Epistemologia (a teoria do conhecimento) O conhecimento e interpretação do Universo estão contidos e derivam do próprio Universo. A interpretação do Universo assenta em princípios lógicos que derivam da razão humana, por sua vez explicável por leis naturais.

3) Ética e Moral O direito que rege as sociedades deve transcrever o progresso ético da humanidade e não «verdades absolutas» reveladas de uma qualquer mitologia. Verdadeiro e falso são valores lógicos atribuídos a uma determinada proposição, ou seja, a verdade não pode ser absoluta, porque ela é um conceito que emitimos sobre uma proposição. Uma verdade de ontem pode não ser uma verdade hoje, porque o contexto em que essa verdade é avaliada mudou ou porque novos dados entretanto descobertos transformaram essa verdade em mentira.

A moral é simplesmente o conjunto de respostas automáticas do nosso sistema neuronal a estímulos exteriores e tem a ver não só com causas hereditárias e ambientais mas com os estímulos a que fomos sujeitos na infância, durante o período de desenvolvimento das conexões neuronais e crescimento dos «spindle neurons».

4) Teleologia Não há qualquer propósito no Universo. O Universo é simplesmente aquilo que vemos, é a única realidade existente e nós somos apenas um infíma consequência de processos naturais casuísticos. O significado da nossa vida é o que fazemos dela e não há qualquer causa última quer para nós quer para o Universo.

27 de Dezembro, 2005 jvasco

O Perigo do Intelecto

«O crente Cristão é uma pessoa simples: os Bispos deveriam proteger esta gente simples contra o poder dos Intelectuais»

Esta afirmação foi feita por Ratzinger em 31 de Dezembro de 1979, no contexto da defesa da acção contra Küng.

Originalmente li-a na Visão, mas o jornal Expresso também a referiu. O resto da imprensa nacional, como é hábito, faz de toda a informação que possa desagradar à Igreja um tabu, e mal referiu esta afirmação cheia de interesse para se entender como pensa o novo Papa. No que respeita ao circuito mediático português foram principalmente os blogues (como o Barnabé, por exemplo) que divulgaram essa informação.

Alguma imprensa internacional (mesmo católica) referiu essa pérola. Encontrei facilmente esta notícia e esta.

No livro Papa Bento XVI: uma Biografia de Joseph Ratzinger (de John L., Jr. Allen) pode ser lida essa afirmação na página 130 da versão em inglês. Nunca espreitei a versão portuguesa, mas deve estar lá perto.

27 de Dezembro, 2005 lrodrigues

Uma vida «chata»

Segundo o «Washington Post» o Papa Bento XVI declarou no seu discurso de Natal que os homens e as mulheres correm o risco de se tornarem vítimas das suas próprias… realizações intelectuais.

Mesmo ainda antes de ocorrer a sua transmutação em Papa, já o «Rottweiler de Deus» havia anunciado solenemente que «os fiéis são pessoas simples que é preciso proteger dos intelectuais».

É muito curioso como é o próprio Papa quem persiste em tratar o seu rebanho de fiéis e devotos católicos como autênticos atrasados mentais.

E como parece temer aqueles a que chama pejorativamente «intelectuais», e a que estranhamente contrapõe os fiéis da Igreja Católica, como se de figuras opostas e inconciliáveis se tratasse.

Como se ele próprio reconhecesse que um fiel, um crente, não pudesse ser um intelectual.
Como se receasse que os intelectuais, esses horríveis seres pensantes, «contaminem» os crentes e os obriguem a deixar de ser pessoas simples e naturalmente afastadas de realizações intelectuais.

Já aqui há uns dias, durante a cerimónia comemorativa do 40º aniversário do encerramento do Concílio Vaticano II o Papa Bento XVI tinha denunciado aquilo a que chamou a ideia completamente errada de que levar uma vida virtuosa é uma coisa «chata».

Tem razão o Papa!
Do alto da sua infalibilidade papal, estas elucubrações do chefe máximo da Igreja Católica são, de facto, brilhantes.

Tanto ele próprio como muitos milhares de outros ilustres religiosos que consagraram a sua vida a Deus e que levam uma vida piedosa e de oração, inteiramente virtuosa e completamente isenta de ?pecado?, têm decerto uma vida muito longe de ser considerada ?chata?.

Pode ser uma vida completamente inútil, isso sim.
Pode ser uma vida inteira desperdiçada, pateticamente dedicada a bajular e a louvaminhar alguém que não existe.
Pode mesmo ser uma vida «simples».
Pode até ser uma vida totalmente isenta de «realizações intelectuais».

