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Autor: André Esteves

28 de Fevereiro, 2004 André Esteves

Religião e Richard Feynman na BBC News e BBC World Radio Service.

Aproveite quem quiser. Um documentário biográfico sobre Richard Feynman na BBC News.

A primeira parte é este sábado com repetições depois do almoço e ao final do dia.

No próximo sábado a segunda parte.

O velho e querido farsante nas suas próprias palavras:

«Eu odiava morrer duas vezes. É tão aborrecido e desestimulante! »

Últimas palavras. Richard P.Feynman morreu de um cancro cerebral, depois de 3 décadas de luta com a doença.

«A primeira regra é não te enganares a ti próprio e que és sempre a pessoa mais fácil de enganar!»

Richard P. Feynman comentando como pensar objectivamente e viver utilizando o senso comum.

Também recomendável, amanhã, na rádio de ondas curtas (sou um amante do rádio de ondas curtas… é sempre interessante ouvir a rádio Vaticano e o contraste com as posições oficiais. Como difere a propaganda para os pobres e as declarações políticas…), BBC World Service, ás 13h00, a série “O que o mundo pensa sobre deus”.

Com perguntas tão interessantes como «Qual o peso da religião nos EUA» ou «Será deus responsável pela guerra?».

What the world thinks of God?

Este programa fez um inquérito sobre a religião, deus e os porquês em todo o mundo, podem-no encontar aqui.

(isto é que é serviço público!)

E claro… Qualquer oportunidade para ver mais um programa da excepcional série de divulgação científica Horizon, não deve ser desperdiçado. Horizon

26 de Fevereiro, 2004 André Esteves

As Mulheres, o islão e certa islamofilia do ocidente

Desde o século XVI, que existe esta corrente intelectual europeia que engrandece o islão, construindo uma visão ingénua (estilo “O bom selvagem”), que utilizava para criticar os erros e falhas morais da sociedade que a rodeava. Associada aos movimentos esotéricos que nasciam da maçonaria regular, procurava também encontrar as raízes do deus uno judaico-cristão-islâmico, reinventando os Templários, Baphomet, absorvendo a teologia sefardita e a Cabala judaica em doses q.b. Ou seja, o habitual e conhecido movimento de cultos de intelectuais, aristocracias e elites, que joga menos no dinheiro, mas mais nas influências, tornando-se, hoje, numa velha e triste tradição europeia e sinal da decadência cultural da velha Europa.

No século XIX, um dos defensores dessa «ideia vaga do islão», foi Sir Richard Burton, escritor e aventureiro inglês que visitou disfarçado de médico afegão, Meca e a Kasbah. No seu «Ensaio terminal» defende o islão contra a crítica ocidental, afirmando «o estatuto legal da mulher no islão é excepcionalmente alto» e que «A mulher muçulmana tem grandes vantagens em comparação com as suas irmãs ocidentais», chegando a afirmar que «os muçulmanos estudam a arte e o mistério de satisfazer a mulher».

Burton viu-se forçado, por si próprio, a calar-se…

Ao traduzir os livros que utilizava como exemplo de tal atitude de vanguarda, encontrou, não valores de liberdade sexual, mas um imenso oceano de preconceito masculino que via nas mulheres meras garrafas para o seu esperma…

No Jardim perfumado de Shaykh Nefzawi, que Burton pretendia traduzir, pode-se encontrar:

«- Sabias que a religião das mulheres encontra-se nas suas vaginas? – pergunta o Shaykh.- Elas são insatisfeitas em tudo o que estiver relacionado com as suas vulvas, e enquanto a sua luxúria for satisfeita, elas não se importam que seja um bufão, um negro, um criado, ou até mesmo um homem renegado. É satanás que faz o sumo correr das suas vaginas.» O Shaykh cita o poeta Abu Nuwas (famoso poeta islâmico) com aprovação:

As mulheres são demónios e nasceram como tal

Que ninguém pode confiar nelas, é o sabido por todos

Se amam um homem é por puro capricho

E para quem elas são mais cruéis, é quem elas amam mais

Seres de traição e engano, eu asseguro

Que o homem que ama verdadeiramente, é um homem perdido

E aquele que não acredita em mim, pode provar a minha palavra

Deixando o amor de uma mulher tomar conta dele, por anos

Se na tua disposição generosa, lhes deste

Tudo e tudo, por anos e anos

Elas dirão depois: «Eu juro por deus! Os meus olhos

nunca viram nada que ele me tenha dado!»

