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Uau!… Vem aí o Papa… uau!…

Por

ONOFRE VARELA

Vi (todos nós vimos nos telejornais) uma cena patética protagonizada pelo presidente da República anunciando a vinda do Papa a Portugal, como se estivesse a anunciar ter saído o Euromilhões a dez milhões de portugueses!… A nossa república laica tem um presidente mais católico do que republicano, que rejubila com as coisas da Igreja como se fizessem parte da ementa pantagruélica que o alimenta (para sobremesa escolhe futebol)!

Muitos anos antes de Marcelo se candidatar à presidência da República, pasmei, num domingo, vendo que todas as televisões ocuparam a tarde de antena transmitindo em directo uma procissão que passeava um andor com a imagem seráfica da senhora de Fátima pela baixa lisboeta; e ele lá estava, num palanque, junto aos bispos que exibiam sorrisos beatos e teciam elogios àquele cortejo patético que transportava uma imagem, ao estilo daquela passagem bíblica que enfureceu Moisés ao ver que o seu povo hebreu promoveu um bezerro de ouro a entidade divina e organizou uma procissão com o mamarracho de ouro passeado em andor!

Deve estar tudo maluco!… Rejubilar porque camionetas, comboios e aviões vão despejar jovens inconscientes (como é próprio da juventude) em Lisboa para rezarem o terço… e o presidente da República já rejubila por antecipação?!… Provavelmente eu não serei deste mundo! Não encontro pinga de interesse nacional (como Marcelo diz ter) nesse encontro de jovens numa missa papal!…

Ouvi na Rádio Renascença a palestra habitual de um sacerdote, muito entusiasmado com a vinda dos jovens e do patrão da sua igreja a Lisboa, e não me pareceu mal aquele seu entusiasmo, por duas razões: primeiro, porque ele próprio tinha participado na organização do processo que haveria de ser contemplado com a vindo do papa; e depois porque a Rádio Renascença é da Igreja… está a jogar em casa e tudo quanto passa naquela antena tem o cunho católico. Por aí está tudo bem… mas a nível nacional, com tanta coisa séria a preocupar a sociedade portuguesa, com banqueiros ladrões, políticos desonestos, professores desempregados, enfermeiros e polícias descontentes, e uma juventude com o futuro comprometido por razões políticas e económicas que o governo não resolve, rejubila-se porque vem aí o Papa, com mocinhas e mocinhos, rezar o terço num fim de semana? Isto é verdade?!… É droga anestesiante, ou estou a sonhar?…

A importância das coisas obedece a uma hierarquia. Por muito importante que eu considere o jogo do pião, ele não se sobrepõe às verdadeiras importâncias do país, que são os problemas económicos e sociais que fazem o evoluir da sociedade. Aceito a importância que terá ver o papa para aqueles que o adoram e querem jogar o pião com ele… mas é igual a ver a Madona… também há quem a adore, embora não contribua para a felicidade dos portugueses, nem, tão pouco, para quem mora na rua onde ela comprou casa.

(Texto de Onofre Varela para a edição do jornal Gazeta de Paços de Ferreira do dia 7 de Fevereiro)