Mas «chata», não!
Isso ela não é com certeza!

(Publicado simultaneamente no «Random Precision»)

26 de Dezembro, 2005 Palmira Silva

Humor Católico: desenvolvimentos

Alertada pelos comentários de alguns dos nossos leitores da vizinha Espanha, aos quais aproveito para agradecer, especialmente à Ester, resolvi investigar um pouco mais o que se passava com este episódio de humor católico com contornos «racistas e colonialistas», como o designou o ministro dos Negócios Estrangeiros da Bolívia, Armando Loayza.

E de facto, em minha opinião, este não foi o episódio infeliz retratado em alguma imprensa mas sim um desafio deliberado lançado pela COBE (certamente com o amen dos seus donos, a Conferência Episcopal Espanhola) ao governo de Zapatero que se atreveu a afrontar a até aqui toda poderosa e intocável Igreja Católica.

Desafio catalizado pela decisão recente do Conselho Audiovisual da Catalunha (CAC), a autoridade reguladora do sector nesta comunidade autónoma cujos membros são designados pelo Parlamento autónomo, que concluiu num extenso relatório de 71 páginas (pdf disponível) que a emissora COPE «incorreu numa infracção dos limites constitucionais ao exercício legítimo dos direitos fundamentais à liberdade de informação e expressão» o que constitui «um incumprimento grave do regime de concessão». Decisão aplaudida pelo colégio de jornalistas catalão. De momento a emissora não sofrerá sanções porque, de acordo com a lei vigente, aprovada este ano com 90% dos votos, tem de incorrer em nova infracção para que tal aconteça. O que tendo em conta o teor das (des)informações transcritas no relatório, mentiras descaradas, insultos ofensivos gratuitos a membros do governo nacional e catalão e afins parece provável antes do final de 2005!

Este episódio de «humor» católico serve para ilustrar qual o tipo de «liberdade de expressão» que os empregados da Conferência Episcopal querem defender daquilo a que chamam a Inquisição Audiovisual da Catalunha. Ou seja, informar com responsabilidade e veracidade é algo que não consta dos padrões da rádio da Igreja Católica espanhola, padrões a que terão de se conformar quando for aprovado o ante projecto de lei anunciado há três dias pela vice presidente María Teresa Fernández de la Vega, a criação do Conselho Audiovisual Estatal que irá colmatar a falta de uma autoridade nacional sobre os media espanhóis (a Espanha é o único país da União Europeia em que esta autoridade não existe).

Que todo o abominável episódio não foi de facto uma partida «leve» e inocente é fácil de perceber lendo a resposta de Federico Jiménez Losantos à reacção de indignação dos governos espanhol e boliviano, que segue a habitual táctica de vitimização e acusações de perseguição da santa madre Igreja. Assim o o piedoso jornalista classifica de «grotesca palhaçada orquestada por Zapatero para chantagear os bispos e liquidar os programas críticos para a sua mísera política antinacional» a reacção do governo de Zapatero e em relação a Evo Morales, o piedoso jornalista considera que «merece, no mínimo, o mesmo tratamento que os seus confrades ditatoriais [o golpista (sic) Chávez e Fidel]: a oposição política e, desde logo, a sátira onde haja liberdade de expressão».

Acho estranho que para este funcionário da Igreja Católica espanhola, que tanto se congratulou com a reeleição de Bush, sejam ditadores estadistas eleitos livremente por uma maioria esmagadora da população. Enfim, pode estar simplesmente em total ressonância com Bento XVI, que afirma que à falta de crença religiosa se segue inevitavelmente o fascismo… Mas já acho mais complicado que considere legítimo apelar ao derrube do governo, eleito democraticamente, de Zapatero por todos os meios, de «unhas e dentes» incluindo «em última instância, o levantamento popular. E em ultissimo lugar, os militares». Claro que há precedentes em Espanha nomeadamente na Guerra Civil espanhola em que Franco teve uma inestimável ajuda de Pio XI, que em 1936 exortou os católicos espanhóis a lutarem lado a lado com o Generalissimo na «difícil e perigosa tarefa de defender e restaurar os direitos e a honra de Deus e da Religião».

Certamente que esta última declaração, quasi um apelo a um golpe militar contra Zapatero não fora o próprio Losantos reconhecer que tal apelo não teria muito eco nos meios militares espanhóis, se enquadra na tal «liberdade de expressão» considerada ameaçada pela hierarquia católica espanhola. Mas já sabemos que para um cristão fundamentalista liberdade de expressão é sinónimo de liberdade de expressão apenas para as suas «verdades absolutas».

