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A ICAR e a liberdade

O diário «El Periódico» dá conta da violenta campanha desencadeada pela hierarquia católica argentina contra o presidente Kirchner, tido por demasiado liberal, por causa de uma exposição de arte que os crentes consideram blasfema. Os bispos abominam uma máquina trituradora de carne que destrói imagens religiosas, um bombardeiro americano com um Cristo crucificado colado a uma das asas e outras imagens menos piedosas.

A ICAR amaldiçoa, não por razões estéticas, a arte que não glorifica Deus e os anjos e está particularmente irada com a reabertura da exposição do artista plástico León Ferrari, autorizada por um tribunal de segunda instância após ter sido encerrada por uma juíza, na sequência do pedido de grupos ultramontanos.

O bispo de Buenos Aires, cardeal Jorge Bergoglio, convocou os católicos para manifestações de rua a fim de impedir o «sacrilégio» que o carácter «blasfemo» da exposição constitui. Esta atitude – lê-se no «El Periódico» – é uma cortina de fumo que encobre uma luta profunda entre o Governo argentino e os bispos alinhados com a extrema-direita.

León Ferrari, de 84 anos, exilado durante a última ditadura (1976/83) abençoada pela Igreja católica e em que lhe desapareceu um dos seus filhos, afirma: «Sou contra a tortura e o cristianismo é a favor, porque o pensamento ocidental e cristão sustenta a existência do inferno o que implica aprovar ou exaltar o castigo a quem é diferente».

Não é a primeira vez que este pintor sofre a censura, mas agora a populaça, acirrada pelo clero, entrou no Centro Cultural Recoleta, onde decorria a exposição, e destruiu três obras ao som de gritos selvagens, «Viva Cristo-Rei!», a que se seguiu uma «missa de desagravo» à Virgem e uma intensa campanha mediática de denúncia à justiça.

Em contrapartida a sociedade civil desceu à rua para defender a liberdade de expressão.

Temas como a contracepção, a pílula, a despenalização do aborto, a educação sexual nas escolas e a união civil dos homossexuais são vistas como ameaças que corroem os alicerces da ICAR e levam os bispos a terçar armas contra o Governo do presidente Kirchner, à semelhança dos seus homólogos espanhóis, em beata cruzada contra o presidente Zapatero.

Apostila 1 – Este artigo, não sendo a tradução literal, foi elaborado com base no do diário «El Periódico», 29-12-04.

Apostila 2 – A intolerância do clero católico fica exemplarmente demonstrada.

Apostila 3 – Na Argentina e em Espanha trava-se uma luta feroz entre o Estado e a ICAR, entre a religião e a liberdade, entre a laicidade e o clericalismo.