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30 de Janeiro, 2007 Carlos Esperança

Hospitais – Infecções religiosas

Os hospitais portugueses são a coutada predilecta do proselitismo com especial destaque para a religião católica.

A presença do capelão é paga pelo erário público a 100%, enquanto os medicamentos e os serviços médicos, cujo valor terapêutico não é inferior, têm taxa moderadora.

Nas enfermarias diz-se a missa e distribui-se a comunhão aos crentes, à hora das visitas, impedindo os amigos e familiares dos outros doentes, por respeito ou intimação, de falar com os acamados que foram visitar.

As paredes de algumas enfermarias parecem montras de quinquilharia sacra decoradas com cruzes, imagens pias e fotos da Irmã Lúcia, como se os micróbios se afastassem da iconografia santa como os administradores do Estado se afastam do cumprimento da lei.

Os Hospitais da Universidade de Coimbra previram um espaço para reflexão de crentes e não crentes, despojado de adereços pios e alfaias litúrgicas. Algum tempo depois apareceu uma enorme cruz sem que alguém tenha reclamado o milagre ou reparado o abuso.

Depois, chegou a Virgem, posteriormente a imagem do santo patrono do hospital, um hospital sem patrono é como um cão sem dono, e finalmente o lugar transformou-se na capela católica com o espaço público apropriado de forma permanente e definitiva (?) por uma confissão religiosa.

É este proselitismo provocatório, a mansa e beata penetração do incenso e da água benta pelos interstícios da nossa indiferença que vai minando a liberdade religiosa e impondo o totalitarismo católico.
Até os médicos do Opus Dei começam o dia de trabalho com uma oração naquele local. É uma forma de darem público testemunho da fé e justificarem a apropriação do espaço.

29 de Janeiro, 2007 Carlos Esperança

João César das Neves e a IVG

Sob o título «Dizer não à irresponsabilidade» João César das Neves (JCN) debita hoje a habitual homilia das segundas-feiras, no Diário de Notícias.
Perante o referendo que se aproxima, JCN chama «militantes histéricos» aos que não se revêem na sua concepção confessional, epíteto bem ao gosto dos talibãs romanos. É a atitude de quem não desiste de enviar para os tribunais quem interrompe a gravidez e procura remeter para a clandestinidade as mulheres que se encontram desesperadas.
JCN julga (ou falseia) que é a liberalização do aborto que está em causa quando é, apenas, a consequência penal que vai a votos.
JCN refere o Código Deontológico da Ordem dos Médicos, que proíbe aos médicos participar na IVG, e, perante a sua inevitável revisão, pergunta em jeito de chantagem: «Mas que devemos pensar de uma classe que muda as suas regras éticas ao sabor da votação e das modas culturais»?
Fazendo tábua rasa da legalidade democrática e omitindo o que se passa na maioria dos países europeus, JCN apenas pretende ser a voz laica do clero romano, o pecador que quer redimir os pecados com a fidelidade ao seu confessor, debitando uma homilia com a visão apocalíptica sobre a eventual vitória do Sim.
Perante as diatribes do virtuoso e pio articulista, vale a pena ler os seguintes artigos do mesmo DN, de hoje:

Editorial;

– “Tou? Dona Maria? Tenho aqui um problemazinho…” ;

29 de Janeiro, 2007 Carlos Esperança

A confissão é uma arma

O pasquim da paróquia do Vaticano, «L’Osservatore romano», classificou Sábado como «ultraje ao sentimento religioso» a reportagem publicada na revista italiana «L’Espresso» com as respostas de sacerdotes a falsas confissões sobre temas éticos e sociais da actualidade.

A confissão foi sempre uma arma da ICAR, às vezes como solução dos recalcamentos sexuais dos padres, outras como instrumento privilegiado de espionagem ao serviço do Vaticano.

O crime de devassa da intimidade dos crentes foi elevado à categoria de sacramento e a fragilidade psicológica dos supersticiosos recompensada com o perdão dos pecados que os sinais cabalísticos dos confessores e a penitência se encarregam de conceder.

A diversidade das respostas às perguntas feitas nas «confissões» dos jornalistas sobre assuntos como o preservativo, a SIDA, a homossexualidade e as células embrionárias provaram que a ICAR não tem princípios, basta-lhe a manutenção do poder.

Os padres não são ungidos para preservar a moral, ainda que obsoleta e, eventualmente, perversa. Levam com um sacramento – a Ordem – para os tornar guerreiros de Cristo e embusteiros da fé. O Vaticano é um antro onde o poder vive da informação que os seus núncios recolhem nas chancelarias e os padres nesse local de devassidão que são os confessionários.

