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Mês: Outubro 2009

28 de Outubro, 2009 Carlos Esperança

O princípio de uma nova tragédia?

Por

E – Pá

A “Esplanada das Mesquitas”, ou o “Monte do Templo”, são locais sagrados dos muçulmanos e dos judeus, em Jerusalém.
Esta área de 14 hectares no centro da Cidade Velha de Jerusalém, no sector árabe, faz parte de uma zona anexada por Israel em 1967.
Tem sido o fermento de constantes conflitos israelo-palestinos.

O rabino Yosef Shalom Elyashiv, um dos mais respeitados peritos na Tora em Israel, declarou que o perigo de criar tensões e derramamento de sangue são mais uma razão para que os judeus não visitem a Esplanada das Mesquitas.
Esta declaração é feita a 8 Out 2009.

A 25 Out 2009 forças militares e policiais israelitas intervêm neste local por supostos incidentes entre palestinos muçulmanos…

Depois dos “novos” colonatos na Cisjordânia, mais uma outra provocação para o Mundo e a desautorização de Obama…que, neste preciso momento, se confronta com o problema nuclear iraniano.

27 de Outubro, 2009 Ricardo Alves

A raiz do problema

No Diário de Notícias, e talvez sem se aperceber, João Miguel Tavares (JMT) vai à raiz do problema levantado por Saramago. E a raiz do problema é esta: «só quem acredita que a Bíblia tem alguma relação com a palavra de Deus está habilitado para sobre ela fazer considerações éticas». JMT, note-se, não põe em causa a liberdade de expressão: o que ele reprova é que quem não tem fé se pronuncie sobre a Bíblia. Na sua opinião, «um ateu (…) tem de olhar para a Bíblia como olha para outro livro qualquer: estética e nada mais». Mais concretamente: «faz tanto sentido o ateu Saramago dizer que “a Bíblia é um manual de maus costumes” como faria dizer que “as obras de Shakespeare são um catálogo de barbaridades”».

Acontece que eu desconfio (e com boas razões) que quando alguém diz a JMT que as obras de Shakespeare retratam o pior da natureza humana, ele concorda e encolhe os ombros. Pelo contrário, quando  Saramago disse o mesmo da Bíblia, ele deu um pulo e foi escrever um artigo de jornal. É justamente por a Bíblia ser a «palavra de Deus» para tanta gente que não a podemos tratar como as obras completas de Shakespeare. Ninguém se apoiou nas obras de Shakespeare para defender a Inquisição, a escravatura, ou ditadura de Salazar. Ninguém fica indignado por se dizer que há episódios hediondos na dramaturgia shakespeareana. Pelo contrário, muita gente utilizou (e utiliza) a Bíblia para transformar a «palavra» (más palavras) em «acção» (más acções).

Como ateus, é evidente que sabemos que a Bíblia é literatura (geralmente da má, mas essa é apenas a minha opinião «estética»). Mas enquanto tanta gente a considerar como um livro «especial», não podemos tratá-la como se fosse mera literatura inconsequente.

[Diário Ateísta/Esquerda Republicana]
26 de Outubro, 2009 Raul Pereira

Manutenção

Durante as próximas horas vamos proceder à manutenção do blog. Prometemos ser rápidos. Obrigado pela compreensão.

Actualização: tudo novo!

26 de Outubro, 2009 Ricardo Alves

Um silogismo delicioso

Encontrado no Que Treta!:

«1 – Jesus morreu crucificado para nos salvar
2 – Os romanos crucificaram Jesus
3 – Os Romanos salvaram-nos».

26 de Outubro, 2009 Carlos Esperança

“O Ódio de Vasco Pulido Valente…

Por

Daniel Nicola

Não se conhece a Vasco Pulido Valente uma palavra simpática sobre seja o que for. Preso no século XIX de onde nunca conseguiu sair, esta múmia a quem ficámos a conhecer (para além da prosa execrável) a voz estridente e irritante naquela parelha única da TV que a censura fez o triste favor de tirar do ar, dedica hoje* a sua crónica de ódio a José Saramago. Não pelo seu livro, não pelas suas declarações. Apenas porque Saramago não foi parido pela elite burguesa e decadente que ao país só trouxe atraso e miséria.

