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Carlos Esperança

9 de Novembro, 2005 Carlos Esperança

Um encontro de crentes

Esta foto é dedicada aos novos leitores do Diário Ateísta que desconhecem a cumplicidade da ICAR com Hitler.

8 de Novembro, 2005 Carlos Esperança

E Deus criou o Mundo…

Quando Deus era um anacoreta sombrio, farto de Paraíso e da solidão, matutou em seu pensamento apanhar o barro que, em dias de chuva, se colava às botas e lhe borrava a oficina.

Recolheu a argila, amassou-a e começou a dar-lhe forma. Percorreu-a com as mãos e moldou o boneco que a água do lago lhe reflectia, nas raras vezes que ia tomar banho.

De vez em quando regressava ao lago para recordar a face. O corpo ia-o esculpindo a olhar para o seu, embevecido como todos os narcisos. Quando acabou, tal como fazia com outras peças, pressionou o indicador sobre a estátua e fez o umbigo.

Extasiado na contemplação, continuou a aperfeiçoar o corpo, deteve-se num empenho devoto no baixo ventre e, de tanto insistir, a estátua ganhou vida.

Estava feito o homem à imagem e semelhança do oleiro.

Como ocorre com artistas em início de carreira, Deus não sabia que tinha feito a obra da sua vida embora o pressentisse pela afinidade que lhe encontrava.

Foi então que resolveu retirar algum barro e, com o que lhe sobrara, fazer outro corpo, ainda mais belo, onde reflectiu a geografia do Paraíso com vales acolhedores e montes suaves. Tinha criado a mulher e, sem o saber, dado início ao Mundo.

Então o velho cenobita, arrependido, desatou aos berros, praguejou, ameaçou e proibiu. Como tinha a paranóia das metáforas disse-lhes que não se aproximassem da árvore do conhecimento, isto é, um do outro, uma ordem que a natureza rebelde das criaturas não poderia acatar.

E, assim, de mau humor, enquanto expulsava Adão e Eva para a Terra, ficou a ruminar castigos, a congeminar torturas e medos para aterrorizar a humanidade. Demorou quatro mil anos – Deus é lento a reflectir -, e mandou-lhes a religião.

Moisés, Jesus e Maomé são os jagunços de Deus que assustam a humanidade e o ganha-pão de parasitas que dividem o tempo a dar Graças, a ameaçar os pecadores e a vender bilhetes para o Paraíso.

7 de Novembro, 2005 Carlos Esperança

Naquele tempo…

Naquele tempo, Deus não era ainda o mito. Era apenas um mitómano a gabar-se de ter feito o Mundo em seis dias, há quatro mil anos, nem mais, nem menos, e ter descansado ao sétimo.

Era um celibatário inveterado que inadvertidamente criara Adão e Eva no Paraíso, onde vivia e tinha a oficina. Fez o homem à sua imagem e semelhança e a mulher a partir de uma costela do primeiro.

Preveniu-os de que não se aproximassem da árvore do conhecimento, advertência que a Eva logo desprezou, tentada por um demónio que por ali andava. O senhor Deus logo os expulsou do Paraíso, recriminando a malvada e com pena do imbecil que se deixou tentar.

Entretanto, na Terra, local de exílio, o primeiro e único casal logo descobriu um novo e divertido método de reprodução que amofinou o Senhor e multiplicou a espécie.

Deus era bastante sedentário mas as queixas que lhe chegaram pelos anjos, um exército de vassalos hierarquizados, levaram-no a deslocar-se ao Monte Sinai onde ditou a Moisés as suas vontades. Ensandecido pelo isolamento e pela castidade veio exigir obediência e submissão aos homens e fazer ameaças.

Após algum tempo, vieram profetas – vagabundos que prediziam o futuro -, lançando o boato de que o velho, tolhido pelo reumático, enviaria o filho para salvar o Mundo. Foi tal a ansiedade entre as tribos que alguns viram no filho da mulher de um carpinteiro de Nazaré o Messias anunciado.

Com a falta de emprego, algum pó e líquidos capitosos à mistura, inventaram a história do nascimento do pregador com jeito para milagres e parábolas.

Puseram a correr que Maria fora avisada pelo anjo Gabriel, um alcoviteiro de Deus, de que, sem ter fornicado, estava prenhe de uma pomba chamada Espírito Santo.

