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Ricardo Alves

28 de Outubro, 2004 Ricardo Alves

A abolição dos juramentos religiosos

Decreto de 18 de Outubro de 1910


«O Governo Provisório da República Portuguesa faz saber que, em nome da República, se decretou, para valer como lei, o seguinte:
Artigo 1º É abolido o juramento com carácter religioso, qualquer que seja a sua fórmula.
Artigo 2º As pessoas que houverem de exercer acidental, temporária ou permanentemente quaisquer funções de carácter ou interesse público, para as quais se tem exigido até agora a prestação de juramento, somente são obrigadas e autorizadas a afirmar, empenhando a sua honra, que cumprirão com fidelidade as funções que lhes são conferidas.
Artigo 3º A fórmula desta afirmação será: Declaro pela minha honra que desempenharei fielmente as funções que me são confiadas.
Artigo 4º As testemunhas farão, antes do depoimento, a mesma declaração ao respectivo juiz, que poderá explicar-lhes, se o entender necessário, que ela as obriga a dizer a verdade e as sujeita, em caso de falta, às penas de testemunho falso.
(…)
Artigo 7º É dispensada toda e qualquer declaração aos estudantes que se matriculem em estabelecimentos de instrução.
Artigo 8º Em todos os casos não referidos neste diploma, em que as leis anteriores davam qualquer eficácia às afirmações sob juramento, este será substituído pela declaração sob palavra de honra.

(…)
Diário do Governo, nº12, 19/10/1910»
Quando um Estado laico faz um cidadão jurar, não pode obrigá-lo a afirmar uma fé, e avançando na laicização do Estado este decreto da República substituía os juramentos religiosos da monarquia por um compromisso de honra que não viola a consciência de ninguém (nem ateus, nem crentes). Anteriormente, era comum coagir cidadãos a fazer juramentos religiosos (a título de exemplo: para entrar na Universidade de Coimbra, era obrigatório jurar o dogma da «Imaculada Concepção de Maria»!). Abolir a coação religiosa e permitir que cada cidadão gozasse da sua liberdade de consciência foi considerado pela ICAR da época (e ainda o é hoje) uma «perseguição terrível feita ao catolicismo»…
27 de Outubro, 2004 Ricardo Alves

Os católicos são uma minoria

Os clericais argumentam com frequência que os católicos serão uma maioria sociológica esmagadora em Portugal, e que portanto teremos que aceitar a Concordata e o seu tratamento privilegiado para as instituições e práticas católicas, a postura reverente e acrítica dos media perante a superstição, e até as limitações aos direitos individuais defendidas pela doutrina católica e propugnadas por ilustres políticos conservadores e pelos Césares das Neves e Mários Pintos da nossa imprensa. Acontece que este raciocínio é politicamente inaceitável e que se baseia numa premissa sociológica errada.

É uma questão de princípio que os direitos individuais, a promoção da ciência e do espírito crítico e a igualdade dos cidadãos estejam acima das maiorias conjunturais. Fazem parte dos princípios básicos que devem enformar uma República laica. Mesmo que a convicção católica fosse maioritária, tal não deveria implicar direitos diferentes para a ICAR ou a preponderância da sua doutrina.

Além disso, a importância do catolicismo no comportamento da população portuguesa anda muito exagerada. Efectivamente, 84% dos residentes em Portugal declararam-se católicos nos Censos de 2001. No entanto, dois dias antes do momento desse censo (científico e rigoroso) do INE, a ICAR procedeu a uma contagem de cabeças nas missas. Apesar de bem preparada (através de uma campanha que incluiu cartazes) e apesar de não haver grandes dúvidas de que, do padre de paróquia ao Policarpo, todos têm interesse em inflacionar os números, a ICAR não reclamou mais do que 1933677 católicos praticantes (18.7% da população total) e 1065036 comungantes (10.3% da população total). Conclui-se portanto que, no máximo, um português em cada cinco será católico praticante, e um em cada dez será comungante. Eu sempre ouvi dizer que não há católicos não praticantes. E que sem o ritual teofágico (quase) não há prova de crença…

