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Categoria: Ciência

5 de Julho, 2011 João Vasco Gama

Fontes fidedignas, e Evangelhos – IV

No primeiro texto a este respeito concluí que, para que um conjunto de relatos mereça muita confiança em relação à descrição de um ou mais eventos, estes devem corresponder às seguintes condições:

-serem feitos por quem observou o(s) evento(s)
-serem recentes face ao(s) evento(s) descrito(s)
-serem feitos por parte desinteressada
-serem de fontes independentes entre si
-serem consistentes

No segundo texto abordei a posição da generalidade dos académicos que estudam este assunto face ao cumprimento, ou não, das primeiras duas condições. Concluí afirmando que a maioria dos académicos acredita que os evangelhos não foram escritos por quem observou os eventos, e a quase totalidade acredita que os evangelhos a que temos acesso foram redigidos décadas depois dos eventos neles descritos.

O terceiro texto abordou a posição dos académicos face às duas condições seguintes. Concluí afirmando que a maioria dos académicos considera que os evangelhos não correspondem a fontes independentes entre si, e ninguém coloca em causa que a sua autoria seja parte interessada no relato que é feito.

Basta que uma condição entre várias não se cumpra para que a conjunção delas fique por cumprir. Ainda assim, pretendo analisar neste texto a quinta condição: a consistência dos vários evangelhos entre si.

Diz-se que quando testemunhas diferentes apresentam um relato alargado que não apresenta qualquer detalhe inconsistente, isso pode ser indício de que o relato não é verídico – tratar-se-á de uma narrativa previamente combinada entre todos aqueles que a relatam. Os mesmos eventos, experienciados por pessoas diferentes, tendem a ser relatados de forma diversa, e como cada relato sofre naturalmente algumas distorções (detalhes que foram mal vistos, mal recordados, ou mal comunicados), seria uma enorme coincidência que vários relatos não apresentassem nenhuma inconsistência de detalhe.

É importante, no entanto, notar que é precisamente porque desconfiamos da capacidade humana para relatar em eventos com precisão absoluta que esperamos encontrar alguma inconsistência nos detalhes. Assim, nestes detalhes inconsistentes ninguém poderá justificar elevada confiança.

No que diz respeito às questões importantes, no entanto, espera-se consistência entre os testemunhos. Se os testemunhos não são consistentes, eles não merecem confiança. Repito: se temos um conjunto de relatos de um determinado evento, e tais relatos apresentam várias inconsistências naquilo que não pode ser visto como um detalhe, então nenhum dos relatos merece confiança.

Qual é a situação dos evangelhos? As diferenças entre os quatro evangelhos, no que diz respeito a aferir os factos históricos ocorridos, são de detalhe, ou são significativas? Peço ao leitor que considere as questões que Bart Ehrman coloca a este respeito:

Em que dia morreu Jesus? Antes ou depois da ceia Pascal? E a que horas? Carregou sua cruz sozinho, ou recebeu a ajuda de Simão? Ambos os ladrões achincalharam Jesus, ou só um deles o fez, e o outro defendeu Jesus? A cortina no Templo rasgou-se antes ou depois de Jesus morrer?

Quem foi ao túmulo no terceiro dia? Foi Maria sozinha, ou foi Maria com outras mulheres? Se foi Maria com outras mulheres, quantas mulheres foram? Que mulheres foram? A pedra estava fora do sítio quando chegaram, ou não? O que viram no túmulo? Um homem? Dois homens? Ou um Anjo? O que é que lhes foi dito para dizer aos discípulos? Deveriam ficar em Jerusalém, ou ir à Galileia? As mulheres contaram o sucedido a alguém, ou não? Os discípulos mantiveram-se em Jerusalém? Ou partiram para a Galileia de imediato?

Todas estas respostas dependem do evangelho em questão. A todas elas são dadas respostas explícitas contraditórias em evangelhos diferentes.