De qualquer forma a Conferência Episcopal espanhola segue à risca as recomendações do finado Papa: «Todos devem saber como fomentar uma vigilância constante, desenvolvendo uma saudável capacidade crítica no que diz respeito à força persuasiva dos meios de comunicação». Afinal liberdade de expressão para todos corresponde para a santa madre Igreja, como advertiu João Paulo II no seu último livro «Memória e Identidade: Conversações entre Milénios», a dar voz à «ideologia do mal» que ameaça insidiosamente a sociedade e que surge quando os governos decidem usurpar a «lei de Deus» como acontece com o de Zapatero.

26 de Dezembro, 2005 pfontela

Sensibilidade estética e curiosidade

Pessoalmente considero a fé religiosa monoteísta tal como ela é estruturada pelas grandes religiões actuais como uma completa charlatanice, propagada e mantida por um grupo de interesse: o clero. Mais ainda: enojam-me profundamente os actos de humilhação individual perante o «divino» que todos os anos somos testemunhas, seja pelas procissões ou outros eventos mais ou menos regulares.

A religião do livro que é dominante no Ocidente, o Cristianismo, sofre do que eu considero ser a patologia da fraqueza. Da virtude por associação à dor, ao sofrimento e à negação. A concepção do Homem como inferior parece ser intrínseca a ela, a sua concepção de deus só me parece possível rebaixando o Homem ou a um escravo ou a um ser que é perfeitamente patético e indigno seja do que for.

Apesar de tudo isto não me é possível negar ao crente o direito de se tornar na criatura patética dos seus sonhos (pesadelos?). O facto de respeitar a sua liberdade individual não torna as suas concepções alienígenas mais próximas da minha estética, nem por um segundo. O que sim me força é a rejeitar o papel de educador, de pedagogo e acima de tudo o de salvador (com tons totalitários como é regra). Deixemos o messianismo para outros.

A conclusão lógica de tudo isto é, ou deve ser, a não interferência. Que muito possivelmente, nos casos de maior curiosidade intelectual, é complementada por uma tolerância derivada da partilha de opiniões e elementos «culturais» – digo isto sem ironia alguma, pois apesar de ser um ateu empedernido, materialista e empirista tenho grande interesse e curiosidade pelos mitos e ideias que circulam, ou circularam, pela «oposição».

O que torna este diálogo impossível (que é essencialmente de natureza intelectual e de escasso interesse para muitos) é o fanatismo. Qualquer posição que defende a existência de um imperativo moral que justifique a acção opressiva não pode aceitar qualquer diálogo, pois a própria existência de uma oposição fere a sua sensibilidade e o seu suposto primado sobre a verdade. A religião exerce por excelência (mas não exclusivamente) esse papel pelas suas organizações que se encontram mais ou menos institucionalizadas conforme o grau de secularização – que é um pré-requisito de uma genuína liberdade civil.

A convivência pacífica não é ameaçada pela diversidade, desde que esta diversidade seja subentendida num contexto da existência de um espaço completamente privado, onde existe liberdade para agir como bem entendemos, e um espaço público que por natureza tem que ser neutro. E o que digo vale tanto para ateus como para teístas.

26 de Dezembro, 2005 Carlos Esperança

O medo e a fé

O medo é o mais fiel aliado das religiões e o sofrimento o húmus onde floresce a fé. A aflição e a angústia debilitam o intelecto, mortificam o corpo e tornam consciências lúcidas em farrapos que as religiões enrolam na manta de charlatanismo que tecem.

Todas as religiões se reclamam do Deus verdadeiro, único que tem a chave do Paraíso. Assim se vê que as religiões são todas falsas menos uma, na melhor das hipóteses, e certamente são todas.

Uma doutrina, impostura ou código de valores que obriga a humanidade a prostrar-se de joelhos em vez de a ensinar a viver de pé, não dimana de um ser superior, brota da vontade de um sádico, nasce no cérebro de um néscio ou da tentação de um biltre.

É explorando fraquezas, medos e inquietações que a religião aparece como panaceia para o abatimento, remédio para a agonia e bálsamo para todas as moléstias.

O padre é o autor da trapaça, o artífice da fraude, o intermediário do embuste. Deus é apenas uma imagem que o tempo corroeu, uma droga que excedeu o prazo de validade mas que ainda ocupa as prateleiras de uma drogaria à espera da falência.

No vértice da pirâmide está o chefe dos embusteiros, o homem do chicote, o frio juiz que aprecia as vendas, pede esclarecimentos e dita as regras. Umas vezes chama-se ayatollah, outras patriarca, mullah, arcebispo ou papa. São espécimes zoológicos da mesma estirpe, implacáveis prosélitos de livros obsoletos que esmagam a liberdade e encerram os rancores divinos.