E depois de te teres empobrecido por causa delas,

Elas choram de dia e de noite, para sempre: «Dá-me!?

«Dá-me! Homem, levanta-te, compra e empresta»

Se não poderem lucrar contigo, contra ti se virarão

Dirão mentiras sobre ti e te irão caluniar.

Não se coíbem de usar um escravo na ausência do mestre

Uma vez as suas paixões acordadas, usam truques e enganos

De certeza, se alguma vez a sua vulva está molhada,

Só pensam em porem dentro um membro em erecção!

Preserva-nos, Allah! Dos truques das mulheres,

e das mulheres velhas em particular…

Assim seja.»

Temos aqui um inventário completo das falhas das mulheres, aos olhos dos homens muçulmanos:

Engano, gula, ingratidão, ganância, luxúria sem fim… ou seja uma porta para o inferno…

Poderão dizer-me: mas afinal, não é isso o que todos os homens em todas as épocas dizem das mulheres?

As guerras do esperma e do coração existem… E são uma constante da condição humana, mas enquanto que na Europa se compunham “cantigas de amor e bem dizer” e se inventava o conceito de «amor romântico», no islão, em todas as classes sociais e pela literatura das classes altas, temos o caminho contrário…

De uma península arábica beduína, onde as mulheres tinham um estatuto quase igualitário aos homens, temos depois da tomada de Meca por Maomé, a completa aniquilação da condição feminina.

E a culpa disto? Quem é que empurrou nesta direcção a civilização muçulmana?

Maomé, a sua família e os clérigos islâmicos, obviamente.

Para compreendermos o islão, é preciso ver que nas discussões sobre o assunto, confundem-se três islãos diferentes:

O islão que o profeta ensinou (ou seja os ensinamentos contidos no corão), o islão como religião, que nasce, é desenvolvido e refeito pela elite de teólogos e clérigos a partir das necessidades históricas, do corão e do hadith (o livro dos ditados do profeta), e o islão profundo, das culturas conquistadas, cultura poética, ciência e arte…

Muitas das “maravilhas” e tolerância, bem como algumas vicissitudes, que são atribuídas ao islão, são na realidade resultado das culturas locais conquistadas e que para manter vivas as suas especificidades e talentos se adaptaram às exigências ortodoxas das classes conquistadoras.. (Um exemplo são os azulejos e arte de embutidos que se desenvolveram a pontos nunca antes vistos, em termos de complexidade, dada a impossibilidade das artes habituais, devido às forte regras contra a idolatria. Outro, a homossexualidade masculina, que apesar de proibida no corão, existe e é herança da antiga cultura grega )

Assim vejamos a visão que o islão do profeta e dos religiosos têm da mulher…

A mulher é um ser inferior.

A lenda de Adão e Eva.

Sura 4:1 «ó Homens! temei o vosso senhor que vos criou de uma só alma; desta ele criou a vossa companheira e dos dois seres fez sair muitos homens e mulheres. Temei a Deus em nome d’O qual fazeis pedidos uns aos outros e respeitai as entranhas [que vos geraram]. na verdade, Deus observa-vos.»

Sura 7.189 «Foi ele Quem vos criou de um só ente, Quem dela tirou a sua esposa para que vivesse na sua companhia e logo o homem coabitou com ela, esta trouxe primeiramente um fardo ligeiro e caminhava sem dificuldade; depois, quando se tornou mais pesado, ambos invocaram o seu senhor: «Se nos deres um filho bem conformado, pertenceremos certamente ao número dos que te rendem graças»»

Destas e de outra sura, (pequeno número diga-se..) os teólogos islâmicos, concluíram que o homem era a criação original – as mulheres foram criadas secundariamente para o prazer e descanso dos homens. Esta noção foi ainda mais desenvolvida para reforçar a suposta inferioridade da mulher. Finalmente, à lenda de Adão e Eva foi dado um carácter sagrado de maneira que criticá-la, seria criticar as próprias palavras de deus, que são imutáveis e absolutas.

O próprio profeta descreve as mulheres em geral: «Sê amigável para com a mulher, pois as mulheres foram criadas de uma costela, mas a parte torcida da costela. No final, se a tentares endireitar a partirás; se nada fizeres, ela continuará a ser torta.»

Para reforçar a inferioridade da mulher, apareceu a noção que esta é uma serpente tentadora.