O Deus do Papa é indiferente à fé de quem se ajoelha aos pés dos padres. Umas vezes são devotos à procura de perdão, agora foram jornalistas em busca da verdade.

29 de Janeiro, 2007 Palmira Silva

Assim Não: versão Gato Fedorento

Ricardo Araújo Pereira (RAP) no seu melhor! Claro que a homilia de ontem de Marcelo Rebelo de Sousa sobre o tema foi ainda mais surreal que qualquer sátira…

29 de Janeiro, 2007 Palmira Silva

Esquizofrenia aguda

Um Bento XVI completamente empenhado na cruzada contra a ciência debitou ontem mais um ataque ao uso da razão, que segundo o Papa causa uma esquizofrenia terrível, ou mais concretamente:

«Deve admitir-se que a tendência para se considerar verdade apenas aquilo que pode ser experienciado constitui uma limitação à razão humana e produz uma esquizofrenia terrível, causa da existência do racionalismo, materialismo e hipertecnologia».

Para além de não perceber o que seja a hipertecnologia denunciada como um mal por Bento XVI e ter dificuldade em aceitar que alguém considere maléfico o uso da razão, só posso considerar como uma manifestação aguda de dissociação cognitiva que o responsável por uma organização assente em «revelações» do «outro mundo» acuse de esquizofrenia quem nunca experienciou excesso de dopamina nas fendas sinápticas e como tal seja avesso a aceitar como verdade alucinações, delírios e percepções irreais sortidas!

Não sei se as tolices debitadas pelo Papa foram causadas pela perda de contacto dos padres italianos com o mundo segundo Bento XVI, padres que por insistirem em usar a razão se desviam completamente da demente doutrina católica no que respeita aos temas éticos e sociais que têm dominado as emanações do Vaticano nos últimos tempos.

Nomeadamente, parece que nem os padres italianos aceitam a doutrina oficial do Vaticano no que respeita a eutanásia, homossexualidade, uso profiláctico do preservativo, investigação em células estaminais e aborto. De facto, o periódico italiano L’espresso, numa peça considerada ultrajante pelo jornal oficial do Vaticano, L’Osservatore romano, reporta a constatação de um facto, que até os representantes da Igreja consideram que muitas «santas e infalíveis» emanações da Santa Sé são patetadas que se devem rejeitar, isto é, advogam «a religião faça você mesmo» tão execrada por Bento XVI.

Os epítetos com que Bento XVI mimoseia quem não aceita os ditames da ICAR têm sido uma revelação para muitos. Depois de igualar o ateísmo ao nazismo, apelidou de terroristas os cientistas que não acatam as ordens da Igreja e agora afirma ser esquizofrenia o uso da razão! Aguardo com um frémito de antecipação mais doutas e infalíveis manifestações do léxico papal!

29 de Janeiro, 2007 Palmira Silva

Huh? Não se importam de repetir?

Este pessoal do NÃO é completamente alucinado. A primeira vez que li as opinações do blog AssimNão mais uma vez pensei estar a ler o equivalente nacional do meu jornal satírico favorito, «The Onion», de tal forma os artigos confirmavam a máxima do mesmo!

Esta teoria da conspiração, que acusa o SIM de … ter perdido o referendo de 1998 de propósito para manipular a opinião pública (!?) é tão cretina que a transcrevo sem mais adjectivações!

«Foi, uma jogada de mestre, dos defensores do sim terem conseguido que o ministério público a começasse a levantar processos-crime depois do Não ter saído vencedor do referendo de 98. Com todo o circo que isso criou de escutas telefónicas, detenções em directo, julgamentos cheios, servindo o intuito claro de chocar a opinião pública que, evidentemente, ficou chocada por se criminalizar um costume que até então ninguém ousara criminalizar.»
Anreia Neves, Portal «Assim não»

Quiçá fosse boa ideia a devota autora ler a contribuição de José Miguel Júdice para o blog SIM no referendo, nomeadamente a parte em que o ex-Bastonário da Ordem dos Advogados diz «não entendo que se defenda a manutenção de um tipo legal de crime e se não aceite que quem infrinja tal comando etico-juridico seja punido. Sempre fui contra a anomia que destrói as estruturas sociais. As sociedades podem mudar as leis, mas devem sempre aplicá-las enquanto estejam em vigor. Defender que se vote ‘não’ e que se não puna quem pratica abortos é, na minha opinião, contra o Estado de Direito

Mas a estrela da cretinice é a opinação seguinte, da autoria de Inês Teotónio Pereira, que debita pérolas como:

«Há uma Vida com dez semanas – que faz caretas, tem dentes de leite, impressões digitais e um coração a bater».