A fé vive do medo, do Inferno, da morte e do insondado. Outrora eram deuses o Mar, o Sol e os Ventos, hoje são outros os monstros e mais sofisticados os atributos. O deus de serviço vagueia à rédea solta pelo Universo a espiar a humanidade e a ruminar castigos para quem abomina os padres e despreza os sacramentos.

26 de Dezembro, 2005 Palmira Silva

Projecto Steve

O templo dos neo-criacionistas disfarçados de IDiotas, o Discovery Institute, uma instituição sem problemas de financiamento, exibe como grande trunfo uma lista de 400 cientistas, na sua maioria ligados ao próprio Instituto, que segundo o DI apresentam grandes dúvidas em relação ao evolucionismo.

Nomeado em honra do paleontólogo Stephen Jay Gould e como paródia às pretensões dos IDiotas* de que a evolução é «uma teoria em crise», o National Center for Science Education (NCSE) criou o Projecto Steve que pretende tratar as inanidades debitadas pelos IDiotas, mais concretamente que existem sérias dúvidas na comunidade científica sobre a evolução, como a anedota que de facto são. Assim o Projecto Steve lista apenas cientistas chamados Stephen ou variações como Stephanie, Steven, Stefan, Esteban, etc. que se prontificaram a assinar o manifesto acima reproduzido. Neste momento há 687 Steves no Steve-o-Meter, incluindo os dois Steves prémios Nobel, Steven Chu e Steven Weinberg, para além de Stephen Hawking, claro!

Todos estes Steves são certamente «adoradores do ateísmo» na opinião dePat Robertson, o pastor evangélico ex-libris dos teoconservadores ou «religious right» e fundador da Coligação Cristã, conhecido pelas pérolas de raciocínio cristãs que debita.

Uma das mais redondas destas pérolas foi debitada durante a emissão de dia 15 do corrente mês no programa «The 700 Club» da CBN (Christian Broadcast Network) em que Robertson sugeriu que os defensores da evolução são «fanáticos» acrescentando que a evolução «é uma religião, é um culto» e como tal afirmou que o ensino da evolução é anti-constitucional, violando a primeira emenda que prevê a separação religião-estado.

Robertson é conhecido internacionalmente pelos piedosos dislates que debita mas este é de tal forma hilariante que lhe merece automatica e destacadamente o prémio na categoria «Anedota do Ano».

*Intelligent Design is Involved in the Origin of The Species

25 de Dezembro, 2005 Palmira Silva

Humor católico

O governo espanhol chamou o seu enviado ao Vaticano devido a uma «partida» feita por um jornalista de uma rádio da delegação espanhola da Igreja de Roma. Certamente foi coincidência a Igreja Católica estar empenhada numa guerra de vale-tudo contra Zapatero e o seu governo e sem dúvida também por coincidência o director do programa La Mañana que perpetrou a «partida», Federico Jiménez Losantos, é um dos mais acérrimos críticos de Zapatero.

Em directo aos microfones da rádio COPE, propriedade da Igreja Católica, e fazendo-se passar por Zapatero, um jornalista da equipa telefonou a Evo Morales, depois das eleições do passado fim de semana o líder da Bolívia, dando-lhe os parabéns por ter integrado o «eixo cubano-venezuelano» e instigando-o a fazer de Espanha a sua primeira visita oficial como presidente da Bolívia.

Jose Luis Rodriguez Zapatero mal soube da manifestação do que passa por humor católico telefonou a Evo Morales, parabenizando-o pela sua vitória eleitoral e pedindo desculpas pela «partida inaceitável» da emissora católica de que fora vítima.

O ministro dos Negócios Estrangeiros da Bolívia, Armando Loayza, entregou ao embaixador espanhol em La Paz, Francisco Montalban, uma carta oficial de protesto dando voz à indignação do governo boliviano em relação à deplorável piada católica, que consideram «uma afronta aos cidadãos bolivianos» e um sinal de «carácter racista e colonialista» .

O governo espanhol na voz do secretário de estado da Comunicação, Fernando Moraleda, exigiu um pedido de desculpas formal da COPE ao presidente eleito da Bolívia.

Não obstante Moraleda ter falado com o presidente do conselho de administração da COPE, Bernardo Herráez, e com o porta voz da Conferência Episcopal Espanhola – proprietária da emissora – Juan Antonio Martínez Camino, que achou inaceitável o que se passou, até agora nenhum pedido de desculpas oficial quer da emissora quer da hierarquia católica de Espanha foi oferecido aos dois estadistas envolvidos. Isto é, o director-geral da COPE, Genaro González del Hierro, enviou uma nota ao embaixador boliviano em Madrid, Álvaro del Pozo, pedindo desculpa pelos «problemas que a partida poderá ter causado» e informou que já tinha comunicado aos humoristas católicos «a inconveniência deste tipo de acções».