E Bart Ehrman nem refere uma série de outras: Jesus foi trazido primeiro perante Caifás ou Anás? Esteve silencioso perante Pilatos ou não? O que dizia o sinal sobre a sua cabeça? Jesus bebeu na cruz? Quem enterrou Jesus? Quais as últimas palavras de Jesus? Madalena reconheceu Jesus quando o viu? E quando Jesus morreru, «Abriram-se os sepulcros, e muitos corpos de santos que dormiam foram ressuscitados; E, saindo dos sepulcros, depois da ressurreição dele, entraram na cidade santa, e apareceram a muitos»?

É possível encontrar mais de 400 inconsistências, grande parte delas relativas a questões que não poderão ser consideradas «detalhes», entre os diferentes evangelhos, ou um número superior se considerarmos ainda os Actos dos Apóstolos.

4 de Julho, 2011 Eduardo Patriota

No Brasil, empecilho para lei do aborto é a Igreja, revelam documentos

Marcela de Jesus – bebê anencéfalo que viveu por 20 meses

O aborto segue como um tema delicado. De forma alguma podemos permitir o assassinato de um feto por puro capricho. A justificativa de um aborto deve ser uma medida extremamente cautelosa, acompanhada por médicos, psicólogos, assistentes socias e outros agentes do governo. Mas, deve-se haver uma justificativa possível. Infelizmente, no Brasil, ainda obrigam grávidas a parirem um feto anencéfalo natimorto. Uma espécie de sadismo que não cabe na mente dos mais esclarecidos. E que, na verdade, não funciona na prática.

O aborto é uma prática comum e continuará sendo. Essa é a conclusão de um telegrama enviado a Washington pela embaixada em Brasília, em 7 de julho de 2004, com uma avaliação da legislação brasileira sobre o assunto. O telegrama obtido pelo site WikiLeaks foi divulgado nesta terça-feira pela Agência Pública, parceira brasileira do site de Julian Assange.

Na conclusão intitulada “leis que não pegam”, o embaixador diz que “apesar de ser ilegal, o aborto é comum aqui e um estudo mostrou que 31% das mulheres grávidas no Brasil fazem aborto. O resultado mais provável desse debate é que o aborto continuará a ser amplamente proibido — com certas exceções — e a proibição continuará a ser amplamente desrespeitada”.

Para os americanos, a oposição da igreja seria um grande empecilho para uma mudança efetiva na lei.  “Apesar da maioria dos brasileiros terem uma mente aberta, a igreja não só se opõe à liminar mas a vê como a ponta do ‘iceberg’ no início de uma série de exceções à proibição do aborto que viesse na prática a legalizá-la”, descreve o telegrama assinado pelo ex-cônsul-geral dos EUA em São Paulo, Patrick Duddy.

28 de Junho, 2011 Eduardo Patriota

Galinha mutante levanta debate religioso em Israel

 

E eu pensando que já tinha visto de tudo…

Uma família judia ultra-ortodoxa mostrou nesta terça-feira (28) uma galinha de quatro patas que nasceu em sua casa, no bairro de Mea Shearim, em Jerusalém. A rara ave levantou um debate religioso sobre seu rótulo de alimento “kosher”, aquele que é considerado puro e por isso é permitido na alimentação de judeus.

Segundo a crença, um animal que tenha órgãos sobressalentes seria considerado impuro (“treif”), mas há quem defenda que isso só é verdade no caso de as patas extras estarem ligadas de alguma forma à bacia da ave, como as patas normais.

Por conta disso, alguns defendem que só se saberá se a carne da galinha é “kosher” ou “treif” depois que o animal for abatido, e sua estrutura, analisada.

Isso prova uma coisa e abre uma dúvida:

Prova que todos judeus ultra-ortodoxos faltaram às aulas básicas sobre biologia, DNA, replicação celular, etc. E a dúvida é: será que esse tempo todo os judeus estavam comendo alimentos proibidos? Será que isso explica os infortúnios deste povo ao longo da história?