O curioso é que esta noção parece provir do Génesis judaico-cristão e não do próprio alcorão, pois se virmos as suras referentes à queda do estado de graça, não encontramos referências a uma Eva maligna…

Sura 2.33 «Dissemos: Ó Adão, habita o jardim com tua esposa; alimentai-vos ambos com os seus frutos, onde quer que eles se achem e à vossa vontade, mas não vos aproximeis dessa árvore, para não vos tornardes pecadores.»

… 2.34 «Satanás, porém, fe-los expulsar daqui e baniu-os. Dissemos-lhe então:«Descei deste lugar, inimigos uns dos outros; a Terra há-de servir-vos de morada e gozo temporário.»

..

Sura 7.18 «E tu, Ó Adão, habita com tua esposa no paraíso e comei ambos os seus frutos onde quiserdes; não vos aproximeis, porém, desta árvore para que não vos torneis pecadores.»

… 7:19 «Satanás fez-lhes uma sugestão pérfida para que eles vissem a sua nudez, que até então, lhes estava escondida. Disse-lhes: O Senhor proibiu-vos esta árvore apenas para não vos tornardes dois anjos ou para não vos tornardes imortais.»

… 7:20 «E jurou-lhes: na verdade, sou o vosso companheiro fiel.»

… 7:21 «Seduziu-os pelo engano e logo que provaram o fruto da árvore surgiu-lhes a própria nudez e apressaram-se a cobri-la com folhas de jardim. O senhor admoestou-os: Não vos proibi esta árvore? Não vos disse que satanás era vosso inimigo declarado?»

… 7:22 «Eles [Adão e Eva] responderam: Ó nosso senhor, nós somos pecadores; se não nos perdoas, se não tens piedade de nós, estaremos perdidos.»

… 7:23 «Disse deus: Descei! Ficareis inimigos uns dos outros. Encontrareis na terra residência e gozos temporários.»

A tradição islâmica também atribuiu a gula e ganância ás mulheres. E encontra suporte no Corão, na Sura 12.22-34, a história de José no Egipto e conta o encontro de José com uma mulher que o quer seduzir á força, das mentiras perante o marido desta e a reacção das mulheres na cidade.

Além disso, maomé ataca os ídolos femininos em Meca, e aproveita para atacar o sexo feminino em geral:

Sura 4:117 «Na verdade, além de Deus eles apenas evocam divindades femininas. Na verdade, eles apenas invocam Satanás, o rebelde» Suras 43:15-19, 52.39, 37:149-150, 53:21-22, 53:27

Além disso, existe espalhado por todo o corão, uma multitude de suras que utilizam a mulher como insulto, culpam as mulheres pelos erros dos homens, dão-lhes castigos ou valores de compensação em muito inferiores ou piores que aos homens…

Por exemplo…

Sura 4:38 «Os homens são superiores às mulheres pelas qualidade com que Deus os elevou acima delas e porque os homens gastam os seus bens a dotá-las. As mulheres virtuosas são obedientes e conservam cuidadosamente durante a ausência de seus maridos o que Deus lhes confiou. Deveis repreender as que dão sinais de desobediência; podeis po-las em leitos á parte e bater-lhes, mas desde que obedeçam não procurareis mais motivos de querela. Deus é excelso e grande.»

Mais úteis para os clérigos e teólogos foram os próprios ditados do poeta, quer no hadith, quer os de reputação popular…

– «A mulher que morre, e cujo marido está satisfeito com ela vai para o Paraíso.»

– «Se alguma coisa pressagia um mau prenúncio, é: uma casa, uma mulher ou um cavalo.»

– «Nunca um povo conhecerá o sucesso, se confidenciar os seus negócios com uma mulher»

– «O fogo do inferno surgiu-me num sonho e eu notei que estava principalmente povoada por mulheres que tinham sido ingratas. «Foi para com deus que eles foram ingratas? Elas não tinham mostrado gratidão para com os seus maridos por tudo o que tinham recebido deles. Mesmo que tenhas, durante toda a tua vida, agraciado uma mulher com a tua generosidade, ela encontrará sempre algo de minúsculo para te atacar um dia, dizendo «nunca fizeste nada por mim.»»

As mulheres são assim, para o islão inferiores e podem ser comparadas a garrafas, nas quais uma rachadela é irreparável… Aliás, maomé costumava dizer: “Lidem com as “garrafas” (as mulheres) com cuidado.