Convém acrescentar que uma em cada quatro crianças nasce hoje fora do casamento, que dois casamentos em cada cinco são efectuados apenas pelo registo civil e que há um divórcio por cada dois casamentos. Segundo a doutrina da ICAR, só se pode ter relações sexuais dentro do «matrimónio» (já sem falar em ter filhos!) e o casamento é um compromisso perante «Deus» e para toda a vida. Conforme se vê, cada vez menos portugueses seguem estes preceitos da ICAR.
23 de Outubro, 2004 Ricardo Alves

Foi há 94 anos…

Decreto de 22 de Outubro de 1910


Para satisfazer ao espírito liberal e às aspirações dos sentimentos republicanos da Nação Portuguesa:
Tendo em vista que o Estado não pode obrigar as famílias, e, portanto, as crianças a determinada crença religiosa;
Considerando que o ensino dos dogmas é incompatível com o pensamento pedagógico que deve regular a instrução educativa das escolas primárias;
O Governo Provisório da República Portuguesa, em nome da República, decreta o seguinte:
Artigo 1º Fica extinto nas escolas primárias e normais o ensino da doutrina cristã.
Artigo 2º O ensino da moral nas escolas primárias e normais primárias será feito sem auxílio de livro, intuitivamente, pelo exemplo da compostura, bondade, tenacidade e método de trabalho do professor, e pela explicação de factos de valor cívico e moral, que imprimam no carácter dos alunos o sentimento da solidariedade social.
Artigo 3º A educação cívica nas escolas primárias e normais primárias, enquanto não forem aprovados novos livros segundo o espírito democrático da República, será feita também por prelecções do professor, que se deverá inspirar sempre nos sentimentos da Pátria, amor do lar, do trabalho e da liberdade.
Pela Direcção Geral da Instrução Primária serão oportunamente publicadas instruções complementares do presente decreto.
Determina-se, portanto, que todas as autoridades a quem o conhecimento e a execução do presente decreto pertencer, o cumpram e façam cumprir e guardar tão inteiramente como nele se contém.
O Ministro do Interior o faça imprimir, publicar e correr. Dado nos Paços do Governo da República, aos 22 de Outubro de 1910. O Ministro do Interior, António José de Almeida




(Sim, foi há 94 anos. E hoje seria desejável que se publicasse novamente o mesmo decreto, sem alterar uma vírgula…)

18 de Outubro, 2004 Ricardo Alves

Peña-Ruiz, filósofo da laicidade

Como poderemos viver juntos, ateus e crentes?

A questão é de enorme actualidade em sociedades como a nossa, cada vez mais diversificadas nas opções espirituais dos seus cidadãos devido aos efeitos cruzados da secularização, da imigração e das ideias da «nova era»… A resposta que uma democracia deve dar, visando a convivência harmoniosa de todos, é a laicidade do Estado.

Henri Peña-Ruiz é o filósofo nosso contemporâneo que mais rigorosamente tem aprofundado e divulgado o conceito de laicidade, explicitando o seu valor positivo como solução para os problemas do nosso tempo. Nos seus numerosos livros (infelizmente, nenhum deles publicado em português) Peña-Ruiz tira todas as consequências da laicidade como o regime constitucional baseado na distinção clara entre a esfera pública (onde as crenças pessoais dos indivíduos devem ser postas de lado) e a esfera privada (onde se exerce a liberdade de consciência). Desfaz o mito de que a laicidade seria um ideal anti-religioso, e denuncia sem contemplações os integrismos religiosos e as derivas do comunitarismo multiculturalista. Reserva um papel muito especial à escola pública na formação dos futuros cidadãos.



No horizonte, Peña-Ruiz aponta-nos o ideal de cidadãos emancipados, iguais entre si, que possam efectuar as suas escolhas livres da tutela de grupos clericais.