25 de Fevereiro, 2011 Eduardo Patriota

Mãe vai à justiça para salvar filho com transfusão

O menino de dois anos não sobreviveria se não recebesse logo uma transfusão de sangue. Ele estava com anemia crônica e diarreia. Mas o seu pai já tinha entregado à direção do hospital um documento que proibia os médicos de adotar esse procedimento. A mãe se rebelou contra o marido a foi a justiça para conseguir a transfusão. Agora, o bebê passa bem.

A família da mãe ficou abalada. A avó, por exemplo, não entende como alguém em nome de uma religião pode deixar o seu filho morrer. “Será que Deus quer que uma criança morra? Isso não é normal, não”, disse ela.

Lembro que no final do ano passado falei sobre o caso onde um casal foi condenado por preferir rezar a levar o filho ao hospital. Vale lembrar que os religiosos não fazem isso por maldade. Eles realmente acham que agindo de tal forma, mesmo que sacrificando um ente querido, estarão agradando a deus. Ou seja, mais vale um filho morto do que desagradar um ser invisível, inaudível, intangível. E isso tem muito mais de egoísmo (o pai quer evitar que deus se aborreça com ele) do que de virtude.

18 de Fevereiro, 2011 João Vasco Gama

Fontes fidedignas, e Evangelhos – III

No primeiro texto a este respeito concluí que, para que um conjunto de relatos mereça muita confiança em relação à descrição de um ou mais eventos, estes devem corresponder às seguintes condições:

-serem feitos por quem observou o(s) evento(s)
-serem recentes face ao(s) evento(s) descrito(s)
-serem feitos por parte desinteressada
-serem de fontes independentes entre si
-serem consistentes

No texto anterior abordei a posição da generalidade dos académicos que estudam este assunto face ao cumprimento, ou não, das primeiras duas condições. Concluí afirmando que a maioria dos académicos acredita que os evangelhos não foram escritos por quem observou os eventos, e a quase totalidade acredita que os evangelhos a que temos acesso foram redigidos décadas depois dos eventos neles descritos.

Basta que uma condição entre várias não se cumpra para que a conjunção delas fique por cumprir. Ainda assim, pretendo analisar neste texto se os evangelhos verificam as duas condições seguintes – serem da autoria de parte desinteressada, e serem de fontes independentes entre si.

Independência das Fontes

Tanto quanto se sabe, os evangelhos emergem da comunidade cristã, que, apesar da seperação geográfica e da informalidade da organização inicial, mantém um grau de união no que diz respeito aos ritos, às crenças, aos valores, que o concílio de Jerusalém procura consolidar. Esta origem, por si, é suficiente para rejeitar a independência destas fontes umas face às outras.

Acrescente-se que, no que diz respeito à origem dos evangelhos segundo S. Lucas e segundo S. Mateus, a maioria dos académicos subscreve a hipótese das duas fontes, segundo a qual os mesmos teriam sido baseados no evangelho segundo S. Marcos e num hipotético documento Q ao qual não temos acesso. Outros subscrevem a hipótese das quatro fontes, onde novamente os evangelho segundo S. Lucas e S. Mateus teriam sido baseados no evangelho segundo S. Marcos, no documento Q, e ainda em outros dois documentos aos quais não temos acesso. No que diz respeito ao evangelho segundo S. João, poucos disputam que o seu autor teve acesso aos restantes evangelhos.

É assim claro que os quatro evangelhos não constituem várias fontes independentes.

Autoria desinteressada

Creio que poucos disputarão o incumprimento desta condição. Ela acontece a dois níveis. Em primeiro lugar, mesmo que os evangelhistas tivessem procurado aferir e descrever os factos de forma independente e desinteressada, ser-nos-ia sempre impossível garantir que o tivessem conseguido. Aliás, são os crentes cristãos os primeiros a laudar a componente transformadora e radical da «Fé em Cristo», e o seu impacto emocional profundo.

Em segundo lugar, nem sequer era essa a intenção dos autores dos evangelhos. Estes foram escritos não com o propósito de efectuar uma descrição desinteressada dos factos ocorridos, mas sim de apelar à conversão dos povos à «Fé em Cristo». Nesse sentido, dada a autoria e o propósito, os evangelhos não se limitam a não cumprir esta condição – eles estão o mais longe possível do seu cumprimento.

