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Categoria: Não categorizado

6 de Janeiro, 2007 jvasco

Coitada da mosca…

«Na edição do jornal O Público de dia 8 [de Dezembro] há um artigo sobre Charles Brabec, que está a montar um museu criacionista em Mafra:

«Charles Brabec traz para a mesa uma série de fósseis. Dentro de uma caixinha transparente está um pedacinho de âmbar amarelo, com uma minúscula mosca-do-vinagre lá dentro. ‘É resina fossilizada, muito antiga; por que é que as moscas-do-vinagre continuam a existir? Não evoluíram!’»

Temos então uma mosca em resina ‘muito antiga’. Claro que não diz quão antiga é. Se disser que a mosca tem 4000 anos ninguém acha estranho que seja parecida com as que vivem hoje em dia. E se disser que tem milhões de anos vai ser difícil defender que o universo tem poucos milhares de anos. Mas uma é clara: ele sabe que a mosca não evoluiu.

Chamamos moscas aos insectos da ordem Diptera (duas asas). Conhecem-se 85 mil espécies nesta ordem e estima-se que haja um total de 200 mil. Do género Drosophila, a tal mosca-do-vinagre, há cerca de mil espécies descritas. O senhor criacionista olha para uma mosca que lhe parece ser duma destas espécies e diz logo que não evoluiu.

Não sei o que Brabec procurava numa mosca primitiva. Um machado de pedra e uma tanga de pele de leopardo? É que aos nossos olhos uma mosca é uma mosca. Primitivas ou não parecem-nos todas a mesma coisa, e é por isso que agrupamos 200 mil espécies no mesmo termo ‘mosca’. Talvez um entomólogo experiente saiba distinguir moscas primitivas de moscas modernas, mas a pergunta de Brabec sugere que ele não é perito na matéria. Além disso muitas características podem evoluir sem que se note nada olhando para a mosca adulta fossilizada. O tipo de alimento, os rituais de acasalamento, onde põem os ovos, o que comem as larvas, e assim por diante. Mas Brabec dá uma olhada e diz que não houve evolução. E porquê? Porque ainda existem moscas do vinagre. É claro, se não existissem ele também dizia que não tinha havido evolução porque se tinham extinguido. O criacionismo tem mesmo resposta para tudo… é pena é ser sempre a mesma resposta.

A fé dos criacionistas protege-se com uma grossa camada de ignorância. Ignoram a teoria que criticam, ignoram os factos, e ignoram até o propósito duma explicação. E é ignorância que nos querem vender, substituindo a compreensão que temos por um milagre incompreensível.»

——————————–[Ludwig Krippahl]

5 de Janeiro, 2007 jvasco

Visões Diferentes

«[…]

Vou tentar mostrar aqui por três hipóteses que a verdade não é revelada pela fé, mas pela dúvida. Começarei pelo contraste entre o modelo Cristão e o modelo Hindu da escola advaita vedanta, o meu preferido nestas coisas da fé.

Segundo o modelo Cristão o universo é uma criação deliberada de um deus inteligente. Há uma diferença clara entre o criador eterno e a criação temporal, que tem inicio e fim. Somos dotados de independência e autonomia, mas temos o dever de contribuir para um plano divino que é o propósito de toda a criação. O criador fez um universo com um propósito sério, recompensa quem contribui para esse fim, e castiga quem se opõe. O mal e o bem são absolutos, determinados pelo propósito do criador.

Segundo o modelo Hindu a consciência de cada um de nós (atman) é idêntica ao ser absoluto para além do tudo e do nada (brahman). O universo não é uma criação, nem tem um propósito. Todos nós e tudo o que vivemos é esta totalidade consciente a brincar e a representar papeis, a fingir que é um médico, uma professora, um morcego, uma pedra, e a perder-se num jogo de faz-de-conta sem inicio nem fim. Não há um propósito. É como uma música ou uma dança; o objectivo não é levar o bailarino deste lado do palco àquele, mas sim dançar. É um fim em si mesmo, e não há mais nada que isto. Não há mal nem bem, culpa nem castigo, mas sim karma, a relação entre acto e consequência que dá drama a esta peça.