Textos de Henri Peña-Ruiz disponíveis na internete:

Laïcité contre Pensée Unique (francês)

Laicismo y justicia social, palancas de la emancipación (castelhano)

Entrevista sobre o véu islâmico (francês)

17 de Outubro, 2004 Ricardo Alves

Explicando Fátima

Existem várias explicações plausíveis para o facto de Lúcia afirmar ter tido várias conversas com uma galilaica (mitológica), que apesar de ter (alegadamente) vivido e morrido há dois mil anos, teria aparecido em Fátima empoleirada numa azinheira para protestar contra alguns actos legislativos dos governos de Afonso Costa.

(1) Lúcia mente. Jacinta mentiu menos, já que só via e ouvia, não falava. Francisco mentiu ainda menos, pois não ouvia, só via. Como estes dois morreram de forma convenientemente precoce e Lúcia está reclusa, é impossível entrevistá-los.

(2) As três crianças tiveram alucinações, por passarem por privações deliberadamente (fome, sede, sono…) conforme está documentado (aliás, a ICAR não apenas admite que eles passaram privações como os gaba por isso, defendendo que passar fome e faltar às aulas para rezar é um comportamento modelar). É sabido que muitos presos políticos sujeitos à tortura do sono alucinaram. A fome e a sede conduzem igualmente a estados de consciência alterada.

(3) As crianças ingeriram substâncias alucinogéneas. É outra possibilidade. Seria interessante estudar que género de cogumelos existem na zona da Cova da Iria.

(4) Lúcia sofre de uma doença mental que lhe provoca alucinações, por exemplo a esquizofrenia. Esta hipótese é reforçada por Lúcia afirmar que teve outras «visões» mais de dez anos depois.

(5) As crianças foram vítimas de uma maquinação. É indubitável que as crianças caíram sob a tutela do clero local pelo menos a partir da primeira alucinação. O «milagre do Sol», com várias pseudo-testemunhas industriadas para dizerem que haviam visto «qualquer coisa» (variável segundo as mesmas «testemunhas») denota um grande esforço de organização. Convém recordar que António Sérgio (o intelectual e ensaísta) esteve presente no local em 13/10/1917 e só viu nuvens.

Pessoalmente, estou persuadido de que a explicação começa em (2), tem o seu ponto fulcral em (5) e continua em (1), mas não descarto nem (4) nem (3).

4 de Outubro, 2004 Ricardo Alves

Comemorar a implantação da República, amanhã

Amanhã, celebrar-se-á o nonagésimo quarto aniversário da Revolução de 5 de Outubro de 1910.

Não faltam alguns, mesmo muito à esquerda, achando que nada haverá a comemorar de uma data que resumem ao fim da monarquia, e que responsabilizam (erradamente) pela ditadura de 1926 e até por uma lendária «perseguição à Igreja Católica». Enganam-se.

1) A República não «perseguiu» a ICAR, a menos que se considere perseguição o ter retirado aos padres o estatuto de funcionários públicos (embora concedendo-lhes pensões generosas), o retirar o ensino da religião do ensino público (que hoje deveria voltar a decretar-se…), instituir o registo civil obrigatório e o divórcio (que destruíram tanto a «família» como o casamento de homossexuais o fará), a abolição dos juramentos religiosos ou a liberdade de consciência e de culto para todos e não apenas para os católicos.

Algumas medidas dos primeiros governos republicanos (como a expulsão dos Jesuítas) poderão parecer, hoje, excessivas (e sê-lo-iam hoje). No entanto, à época a ICAR era bem diferente do que é actualmente. Era ainda a ICAR ultramontana que recusava quer a República, quer a Democracia, quer a Laicidade. E que esteve na oposição activa à República. A ICAR só viria a mudar (e relativamente…) com o Concílio Vaticano 2º.