«O lugar da mulher é na casa ou na campa» – ditado Pashtun

Se quisermos juntar a esta visão da mulher, todos os outros pontos em que encontramos a condição feminina no islão, não podemos considerar que o islão seja particularmente emancipado e justo.

O hijab – o corão só pede que seja mantida o pudor Sura 24:30-31, no entanto toda a sociedade islâmica é um campo onde as pulsões sexuais masculinas são privilegiadas… Deste modo, a guerra do esperma manifestou-se na sistemática ocultação das mulheres em sistemas de roupa cada vez mais elaborados.

Além disso, o hijab associou-se á ostentação da riqueza de uma família, em certas partes do islão. Noutras, as condições económicas e ambientais geraram uma versão minimalista, o lenço na cabeça…

Mas continua e sempre será uma marca da sua inferioridade perante os homens e allah…

Aos olhos de muitas mulheres muçulmanas, talvez não…

Afinal, não é também a religião um mecanismo de controlo mental?

As ocupações permitidas à mulher: nenhuma que envolva a razão, pois a mulher não a tem.

A circuncisão e excisão feminina.

O casamento inegualitário para a mulher.

A impureza constante devido ao período.

A obrigação de satisfação sexual do homem, nenhuma para a mulher…

A desprotecção perante a justiça da mulher, quer em crimes sexuais como abuso físico e financeiro.

O corpo de uma mulher, especialmente a vagina, não lhe pertence! É “comprada” pelo marido na hora do casamento.

A lista é interminável, bem como as referências corânicas, do hadith, dos califas e família do profeta, quer para o islão wahibita, como para o shiita…



Querer justificar determinadas posições ocidentais sobre a cultura muçulmana, com somente citações do alcorão é como pedir a um muçulmano que seja como um protestante cristão perante o catolicismo… Coisa que lhe é impossível porque a própria palavra do profeta, garante que seja a classe teológica a protectora da palavra… Além disso, Maomé ao deixar um códice escrito, (assunto ainda por cima difícil de investigar… dado que cópias antigas do corão que se afastassem da ortodoxia foram simplesmente eliminadas… embora hoje haja descobertas arqueológicas que prometem algumas revelações… com muita polémica e furor para os clérigos muçulmanos (infiéis a decidirem o que é o corão?!)), desacelerou efectivamente a capacidade de mudança da religião muçulmana, em contraste com a religião cristã onde o rito precedeu as escrituras, tornando possível a igreja católica e ortodoxa na forma actual.

As grandes mudanças culturais do islão, deveram-se em grande parte às culturas conquistadas e hoje, ao choque da modernidade e da cultura ocidental. No entanto, a distância entre um teólogo moderado e um ortodoxo é muito pequena em comparação com a religião cristã e ainda mais com os movimentos humanistas progressistas mundiais.

O fundamentalismo que hoje, tanto assusta, é em parte, um querer voltar para o passado, para a prática e cultura que distinguiu os muçulmanos do ocidente, e logo para o que de pior e mais reaccionário e inumano que possamos encontrar no islão.

Nestes tempos pós 11 de Setembro e da «guerra do véu» em França, fica bem a uma certa intelectualidade ecuménica defender, como fizeram no passado, os argumentos e «impressões» da antiga islamofilia, em nome da tolerância. Aliás.. os próprios elementos superiores dos conselhos islâmicos da Europa o fazem com habilidade.

A tolerância é um valor por si. E as religiões nas suas formas originais não o suportam… Só a prática dos homens e a necessidade de paz é que a fez estabelecer nas sociedades. Hoje, temos a Carta Universal dos Direito Humanos como guia, não quaisquer verdades reveladas de um deus qualquer.

Mas no fim disto tudo…

As mulheres é que continuam a sofrer.

Fontes usadas liberalmente, (sim.. plagiei alguns parágrafos, isto é um blog, não uma tese de doutoramento):

Porque não sou muçulmano. de Ibn Warraq, Edição da Prometheus Books, ISBN: 0-87975-984-4

Alcorão de Allah ou da boca do profeta (não sabemos… não se esqueçam dos versículos satânicos), Edição problemática da antiga Junta de Investigações Científicas do Ultramar, tradução de José Pedro Machado… (infelizmente não posso estudar árabe e o corão original, sem me arriscar a ser morto pelo professor…), o facto de o corão ter de ser lido em árabe para não haver degradação da palavra do profeta, traz muitas complicações a quem o quer ler traduzido no ocidente. A inexistência de um versão “oficial” torna difícil a correspondência e citação correcta de muitas suras, devido ao facto, das traduções ocidentais se basearem em “vulgatas” que variam tanto na tradução contextual, como na ordenação das suras por polémicas académicas da ordem cronológica das suras. É assim habitual encontrar discrepâncias nos corões que se possam adquirir.