Estes são apenas dois exemplos de milhares de modelos contraditórios que a fé criou. Mas se a fé traz discórdia, a dúvida traz consenso. O terceiro modelo, dado pela ciência moderna, inverte a posição da consciência no processo. Sendo humanos vemos tudo com consciência, e por isso assumimos que a consciência está na origem das coisas. Mas combatendo esta tendência compreendemos a consciência como o produto de processos inconscientes. Como a chuva, o diamante, ou a divisão celular. Assim vemos um universo que é. Não é para. Não é porque. É. Neste modelo o mal e o bem, explicações, razões, causas, tudo isso são conceitos nossos que podemos aplicar apenas onde aplicável. A realidade transcendente é a realidade que, a qualquer momento, nos transcende, mas que se torna acessível quando desenvolvemos ferramentas materiais e conceptuais para a compreender. O electromagnetismo, a gravidade, o DNA, a vida. A origem do universo. A consciência em si, eventualmente.

Mas falei inicialmente de três hipóteses, e não de modelos. Estas hipóteses são que cada um destes modelos corresponde à realidade. Separar a hipótese do modelo pode parecer um preciosismo desnecessário, mas é importante. Se virmos o modelo como verdadeiro ou falso vamos avalia-lo de dentro do modelo e cair em argumentos circulares. A consistência interna […], ou o acreditar para compreender e compreender para acreditar, como dizia Ricoeur. Mas a hipótese de o modelo corresponder à realidade é exterior ao modelo, e por isso a única forma de validar o modelo é compará-lo com a realidade externa ao modelo. Qualquer que seja o modelo.

A fé é a nossa relação íntima com o modelo. A dúvida questiona a hipótese de o modelo corresponder à realidade e abre o modelo ao confronto com o que observamos à nossa volta. É a dúvida que usa os modelos para revelar o que a realidade nos esconde.

Concordo […] que o ‘revelatum’ é para todos. A realidade revela-se a todos. Mas pela dúvida, não pela fé. É por tentar encaixar modelos com a realidade que a ciência se torna uma e igual para todos, e este confronto constante entre modelos e realidade amplia gradualmente o nosso conhecimento. A fé é o apego sentimental a um modelo qualquer, e gera um conjunto disjunto de crenças contraditórias que são mais reveladoras das limitações humanas que da realidade que nos transcende.»

——————————–[Ludwig Krippahl]

4 de Janeiro, 2007 Ricardo Alves

O direito a não pertencer

O arcebispado de Valência (Espanha) da ICAR recusa-se a actualizar os registos de baptismo de cidadãos que já pediram expressamente para ser retirados do registo eclesial.

A apostasia é um acto através do qual os cidadãos anunciam à igreja onde foram baptizados que já não se consideram crentes, e que portanto, em coerência, gostariam que o seu nome fosse suprimido do registo de uma igreja a que já não pertencem. A Lei de Protecção de Dados espanhola (como a portuguesa) dá acolhimento legal a esta pretensão.

Infelizmente, o arcebispado valenciano insiste em recorrer aos tribunais, tentando negar o direito dos cidadãos a abandonarem uma igreja a que não querem pertencer, e onde não entraram por vontade própria. Cerca de 1 500 cidadãos já reclamaram junto da Agência Espanhola de Protecção de Dados. Também foram reportados problemas com os processos de desbaptização em Madrid.

A maior parte dos pedidos de apostasia ocorreram por ocasião da visita do Papa a Espanha.

(Notícia descoberta via Renas e Veados.)
4 de Janeiro, 2007 Palmira Silva

O Irracional e o aborto

Transcrevo no Diário Ateísta o texto de uma amiga, com quem há uns tempos iniciei outra aventura blogoesférica, por falta de tempo completamente negligenciada. As reflexões da Teresa sobre o tema aborto constituem uma abordagem diferente das que temos apresentado nestas páginas, pelo que considerei relevante a sua transcrição no Diário Ateísta.

Há muito tempo enviei uma carta a um amigo reflectindo sobre os argumentos de João Pereira Coutinho num artigo sobre «Vida moderna», publicado no Independente a 28 Nov. 2003. Dizia mais ou menos assim.

Penso que é intelectualmente saudável tentar compreender os argumentos dos que estão situados do outro lado da nossa fronteira ideológica. A questão do aborto e do direito à vida serve exemplarmente para testar os métodos de raciocínio de ambos os lados, da esquerda e da direita. João Pereira Coutinho polemiza com base nos seus ideais da direita liberal e afirma que «o direito à vida – o direito a que uma promessa de vida cumpra o seu destino- deve ter prevalência sobre a expressão da nossa autonomia».