Tal como o ministro da Justiça espanhol, Juan Fernando López Aguilar, que prometeu investigar o caso, considero que a mui católica partida denota «prepotência e arrogância» (algo a que a Aguilar já devia estar habituado já que são as imagens de marca da Igreja de Roma) e que é «moralmente reprovável, politicamente censurável e exige um pedido de desculpas». Mas suponho ser difícil vermos um pedido de desculpas formal da Conferência Episcopal Espanhola a Zapatero…

25 de Dezembro, 2005 Palmira Silva

Virgem dentro de preservativo

Uma das primeiras acções de Ratzinger como Bento XVI foi forçar a demissão do editor do periódico jesuíta «America», o padre Thomas Reese, com quem mantinha um historial de discórdia enquanto Ratzinger. Na realidade o então zelador pela pureza da fé católica discordava veementemente da opção de Reese em apresentar sobre todos os ângulos assuntos «fracturantes» como o uso profiláctico do preservativo , a ordenação de padres (publicamente) homossexuais, a posição dos católicos pró-escolha na ICAR, o secretismo nas medidas de disciplina na Igreja e outros assuntos que Ratzinger não queria discutidos.

Agora com outro editor a revista continua a merecer protestos dos meios católicos devido a um «escândalo» que «chocou» católicos no mundo inteiro, a publicação nesta revista de um anúncio a uma estátua do artista britânico Steve Rosenthal, que oferecia aos leitores a oportunidade de comprar «uma espantosa estátua de 22 cm da Virgem Maria em cima de uma serpente, usando um véu delicado de látex».

O editor da revista pediu prontamente desculpas aos seus leitores pela publicação do anúncio a esta «obra de arte religiosa contemporânea», que afirmou ter sido aceite pelo facto de o autor só ter enviado uma prova a preto e branco que tornava difícil apreciar que o véu de látex era de facto um preservativo e a serpente um espermatozóide…

O artista afirmou recentemente que tinha orquestrado o seu trabalho de forma à publicação do anúncio coincidir com o Dia Mundial de Combate à Sida a 1 de Dezembro, e que esta foi uma forma de protesto contra a posição do Vaticano em relação ao uso profiláctico do preservativo.

25 de Dezembro, 2005 Palmira Silva

Fim do multiculturalismo: a burka na Holanda

Mulher afegã usando uma burka

Depois de proibido em algumas cidades europeias, por exemplo Como no norte de Itália, Antuérpia e Ghent na Bélgica, o uso da burka parece prestes a ser banido na Holanda, que seria assim o primeiro país europeu a legislar sobre o tema. De facto, uma proposta visando a proibição do uso da burka em público na Holanda tem o apoio da maioria dos deputados no Parlamento holandês e, como tudo indica, será formalizada em Janeiro próximo, o que tem causado uma longa controvérsia neste país.

Rita Verdonk, a dama de ferro que tem a pasta da Integração, comprometeu-se a investigar onde e quando pode a burka ser banida dos locais públicos. Considerando que a ministra tem seguido uma linha dura com os grupos muçulmanos extremistas, não contemporizando com atitudes até há pouco tempo «desculpadas» em nome do multiculturalismo, por exemplo cancelou uma reunião com líderes muçulmanos que se recusavam a cumprimentá-la por ser uma inferior mulher, parece muito provável que esta «tradição» de vestuário, em minha opinião inaceitável, tenha os dias contados na Holanda.

Na Indonésia, pelo contrário, os fundamentalistas islâmicos, especialmente na província de Aceh, usam todos os meios para obrigar as mulheres a usarem os trajes «tradicionais» que as cobrem dos pés à cabeça, criando inclusive uma polícia especial, a Wilayatul Hisbah (ou Brigada de Controle) que procura entusiasticamente mulheres que se atrevam a desviar um milímetro da Sharia para as humilhar publicamente.

Porque, como vocifera Marluddin Jalil, um juiz fundamentalista, o tsunami que fustigou a área há um ano foi castigo de Deus pelos comportamentos «imorais» das mulheres da zona: «O tsunami aconteceu por causa dos pecados das pessoas de Aceh», indicando que com pessoas se estava a referir apenas às mulheres continuando «O sagrado Corão diz que se as mulheres forem boas então o país está bem».