Para VPV as ideias de Saramago são “de trolha ou tipógrafo semi-analfabeto”, produto da senilidade dos seus “80 e tal anos”. O Nobel foi atribuído como a “vários camaradas que não valiam nada” e é lido por milhões de pessoas “acéfalas que nem distinguem a mão esquerda da mão direita.” VPV não reconhece “a Saramago a mais remota autoridade para dar a sua opinião sobre a bíblia ou sobre qualquer outro assunto”. Essa suposta autoridade só lhe deve ser concedida porventura a ele próprio que opina acerca de tudo dizendo pouco mais do que nada, mantendo porém sempre o indelével traço da arrogância e altivez. Depois vem a velha lenga-lenga do PREC e do DN há muito desmentida, quer por Saramago, quer por quem o acusava, mas parece que tal não teve eco nas masmorras do séc. XIX onde VPV está agrilhoado.

Mas a sobranceria e desdém não acabam aqui: “Saramago está mesmo entre as pessoas que nenhum indivíduo inteligente em princípio ouve” e a pérola final diz tudo sobre o carácter do seu autor: “D. Manuel Clemente conhece com certeza a dificuldade de explicar a mediocridade a um medíocre e a impossibilidade prática de suprir, sobre o tarde, certos dotes de nascença e de educação.” Ou seja, resume tudo à falta de berço, argumento tão querido à nata da sociedade que passados quase 100 anos sobre a fundação da República ainda não entendeu (apesar de todas as obras e teses por ele publicadas) nem o seu significado, nem sequer a premissa de que somos Homens iguais a quem se devem dar iguais direitos e iguais oportunidades. E é por isso que destila diariamente o ódio a tudo e a todos que vêm de baixo, aos que sobem a pulso, aos que não se deixam vencer pela sua condição social, aos que indo da “província” para Lisboa não se intimidam pelas elites que ainda se julgam aristocráticas por viverem das rendas que os negócios do estado proporcionam, bem mais lesivas para o país do que os supostos milhões perdidos para os pobres preguiçosos do RSI a quem todos culpam.

A verborreia de VPV é bafienta e rancorosa. Nada mais. Um produto de quem pouco vivendo prefere o ataque à vida dos outros. VPV coloca-se num pedestal tão alto que acaba por pouco ou nada ver, e quando vê, vê desfocado pela névoa do preconceito.

E conclui: “O que espanta neste ridículo (…) é a extraordinária importância que lhe deram criaturas com bom senso e escolaridade obrigatória”. Deve estar a pensar nele próprio, pois acabou por lhe dedicar toda a sua crónica no Público, e logo na irrelevante última página do jornal… Quem se espanta sou eu perante espantalhos destes!

* Texto enviado em 23 ct.

25 de Outubro, 2009 Ludwig Krippahl

Treta da semana: Leitura simbólica.

A propósito das declarações de Saramago, que a Bíblia é um «manual de maus costumes», teólogos e sacerdotes têm apontado que ler a Bíblia é uma coisa muito complicada. Como disse Carreira das Neves em debate com Saramago, a Bíblia tem infinitas leituras (1). Mas isso quase tudo tem e, retorquiu Saramago, por muitas interpretações que se dê a um texto não se pode esquecer o que lá está escrito.

Um problema que este episódio revela é a noção que alguns iluminados católicos sabem, com o saber de quem sabe, qual a interpretação certa para cada passagem. Por exemplo, o Filipe Noronha, no Companhia dos Filósofos, escreve acerca de Saramago que «mesmo para quem se diz ateu, a sua interpretação do texto e a mensagem que nos quer fazer chegar é […] um sinal claro de que devemos insistir na luta contra este tipo específico de ignorância.»(2) Mas dizer que a interpretação de Saramago é ignorante implica haver conhecimento. E, acerca disto, não há. Podemos ler tudo o que os cristãos escreveram acerca da Bíblia, de Aquinas a Ricoeur passando por Kiergegaard e C. S. Lewis, e o que vamos encontrar – nos duzentos mil livros que Carreira das Neves mencionou – é só opiniões. Para ser conhecimento precisavam assentar a opinião em algum processo fiável, testável e independente de opções subjectivas. Julgam que interpretam bem, cada um com a sua interpretação. Mas não sabem.

E isto de exigir «uma compreensão da Bíblia enquanto texto literário para verdadeiramente chegar ao seu sentido»(3) é moda recente. Só a partir do século XIX é que a exegese católica começou a considerar a Bíblia literatura. Antes disso defendiam uma interpretação literal. Daí que, quando afirmam que não se deve ler a Bíblia à letra, de uma forma a que chamam “banal”, contradizem dezoito séculos de tradição católica e outras variantes contemporâneas de cristianismo.

