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A Laicidade na Grécia

Apesar de a palavra «laicidade» dever a sua origem a um étimo grego («laos»(1)), a Grécia actual é talvez, com a possível excepção de Malta, o Estado da União Europeia que mais se afasta do ideal de laicidade do Estado. O caso da Grécia evidencia que o confessionalismo de Estado é uma máquina de negar direitos, e que portanto, ao contrário do que afirmam os nossos críticos habituais, é a religião que actua negativamente.

No país em que a Constituição não só é proclamada «em nome da Santíssima Trindade» como declara no seu artigo 3º que a «religião predominante» é a religião ortodoxa grega, um grupo de cidadãos que queira fundar uma igreja e abrir um templo não o pode fazer sem obter a necessária autorização junto da… Igreja Cristã Ortodoxa Grega (ICOG). Evidentemente, a ICOG usa este direito de veto para controlar a concorrência. É assim que, apesar da existência de um número considerável de muçulmanos em Atenas, jamais a ICOG autorizou que uma mesquita abrisse as portas nessa cidade. (E os sacerdotes ortodoxos são, como é evidente, funcionários públicos com todas as regalias consequentes.) A liberdade de associação está portanto limitada.

A liberdade de expressão está restringida por duas disposições constitucionais, uma que proíbe o «proselitismo» (ou seja, as tentativas de persuadir ou simplesmente informar as pessoas de que existem outras opções religiosas ou filosóficas) e outra que permite a apreensão de jornais e livros em casos de «ofensa à religião cristã» (além disso, a reprodução da «Sagrada Escritura» depende da autorização da inefável ICOG). Assim, a liberdade de difundir ideias na Grécia está limitada à difusão da ortodoxia.

A falta de liberdade religiosa na Grécia causou atritos consideráveis com a U.E. apenas em torno da questão dos Bilhetes de Identidade, que deixaram efectivamente de mencionar a religião do seu portador (é um direito humano básico manter a convicção filosófica ou religiosa privada). No entanto, os B.I. gregos são vitalícios… portanto os B.I. emitidos antes de 2001 continuarão a exibir a religião de quem identificam.

A Grécia tem ainda outras extravagâncias religiosas, das quais a mais famosa é o Monte Athos, uma pequena península habitada apenas por monges do sexo masculino, que tem constitucionalmente o direito de se autogovernar e onde é proibida a entrada a pessoas «heterodoxas». Os tratados da UE regulando a famosa «liberdade de circulação» têm respeitado o «direito à diferença» do Monte Athos, o único espaço da UE onde um «cidadão europeu» não pode entrar. Outro território regido por leis supra-constitucionais é constituído por algumas localidades na fronteira com a Turquia, onde, sendo a população maioritariamente muçulmana, o ensino é em turco e com uma componente de estudos do Islão.

(1)«Laos» significa «povo», mas enquanto totalidade indivisível, enquanto «ethnos» remete para o fundo «racial» ou cultural, e «demos» para a entidade com capacidade política.