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Buttiglione fora da Comissão

Rocco Buttiglione, personalidade avançada por Durão Barroso e pelo primeiro ministro italiano para suceder a António Vitorino na Comissão de Justiça e Assuntos Internos, anunciou a desistência da sua candidatura a comissário europeu após ter sido apontado como uma das causas para a reformulação da equipa de comissários proposta pelo Presidente da Comissão Europeia – acontecimento sem precedentes na história da União Europeia.

O ex-candidato a comissário é um amigo muito próximo do Papa João Paulo II e foi o rastilho de uma crise sem precedentes no Parlamento Europeu após ter declarado que a homossexualidade é pecado e que o papel principal das mulheres no casamento é ter filhos. Alguém com estas posições acerca da emancipação do sexo feminino e da tolerância para com diferentes opções sexuais reúne, à partida, todas as condições necessárias para se ocupar da pasta da Justiça e dos Assuntos Internos.

Quando se ocupa um cargo de tal relevância, é preciso ter em conta um determinado número de conquistas axiológicas, nomeadamente a igualdade de direitos entre os cidadãos independentemente do sexo, religião e orientação sexual. A mulher não mais será uma parideira submissa cujo único objectivo de vida é cuidar do marido e dos filhos. A mulher terá uma posição igual no que diz respeito a direitos e obrigações matrimoniais, bem como em relação à educação dos filhos; a mulher terá as mesmas oportunidades de acesso ao emprego e à educação; a mulher terá protecção na maternidade. Os tempos de subjugação acabaram. Quanto aos homossexuais, ainda têm um caminho mais longo a percorrer.

Buttiglione considera-se uma «vítima inocente» escolhida pela humanidade, que «periodicamente decide purificar-se». «Desta vez fui eu o escolhido para essa função e não me queixo muito», disse. Ou seja, temos um mártir dos defensores dos valores cripto-conservadores católicos, perseguido por expressar livremente as suas opiniões. Ora, como escreveu a Palmira, este amigo pessoal do Papa não é uma vítima inocente. Ele é membro vitalício da Comunhão e Libertação, uma organização conservadora cujo objectivo é trazer os valores religiosos para a vida política. Para além disso, após ter sido nomeado Ministro dos Assuntos Europeus, em 2002, tentou proibir a inseminação artificial, solicitou o financiamento público para estabelecimentos de ensino católicos e o pagamento de subsídios a mulheres que decidissem não abortar.

Ter o cavalheiro em questão à frente da Justiça europeia seria um passo para que as doutrinas altamente retrógradas da ICAR fossem adoptadas em legislação europeia e, assim, para a destruição dos valores da Democracia, da Igualdade e da Liberdade que conformam a União Europeia.