2) A obra da 1ª República, muito dificultada por uma oposição violenta de monárquicos e católicos que nunca deixaram o regime estabilizar-se, foi também muito mais de enaltecer do que aquilo que os manuais do Estado Novo diziam (e que hoje é repetido acriticamente por muitos!): a fundação de universidades (como o IST); a reorganização da actividade colonial; o direito à greve; o equilíbrio das contas (Afonso Costa conseguiu quase sempre orçamentos superavitários até à guerra). Pergunta o leitor mais desconfiado: então a República caiu porquê? Em boa verdade, a partir de 1918 quase todos os regimes democráticos da Europa foram ameaçados ou caíram, geralmente às mãos daqueles a que hoje chamamos fascistas, e que na ibéria se apoiaram muito claramente na ICAR.

Poucos dias depois de um Parlamento democrático ter aprovado uma Concordata com a ICAR, e porque, portanto, faz todo o sentido continuar o combate dos republicanos de 1910, nós, os que não partilhamos a visão salazarista/católica da Revolução de 1910, pensamos que faz todo o sentido comemorarmos a República.

A Associação República e Laicidade estará presente, às 10 horas e trinta minutos, junto à estátua de António José de Almeida, e posteriormente na deslocação aos túmulos dos caídos na implantação da República e num almoço no Centro Republicano Almirante Reis, às 13 horas e trinta minutos.

28 de Setembro, 2004 Ricardo Alves

A Concordata

A nova Concordata, que substituirá a Concordata salazarista de 1940, será submetida à aprovação da Assembleia da República no dia 30 de Setembro de 2004. A Associação República e Laicidade reafirma a sua oposição de princípio a esta ou qualquer outra Concordata, rejeição essa que se apoia nos fundamentos seguintes:

1) Se é verdade que pelos acordos de Latrão (celebrados com Mussolini, em 11 de Fevereiro de 1929) o Vaticano se passou a assumir como uma entidade independente do Estado italiano, e que, em termos internacionais, a Santa Sé se apresenta como uma entidade equiparada a um «Estado Soberano», na verdade essa entidade (o governo central, teocrático, da comunidade católica) não reúne de todo as condições -designadamente, de território e de população- para poder ser considerada equiparável a um «Estado» com o qual a República Portuguesa deva estabelecer «tratados internacionais».

2) Sendo a Constituição portuguesa suficiente para garantir o exercício pleno da liberdade de credo e de culto dos cidadãos, uma Concordata -a nova, tal como a velha- só faz sentido para, ao arrepio do princípio republicano e constitucional da igualdade dos cidadãos, estabelecer no espaço jurídico nacional um estatuto específico que confira um tratamento diferenciado favorável à comunidade católica. Efectivamente, uma Concordata, ao tomar a forma de um «tratado internacional», e só podendo portanto ser alterada com o consentimento mútuo de ambas as partes, retira ao controlo democrático os privilégios de tal comunidade -ao contrário do que acontece com as demais igrejas e comunidades religiosas, sujeitas a uma lei geral -a Lei da Liberdade Religiosa– revogável pelas instâncias democráticas.

A nova Concordata -negociada secretamente, recordemo-lo- repete, em alguns aspectos, a Lei da Liberdade Religiosa -uma Lei indesejável pois discrimina os cidadãos em função das suas crenças e hierarquiza as confissões religiosas-, mas contém alguns aspectos que destacam a Igreja Católica das confissões regidas pela Lei da Liberdade Religiosa, e que também por isso nos merecem particular preocupação:

1) O artigo 1º arrisca comprometer a República Portuguesa com a Igreja Católica na «promoção da dignidade da pessoa humana, da justiça e da paz», conceitos nos quais são conhecidas as divergências entre as concepções laicas e as de origem dogmática, enquanto o artigo 4º estende essa «cooperação» a organizações internacionais em que Portugal e a Santa Sé sejam partes, o que faz temer pressões para o alinhamento da nossa diplomacia por posições dogmáticas em questões como o planeamento familiar ou a bioética;