Provavelmente terei que adquirir um corão em inglês(!), dado que têm maior circulação e a maioria das referências são feitas em relação a essas traduções… As suras citadas são aquelas para as quais encontrei concordâncias…

Sir Richard Burton, foi o primeiro tradutor do Kama Sutra e do famoso «Arabian Nights» http://www.isidore-of-seville.com/burton/

A minha saudação e agradecimento a Ibn Warraq, homem livre de pensamento, pela sua coragem e discernimento.

23 de Fevereiro, 2004 André Esteves

The End of the World

Seguindo o mote da Mariana com a letra dos Muses, aproveito para colocar a letra de um happening da Laurie Anderson.

O texto é sugestivo… Mas ouvido da sua boca é inesquecível…

The End of the World – by Laurie Anderson

«Hi! This evening I’ll be reading from a book I just finished and since a lot of it is about the future, I’m going to start more or less on the last page, and tell you about my grandmother. Now she was a Southern Baptist Holy Roller and she had a very clear idea about the future, and of how the world would end.

In fire.

In fire.

Like in Revelations.

Like in Revelations.

And when I was ten my grandmother told me the world would end in a year. So I spent the whole year praying and reading the Bible and alienating all my friends and relatives. And finally the big day came. And absolutely nothing happened. Just another day.

Ooooaaaah!

Now my grandmother was a missionary and she had heard that the largest religion in the world was Buddhism. So she decided to go to Japan to convert Buddhists.

And to inform them about the end of the world.

And to inform them about the end of the world.

And she didn’t speak Japanese. So she tried to convert them with a combination of hand gestures, sign language and hymns, in English.

Ooooaaaah!

The Japanese had absolutely no idea what she was trying to get at. And when she got back to the United States she was still talking about the end of the world. And I remember the day she died. She was very excited. She was like a small bird perched on the edge of her bed near the window in the hospital. Waiting to die. And she was wearing these pink nightgowns and combing her hair so she’d look pretty for the big moment when Christ came to get her.

Ooooaaaah!

And she wasn’t afraid but then, just at the very last minute something happened that changed everything. Because suddenly, at the very last minute she panicked. After a whole life of praying and predicting the end of the world, she panicked. And she panicked because she couldn’t decide whether or not to wear a hat.

Ooooaaaah!

And so when she died she went into the future in a panic with absolutely no idea of what would be next.»

19 de Fevereiro, 2004 André Esteves

O contra-argumento ao medo de Pascal…

Paris, 23 de Novembro, de 1654. Uma carruagem atravessa uma ponte sobre o rio Sena.

De repente, os cavalos que a puxavam, assustam-se e com um esticão, levantam a carruagem no ar.

Aterrando sobre a berma da ponte, a carruagem inclina-se perigosamente, deslizando para o rio abundante

que corre por debaixo. Por um milagre, a berma encaixa entre as rodas da frente, imobilizando, pendurados,

a carruagem e os seus ocupantes.

Do silêncio que se tenta impor, depois, entre os transeuntes, não sobra nada…

Dentro da carruagem, Blaise Pascal grita, aterrorizado, olhando a morte à sua frente.

Em mais de uma discussão sobre a não-existência de Deus, tenho encontrado pessoas, que, pomposamente, invocam a chamada «Aposta de Pascal». A «Aposta» é, supostamente, um argumento probabilístico para convencer qualquer homem, a crer em Deus, se racionalmente fizer uma análise custo/benefício de manter uma fé num redentor.

Na sua forma original:

Deus ou existe ou não existe. Por necessidade, temos que fazer uma aposta:

Se aposto por ele e ele existir: lucro máximo.

Se aposto por ele e ele não existir: nenhuma perda.

Se aposto conta ele e ele existir: perda máxima

Se aposto contra ele e ele não existir: nem perda, nem lucro.