A questão essencial é a de saber qual o fundamento ético, científico, legal ou político – universal – que está na base da aprovação ou da criminalização de actos individuais. Racionalmente posso um dia vir a admitir que a minha opinião, contrária àquela, possa estar errada. Mas o autor não consegue convencer-me com o seu raciocínio.

Para mim é incompreensível pretender provar que a vida, ou o direito à vida, é anterior e superior à expressão da nossa autonomia. Porque não consigo discernir a existência de um ser, definido como humano, destituído de vontade. Admito que a prosa é bonita e de uma sensibilidade tocante, «o direito a que uma promessa de vida cumpra o seu destino», mas o raciocínio em que se fundamenta não está correcto.

Também não consigo entender que a única resposta a dar à questão metafísica da vida tenha de ser «radicalmente política», isto é, oriunda «do Estado constituído numa sociedade civilizada». Isto só seria correcto se admitissemos que os actos políticos são oriundos da ética, ou seja, que a ética e a política são uma e a mesma coisa. [Não necessitamos de ir muito atrás na História contemporânea ou na História das civilizações para compreendermos que os valores políticos não são imutáveis.]

Não se podem invocar razões secundárias baseadas nos «equilíbrios frágeis» de uma comunidade como suporte de leis que se pretendem universais. O direito à vida a inscrever como lei fundamental de um Estado é de aplicação restrita, aplicável apenas às mulheres desse Estado. Por outras palavras, a comunidade, o Estado, faz inscrever uma vontade em letra de lei a qual é superior a outra vontade, a das mulheres, penalizando-as por um acto autónomo da sua vontade.
Isto só é possível se os sujeitos da acção a criminalizar forem destituídos de vontade e de descernimento, isto é, politicamente não autónomos. Como diz o George Steiner, se um raciocínio é redutor, exemplificando aquilo que não consegue generalizar, é porque os argumentos não são universais.

Um exemplo deste tipo de raciocínio chegou-nos recentemente do Parlamento francês. Este legislou sobre as sancções a aplicar aos automobilistas que, involuntariamente, provocassem a morte de mulheres grávidas. De imediato se pretedeu que este raciocínio fosse extensivo a todas as grávidas. Pois se um acto involuntário do desgraçado de um automobilista era tão severamente penalizado então, por maioria de razão, seria penalizado o acto voluntário de uma futura mãe que abortasse. Este raciocínio abortou naturalmente.

O aborto é praticado desde a noite dos tempos, em todas as civilizações, sem regras e de forma aleatória. A Natureza às vezes apresenta-se-nos sem regras. O que deveria ser intelectualmente inadmissível é fazermos de conta que no decurso civilizacional, os únicos seres capazes de gerar ou interromper a vida tenham sempre pertencido à humanidade – essa humanidade de seres dotados de vontade autónoma e com direitos universais.

Só uma mãe pode decidir como, quando e com quem gerar ou não vida. É em nome desse dado de natura que as suas detentoras foram subjugadas. Foi o meio escolhido há séculos por uma civilização, «por forma a acautelar a satisfação dos seus interesses futuros».

Há uma classificação, e não só de género, explícita ou codificada, dos seres inteligíveis que cabem na humanidade e que podem ser nomeados. Não existem seres humanos sem crenças porque não existem seres humanos sem cultura. O direito à vida é uma crença, com base moral, que não se fundamenta em nenhum raciocínio empírico.

Naturalmente que se pode e deve discutir as crenças de cada um. Deve admitir-se que existem princípios morais fundadores, não sujeitos a transacções políticas, que constituem o espírito da nossa pertença à humanidade e que estão muito para além do nosso corpo, da nossa mente construída ou da nossa alma criativa.

Teresa Sá e Melo, Lisboa 20 de Abril de 2006

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4 de Janeiro, 2007 Carlos Esperança

A ICAR e a IVG

Na caverna de Deus ulula o Papa, convencido de que a tiara lhe aumenta a raciocínio e os paramentos lhe conferem santidade. Julga que o incenso, a água benta e o sinal da cruz são poderosos demonífugos que convertem incréus e levam de volta os apóstatas.

Nada disso. Apenas alinham em devota subserviência os ventríloquos do costume: os patriarcas, cardeais, arcebispos, bispos, cónegos, monsenhores, arciprestes, vigários, reitores, abades, padres e arquipadres, presbíteros e arquipresbíteros, diáconos e toda a variedade de Reverências, Excelências Reverendíssimas, Eminências e outros primatas paramentados que obedecem cegamente à Santidade vitalícia domiciliada no Vaticano.