2) O artigo 7º garante a protecção estatal contra «o uso ilegítimo de práticas ou meios católicos», o que poderá implicar a intervenção do Estado nos conflitos internos da Igreja Católica ou, mais grave ainda, reinstaurar o «delito de blasfémia»;

3) O artigo 15º recomenda «aos cônjugues que contraírem o matrimónio canónico» que não se divorciem civilmente, enquanto o artigo 16º reconhece efeitos civis à nulidade canónica do casamento;

4) O artigo 19º garante o ensino da religião católica na escola pública, a expensas do Estado e sem a exigência de um número mínimo de alunos, quando a escola pública deveria limitar-se a transmitir conhecimentos e abster-se de difundir crenças;

5) O artigo 21º reconhece a «especificidade institucional» de uma universidade privada, a Universidade Católica, o que não acontecia na anterior Concordata;

6) O artigo 25º concede à Igreja Católica um direito de ingerência no planeamento territorial e urbano, em todo o território nacional;

7) O artigo 26º confere às instituições católicas um regime de isenções fiscais diferente daquele instituído para as comunidades religiosas regidas pela Lei da Liberdade Religiosa.

A Associação República e Laicidade reafirma que a Concordata é desnecessária (assim como a Lei da Liberdade Religiosa), que deve ser interpretada como não prevalecendo contra a Constituição, e que constitui um obstáculo à efectivação da desejável plena igualdade de todos os cidadãos e da necessária laicidade do Estado.

(Este texto constitui a posição da Associação República e Laicidade sobre a nova Concordata, e já foi enviado aos grupos parlamentares.)

21 de Setembro, 2004 Ricardo Alves

A laicidade também protege os católicos

Joseph Raymond Hanas, um cidadão dos EUA, foi condenado em Janeiro de 2003 num tribunal do Michigan por um crime não violento relacionado com o uso de drogas. O tribunal deu-lhe a escolher entre cumprir uma pena de prisão ou entrar num programa de reabilitação de toxicodependentes. Hanas escolheu a reabilitação.

Nos EUA, desde 1996 que foi decidido confiar alguns destes programas a comunidades religiosas. Após a subida ao poder de George W. Bush, o número destas faith-based initiatives subiu, enquanto o seu financiamento (federal e estadual) aumentou significativamente.

Joseph Hanas foi portanto, e à semelhança do que acontece com muitos sem-abrigo ou alcóolicos em recuperação, enviado pelo Estado para um centro de tratamento de toxicodependentes pertencente … a uma igreja, neste caso pentecostal. O seu «tratamento», conforme descobriu rapidamente, consistia em estudar a Bíblia e assistir aos serviços religiosos pentecostais. Mais, disseram-lhe que só estaria curado quando se tornasse um «cristão renascido» (born again christian)! Ora, Joseph Hanas pensava já partilhar a fé cristã: era católico. Infelizmente, as pessoas pagas pelo Estado para o «curar» não apenas lhe tiraram o seu rosário e a Bíblia católica como o impediram de ver o seu padre. Mais, explicaram-lhe que o catolicismo é uma forma de «bruxaria»…

Quando Joseph H. pediu transferência para outro programa, o juiz entendeu que havia falhado na reabilitação e enviou-o para a prisão. Joseph H. está a recorrer da decisão.

A laicidade é desrespeitada sempre que o Estado financia igrejas. O financiamento de caridades religiosas, em igualdade de circunstâncias com instituições de solidariedade social laicas, não constituiria uma afronta ao princípio de laicidade se não resultasse quase sempre (de forma exacerbada no caso aqui descrito) em proselitismo com dinheiro público. Uma das consequências da laicidade é justamente o Estado, incluindo os seus meios financeiros, não poder ser usado para propagandear uma religião, seja ela maioritária ou não, junto dos cidadãos. Neste caso, a vítima de proselitismo foi um católico. Católicos, defendei a laicidade!