Ou seja, segundo Pascal, a melhor estratégia a seguir é apostar pela existência de deus, porque nas alternativas, não ganhamos nada com isso…

O argumento é intelectualmente desonesto. Porque para o considerarmos, seriamente, temos que aceitar as premissas…

Ou seja. Que se deus existir, ele é cristão. E que pretende pôr todos os pecadores no inferno…

Quando se trabalha com probabilidades é preciso ser-se rigoroso. Num problema em que queiramos determinar a probabilidade de uma proposição, temos que considerar todas, mas TODAS, as possíveis consequências dessa proposição… É exactamente sobre este número que se determina o valor das probabilidades que desejamos conhecer.

Assim, temos que reformular o problema, em termos de probabilidades compostas…

1. Entidades metafísicas existem ou não existem. Logo 50% de probabilidades para cada uma das possibilidades.

2. Qual a probabilidade de uma entidade metafísica existir? Temos que dividir em números iguais, os 50 % pelo número de divindades conhecidas… ( para não falar nos deuses desconhecidos… lembremo-nos de Paulo em Atenas… mas vamos nos restringir aos deuses conhecidos)

É trivial ver que a probabilidade de Deuses não existirem, é sempre maior que a probabilidade de um deus qualquer existir… E não podemos considerar os 50 % das entidades metafísicas como um todo.. Afinal os deuses existem, em exclusão dos outros…

É óbvio, então chegar à conclusão que a aposta mais sensata, é não apostar em deuses…

E procurar a felicidade nesta terra, para nós e para os outros.

Mas, porque é que Pascal, um génio polimático, forçou o argumento? Por causa do medo…

Quando nos deixamos possuir pelo medo e temor. Da morte, deus, inferno, apocalipse ou outro fim qualquer…

Deixamos de viver a vida e também de aplicar a razão…

Forçamos os nossos argumentos, para que justifiquem as nossas emoções.

E no medo, a alternativa é sempre assustadora.

Mas a aposta de Pascal tem um final triste.

Oito anos depois do terrível acidente que o atirou para o ascetismo e obsessão, Pascal morria, acamado, no meio de dores horrendas.

Um cancro do estômago, causado por úlceras de origem nervosa, espalhou-se pelo seu corpo.

Ao mesmo tempo que o seu sistema imunológico, debilitado, sucumbia à tuberculose…

Morreu do medo que tinha de viver.

12 de Fevereiro, 2004 André Esteves

Dia de Darwin – Reflexões sobre a ciência e a razão em Portugal



Hoje é dia de Darwin. Ele nasceu há 195 anos.

Nas universidades progressistas americanas e inglesas, e um pouco por todo o mundo, comemora-se este dia, não só pelas descobertas científicas que Darwin deu a todos nós, mas também para celebrar a humanidade comum que todos partilhamos e um certo deslumbramento pelo universo que todos os exploradores e verdadeiros cientistas sentem.

Vejam a imagem que está à vossa esquerda. É uma fotografia de Darwin com 68 anos.

Sabem o que gosto imenso nela? Olhem para os olhos…

Confusos? Pois… Darwin com 68 anos era estrábico.

Mas se olharem para a imagem focando o olho da direita, vêem um Darwin sonhador… a olhar para o futuro e para as estrelas…

Se olharem focando para o olho da esquerda, terão uma surpresa…

Um Darwin sorridente, que aparenta uma calma transcendente.

Dizem as lendas, que Demócrito, o filósofo grego que «inventou» o átomo, sorriu durante toda a vida, tal era a felicidade fulminante que o iluminou naquele momento único, em que a ideia do átomo se formou na sua mente.

Na vida de um cientista, artista ou de qualquer pessoa apaixonadamente criativa vive-se para e desse momento…

Não é necessário ser uma ideia original.

Qualquer ideia é sempre única, quando floresce pela primeira vez dentro do nosso cérebro.

Venho de uma família protestante, e apesar de todo o gênero de experiências com o «espírito santo», nada me marcou como o momento em que tive «Uma luz no meio da escuridão».

Tinha 12 anos, e tinham-me emprestado um computador, e por mim próprio aprendi a programar BASIC.

Uma das coisas que sempre me tinha fascinado, eram os números primos…

De modo que, programei o computador para gerar números primos de uma maneira muito básica, a partir de uma progressão aritmética de impares (o único número primo par é o 2) e testava a primalidade desses números…

Escusado será dizer, que ao fim de algum tempo, o computador praticamente parava…

No entanto, a memória RAM não era toda utilizada…

Havia algo de fundamentalmente lento no algoritmo que eu criara.

