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Autor: Abraão Loureiro

15 de Maio, 2011 Abraão Loureiro

Um Amigo e Pêras

O melhor amigo do meu pai ainda se mantém vivo na minha memória. Era ateu, activista político e considerado um engenheiro civil notável.
Por vários motivos não o posso esquecer: Porque tinha muita paciência comigo; Porque me acarinhava muito (talvez por não ter tido um filho, era pai de duas filhas bem mais velhas do que eu); Porque me explicou coisas que o meu pai não me explicou. Eu era visita constante na sua casa. Havia motivos fortes para isso: Um piano que me atraía e onde eu martelava as teclas, um violino que eu ouvia, pegava mas não me atraía e um carro descapotável onde eu me sentava e sonhava que conduzia. Sua esposa dava aulas particulares de música. Complementava o orçamento familiar em virtude das dificuldades que ele enfrentava constantemente por ser avesso ao regime. Tão avesso foi que volta e meia a PIDE ia a casa prendê-lo. Uma vez ouvi o meu pai contar a um amigo que ele construiu um esconderijo por baixo do monte da lenha na garagem para aí delinear o orçamento possível de forma a família viver enquanto estivesse na prisão. Terminado o esquema de sobrevivência familiar foi-se entregar voluntariamente. Da última vez não voltou vivo, vítima das torturas infligidas.
Um exemplo do seu elevado nível cultural: Numa das noites que ele me acompanhou até casa dos meus avós (nesse tempo eu tinha 7 anos), perguntei-lhe como é que as cegonhas traziam os bebés. Então ele com a sua habitual calma, tanto no falar como no caminhar, foi-me explicando com todos os pormenores o processo desde a concepção até ao nascimento. Fiquei completamente esclarecido e com a certeza que sabia mais que os meus amigos e olhem que nessa altura nós até já sabíamos umas malandrices. Agora, ao lembrar-me de tantas coisas que ele me ensinou fico admirado comigo mesmo pelo facto de sempre o ouvir com atenção e compreender sem ficar constrangido mesmo nos assuntos que envolveram educação sexual, coisa por muitos impensável ainda nos dias de hoje.
Bom, o motivo desta crónica é simples. Apenas contar a troca de galhardetes entre ele e um outro cidadão (ou vilão, pois nessa época era ainda vila).

Todos sabendo o seu ateísmo, numa conversa de rua há um que dispara:
Oh engenheiro, com essas barbas só lhe faltam os cornos para parecer o diabo.
Resposta na ponta da língua: Meu caro pois a si só lhe faltam as barbas!

10 de Maio, 2011 Abraão Loureiro

As Palavras

As palavras valem para nós tanto quanto os objectos que possuímos. Ou seja, atribuímos-lhe o valor estimativo: Estimativo de estimação emocional e (ou) estimativo de valorização comercial.
Ler não é apenas bom, ler é fundamental mas ler e não discorrer é prejudicial e como diz o velho provérbio, se acreditas em tudo o que lês, então o melhor é não leres.
Bom, quero com isto dizer que cada parte apresenta a frase que lhe convém e ninguém está livre de errar ao acreditar.
A diferença entre uma parte e a outra reside no facto de uma ler e a outra ler e pesquisar exaustivamente.
Sabemos bem que os criacionistas são hábeis em manipular textos sem o medo dos desmentidos dos autores por já não estarem entre os vivos e desta forma influenciar as pessoas. É mais fácil uma pessoa acreditar que existe mais vida para lá da morte e a salvação pelos seus erros no último momento mostrando o arrependimento perante o seu deus do que estar convicto que quando chegar a hora tudo acabou.
A isto eu chamo medo e oportunismo. Uma permuta, eu faço-te isto em troca daquilo.
Tudo isto vem à baila pela quantidade de comentários ao artigo anterior postado por Luís Grave Rodrigues em no passado dia 9 com o título “Criacionistas”, eu pessoalmente estou-me nas tintas para o que fulano disse por mais famoso que tenha sido em vida. Simplesmente sou ateu porque o meu raciocínio assim me conduz. Não sou ateu por medo nem por influência.
Graças ao avanço da tecnologia já não vai ser possível aos falsários escreverem as frases falsas dos ateus famosos. Hoje tudo está gravado em som e imagem para memória futura. Quero ver daqui a alguns anos se ainda estiver vivo, vídeos de pessoas dizendo o contrário do que realmente disseram. Contudo, creio ser possível alguém se desdizer influenciado pelo efeito colateral de medicamentos tomados para alívio do sofrimento. Só quem nunca acompanhou de perto um doente em fase terminal pode duvidar pois o grau de sofrimento é horroroso. Mas acrescento que até hoje não vi nem ouvi alguém mostrar algum tipo de arrependimento pelo seu ateísmo ou seja, ninguém pediu ajuda divina.
O que vai acontecer comigo, não sei. Nem sei de que forma vou morrer.
Hoje dia 10 de Maio de 2011 e são 13 horas e 15 minutos.