13 de Janeiro, 2011 João Vasco Gama

Fontes fidedignas, e Evangelhos – II

No texto anterior a conclusão foi que para que um conjunto de relatos mereça muita confiança em relação à descrição de um ou mais eventos, os relatos devem corresponder às seguintes condições:

-serem feitos por quem observou o(s) evento(s)
-serem recentes face ao(s) evento(s) descrito(s)
-serem feitos por parte desinteressada
-serem de fontes independentes entre si
-serem consistentes

Quem discorda desta conclusão deve discuti-la no texto anterior. Eu vou discutir se os Evangelhos correspondem a estas características, em particular se os evangelhos foram escritos por quem observou o evento, e se são recentes face aos eventos descritos.

Note-se que, caso fosse possível concluir que os evangelhos tinham sido escritos pelas testemunhas oculares dos eventos relatados pouco depois dos mesmos terem ocorrido, isso não implicaria que os mesmos fossem fidedignos. Faltaria ainda verificar que verificariam as restantes condições enumeradas.

É preciso dizer que aferir, ou saber se é impossível fazê-lo, os autores dos diferentes evangelhos, e a data de escrita dos mesmos não é um assunto trivial. É necessário um grande estudo, dedicação e bases para conhecer os factos que permitem tirar as melhores conclusões a esse respeito, e ser capaz de os interpretar de forma cientificamente adequada. Como não sou um historiador nem escrevo para um público de historiadores, opto por expor as conclusões que a generalidade dos especialistas no assunto tiraram a partir dos dados a que têm acesso.

Evangelho segundo Marcos
O evangelho em si é anónimo (o autor não revelou a sua identidade), mas a tradição cristã inicial atribuiu este evangelho a S. Marcos, que se teria baseado no testemunho de S. Pedro. A opinião da maioria dos académicos é que a tradição está errada, e a autoria deste evangelho é desconhecida. Esta opinião é baseada na linguagem em que o texto foi escrito (grego, num estilo muito erudito; ao invés do aramaico comum que seria de esperar) e na heterogeneidade das fontes que usou. Ainda assim, há vários académicos que consideram a tradição cristã inicial credível.
Já no que diz respeito à data do evangelho, existe consenso entre os especialistas: terá sido escrito perto do ano 70 d.C., na Síria. A maioria dos académicos acredita que este foi o primeiro dos evangelhos conhecidos. Ele terá sido escrito várias décadas depois dos eventos que relata.

Evangelho segundo Mateus
O evangelho em si é anónimo (o autor não revelou a sua identidade), mas a tradição cristã inicial atribuiu este evangelho a S. Mateus, o cobrador de impostos que se teria tornado discípulo de Jesus. A opinião da maioria dos académicos é que a tradição está errada, e a autoria deste evangelho terá pertencido a um judeu-cristão que o teria escrito no início do século primeiro, originalmente em grego (e não uma tradução do aramaico ou hebraico). Outros académicos acreditam que a tradição não está errada, e que, tendo sido S. Mateus um cobrador de impostos, faria pouco sentido atribuir-lhe erroneamente a autoria de um evangelho.
Embora exista discordância quanto a qual dos dois evangelhos, Marcos ou Mateus, terá sido escrito primeiro, sendo a opinião maioritária a de que Marcos precede Mateus, a data da escrita deste evangelho é colocada entre 70 d.C. e 110 d.C. Uma minoria de académicos acredita que o evangelho pode ter sido escrito a partir de 63 d.C., novamente várias décadas depois dos eventos que relata.