Tinha notado algo acerca da própria natureza dos números primos!!!

Mas deveria haver alguma maneira mais eficiente, mais rápida, mais sensata de calculá-los…

O problema obcecou-me… Enquanto dormia os números chocavam-se nos meus sonhos.

Quando visualizei pela primeira vez um método mais rápido, foi como se abrissem as portas da criação e trombetas tocassem por todo o mundo! E quando o implementei, funcionava!

Anos mais tarde, consegui arranjar um livro sobre Teoria dos Números, que é a parte da matemática que estuda as propriedades intrínsecas aos números e descobri!

Surpresa de adolescente!

O método já era conhecido. Tinha sido descoberto por um dos grandes matemáticos da antiguidade. Chamava-se Eratóstenes. E o algoritmo é conhecido por Crivo de Eratóstenes.

Nesse momento tive outra epifania…

Eu e Eratóstenes, separados de séculos, tivéramos a mesma ideia.

Dois milénios separavam-nos, mas juntos, partilhamos aquele problema, aquela revelação.

Éramos homens separados no tempo, mas tão próximos na nossa curiosidade e solução.

Ainda hoje, fico profundamente emocionado quando penso nesta experiência.

Creio que é uma das experiências mais intensas sobre o que é a condição humana que a ciência tem para nos oferecer.

Quando olho para a fotografia de Darwin, com 68 anos, e tendo lido várias biografias, sei que ele está feliz. Morrerá feliz.

Deu-nos a teoria da evolução.

Com calma, sofrimento, no meio da doença e da enorme pressão social por que passou, deu um passo de gigante na nossa compreensão do que somos, de onde vimos e potencialmente, para onde quisermos ir.

É uma pequena certeza… Não é uma grande construção de toda a realidade, que explique todo o universo. No entanto, como disse um poeta turco:

«Prefiro uma vela acesa no meio da escuridão, a holofotes ligados em pleno dia».

É esta a diferença que um amante da ciência tem, em relação a qualquer verdade revelada…

Lentamente, mas com a força das pequenas confianças que obtemos, vamos tendo um vislumbre da verdade que é mais pura que qualquer visão do universo que as religiões nos oferecem.

É um projecto sem fim, de homens ligados através dos tempos, pelas suas experiências com a realidade.

—-

Não se comemora o dia de Darwin em nenhuma universidade portuguesa. Porquê?

O número de artigos científicos têm aumentado ao longo dos anos.

Universidades crescem e «elites» se estabelecem…

Será que temos ciência em Portugal, mas não temos cientistas?

8 de Fevereiro, 2004 André Esteves

Deus não estava lá.. Só a incúria dos homens.

Há três anos atrás, dirigi-me para Castelo de Paiva com a minha mulher e um amigo.

Tinha havido a iniciativa, entre amigos e colegas de trabalho, de se organizar uma descida em rafting no rio Paiva.

Quando nos preparávamos para entrar nos botes, já eu sentia que havia qualquer coisa mal. O rio transbordara, e as árvores à beira rio tinham se transformado em lanças a emergir ou submersas na água.

O rio corria desalmadamente.

Comecei a aperceber-me que a empresa que organizara a descida não tinha avisado a polícia, ou bombeiros, do que se ia passar. A pressa com que nos queriam atirar para a água, puxou-me ainda mais o receio.

Tive que arrancar de um instrutor aparvalhado por alguém fazer perguntas, quais seriam os procedimentos no caso de cairmos à água… Entramos na água… e só saímos depois de virarmos três barcos e 6 pessoas quase morrerem afogadas, inclusive eu.

Fiquei preso num rolo de água de uma cascata, bebi e respirei água, enquanto via a minha morte, afogando-me num turbilhão. Felizmente que me lembrei das instruções que tinha pedido e relaxei o corpo, ao mesmo tempo que aceitei a minha morte e, ao fim de uma eternidade surda, acabei por me soltar da corrente que me aprisionava.

Percorri mais de 100 metros ao sabor da corrente, sem saber se estava morto, se estava vivo.

Reagrupámo-nos na margem, com mais de vinte pessoas cheias de escoriações, enlameadas e assustadas. Cheirava-se o medo no ar. Tive um ataque de pânico. Recriminava-me por me ter deixado apanhar naquela situação. Não podia ver um barco à frente…

A muito custo, convenceram-me a entrar no barco e a manter-me no fundo.