E a letra continua lá. Podemos interpretar o livro de Jó como uma crítica à justiça retributiva, mas é ainda verdade que Jahve e Satan submeteram o desgraçado a uma injustiça intolerável. Podemos ler o sacrifício de Abraão como um salto de fé, a solução para um dilema impossível, algo com um significado existencial tão profundo que não serve para nada. Mas não podemos negar que o texto exalta um personagem disposto a matar o filho em nome da religião. E isso é um mau costume. Qualquer pessoa civilizada reconhece que a liberdade religiosa acaba muito antes do infanticídio. Mesmo sendo legítimo aos católicos darem outras interpretações a estes textos, essas não anulam o que lá está escrito.

E há episódios que nenhuma (re)interpretação pode safar. Moisés desce da montanha e manda chacinar uma data de gente por ter um deus diferente. Deus manda matar cidades inteiras, destrói Sodoma e Gomorra por causa de preferências sexuais, transforma uma mulher em sal só porque olhou para trás, mata os primogénitos no Egipto só porque o Faraó era teimoso e assim por diante. Se os lermos como obra humana, estes relatos explicam-se pelo contexto cultural. Eram pessoas menos esclarecidas, intolerantes, sem respeito pela liberdade religiosa, privacidade e outros direitos fundamentais. Mas se é um livro inspirado por um deus então esse deus é horrível. Esse deus permitiu – e permite – que se façam coisas terríveis em seu nome. Se apedrejar uma rapariga até à morte por ter relações sexuais antes de casar não é um mau costume, não sei o que possa ser.

Finalmente, muitas interpretações pouco ajudam. O Novo Testamento relata como Jesus cresceu, liderou um grupo de crentes e foi morto na cruz. Os cristãos interpretam isto como um sacrifício do seu deus que, tornando-se homem, morreu e ressuscitou para nos redimir e mostrar que a morte pode ser vencida. O que é uma afronta ao sofrimento humano. Ser torturado e morrer é terrível, mas é terrível para quem é mortal, quem perdendo a vida perde tudo, quem não se pode defender do mal que lhe causam e deixa filhos órfãos e família desamparada. Um deus eterno, omnisciente e omnipotente, que com um pensamento podia ter transformado os soldados romanos em bolacha Maria, nunca esteve em perigo nem fez sacrifício nenhum. Fez teatro. E de mau gosto. É como ir à Etiópia, passar lá uma tarde sem lanchar e, de volta a casa, mandar àquela gente que morre à fome um postal da jantarada para terem esperança de vencer o seu jejum.

Muito pouco na Bíblia é compatível com os valores da civilização moderna. Quem preza a liberdade e a justiça não pode concordar nem com o antigo testamento, com um deus tirano que castiga e tortura só porque lhe apetece, nem com o novo testamento, em que o mesmo deus se faz inocente e se finge matar para nos dar esperança ou mostrar que morrer na cruz é amor. É claro que podemos reinterpretar a Bíblia à luz dos nossos valores. É sempre possível inventar que tudo o que parece mal é metáfora para outra coisa que vá escapando. Mas é incorrecto vender esta reinterpretação, muito forçada, como conhecimento. É mera opinião. E seria mais prático e honesto admitir, de uma vez por todas, que a Bíblia é um conjunto de obras literárias escritas por humanos. De grande valor histórico e cultural, com passagens bonitas, e com as falhas e caducidade de qualquer obra humana. O texto faz parte da nossa cultura mas a mensagem, felizmente, deixou de ser relevante.

Em simultâneo no Que Treta!

1- SIC, 23-10-09, Frente-a-frente, José Saramago e Joaquim Carreira das Neves
2- Filipe Noronha, 23-10-09, Todos temos razão.
3- Agência Ecclesia, Saramago faz releitura banal da Bíblia. Via (2).
4- Catholic Encyclopedia, Biblical Exegesis

25 de Outubro, 2009 Fernandes

O Deus do Clero

Este Deus é totalmente autónomo. Absoluto. Encerra tudo em si mesmo. É completamente diferente de tudo o que existe, pelo menos assim é descrito em todos os catecismos, e assim configurado, é como melhor serve e menos prejudica os interesses do Clero.