(Informações recebidas do Council for Secular Humanism.)

20 de Setembro, 2004 Ricardo Alves

Carta ao «Primeiro de Janeiro»

Publicou o «Primeiro de Janeiro», na sua edição de 19/9/2004, um artigo de opinião do cidadão António Marcelino que impõe alguns esclarecimentos e reparos.

Cumpre-me esclarecer que a Associação República e Laicidade (ARL) existe legalmente há mais de um ano e que, praticando a laicidade internamente, não exige dos seus associados opção filosófico-religiosa alguma, seja ela o ateísmo, o catolicismo ou outra qualquer. Não é portanto uma associação de ateus, embora uma delegação da ARL, preocupada com a discriminação grave a que os ateus continuam sujeitos, tenha participado no encontro de ateus realizado em Lisboa no dia 4/9, onde foi discutida a criação de uma associação ateísta.

No Censo português de 2001 declararam-se sem religião 342 987 pessoas. Estes cidadãos gozam dos mesmos direitos de liberdade de associação e de expressão que permitem às igrejas e comunidades religiosas a sua liberdade religiosa -só inteiramente legítima se sujeita a leis comuns a todos. A laicidade, para além de implicar a separação do Estado das igrejas e comunidades religiosas, realiza-se inteiramente na clara separação jurídica da esfera privada -onde se exerce a liberdade individual de adesão a uma convicção e a liberdade colectiva de associação- e da esfera pública -onde o Estado se deve assumir totalmente incompetente em matéria de religião e de convicção e impedir a apropriação do espaço público por qualquer grupo confessional ou filosófico. Justamente por defender que ninguém vale menos por ter ou não ter fé, a ARL defende a liberdade de criação e actuação de grupos de convicção e opõe-se à Concordata (e à Lei da Liberdade Religiosa), pois esta diferencia os direitos dos cidadãos católicos penalizando inevitavelmente os não católicos, nomeadamente ao garantir o ensino da religião católica nas escolas públicas, ao isentar os sacerdotes da obrigação de ser jurado e de depôr em tribunal, ou ao estipular um regime distinto para instituições como a Universidade Católica. A Concordata é tanto mais grave quanto, ao ser aprovada como um tratado internacional, retira ao controlo democrático as regras que se aplicam à Igreja Católica. Desejável seria portanto que a Assembleia da República se abstivesse de aprovar a nova Concordata (previsto para o dia 30/9) e revogasse a velha (assim como a Lei da Liberdade Religiosa), reforçando assim, sem discriminações nem privilégios, a plena igualdade de todos os cidadãos.

Ricardo Gaio Alves (Secretário da Direcção)

(Carta enviada ao «Primeiro de Janeiro» com pedido de publicação)

16 de Setembro, 2004 Ricardo Alves

Darwinismo em perigo na Sérvia-Montenegro

O ensino da teoria da evolução esteve em perigo na Sérvia-Montenegro. A Ministra da Educação, de seu nome Ljiljana Colic, tentou que a teoria da evolução não fosse ensinada no ano escolar que agora se inicia. Simultaneamente, recomendou que futuramente o darwinismo fosse ensinado a par do criacionismo. Segundo o biólogo Nikola Tucic, a decisão terá resultado de pressões da Igreja Ortodoxa Sérvia.

Felizmente, após uma reunião entre a ministra e o Primeiro Ministro Vojislav Kostunica, e num momento em que a imprensa balcânica cobria de ridículo a Ministra da Educação, o vice-ministro da Educação surgiu perante os jornalistas e anunciou que «Charles Darwin ainda está vivo», estando a Ministra «ausente em viagem de negócios».

A escola pública deve servir para transmitir conhecimentos e não para difundir crenças. Deve desenvolver o espírito crítico e o raciocínio lógico; não deve propagandear dogmas nem submeter os jovens a uma religião.

Notícia na BBC (português); Notícia na Laic.info (francês); Notícia na National Secular Society (inglês).