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Carlos Esperança

24 de Abril, 2005 Carlos Esperança

Viva o 25 de Abril

O Diário Ateísta saúda todos os que se bateram pela liberdade e tornaram possível a democracia.

O Diário Ateísta presta uma sentida homenagem a todos os que arriscaram a vida para que a censura, as prisões políticas, o degredo e a tortura tenham sido abolidos.

Sem o 25 de Abril não seriam respeitados os direitos, liberdades e garantias que a Constituição da República Portuguesa assegura, nem o fim da discriminação a que a mulher foi sujeita com a cumplicidade da Igreja católica.

Sem o 25 de Abril não seria tão marcada a «crise de vocações sacerdotais» nem tão amplo o espaço de liberdade que a sociedade conquistou ao poder despótico da religião e da ditadura.

Por tudo o que Portugal sofreu e pelo muito que a Revolução de Abril fez pela paz, progresso e liberdade, prestamos aos capitães de Abril a nossa grata e comovida homenagem.

Viva o 25 de Abril. SEMPRE.

24 de Abril, 2005 Carlos Esperança

Bento XVI foi entronizado

O Papa Ratzinger foi hoje aclamado por cerca de 300 mil pessoas, depois de ter tomado conta do Vaticano e se ter adornado com os símbolos do poder absoluto para o exercício vitalício das funções: o pálio e o Anel do Pescador.

Os suspeitos habituais aplaudiram-no entusiasticamente na primeira viagem triunfal à volta da Praça de S. Pedro. Os que gostavam do antecessor já se sabia que ficariam maravilhados com o sucessor. Este é o mistério da fé que faz de um indivíduo pouco recomendável um Santo Padre.

É interessante comparar os 4 milhões de peregrinos que se deslocaram para ver o cadáver de JP2 com os 300 mil que se incomodaram a saudar em apoteose o novo Papa.

Os católicos preferem um papa morto a um vivo. A vida é a morte da virtude e a morte é o alimento da fé.

22 de Abril, 2005 Carlos Esperança

Bento XVI – papa da Contra-Reforma

Consta que o conclave, donde saiu o novo Papa, só não elegeu o Prefeito da Sagrada Congregação da Fé (ex- Santo Ofício) à primeira votação, pelo mau aspecto que poderia provocar e para não deixar mal colocado o Divino Espírito Santo a quem se reconhece dificuldade e lentidão a iluminar cardeais.

O novo monarca absoluto e vitalício, regedor do bairro de 44 hectares, sede do catolicismo político, só desagradou a alguns católicos ingénuos convencidos de que a sua religião é compatível com a liberdade e a democracia, que se compadece com a modernidade e se preocupa com a explosão demográfica ou com o flagelo da SIDA que ameaça dizimar a África e provoca tragédias em todos os continentes.

Os católicos fundamentalistas, que sempre digeriram mal essa aventura liberal que deu pelo nome de Vaticano II, exultam com o jovem Papa. Os muçulmanos estão de acordo com ele. A sua religião (a de cada um deles) é a única que conduz à salvação, convicção igualmente perfilhada por judeus ortodoxos. Todos têm instruções do seu Deus para converter os outros à verdadeira fé, através dos meios necessários.

Em vez de Bento XVI podia aparecer um papa defensor da democracia, arauto da liberdade, adversário da pena de morte, inimigo da censura, entusiasta do pluralismo. Esse perigo foi esconjurado. Este papa é contra a «ditadura do relativismo», a favor da democracia da verdade única, pois sabe e apregoa que «não há salvação fora da ICAR».

Ainda antes de ser infalível, atributo que desde Pio IX detêm os papas romanos, já tinha identificado as grandes ameaças do catolicismo: «O marxismo, o liberalismo, a libertinagem, o colectivismo, o individualismo radical, o ateísmo e o vago misticismo religioso» e alertado para a necessidade de haver limites à «liberdade de opinião».

A Alemanha, o país que ficou associado à Reforma, tornou-se agora a pátria do profeta da Contra-Reforma, Joseph Ratzinger, sob o pseudónimo de Bento XVI. Desde Adriano VI (1522/23) que a defesa da fé católica não era confiada a um pastor alemão.

A Europa está de parabéns. A secularização conteve a agressividade papal, agora há razões para cultivar a teofobia que a emancipe definitivamente do poder clerical. E há uma razão acrescida para reforçar a laicidade do Estado, para que a lepra do islão político não corroa a liberdade cujas malhas foram tecidas pela Revolução Francesa.

22 de Abril, 2005 Carlos Esperança

Pastor alemão mostra os dentes

O Papa Bento XVI, avatar de Torquemada sentado no trono pontifício, iniciou a ingerência nos assuntos internos de países soberanos e a luta contra decisões legítimas de países democráticos. É o início da luta contra a «ditadura do relativismo», uma pia boçalidade papal para designar o pluralismo democrático.