A minha mulher segurou-me e confortou-me, sabendo que, no meu pânico, podia saltar para a margem…

Na parte final, antes de chegarmos, ganhámos velocidade relativamente à margem e só a custo não nos despedaçavamos nas pedras e rápidos que estavam à frente, lutando contra a corrente, conseguindo agarrar um ramo, parar o barco e puxarmo-nos exaustos e a tremer por uma ribanceira acima, até chegarmos à estrada e aos nossos carros. Voltamos para casa, atordoados, a desejar por um banho quente e um lugar seguro e acolhedor.

Na manhã seguinte, ao ver as notícias na televisão, fiquei aparvalhado…

A ponte por onde tínhamos passado, horas antes, duas vezes, na ida e na volta daquela aventura idiota, tinha caído.

Sobreviver é f*****… Sabem porquê?

Porque se morremos, morremos.

Se sobrevivemos, tentamos tirar todo o gênero de lições e ilações sobre o que aconteceu.

E é difícil saber quando parar… Só quando controlamos a espiral de emoções libertadas é que emergimos para a calma. E conseguimos aprender alguma coisa…

Passados estes três anos, há uma reflexão que permanece: Estamos nas mãos uns dos outros.

E é só isso o que nos protege de um universo aleatório, adverso e terrível.

No entanto, naquele dia, houve pessoas que não me seguraram a mão.

A confiança numa sociedade é construída pela palavra e pelo cumprimento dos compromissos aceites.

A Competência é o cumprimento num serviço, trabalho ou profissão de certos compromissos: regras, objectivos de qualidade, segurança e transparência para com os outros nos nossos produtos e serviços.

Quando as pessoas deixam de se nortear por esses princípios e passam a “acreditar” que as coisas funcionam… Que alguém ou “alguma coisa” os há-de safar das consequências do seu mau trabalho ou má gestão dos seus negócios e responsabilidades, é quando se quebra o compromisso que todos temos uns com os outros, de manter a máquina da civilização e sociedade a funcionar e a preservar a vida comum.

Naquela noite morreram 59 pessoas. Caíram para uma morte certa, num rio a transbordar de incompetência.

Incompetência alimentada por uma cultura de aparências, superstição, cupidez e preguiça.

Ontem, duas novas pontes foram inauguradas, perto do local da tragédia.

Um governo que representa tudo o que de pior temos, transgrediu a constituição e a lei da liberdade religiosa, ao iniciar a cerimónia de estado, com um sacerdote católico romano a abençoar as pontes…

A ponte que caiu, quando inaugurada, foi abençoada por um sacerdote católico romano…

Onde está a racionalidade, neste tempo que passou?

Aprendemos alguma coisa?

Ou continuamos a alimentar a incompetência? E a esquecer a mão dos outros…

Associação Républica e Laicidade

Comunicado de imprensa sobre a inauguração das duas novas pontes em castelo de Paiva.

7 de Fevereiro, 2004 André Esteves

O temor… Base da religião.

” A religião é fundamentada primeiramente e sobretudo no temor.

Por um lado é o terror perante o desconhecido, por outro, o desejo de sentir uma espécie de irmão mais velho que esteja ao nosso lado quando nos sentimos receosos ou em dificuldades.

O temor é a base deste problema – temor do misterioso, temor do malogro, temor da morte.

E o temor engendra a crueldade, razão porque a vemos de mãos dadas com a religião.

O temor está na base de uma e de outra.

Neste mundo, começamos a compreender as coisas, a dominá-las um pouco com a ajuda da ciência – que vai abrindo caminho pouco a pouco apesar da oposição da religião cristã, das igrejas em geral e de todas as superstições.

A ciência pode ajudar-nos a vencer esse covarde terror em que a humanidade têm vivido durante tantas gerações; a ciência pode ensinar-nos, e penso que o nosso próprio coração nos pode também ajudar, a não mais procurar apoios imaginários à nossa volta, a não mais forjar aliados nos céus, mas a concentrar todos os nossos esforços aqui na terra, a fim de fazer deste mundo um lugar onde se possa viver agradavelmente, ao contrário do que têm feito todas as igrejas através dos séculos. “

Do livro, Porque não sou cristão. de Bertrand Russel – livro baseado na conferência ao South London Branch da National Secular Society, UK em 1927

Vão 83 anos desde estas palavras… Não perderam o seu toque de verdade.

Que comece o bom combate.