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  • 12 de Novembro, 2012
  • Por Carlos Esperança
  • Vaticano

A Igreja católica e os milagres

Há quem pense que o Vaticano só tem para vender água benta, bênçãos e indulgências, produtos que o mercado da fé absorve na razão inversa do bem-estar das populações.

A vendas de títulos eclesiásticos de cónego, bispo e cardeal, com as respetivas funções e proventos, foi o abominável pecado da simonia que os protestantes condenaram, depois de verem os papas medrar com o negócio. Hoje, o Papa é mais cuidadoso mas ainda nos tempos de Salazar e Franco eram os ditadores que tinham a última palavra nas escolhas episcopais que, aliás, as concordatas lhes concediam.

As Igrejas vivem do fausto e do poder. Abandonadas ao negócio por conta própria não prosperam. Os cargos eclesiásticos são negociados em segredo com os Estados que lhes são fiéis ou com as oposições dos Governos de que não gostam.

Acontece que os principais produtos de exportação da ICAR, que rendiam muito ouro, entraram em decadência por saturação do mercado ou desinteresse da clientela. Já não se compram relíquias. A água de Lourdes, o ramo de azinheira benzido em Fátima ou o terço comprado no Vaticano vendem-se com dificuldade, ao preço da uva mijona. Já lá vão os tempos dos relicários com pedacinhos do santo lenho, farrapos das fraldas do menino Jesus ou ossos de S. Francisco. O raio do carbono 14 estragou o negócio pio.

As bulas que autorizavam comer carne à sexta-feira, compradas por pessoas que não tinham dinheiro para a ementa, desapareceram por falta de fé e de interessados. As indulgências plenárias passaram a ser de borla e só a liturgia dos batizados, casamentos e funerais ainda se aguentam no mercado. As procissões, onde as notas pregadas com alfinetes nas vestes do santo de serviço servem para exibir a vaidade dos benfeitores e suprir as necessidades do clero, rendem cada vez menos.

O Purgatório, uma mina em atividade durante séculos, foi encerrado por falta de visão ou de transportes para o Paraíso, depois de fortunas gastas em missas para sufragar as almas dos que se finaram com pecados veniais.

Atualmente restam dois negócios à ICAR, as peregrinações e a indústria da santidade, dependentes as primeiras da produção da segunda. A indústria da santidade, pelos emolumentos que rende à Cúria romana e pelos óbolos que atrai aos santuários onde o canonizado se encontra esculpido numa peanha ou colado a um andor, é a última fonte de rendimento com produtos pios.

O resto, e é a grande fonte de receita, é o património que as devotas almas deixam em testamento nos países onde a promiscuidade com o clero exonera de impostos o esbulho feito aos moribundos. É altura de tributar os bens da ICAR e de averiguar como foram obtidos.