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50.º aniversário da chegada do homem à Lua

Nesse dia estava em Malapísia, algures no Niassa, Norte de Moçambique, e recordo as manifestações de júbilo, na dolorosa guerra colonial, empolgados com o relato que entre ruídos nos chegava através de um rádio a pilhas. Foi uma gesta heroica da Humanidade e um salto enorme da ciência.
Em homenagem à ciência, por contraste, deixo uma crónica sobre o obscurantismo.

Vaticano – A indústria dos milagres (Crónica ímpia)

Na ânsia de fabricar milagres, JP2 e B16 convocaram centenas de defuntos, sepultados em zonas de confiança ideológica da ICAR, para curarem uma criança aqui, uma freira acolá, um médico noutro sítio, enfim, uma quantidade enorme de doentes estropiados por Deus. A boa vontade dos defuntos, em péssimo estado de conservação, aliviou alguns cristãos das moléstias enviadas pela divina providência, na sua infinita bondade.

O exercício da medicina tem sido o passatempo desses bem-aventurados, há muito desaparecidos, cristãos com pecados apagados pelo tempo e virtudes avivadas pelos Papas. No laboratório do Vaticano autenticam-se certificados de garantia para os milagres e criam-se novos beatos e santos que povoam a folha oficial do bairro de 44 hectares.

Antigamente era o próprio Cristo que se deslocava à Terra para ajudar a ganhar batalhas aos seus eleitos ou que aconselhava os cristãos sobre a forma de matarem os infiéis com mais eficácia. Depois de numerosos desaires, ou porque a idade e o reumático lhe limitaram as deslocações, Deus deixou ao Papa a tarefa de engendrar os milagres mais adequados à promoção da fé e estupefação dos crentes. Os dois últimos pontificados abandonaram o método artesanal de fazer um santo aqui outro acolá, de acordo com os interesses políticos do Vaticano e as oferendas dos países favorecidos, para ao fabrico industrial.

As curas de cancros foram, durante muito tempo, as preferidas da Cúria romana. Problemas de ossos, moléstias da pele, diabetes, paralisias e outras doenças fazem parte do cardápio da santidade. Mas, com tanta clientela para elevar aos altares, o Vaticano já chegou ao ponto de deixar para um imperador (Carlos I da Áustria) a cura de varizes a uma freira. Foi uma ofensa aos quatro filhos vivos que assistiram à beatificação. Se para um imperador o milagre se reduziu à cura de varizes, temia-se que quando JP2 fosse um sólido defunto, só dispusesse de um furúnculo para curar, numa catequista da Polónia, para chegar a santo, pois não podia repetir o número da cura do Parkinson na freira francesa. Vá lá, a Cúria foi zelosa e creditou-lhe a cura de um aneurisma cerebral a uma mulher costa-riquenha, Floribeth Mora, milagre mais difícil, digno de um profissional. E foi já com os dois milagres obrados e reconhecidos pelas autoridades competentes que o Papa Francisco o elevou a santo.

Os medicamentos estragaram os milagres de grande efeito, como a cura da lepra, por exemplo. Há milagres que o Vaticano não arrisca – hemorroidas, por causa do sítio, e a sífilis, a blenorragia, a SIDA e outras moléstias para castigar os pecadores.

Mas há enganos que há muito deixou de cometer, canonizar por engano um cão que julgava mártir, ou uma parelha de mulas que morreram de exaustão e que a ICAR pensou tratar-se de santas mulheres que sacrificaram a vida pelo divino mestre.

Os milagres são cada vez mais rascas, mas os dados biográficos dos que os obram são cada vez melhor escrutinados.

Só a ciência avança.