O defunto João Paulo II, num dos momentos de maior desvario e rancor, pediu aos advogados católicos para manifestarem objecção de consciência e não patrocinarem casos de divórcio. Foi o espírito reaccionário do velho déspota na sua apoteose.

Agora é o supremo inquisidor que confunde a Espanha dos reis católicos, Fernando e Isabel, com a Espanha laica e democrática que as circunstâncias da história devolveram à monarquia mas não tornaram refém do despotismo. Bento XVI acaba de incitar os espanhóis à insurreição civil, convidando ao funcionários públicos à desobediência às leis, instigando-os a negarem-se a celebrar casamentos entre homossexuais.

O casamento, anterior à religião católica, é o contrato entre duas pessoas para a administração de bens comuns e outros fins que a lei define, sem a interferência divina nem a chantagem dos seus padres. A intromissão de Bento XVI nos assuntos internos da Espanha democrática é a desforra da Igreja que considerou o ditador Franco um enviado da Providência, que silenciou milhares de assassinatos, que conviveu com os carrascos espanhóis durante décadas.

Há um apelo urgente e necessário a fazer aos funcionários públicos que processam os vencimentos dos professores de religião católica, à custa do erário público. Cancelem os pagamentos dos veículos litúrgicos que atropelam a Constituição e traem a democracia. A Espanha, onde dezenas de facínoras que apoiaram Franco foram canonizados por João Paulo II, não é um protectorado do Vaticano. É um país livre e democrático onde os dentes do pastor alemão Bento XVI não podem transmitir a raiva.

21 de Abril, 2005 Carlos Esperança

Timor – Um protectorado do Vaticano (2)

Em 26 de Março escrevi no Diário Ateísta, sob o título em epígrafe, um artigo sobre a ausência de liberdade religiosa em Timor, tema a que o João Vasco voltaria, há uma semana, com o artigo denominado «Sintomático…».

Não sei se é a influência do desvario islâmico, que grassa na região, ou a natureza da ICAR, apenas contida nos Estados laicos, que leva os dois bispos de Timor a açular as populações autóctones contra o primeiro-ministro Mari Alkatiri, a quem acusam de chefiar um «regime antidemocrático» pelo facto de pretender diminuir o peso da religião nas escolas públicas.

Ontem, a ICAR passou a ter como monarca absoluto e vitalício Bento XVI, um misto de Tomás de Torquemada e de Carol Wojtyla, que, tal como os bispos de Timor, defende que «só na Igreja Católica» está a salvação, visão totalitária que sobreviveu ao concílio Vaticano II, que a repudiou pela primeira vez.

No mesmo dia em que o inquisidor se tornou Papa, os bispos de Dili e de Baucau, largaram nas ruas da capital de Timor, sob o comando do padre Benâncio Araújo, cinco mil timorenses armados de terços e imagens da Virgem, numa manifestação contra o Governo, que acusam de antidemocrático por pretender tornar facultativa a disciplina de religião e reduzir a sua carga horária.

O padre Benâncio, porta-voz da Diocese de Dili, apelou ainda a outros membros da ICAR para organizarem manifestações para «derrubar o regime antidemocrático», eleito democraticamente.

O episcopado timorense exige o ensino obrigatório da religião na escola pública. Desde há dois meses, a Igreja católica não se limita a rezar. Combate e uiva, agora cada vez mais raivosa e em sintonia com o novo pastor alemão.

Portugal e a Europa poderão defender a liberdade religiosa em Timor?

20 de Abril, 2005 Carlos Esperança

Bento XVI – pastor alemão

O facto de os cardeais terem escolhido entre si o pastor alemão Ratzinger para o redil da ICAR, justifica uma segunda publicação no Diário Ateísta do texto escrito em 15-02-2001 para o «Diário as Beiras», de Coimbra.

O Cardeal Joseph Ratzinger, Prefeito da Sagrada Congregação da Fé (ex. Santo Ofício) num ensaio consagrado à liturgia, em 11 de Fevereiro de 2001, criticou severamente a música rock e pop e manifestou reservas em relação à ópera que acusa de ter «corroído o sagrado» de tal modo que – cita – o papa Pio X «tentou afastar a música de ópera da liturgia», donde se deduz que ela é claramente desajustada à salvação da alma.

Eu já tinha desconfiado que certa música é a «expressão de paixões elementares» e que o «ritmo perturba os espíritos», estimula os sentidos e conduz à luxúria. Salvou-me de pecar a dureza de ouvido que tinha por defeito e, afinal, era bênção.
Mas nunca uma tão relevante autoridade eclesiástica tinha sido tão clara quanto aos malefícios da música, descontada a que se destina à glorificação do Senhor, à encomendação das almas ou a cerimónias litúrgicas (outrora com o piedoso sacrifício dos sopranistas).