Todo este coro de avençados da ICAR repete as mesmas inanidades que o Papa debita, sem prejuízo de dizerem o contrário quando a crença, os tempos e o prazo de validade da mentira anterior se esgotarem.

Confundir um embrião com uma criatura humana não é uma questão de ciência, é uma alucinação que o sindicato da hóstia vulgariza. É a mesma perturbação sensorial que vê milagres em coincidências ou imposturas, que vê um corpo apodrecido há dois milénios e o respectivo sangue numa rodela de pão ázimo, que engendra um hímen intacto numa fêmea parida.

Pessoas assim, a quem a fé ou o embuste causam alterações sensoriais, são dadas ao exagero e à mitomania. Numa pessoa simples tal comportamento chama-se mentira ou destrambelhamento mental, num dignitário eclesiástico atribui-se ao milagre da fé.

Não admira, pois, que o Papa e os seus sequazes vejam no orgasmo um genocídio capaz de esbanjar almas e provocar a cólera de Deus.

Mas se a ICAR vê no embrião uma pessoa, por que motivo não o baptiza?

3 de Janeiro, 2007 Carlos Esperança

B16 e os Direitos Humanos

Bento XVI assinala o início de 2007 com um forte apelo em favor da defesa da vida e da paz em todo o planeta.

***
O ditador vitalício do bairro das sotainas, B16, julga-se defensor dos direitos humanos só porque vê num embrião um daqueles impostores de que fez santos, após a morte; um daqueles meninos obrigados a dormir com as mãos fora da roupa, nos Invernos dos seminários, para produzir um padre; ou uma daquelas freiras que se encontram com residência fixa e em reclusão num convento das carmelitas.

Ao apelar à paz, esquece que foi o último titular da Sagrada Congregação da Fé, (ex-Santo Ofício) que é o chefe vitalício de uma Igreja que evangelizou os Índios pelo terror e pela varíola, que expulsou os islamistas da Península Ibérica em guerras sangrentas, que perseguiu e queimou judeus, que condenou livres-pensadores e a democracia, que esteve sempre do lado do obscurantismo, dos ditadores (desde que fossem católicos) e dos regimes autoritários.

Quem é o Papa que se diz mandatário de Cristo, sem procuração com assinatura reconhecida, prova testemunhal ou sequer a certeza da existência do representado.

Quem leva a sério o indivíduo que confirma curas miraculosas sem nunca ter mostrado provas fotográficas de um maneta a quem tenha nascido a mão ou de um cego cujo olho de vidro tenha passado a captar imagens?

A aldrabice da religião é o húmus onde floresce a intolerância e se cultiva o ódio. O Papa é um ayatollah vestido por costureiros ocidentais, com cores garridas e paramentos de fino corte. Que diferença existe entre um Conselho de Ulemás e uma Conferência Episcopal? São faces da mesma moeda, impostores do divino, embusteiros místicos, que vivem do medo que inspiram e do terror com que assustam os supersticiosos.
2 de Janeiro, 2007 lrodrigues

O Pesadelo dos Ateus

Até que enfim!
Foi encontrado um argumento absolutamente irrefutável, que nenhum ateu se atreverá sequer a desmentir ou a pôr em causa, e que de uma vez por todas desmente e faz cair por terra a teoria da evolução, e demonstra inequivocamente que tudo o que existe no Universo resulta da criação e é obra de Deus.

Foi finalmente encontrado o argumento final para a existência de Deus e que é um autêntico pesadelo para os ateus: a banana!

(Publicado simultaneamente no «Random Precision»)

2 de Janeiro, 2007 Carlos Esperança

Bento 16 reza

Papa reza para que 2007 seja um ano de paz. O Papa reza, a vaca muge, o corvo crocita, a rola geme e o papagaio palra. Cada animal tem a voz que o identifica.

Todos os anos o Papa reza debalde pela paz, este Papa, os precedentes e os que vierem. Se faltassem provas de que Deus não existe ou, no mínimo, é insensível à dor, bastariam os apelos lancinantes do Papa para provar a indiferença divina e a irrelevância papal.

Não há orações que salvem da fome as crianças que morrem de inanição, preceitos canónicos que encravem as armas, missas que demovam a humanidade da orgia de sangue que grassa nos países mais pobres e devotos.