Evangelho segundo Lucas
O evangelho em si é anónimo (o autor não revelou a sua identidade), mas a tradição cristã inicial atribuiu este evangelho a S. Lucas, um companheiro de S. Paulo. Este autor terá sido, na opinião generalizada, o autor dos «Actos dos Apóstolos».
O autor, quem quer que fosse, tinha uma educação muito superior à da generalidade da população, era muito viajado e muito bem relacionado, a forma como escrevia (grego) revelava uma erudição elevadíssima. Os académicos dividem-se entre os que acreditam que a tradição não está errada, e os que acreditam que o autor deste evangelho teria sido um cristão gentio anónimo. Entre os que acreditam nesta última possibilidade existe quem acredite que o autor teria tido acesso a testemunhas oculares dos eventos descritos, e os que acreditam que tal não terá sido o caso. Aquilo que é comum a estas três possibilidades é que o autor não terá sido, ele próprio, testemunha dos eventos que descreve.
A generalidade dos académicos acredita que este evangelho terá sido escrito entre 80 d.C. e 90. d.C., mas alguns acreditam que pode ter sido escrito entre 60 d.C. e 65. d.C., em qualquer dos casos décadas depois dos eventos descritos no evangelho.

Evangelho segundo João
O evangelho em si é anónimo (o autor não revelou a sua identidade), mas a tradição cristã inicial atribuiu este evangelho a S. João, alegadamente o “discípulo amado” de Jesus. A opinião da maioria dos académicos é que a tradição está errada, e a autoria deste evangelho é desconhecida. Esta opinião é baseada no facto de S. João ter sido, tanto quanto se sabe, analfabeto, ao invés de fluente em filosofia helenística como a escrita deste evangelho – novamente escrito em grego com um estilo revelando erudição – exigiria. Uma minoria de académicos disputa esta alegação fazendo notar que a tradição não surgiu subitamente, mas ao invés existiria uma continuidade tal que poderia indiciar que, se S. João não tivesse escrito o evangelho, te-lo-ia influenciado de forma decisiva.
A generalidade dos académicos acredita que o evangelho terá sido escrito entre 90 d.C e 100 d.C. Uma minoria de académicos acredita que a ausência de referências à destruição do templo de Jerusalém será indício de que a data da escrita do evangelho possa ser pouco anterior a 70 d.C. Em qualquer dos casos décadas depois dos eventos descritos no evangelho.

Evangelhos não-canónicos
O consenso generalizado é de que não foram escritos por testemunhas directas dos eventos descritos, e décadas depois dos mesmos terem ocorrido.

Conclusões:
A opinião maioritária entre os académicos é a de que os diferentes evangelhos não foram escritos por quem observou directamente os eventos descritos. Alguns académicos sérios podem contestar esta afirmação no que diz respeito a alguns dos evangelhos, mas a generalidade dos especialistas considera que as evidências são suficientes para afirmar que a hipótese mais provável é que os evangelhos tenham sido escritos por anónimos que terão relatado aquilo que lhes contaram.
Aquilo que imediatamente descarta os evangelhos como fontes de confiança em relação aos eventos neles descritos, é o facto de, de acordo com todos os académicos sérios, nenhum deles ter sido escrito e compilado menos de dez anos depois dos eventos descritos; pelo contrário, todos os evangelhos terão sido escritos várias décadas depois dos eventos que relatam.

E se porventura os evangelhos tivessem sido escritos por testemunhas directas dos eventos ocorridos, pouco depois dos mesmos terem lugar? Será que os poderíamos considerar fontes fidedignas? Para isso teremos de aferir se cumprem as restantes condições, que é o que farei no próximo texto sobre este assunto.

11 de Janeiro, 2011 João Vasco Gama

Fontes fidedignas, e Evangelhos – I

Um historiador geralmente não tem acesso directo aos factos históricos. Ele tenta, a partir dos diferentes indícios, estabelecer as hipóteses mais prováveis que com eles são compatíveis. Consoante a abundância e fiabilidade dos diferentes indícios, o historiador pode ter mais ou menos confiança numa determinada hipótese.

Por exemplo, podemos ter muita confiança que António Oliveira Salazar nasceu muito perto de Santa Comba Dão. Podemos ter muita confiança que Napoleão Bonaparte mandou invadir Portugal. Podemos ter muita confiança que Júlio César foi assassinado no Senado.