Com argumentos deste calibre não há discussão racional possível com os apóstolos do NÃO!

29 de Janeiro, 2007 lrodrigues

E se o «NÃO» ganhar?

Independentemente dos critérios que levarão os portugueses a votar «SIM» ou «NÃO» no próximo referendo sobre a despenalização do aborto, e (longe vá o agoiro) se o «NÃO» ganhar?

O que mudará neste caso em Portugal?
A resposta é por demais simples, e tão óbvia que até chateia: nada vai mudar; tudo ficará na mesma como agora.
Quer então isto dizer que depois do referendo vai deixar de haver mulheres a abortar em Portugal?
Claro que não!
Como é por demais óbvio, nem uma só mulher em Portugal que pretenda abortar (e independentemente dos motivos que a tiverem levado a tomar essa decisão) e tenha decidido nesse sentido, vai deixar de o fazer em função do resultado de um referendo.
O número de abortos que se vão realizar em Portugal será precisamente o mesmo.
Então, e se o «NÃO» ganhar, a prática do aborto que não se insira na lei já actualmente em vigor (violação, malformação do feto ou perigo para a saúde da mãe) continuará a ser criminalizada e penalizada.
Mas, apesar disso continuará a haver abortos em Portugal, já que a penalização, como é sabido, nunca constituiu o menor motivo de dissuasão para as mulheres que pretendam abortar.
É por isso que as mulheres que tenham decidido abortar se dividirão em dois grupos: as que têm dinheiro e as que não têm.
As que têm dinheiro irão fazê-lo em clinicas inglesas, ou até aqui bem pertinho, em Badajoz. E o número de abortos, quanto a estas, será precisamente o mesmo.
Aliás, se eu fosse um dono sem escrúpulos de uma clínica de Badajoz o que eu faria melhor era financiar o mais possível a campanha do «NÃO». Mas isso é outra conversa.
As mulheres que não têm dinheiro e que tenham decidido abortar recorrerão a uma clínica clandestina, a um qualquer «vão de escada», ou até a uma «parteira» amiga, que tem muita experiência em meter agulhas de tricot por mulheres adentro, e até lhes faz um desconto.
Então, por sua vez, as mulheres sem dinheiro que tenham decido abortar clandestinamente dividir-se-ão em dois grupos: aquelas a quem a coisa corre bem, e aquelas a quem a coisa corre mal.
Aquelas a quem a coisa correr bem, pode ser que se safem e que não sejam descobertas pelas autoridades policiais.
Aquelas a quem a coisa correr mal, vão de urgência para o Hospital.
Então, se a coisa correr mesmo mal, morrem; se a coisa correr bem, safam-se.
Mas são estas que se safam precisamente aquelas que vão ter um processo crime às costas, porque o médico que as safou é obrigado a participar a ocorrência à Polícia.
Quer então isto dizer que se o «NÃO» ganhar no referendo as mulheres que abortem e as pessoas que as auxiliem continuarão a ser perseguidas criminalmente.
Serão julgadas e, provado o crime, serão condenadas na pena correspondente, já que o aborto é punido com pena de prisão até três anos.
Mas atenção: só as mulheres que não têm dinheiro.
Porque as que têm dinheiro não terão praticado qualquer crime, porque terão abortado num país estrangeiro onde, porque essa conduta não é punível, ela não deixará qualquer rasto.
Serão então julgadas somente as mulheres mais pobres e com menos recursos que tenham abortado num «vão de escada» e, mesmo dentre estas, provavelmente só aquelas a quem «a coisa correu mal» e que por isso tenham sido «apanhadas».
Essas serão sentadas no correspondente «banco dos réus».
Serão fotografadas por jornalistas à entrada e à saída do tribunal, serão humilhadas perante toda a gente e obrigadas a contar e a explicar, para quem quiser ouvir, os motivos mais íntimos e pessoais que as terão levado a uma decisão tão trágica como é a de abortar.
Provado o crime, serão então condenadas na pena correspondente, já que o aborto é punido com pena de prisão até três anos.
Em suma, se o «NÃO» ganhar, tudo ficará na mesma em Portugal.
Porque foi nesse sentido que as pessoas que terão votado «NÃO» no referendo terão decidido.
E terá sido nesse mesmo sentido, aliás, que terão decidido as pessoas que optem por abster-se no referendo.
Todas elas terão decidido por si próprias e, obviamente, e porque se acham nesse pleno direito, terão decidido também pelas outras pessoas.
Se o «NÃO» ganhar, presumo que essas pessoas fiquem satisfeitas.
Afinal, e pelos vistos, pensam que como está é que tudo está bem….