O Deus do Antigo e do Novo Testamento em nada difere do Zeus grego, do Júpiter romano ou Wotan germano. Todos são deuses despóticos, violentos e cheios de ciúme. Muitos duvidam da teologia que se encarrega da concepção de Deus, da fundamentação e das consequências que daí advêm para a vida dos homens. Não vai longe o tempo em que os Padres (a quem Deus investiu como donos-da-Verdade), ensinavam na catequese os muitos detalhes da natureza e vontade do “Deus-Verdadeiro”. Explicavam: «só o que a Igreja Católica ensina, é que foi revelado por Deus». Significa isso que nenhuma Igreja a não ser a Católica, está bem informada? Deus só se revela às suas ovelhas de forma indirecta? Os crentes só obtêm verdades em segunda mão? O Catecismo Católico continua a ensinar: «Deus permite o sofrimento, para que façamos penitência pelos nossos pecados para podermos obter a recompensa eterna». Assim sendo, milhares de sofredores, de assassinados (especialmente os assassinados pelo Clero), só padecem a dor para poderem obter a recompensa celestial? O catecismo, como código moral que é, continua: «os condenados ao Inferno sofrem mais do que qualquer homem pode imaginar. Padecem os tormentos dos fogo…e habitam na companhia do Diabo». Nos anos sessenta, estes absurdos, eram “Matéria de Fé” . O Clero, agora, não opina de maneira igual sobre este assunto. Ter-se-á então equivocado? Não é válido, hoje, aquilo em que éramos obrigados a acreditar firmemente, há trinta anos apenas?

– O Pecado é uma ofensa ao amor paterno, o perdão só Ele o pode conceder -. As interacções deste tipo, persistente e regularmente repetidas, são os factores constituites de qualquer religião. Às pessoas expostas a semelhante manipulação mental, estes mecanismos convertem-se em estruturas psíquicas solidificadas. As interacções entre Deus-Pai e Deus-Filho são petrificadas e convertidas em esquemas organizacionais abstractos (patterns) de modo que, os actos de demonstração amorosa como, a oração, o arrependimento e a obediência, provocam de maneira automática, as contrapartidas correspondentes, – o amor paternal de Deus! – Um deus que ama os seus, na condição de que estes acreditem que ele existe e Lhe obedeçam segundo a Sua vontade. Um Deus que ameaça com sofrimento eterno quem se atreve a questionar o seu amor ou a sua existência.

Deus não existe, o Clero sim. Este servir-se-á sempre da religião como do pão para a boca. Intitulam-se intérpretes de Deus, numa indisfarçável soberba e ganância pelo poder. Para eles a religião é o “emprego”. No dia em que o cristianismo se mostrar irremediavelmente inútil aos seus interesses, substituirão esta, por outra cosmovisão mais rentável.

Quem se atreverá a exigir de Deus, gestos de amor que possam, eventualmente, divergir dos interesses do Clero?

 

24 de Outubro, 2009 Ricardo Alves

Ateísmo e anti-teísmo

No seu artigo de hoje no Diário de Notícias, o padre católico Anselmo Borges distingue o Caim de Saramago das declarações do escritor sobre a Bíblia. Gostou do livro, classifica as declarações como «ignorância arrogante». Afirma que «perante o Deus de Saramago, só haveria uma atitude digna para o crente: ser ateu».

Já li e ouvi muitos católicos dizerem isto. Acontece que estão a incorrer numa confusão. Não é por fazer um juízo de valor (ético) sobre o Deus da Bíblia que eu sou ateu. É por fazer um juízo de facto (científico) sobre as alegações da existência de «Deus», sobre a origem do universo, sobre a «vida depois da morte» e sobre a «ressurreição», que sou ateu. E comigo muitos outros, que fundamentam (quando necessário) o seu ateísmo em Bertrand Russell, Carl Sagan ou Richard Dawkins, e na ciência em geral.  Somos ateus porque temos a certeza quase total de que aquele «Deus» não pode existir no universo que conhecemos. A questão de saber se o «Deus» da Bíblia e das suas múltiplas intepretações é justo, cruel ou tirânico é uma questão separada, e que não nos torna mais ou menos ateus.

Efectivamente, eu rejeito que o «Deus» da Bíblia seja justo, amoroso ou misericordioso. Mas isso não tem nada a ver com a questão da existência. É por saber (com um grau de certeza maior do que saber se vai chover amanhã) que não existe, que sou ateu. Se eu estivesse convencido da existência de «Deus», a questão seria outra. Em primeiro lugar, não seria ateu. Mas, por rejeitar as suas crueldades e ensinamentos imorais, não lhe prestaria culto e revoltar-me-ia contra os seus actos. Seria, então, anti-teísta. O que é outra coisa.

[Diário Ateísta/Esquerda Republicana]