Espero que o gregoriano, sobretudo se destinado à missa cantada, bem como o Requiem, apesar do valor melódico, possam ressarcir-nos a alma dos danos causados pelo frenesim da valsa, a volúpia do tango ou a euforia de certos concertos profanos.
Só agora, mercê das avisadas palavras de Sua Eminência, me interrogo sobre a acção deletéria do Rigoleto ou da Traviata, dos pensamentos pecaminosos que Aida ou Otelo poderão ter desencadeado em donzelas – para só falar de Verdi – ou dos instintos acordados pela Flauta Encantada de Mozart ou pelo Fidélio de Beethoven! E não me venham com a desculpa de que há diferenças entre a ópera dramática e a cómica, ou entre esta e a bufa.

A música, geralmente personificada na figura de uma mulher coroada de loiros, com uma lira ou outro qualquer instrumento musical na mão, já nos devia alertar para o pecado oculto na arte de combinar harmoniosamente os sons.

Sua Eminência fez bem na denúncia. Espera-se agora que, à semelhança das listas que publicou com os pecados veniais e mortais e respectivas informações complementares para os distinguir, meta ombros à tarefa ciclópica de catalogar as várias músicas e os numerosos instrumentos em função do seu potencial pecaminoso.

Penso que a música sacra é sempre de louvar (desde que dispensados os eunucos), enquanto a música de câmara, a ser executada em reuniões íntimas, é de pôr no índex. Na música instrumental, embora o adjectivo seja suspeito, talvez não haja grande mal, mas quanto à música cifrada não tenho dúvidas de que transporta uma potencial subversão.

Nos instrumentos há-os virtuosos, como o sino, o xilofone, as castanholas e quase todos os de percussão, deixando-me algumas dúvidas, mais por causa do nome, o berimbau.

Nos de corda, excepção para o contrabaixo e, eventualmente, o piano (excluídas perigosas execuções a quatro mãos) quase todos têm riscos a evitar. A lira, o banjo, a cítara, o bandolim e o violino produzem sons que conduzem à exacerbação dos sentidos.

Mas perigosos mesmo – a meu ver – são os instrumentos de sopro. Abro uma excepção para os órgãos de tubos que nas catedrais se destinam a glorificar o Altíssimo. Todos os outros me parecem pecaminosos. A flauta, o clarim, o fagote, o pífaro e a ocarina estimulam directamente os lábios e, desde o contacto eventualmente afrodisíaco aos sons facilmente lascivos, tudo se conjuga para amolecer a vigilância e deixar-nos escravizar pelos sentidos. Nem o acordeão, a corneta de pistões ou a gaita de foles me merecem confiança.

19 de Abril, 2005 Carlos Esperança

Tibi gratias, Bento XVI

O prefeito da Sagrada Congregação da Fé (ex-Santo-Ofício) Joseph Ratzinger, foi «eleito» Papa pelos 115 cardeais do conclave reunido para o efeito. O Espírito Santo, «a única pomba feia e estúpida do mundo» – segundo Fernando Pessoa -, e a terceira pessoa da Santíssima Trindade, segundo a ICAR, esteve ausente da votação.

Há quem pense que um caçador furtivo abateu a dita pomba, confundindo-a com um pato bravo, quando se dirigia para a Capela Sistina. Só assim se compreende que o conclave tenha optado pelo mais reaccionário e intolerante dos cardeais, que definiu a teologia do Vaticano durante o longo pontificado de JP2.

O jovem cardeal, de 78 anos, escolheu o nome de Bento XVI. Um amigo meu acaba de me anunciar que o ex-cardeal Nazinger se tornou o actual Sebento 16 e que as igrejas protestantes estão a conceder asilo aos católicos foragidos do fundamentalismo romano.

O Diário Ateísta não pode deixar de se regozijar com o regresso acelerado ao Concílio de Trento e com a radicalização do papado de JP2 por intermédio do seu avatar Bento XVI. Quanto pior, melhor. Bento XVI é a face mais retrógrada da ICAR, um impiedoso inquisidor.

A Contra-Reforma retoma vigor. O tribunal do Santo Ofício voltará em breve. Leonardo Boff acaba de declarar que Ratzinger «nos últimos 23 anos silenciou e puniu 140 teólogos. É a direita da direita da Igreja». Se o cardeal Ratzinger, o rottweiler de Deus, perseguiu, ostracizou e excomungou quem se afastou da ortodoxia da ICAR, do que será capaz o chacal da fé eleito papa?

Tibi gratias, Bento XVI. Habemus Papam.