(Publicado simultaneamente no «Random Precision»)

28 de Janeiro, 2007 Palmira Silva

Inspectores Forenses da Vagina – II

Considerando que os cruzados pelo NÃO, pelo menos de 11 movimentos, comungam tão em uníssono que se fizeram representar pela mesma pessoa no sorteio dos tempos de antena, tenho uma certa curiosidade em saber se partilham igualmente a condenação do aborto terapêutico que encontrei aqui e, caso afirmativo, porque razão não o afirmam publicamente.

Uma condenação que, não obstante todos os protestos de que a IVG não é uma questão religiosa, transcreve literalmente a posição da Igreja Católica sobre o tema, expressa, por exemplo, na encíclica Humanae Vitae, que afirma peremptoriamente «o aborto, mesmo por razões terapêuticas, deve ser absolutamente proibido».

Posição reiterada pela sucessora do Santo Ofício da Inquisição, a Congregação para a Doutrina da Fé, que confirma que o aborto terapêutico não é admissível sequer em casos «de vida ou de morte para a mãe».

Ressalvando a interpretação «progressista» da doutrina católica debitada, que considera «moral» mutilar a mulher removendo uma trompa grávida ou um útero canceroso através do sofisma que dá pelo nome de duplo efeito, a interpretação tradicional encontrada na Enciclopédia Católica afirma categoricamente que é ilícita qualquer intervenção numa gravidez, mesmo numa gravidez ectópica em que o embrião é «um agressor injusto» mas o efeito negativo (remover o embrião) é o meio de obter o positivo (salvar a mulher).

Para quem pense que esta posição é totalmente incompatível com o século XXI relembro o primeiro post com o mesmo título que confirma existirem alguns países em que vigora a estrita proibição da IVG, mesmo em caso de perigo de vida da mulher. Sem qualquer surpresa verificamos serem todos países em que o peso político da Igreja Católica é (ou foi) muito grande. Nomeadamente, e para além do Vaticano, claro, o Chile, Malta, El Salvador, Nicarágua e até recentemente a Colômbia.

As meias tintas dos bispos nacionais, que a crer em alguma comunicação social conseguem defender simultaneamente o voto «não» e a «despenalização» da mulher, são, como disse o Ricardo, apenas uma forma de manipular consciências. Obtêm o resultado pretendido (votos NÃO), aliviando ao mesmo tempo o peso de consciência daqueles que não querem ver penalizadas as mulheres que interrompem uma gravidez. Mas um voto NÃO, não obstante as confusões lançadas por alguns sectores católicos, é simplesmente afirmar que se concorda com a punição destas mulheres! Apenas isso!

E estas confusões católicas escondem a real posição da hierarquia da Igreja, que já declarou ser imoral a lei actual e avisou que a vitória do NÃO «não significa a nossa concordância com a Lei vigente». Isto é, gostariam para Portugal de um código penal análogo ao encontrado nos redutos do catalicismo mais jurássico!

Como hoje afirmou Jorge Sampaio no encontro de eurodeputados pelo SIM:

«Não cabe ao Estado democrático aderir, professar ou defender, a propósito, uma singular ou particular concepção moral, filosófica ou religiosa. Nem, consequentemente, cabe ao Estado democrático inquirir os cidadãos sobre as concepções que cada um sustenta nesse domínio. Portanto e definitivamente por mais que alguns pretendam continuar a confundir, manipular e distorcer sobre o que está em causa neste referendo que fique claro que não é de nada disso que se trata.»

«Nesta consulta popular a única questão a decidir é sobre se, sim ou não uma mulher que interrompe voluntariamente a gravidez nas primeiras 10 semanas e num estabelecimento autorizado deve ou não ser penalizada, ser perseguida, julgada, condenada e eventualmente enviada para a prisão. SIM ou NÃO».

Por muito que os fundamentalistas católicos não o aceitem, Portugal é uma democracia, não é uma teocracia! Votando SIM no próximo referendo assumimos a maturidade democrática que tarda em arribar em terras lusas! E repudiamos a existência de inspectores forenses da vagina…

28 de Janeiro, 2007 pfontela

A Indignação

Uma das coisas mais bizarras que se passam nos dias de hoje é sem dúvida nenhuma a indignação religiosa face à modernidade. Os crentes ficam indignados com a emancipação da mulher, com a liberdade de escolha individual, com os sistemas de valores não autoritários, enfim ficam irritados com tudo o que não seja um claro sim às suas posições sociais e políticas (convém lembrar aos mais esquecidos que essas posições não são actualizadas há séculos e que se baseiam em conceitos que já eram antiquados na renascença). No meio de tanta raiva e indignação nunca lhes ocorre ver ou pensar sequer nos outros.

