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A verdadeira Ideologia do Mal

Foi publicado hoje o novo livro do Papa, «Memória e Identidade: Conversações entre Milénios», que mereceu ondas de protesto da comunidade judaica pela comparação entre o aborto e o Holocausto. A dimensão do disparate, que iguala um dos maiores horrores da História da Humanidade e a recusa de um dogma da Igreja de Roma, é tal que o Cardeal-arcebispo de Colónia, Joachim Meisner, que fez a mesma comparação, já apresentou as suas desculpas à comunidade judaica pela comparação.

Claro que o Papa não se retractou e na conferência de Imprensa de ontem, o Cardeal Joseph Ratzinger afirmou que as críticas das comunidades judaicas são infundadas já que o Papa «não tentou colocar o Holocausto e o aborto no mesmo plano» mas apenas avisar que o mal é omnipresente «mesmo em sistemas políticos liberais». O que é um pouco difícil de acreditar já que o papa compara a legislação que permite o aborto ao Holocausto e afirma que ambos surgiram quando os governos decidiram usurpar a «lei de Deus»!

O pio Papa aproxima-se cada vez mais do Pio IX que beatificou e parece comungar não só do horror à democracia como à liberdade de opinião e expressão. Assim, depois de no livro ter advertido para os perigos da democracia fora dos auspícios do Vaticano e das «leis divinas», ataca os meios de comunicação numa Carta Apostólica de 20 páginas, apresentada na segunda feira. Meios de comunicação que considera precisarem urgentemente da «redenção de Cristo». E onde propõe que «Todos devem saber como fomentar uma vigilância constante, desenvolvendo uma saudável capacidade crítica no que diz respeito à força persuasiva dos meios de comunicação», isto é, promove a tão católica tradição da censura. Na apresentação da carta, o bispo Renato Boccardo disse que grande parte dos media enfermava de um «processo degenerativo» em que os valores cristãos eram ignorados. Ou seja, entre outras degenerações, como aceitarem a liberdade de expressão e de opinião, não se coibem de ir contra a opinião do Vaticano exibindo filmes e programas considerados «imorais» pela Igreja.

Talvez estes programas façam parte dos tais «padrões culturais negativos» difundidos pelo Ocidente, que o Papa critica no seu livro, que o preocupam especialmente pela possível «contaminação» dos países da Europa de Leste juntamente, claro, com os casamentos homossexuais, parte destacada do que considera uma «ideologia do mal» que ameaça insidiosamente a sociedade.

Pessoalmente considero a verdadeira «ideologia do mal» as prosas emanadas do Vaticano, nomeadamente estas que negam as liberdades fundamentais da cidadania, que menosprezam e banalizam o Holocausto comparando-o com o não acatar dos dogmas da Igreja, que querem no fundo voltar a escravizar a Humanidade aos ditames de uma Igreja autocrática e autoritária que se considera dona e senhora da verdade e criminosos malvados os que não aceitam essas verdades!