O que nos faz ter muita confiança num determinado facto histórico, seja ele qual for?

Uma condição necessária é a existência de muitos relatos consistentes contemporâneos com o evento. Esta condição é necessária, mas insuficiente para atribuir à ocorrência do evento uma confiança muito elevada.

Um relato, por si, pode consistir numa descrição adequada daquilo que se passou, mas pode também consistir numa descrição distorcida ou falsa, seja a distorção ou falsidade devida a equívoco, mentira deliberada, ou algo de ambos.

O que é que pode condicionar a confiança que se deve depositar num relato?
Em primeiro lugar, saber se o autor teve acesso directo ao que relata, ou se relata algo que outros lhe contaram.
Em segundo lugar, saber se o autor relata o evento pouco depois de ter acontecido, ou muito depois.
Em terceiro lugar, aferir se o autor é parte desinteressada, a nível material ou emocional, nos eventos que descreve.

O que é que pode condicionar a confiança que se deve depositar num conjunto de relatos que descrevem um mesmo evento?
Em primeiro lugar se cada um dos relatos é independente dos outros.
Em segundo lugar se são consistentes entre si.

É verdade que uma consistência excessiva entre dois relatos pode também ser um indício da fabricação dos mesmos. Se duas testemunhas em tribunal relatam um acidente com exactamente as mesmas palavras, será razoável suspeitar de concertação entre ambas. É natural que ambas expliquem o que viveram em termos diferentes, ou mesmo que ocorra um equívoco de pormenor aqui e ali e que portanto os relatos honestos de ambas as testemunhas tenham inconsistências ligeiras.
Mas se quatro ou cinco testemunhas relatam o evento com inconsistências muito significativas entre as versões, é natural que se tenha pouca confiança no testemunho de cada uma delas, pelas contradições que tem com os restantes. Neste sentido, inconsistências relevantes entre as fontes é algo que deve diminuir a nossa confiança nestas.

Resumindo, para que um conjunto de relatos mereça muita confiança em relação à descrição de um ou mais eventos, os relatos devem corresponder às seguintes condições:

-serem feitos por quem observou o(s) evento(s)
-serem recentes face ao(s) evento(s) descrito(s)
-serem feitos por parte desinteressada
-serem de fontes independentes entre si
-serem consistentes

Em que ponto estamos no que diz respeito aos evangelhos?
Vou explorar este assunto no meu próximo texto.

17 de Dezembro, 2010 Eduardo Patriota

No Brasil mais de 24% do tempo na TV é para religião e compras

Eu ainda continuo achando que se tivéssemos mais ciência nas TVs, teríamos menos religiosos fundamentalistas. Infelizmente, não é o que ocorre no Brasil. Tanto nas TVs quanto nas rádios, há uma invasão de igrejas neopentecostais que ficam o dia todo passando orações, milagres e curas feitos pelos donos das igrejas, além de (claro) pedir o dízimo ou mesmo o trízimo (sim, há uma igreja que prega que você deve dar 30% do que ganha).

Levantamento da Agência Nacional do Cinema (Ancine) constatou que 24,1% da programação das TVs abertas no Brasil estavam destinados a telecompras e religião em 2009. A CNT, por exemplo, responde sozinha por 29,4% dos programas que tratam desses temas em toda a TV aberta. Na sua grade, o peso supera os 50%.

João Brant, membro da Coordenação Executiva da Intervozes, organização não governamental que defende o direito à comunicação, critica o excessivo espaço dedicado à religião e a falta de pluralidade religiosa:

“Não existe preocupação com a diversidade. O problema maior é o proselitismo religioso. Tem que haver respeito à liberdade de crença. Há espaços dedicados na TV para apenas uma religião. E ainda há ataques a outras crenças.”

Pelo levantamento, a CNT é a emissora que mais dedica tempo a esses programas (64,1%), enquanto a TV Gazeta vem logo atrás, com 58,8%. Em seguida, vêm a Rede TV!, com 38,6%, a Band, com 28% e a Record, com 21,5%.