Como será que os ateus se sentem no meio disto tudo? Como é que os defensores da igualdade dos sexos se sentem ao terem que lutar todos os dias por algo que devia ser um direito adquirido? Como é que as minorias sexuais que foram perseguidas, humilhadas e chacinadas se sentem ao ver os mais básicos direitos negados pelas mesmas pessoas que acenderam os fogos dos autos de fé? Todas estas coisas não parecem sequer ocorrer ao crente médio. Em parte é cegueira derivada de viver numa sociedade que recompensa a afirmação de todas estas alarvidades e em parte é apenas egoísmo. Não querem saber porque não estão para ser incomodados, eles estão certos porque sim. Porque o livro diz que sim. Porque uns homenzinhos de fatiota não resolveram os complexos de juventude dizem que sim.

Cada vez que um crente atirar à cara que se sente ofendido com A ou B eu faço questão de lhe dar uma lista detalhada de tudo o que nele e na sua religião me é pessoalmente ofensivo, tudo o que é politicamente opressivo e simplesmente injusto. O resultado normalmente é o amuo. Sentimento digno de uma criança que ficou chateada ao lhe dizerem que o mundo não existe para a satisfação dos seus caprichos pessoais.

Publicado também no InBetween
28 de Janeiro, 2007 dsottomaior

BRASIL para TODOS

Apesar de o estado brasileiro ter se tornado oficialmente laico com o fim do império, desde então concedeu-se tacitamente ao cristianismo romano, e somente a ele, a manutenção do privilégio de exibir seus símbolos nos lugares mais proeminentes de câmaras legislativas, tribunais e outras dependências dos três poderes, desde hospitais do interior até o senado e a câmara federais, o Supremo Tribunal e o palácio da presidência da república.

Ao longo de mais de um século, população e autoridades permaneceram religiosamente calados a essa afronta à lei e à neutralidade do estado, com exceções que se contam nos dedos de uma mão. Todas as sociedades convivem com ilegalidades sem poderem extirpá-las completamente, mas é difícil pensar em exemplos em que a contravenção é escancaradamente aberta, universal, e não só não é combatida como é orgulhosamente sustentada nos próprios salões do poder judiciário, que deveria ser o defensor da lei. Onde se terá visto inversão de valores dessa ordem durar por tanto tempo?

Agora finalmente os ventos começam a mudar. Em 2005, o juiz Roberto Arriada Lorea tentou sem sucesso remover crucifixos dos tribunais. No ano passado, um consciencioso cidadão levou ao conhecimento do Ministério Público a existência de um crucifixo nas dependências da Universidade de São Paulo. Embora o MP tenha sido informado do que já sabia, sua atitude
foi a de seguir a lei e pedir a retirada do símbolo, no que foi atendido. Uma vez estabelecido esse precedente, ficou claro que se podia estabelecer uma campanha de ampla retirada de símbolos religiosos em repartições públicas através do envio maciço de representações ao MP.

De fato, essa campanha foi lançada com o nome BRASIL para TODOS. O site www.brasilparatodos.org disponibiliza todos os endereços do MP no país, assim como um modelo de representação que os visitantes podem utilizar. Os próprios organizadores da iniciativa já se mobilizaram com relação a uma lista inicial de 13 símbolos religiosos, e no momento aguardam a resposta do judiciário. Esta é a primeira iniciativa do tipo no Brasil.

A campanha também é inédita também pelo fato de contar com o apoio de uma série de líderes religiosos, incluindo um importante bispo católico (aposentado), que se unem com descrentes, juristas, políticos e acadêmicos para levar o projeto adiante. Apesar de suas diferenças, todas essas pessoas se uniram no entendimento de que a lei e a cidadania em uma sociedade plural estão acima de preconceitos paroquiais e interesses de proselitismo sectarista. É uma lição de civilidade e modernidade e cabe a todos nós não só torcer por seu sicesso, como ajudá-lo ativamente. As instruções estão no próprio site. Para os interessados no assunto, está prevista a exibição de matéria a respeito no Jornal Hoje, da rede Globo, segunda-feira a partir das 13:15.