Nascido o puto, que nunca mijou, usou fraldas, fez birras ou fornicou, cedo se dedicou aos milagres e à pregação falando no pai e na obrigação de todos irem e ensinarem as sandices que debitava. Acabou mal e deitaram as culpas aos judeus, desde então os suspeitos do costume. Claro que JC também era judeu mas isso não quer dizer nada.

Sabe-se que foi circuncidado, que era um monoglota exímio em aramaico, língua em que discutiu com Pôncio Pilatos, que só sabia latim, sem necessidade de intermediário.

Quando se lixou, crucificado, esteve três dias provisoriamente morto e, depois, subiu ao Céu levando o prepúcio que tantas discussões teológicas havia de gerar. Os judeus ainda hoje são odiados porque o mataram mas há quem diga que isso foi uma calúnia dos que se estabeleceram com a nova religião e queriam substituir a antiga.

6 de Novembro, 2005 Carlos Esperança

Europa, escuta…o Vaticano está em luta…

Bento XVI lança Igreja na luta contra a secularização da Europa

Nas alfurjas do Vaticano ouvem-se latidos contra o laicismo. O pastor alemão mostra os dentes, afia as garras e vocifera em latim. Saem-lhe santas imprecações em forma de oração, por hábito e contenção beata.

Quando o paramentam para os rituais, enquanto sente as mãos macias do sacristão e as sedas que lhe moldam a pele, B16 cisma vingar-se contra a Europa indiferente a que as pessoas da Santíssima Trindade sejam três ou trezentas, os mandamentos da lei de Deus sejam dez ou cem e os milagres necessários para criar um santo sejam dois ou duzentos.

B16 não palra e crocita, grunhe e uiva. Como cabo de um exército de sotainas convocou as hostes para anunciar o Evangelho, aqueles 4 livros cheios de contradições e violência que se juntaram ao Antigo Testamento, por ordem de Constantino, escolhidos entre muitos outros ainda mais contraditórios e inverosímeis.

Ao pedir aos bispos «um testemunho claro, público e corajoso», B16 não manda ensinar padre-nossos ou treinar beatos a ruminar ave-marias, usa um eufemismo para lançar a cruzada, faz uma declaração de guerra com palavras melífluas, incita os bispos a brandir o báculo e a arremeter contra Governos que se neguem a esportular o óbolo, a fazer a genuflexão e a dificultar o proselitismo.

Para B16 a liberdade é a «ditadura do relativismo», o respeito pelos Mandamentos de Deus (interpretados pela Mafia que dirige) deve ser imposto e não admite que «desapareça a identificação com o Magistério da Igreja», isto é, a subserviência à tiara.

B16 exorta os Bispos a que «exponham a Palavra de Deus com toda a clareza, mesmo os pontos que, muitas vezes, são escutados com menos vontade ou que provocam reacções de protesto ou mesmo de deserção». É a ordem de marcha, em beata cruzada contra os infiéis, réprobos, apóstatas e ateus.

5 de Novembro, 2005 Carlos Esperança

Religião e charlatanismo

O obscurantismo é o húmus em que as três religiões do livro mergulham as raízes. A tradição, os mitos e o charlatanismo são os ingredientes com que fabricam Deus.

Mas quem é Deus? É o indivíduo que criou o mundo em seis dias e descansou ao sétimo, o ser cruel e misógino, o narcisista desejoso de louvores, o sádico que exulta com sacrifícios e aluga quartos no Céu às almas que, por definição, não ocupam lugar?

Talvez seja o velho, apoquentado pelo reumático e interesseiro, que vinha do Céu à Terra para ditar a sua vontade a Moisés, no Monte Sinai, ou para reiterá-la a Maomé, analfabeto e rude, com desvarios aumentados.

Ou seria um OVNI que perdeu a bússola e só conhecia Jerusalém e arredores, região do planeta onde semeou sandices, ameaças e medos, onde prometeu reunir vivos e mortos, TODOS, de todos os tempos, no exíguo vale de Josafá?

O Deus monoteísta é certamente o charlatão que prometia a ressurreição e a vida eterna, que se disse proprietário de uma quinta, chamada Paraíso, onde correm rios de mel e há um bar de alterne com imensas virgens à espera de beatos dementes e criminosos.

Esse Deus é o troca-tintas que ora abria o mar, para passar o povo eleito, ora convencia outras tribos de que era delas que gostava e lhes deixava as mesmas terras, rios e lagos, num exercício de intriga que semeou ódios, ressentimentos e guerras perpétuas.

