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Infame decreto

O decreto 7/2005, de 1 de Março, da Presidência do Conselho de Ministros representa um dos mais flagrantes atropelos à Constituição da República Portuguesa. Este documento decreta o luto nacional pela morte da senhora Lúcia.

A Lei Fundamental, no seu art. 13º, estabelece um princípio da igualdade, ou seja, «todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei» (número 1)e «ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social» (número dois). Mais à frente, no art. 41º, estipula-se o seguinte: «a liberdade de consciência, de religião e de culto é inviolável».

Ora bem, o mencionado decreto afirma que «a Irmã Lúcia foi um dos testemunhos vivos de um acontecimento decisivo na História do Portugal contemporâneo – a sequência das aparições de Fátima -, tendo consagrado toda a sua existência a um culto e a uma reflexão que não deixaram indiferentes largas camadas da população portuguesa, incluindo os não-crentes». É inegável que a existência daquela senhora marcaram os não-crentes, especialmente com mensagens tão democráticas como aquela em que diz que Salazar foi um enviado de Deus.

Mas o pior deste texto é o facto de o Governo da República Portuguesa considerar como verdadeiras as aparições de Fátima, fenómeno contestado mesmo no seio da própria Igreja Católica, com o decreto a insistir: «de facto, as aparições de Fátima, de que a Irmã Lúcia foi directa interveniente (…)».

É inadmissível que, trinta anos após o fim do fascismo, tenhamos tido um executivo que vergasse a República de uma forma tão indecente à religião. É nestas alturas que desejo ter nascido por alturas da Primeira República.