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Se…

Se a virgem Maria, farta de roncos e do abandono a que a votara o carpinteiro de Nazaré, não tivesse o hábito de dormitar à soleira da porta, descomposta, a rezar a Jeová;

Se não fosse noite de lua cheia quando uma pomba suspeita (as outras voam de dia) por ali passou e olhou e viu o que não devia;

Se a dita pomba continuasse a trajectória do voo em vez de poisar e ficar ali a humilhar o humilde carpinteiro;

Se a natureza não tivesse seguido o seu curso como soía;

Não seria necessário que um anjo de nome Gabriel, alcoviteiro de serviço ao Paraíso, fizesse tão longa viagem para avisar Maria de que era prenhez o volume que sentia.

Se quem conta um conto não acrescentasse um ponto;

Se a criança, em vez de ajudar na oficina, não tivesse enveredado pela pregação e feito carreira no ramo dos milagres;

Não teria florescido um negócio que leva dois mil anos de prosperidade e igual tempo a divulgar as peripécias de um curandeiro que fazia milagres à beira do lago Tiberíades e falsificava vinho para casamentos.