Deus é uma criação infeliz, com todos os defeitos humanos e nenhuma virtude, vingativo, caprichoso e autoritário. É o déspota que faz a síntese entre o pior de que os homens são capazes e os excessos que só Deus pode. É fautor de guerras, justificação para a violência e desculpa para a crueldade.

O ateísmo data do séc. XVI e só começa verdadeiramente em 1729 com a publicação da «Memória dos pensamentos e sentimentos do abade Jean Meslier». Meslier (1664-1729) deixou um Testamento em que desmascara a Igreja, Jesus, Deus, a Religião e se assume como ateu, provando a falsidade de todas as divindades e de todas as religiões do mundo.

Todavia, já no século II os cristãos denunciavam e estigmatizavam os «atheos», «os que não acreditam no seu Deus ressuscitado ao terceiro dia», um cadáver provisório a que a mãe do imperador Constantino viria a inventar um oportuno sepulcro.

4 de Novembro, 2005 Carlos Esperança

In illo tempore

Quando eu era criança, as almas penadas soíam visitar parentes e reclamar missas que podiam aliviar as penas e dar-lhes tranquilidade eterna. Os santos eram os habituais, sem novas adições que os milagres, as necessidades do mercado e o espírito supersticioso de JP2 haviam de criar.

Era o tempo em que Pio XII, após o conúbio com o nazi/fascismo, se afadigava a preparar a fuga de criminosos nazis para os poupar ao julgamento de Nuremberga.

Na paróquia onde eu vivia, rezava-se pelos «nossos governantes», cujo passado era pouco recomendável, pelo Santo Padre, que era pior, e execravam-se os judeus, que acabavam de ser vítimas de um genocídio, por terem matado Jesus.

A adesão da ICAR ao nazismo não foi um acidente de percurso ou o erro de um Papa particularmente reaccionário, foi o corolário da fé, um paradigma da religião que apoiou todas as ditaduras com excepção do comunismo.

É curioso recordar que o nazismo nunca foi excomungado, enquanto o comunismo, após a queda do muro de Berlim, viu reiterada a excomunhão. Hitler teve direito a missa solene e à compungida mágoa da igreja católica manifestada em todas as paróquias da Alemanha, por ordem expressa da ICAR, apesar do suicídio ser, para a Igreja, motivo de exclusão dos sacramentos.

2 de Novembro, 2005 Carlos Esperança

O Papa e a morte

Perante milhares de devotos e curiosos que ontem assistiam ao Angelus, no Vaticano, data conhecida por dia de Todos os Santos, entre os membros da seita, o Papa defendeu que «a morte é a transição entre a peregrinação terrestre e a pátria do Céu».

B16 exortou os católicos a não temerem a morte, encarando-a «com serenidade».

Acontece que não há dupla nacionalidade, que a «pátria do Céu» não é recomendável e que a viagem não costuma ser uma opção estimulante nem uma decisão pessoal.

Mas, para quem vive da morte, o Céu é uma opção de vida e uma mercadoria a promover.

27 de Outubro, 2005 Carlos Esperança

A fábula de Cristo

«A fábula de Cristo é de tal modo lucrativa que seria ingénuo advertir os ignorantes do seu erro». Leão X, papa in «Cristo Nunca Existiu» – Emílio Bossi.

Com excepção de João Paulo II, um homem supersticioso e beato, representante de uma Polónia rural, atrasada e autoritária, é pouco provável que os Papas modernos acreditem na existência de Deus.

No passado houve vários, comprovadamente ateus, chamados anti-papas pelos sucessores que herdaram o negócio e a quem coube redimir o passado onde avô, filho e neto usaram a tiara e muitos estimularam orgias que fizeram do Vaticano o mais sofisticado bordel da Europa. Os Bórgias são os mais conhecidos desse passado de cupidez, simonia, deboche e luxúria mas muitos outros usaram o poder e a riqueza do cargo para se regalarem com os mais deliciosos pecados, que consideram abomináveis, da Igreja a que presidiam.

Hoje, já não há papas na casa dos vinte anos. Os cardeais escolhem indivíduos cuja idade os torne imunes às tentações da carne e ao fascínio do múnus.

Não é provável que homens cultos e experientes acreditem nas fábulas que a cegueira ontológica dos evangelistas criou, mas compreende-se que não abdiquem do poder que sabem estar dependente do número de crentes de que dispõem e da intensidade da sua fé.

Com a excepção de JP2 – repito -, os Papas não acreditam em milagres embora se sintam na necessidade de rubricar alguns para gáudio de populações simples, pobres, crédulas e fascinadas pelo fantástico.