Enquanto no Vaticano o Papa pede ao Deus dele que haja paz, através da televisão para que os fiéis o vejam, o ditador vitalício não se dá conta de que os homens, cansados de Deus, acabarão por virar-se para si próprios.

Os homens, de mãos postas, não trabalham a terra, de joelhos não constroem fábricas e a rezar não resolvem problemas, enganam-se a si próprios. Os que disparam as armas e dizem que «Deus é grande» construiriam fábricas, se o clero que fanatiza as crianças e instila o ódio estivesse interessado em melhorar o mundo e a prescindir do poder.

Se o Papa, em vez de rezar, trabalhasse, deixasse de dizer que é o representante de Deus como nos manicómios os doentes dizem ser Napoleão, não teríamos um exército de parasitas e ociosos a divertirem-se com a missa, o terço, o lausperene, a procissão, o Te Deum, o Ano Santo, a indulgência plena e a novena de acção de graças, teríamos gente para trabalhar em prol da paz e da prosperidade.

O clero está para a paz e o progresso como as religiões para a democracia e a liberdade.

1 de Janeiro, 2007 Palmira Silva

Bento XVI ensandeceu mesmo!


Tal como o Carlos, só consigo perceber as declarações de final e início de ano de Bento XVI pressupondo que ensandeceu de vez!

De facto, equiparar os cientistas a terroristas e as vítimas de terrorismo a embriões sem consciência de si nem do meio ambiente no mínimo não reflecte grande sanidade mental! E a afirmação de ser a Igreja «paladina dos direitos fundamentais de cada pessoa» corrobora o diagnóstico.

Bastaria a um Bento XVI na posse das suas faculdades mentais lembrar o Sílabo dos Erros do seu predecessor Pio IX– que reforça a enciclica Quanta Cura na condenação pela Igreja de tudo o que agora é suposta ser «paladina» – para não se atrever a debitar o monte de inanidades que constam na sua mensagem de Ano Novo!

Na realidade, é no mínimo bizarro que no mesmo texto em que condena o relativismo das inadmissíveis «concepções antropológicas do homem», Bento XVI declare ser a Igreja «paladina» de tudo o que num passado recente tão veementemente condenou!

Nomeadamente «as perversas opiniões e doutrinas» que «com Nossa autoridade apostólica as reprovamos, proscrevemos e condenamos; e queremos e mandamos que todas elas sejam tidas pelos filhos da Igreja como reprovadas, proscritas e condenadas» como sejam a democracia, a liberdade de expressão, que corrompe as almas, a liberdade de consciência e de imprensa mas especialmente a liberdade religiosa!

Não se percebe como em apenas algumas décadas a Igreja, segundo Bento XVI detentora da «verdade absoluta» e impoluta de abominados «relativismos», passou de repudiar e declarar loucura a pretensão de que «a liberdade de consciências e de cultos é um direito próprio de cada homem» para reinvidicar, «de modo particular», «o respeito da liberdade religiosa de cada um»!

Mais bizarro ainda se lembramos a ululação de ser «contra a doutrina da Sagrada Escritura, da Igreja e dos Santos Padres» « afirmar que ‘a melhor forma de governo é aquela em que não se reconheça ao poder civil a obrigação de castigar, mediante determinadas penas, os violadores da religião católica’»

Já a existência de uma «tão grande conspiração de inimigos contra o catolicismo e esta Sé Apostólica» que carpia Pio XII na boa tradição de vitimização católica, foi reiterada na alocução de hoje em que Bento XVI saudou os «mártires» actuais, isto é, os fundamentalistas «católicos que mantêm a sua fidelidade à sede de Pedro» «à custa de graves sofrimentos» (infligidos pela imaginada guerra ao Natal?).

Fundamentalistas católicos que têm agora mais um item proibido a acrescentar à longa lista dos prazeres profanos de que se devem abster: as festas de réveillon, esses «ritos mundanos» que Bento XVI criticou no Te Deum de domingo.

Achei divertidissimo que o líder de uma Igreja que vende exorcismos, milagres e uma vida no Além como evasão deste «vale de lágrimas», critique os «ritos mundanos, marcados principalmente pela diversão e vividos frequentemente para evadir a realidade» e que só servem para «exorcizar os aspectos negativos» da vida e para «proporcionar sorte improvável».