18 de Abril, 2005 Carlos Esperança

A gralha do «Público»

Para mim, ateu e jacobino, todos os cardeais são iguais: piedosos, tementes a Deus e, a partir de certa idade, castos. Sei que são importantes para os católicos e, nesta altura do conclave, decisivos para a escolha do Papa que melhor defenda os interesses da ICAR (Igreja Católica Apostólica Romana).

Tal como os cardeais, os papas tendem a ser iguais. A Santidade é profissão e estado civil comum a todos. A dilatação da fé é a obsessão que uns ensaiam de forma discreta e outros de forma vigorosa. O proselitismo está na matriz genética da ICAR desde o tempo do Imperador Constantino. As Cruzadas não foram um epifenómeno, foram uma manifestação de fé mal sucedida. A Inquisição não foi erro de percurso, foi o exercício do poder com excesso de fé. A contra-reforma não foi a crueldade de que se fala, foi um exercício pedagógico vigoroso destinado à reconversão dos crentes transviados.

O que eu não esperava ver era o «Público» a partilhar as minhas convicções. No seu número de hoje, apesar das desculpas que amanhã vai apresentar aos leitores, publicou o perfil do Patriarca Policarpo e o do cardeal Saraiva Martins, respectivamente nas página 4 e 5. Só os nomes, os títulos e as fotos são diferentes, tudo o resto é absolutamente igual, efeito provável da clonagem que a Santa Madre Igreja tanto abomina.

Já Luís de Stau Monteiro no seu livro «A Guerra Santa» considerava os generais todos iguais, a ponto de os soldados confundirem o general inimigo com o próprio, de tal modo que dois exércitos que aprisionaram os generais inimigos não deram conta da troca dos generais nem estes se aperceberam de ficar a comandar o exército errado.

Se o engano é possível com generais, mais fácil se torna com cardeais.

16 de Abril, 2005 Carlos Esperança

A religião e a liberdade

Os ateus não reivindicam superioridade moral. Não é a crença que faz alguém melhor nem o ateísmo que torna qualquer um pior. A influência do meio ambiente, a educação recebida, a instrução que se adquire e a matriz genética fazem os homens. Os homens são eles próprios e a sua circunstância, como disse Ortega y Gasset.

Há crentes que visitam o Diário Ateísta e que demonstram tolerância, espírito de diálogo, sentido crítico e respeito pelos valores humanos. Mas isso não faz respeitável a sua religião nem universais os seus valores e, muito menos, acrescenta provas da existência de Deus. Apenas faz deles cidadãos respeitáveis ou mesmo exemplares.

O Diário Ateísta esforça-se por preservar alguns valores que as religiões combatem – a liberdade individual, a laicidade do Estado e o tratamento igual de todos os cidadãos, independentemente do sexo, da religião ou da raça. É surpreendente que os crentes não se interroguem sobre a geografia das religiões e não reflictam sobre a distribuição dos credos pelo planeta e à custa de quanto sangue.

Outro aspecto inquietante é o facto de todas as religiões defenderem um tratamento igual quando são minoritárias e afirmarem que «não de deve tratar de forma igual o que é desigual» quando são maioritárias – argumento usado até à náusea em Portugal, pela ICAR, na negociação da Concordata.

A religião só não é mais repressiva porque não tem força suficiente. A cada conquista exige sempre mais. Não dispensa os baptismos em crianças de tenra idade, não desiste de tornar obrigatório o ensino religioso na escola oficial, interfere através das Associações que domina nos conteúdos e programas escolares e no comportamento social dos que não são crentes, condiciona o aparelho de Estado e interfere nas leis.

A possibilidade do divórcio entre casais que contraíram matrimónio católico só foi possível depois do saudoso ministro da Justiça Salgado Zenha ter ameaçado com a denúncia da Concordata. As Escolas do Magistério Primário, até ao 25 de Abril, tinham uma cadeira de Religião Católica, igual a qualquer outra, que exigia nota positiva para a obtenção do diploma de professor. Ninguém era dispensado da missa de consagração do curso, da bênção da pasta e da fotografia com o bispo da diocese. Ninguém podia ser professor do ensino primário sem professar a religião católica, embora a lei fosse omissa a esse respeito.

A admissão nas Escolas de Enfermagem exigia um certificado de baptismo católico e o atestado de bom comportamento passado pelo padre da paróquia de nascimento. Eram documentos necessários. E, no fim do curso, lá vinha a bênção, a missa da consagração e outras pias violências a que tinha de sujeitar-se quem precisava de ganhar a vida.

Para que a violência clerical se contenha é preciso uma vigilância constante. O combate às religiões e o exercício da blasfémia são necessários à preservação da liberdade de pensamento que as igrejas se esforçam por pôr permanentemente em causa.