26 de Outubro, 2005 Carlos Esperança

B16 – regedor do Vaticano

O cardeal Joseph Ratzinger foi várias décadas Prefeito da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé – ex-santo Ofício -, espécie de Ministério Romano para a Promoção da Virtude e Prevenção do Vício. O mérito valeu-lhe a prorrogação do prazo de validade canónica por JP2, o Papa que dirigiu a ICAR até algumas horas após a morte.

O Opus Dei fez do cardeal inquisidor o Papa Bento 16.

B16 foi autor do rol dos pecados mortais e veniais e seu diagnóstico diferencial. A cópula é pecado mortal para solteiros mas pode tornar-se virtude em casais abençoados pelo sacramento do matrimónio se o objectivo único for a prossecução da espécie.

B16 elaborou o código de conduta eleitoral, para políticos católicos, em questões como o aborto, a eutanásia e outras, que o demo subtilmente tem trazido à colação e só lhe falta mandar actualizar o Índex dos livros proibidos, inalterável desde 1961.

B16 é o guardião da moral e dos bons costumes, avençado do divino, que não desiste de encaminhar almas para o redil da ICAR.

Ele não é apenas o representante de um cadáver com dois mil anos, é o responsável pelos negócios feitos à sombra da cruz, o estratego da divulgação da hóstia, o autor dos certificados de garantia dos milagres e o mais credenciado especialista para transformar a água vulgar em benta.

Do bairro de 44 hectares, que é o seu habitat, dirige um exército imenso de beatos, padres, frades, bispos e freiras, disposto a obedecer-lhe, capaz de dar e tirar a vida para lhe agradar.

Do seu covil – o Vaticano -, influencia os países católicos e traça planos para conquistar o mundo. O seu Deus é o poder e, a sua obsessão, o proselitismo.

23 de Outubro, 2005 Carlos Esperança

A burla das religiões

Quem pode levar a sério as religiões do livro? Moisés, Jesus ou Maomé não suscitaram tanto entusiasmo como as actuais estrelas pop, o Papa JP2 ou Fidel de Castro. Nenhum foi tão amado como o sanguinário Ayatollah Khomeini ou o demente Kim Il Sung II. No entanto, têm seitas com milhões de devotos que se reclamam da sua inspiração.

Figo tem mais admiradores do que Jesus teve. Cristiano Ronaldo, se não for afectado por escândalos sexuais, tem um futuro mais promissor do que se augurava a JC antes de Constantino (o 13.º apóstolo) ter entrado no negócio na primeira metade do séc. IV e mandado seleccionar a Eusébio de Cesareia evangelhos coerentes a partir de 27 versões. O Novo Testamento é menor que os Evangelhos apócrifos. Bin Laden tem mais admiradores do que Maomé teve em vida.

Os livros ditos sagrados são pouco sérios, violentos e baseados na tradição oral. A Tora foi escrita em data muito posterior à que a tradição lhe atribui. Os evangelistas nunca viram Jesus, profissional da pregação e dos milagres – uma ocupação alternativa.

O Corão foi escrito um quarto de século após a morte de Maomé e Marwan, governador de Medina, «encarregou-se de recolher, primeiro, e destruir e queimar, depois, várias versões, a fim de deixar apenas uma e evitar que a confrontação histórica revelasse a falsificação humana»[CE1] .

O mundo é muito mais antigo do que Deus julgava e a história da humanidade nada tem a ver com a sua alegada semana de trabalho. A reprodução humana nunca foi repetível pelo método divino e é bem mais eficaz e agradável do que Deus gosta.

A superstição, ignorância e medo estão na base das religiões monoteístas. A morte é a pulsão que alimenta a fé e os padres os charlatães que a promovem.

Não pode ser levado a sério quem garante que sinais cabalísticos fazem da hóstia «verdadeiramente, realmente, substancialmente» o corpo de Cristo e do vinho o sangue. Apesar do desejo cristão de que a ciência fosse abolida, qualquer laboratório confirma que, antes e depois da transubstanciação, as propriedades físicas e químicas do pão e do vinho permanecem inalteradas.

A ICAR só acertou no futuro ao desprezar o Espírito Santo. Evitou complicações com as autoridades sanitárias na sequência da actual gripe das aves. Nem o Concílio que entronizou B16 o deixou entrar. O Opus Dei dá mais luz, tem mais poder e não é fácil que a gripe das aves dizime tal fauna.

[CE1] Traité d’athéologie, Michel Onfray – Ed. Grasset 2005