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Mês: Fevereiro 2006

9 de Fevereiro, 2006 Ricardo Alves

Por um punhado de cartunes: laicidade e clericalismo

Aconteceu-me um dia, já não sei a propósito de quê, falar do meu ateísmo a um muçulmano com quem estava sentado à mesa. O meu comensal rapidamente me informou, com veemência, de que eu não podia dizer o que pensava. Ainda me recordo de como fiquei atónito.

Serve isto, hoje, para sublinhar que ceder na expressão do que pensamos pode começar na censura de caricaturas de Maomé, mas no limite leva a que eu não possa dizer que sou ateu. Como é evidente, não me podem impedir de pensá-lo no mais inalienável dos meus espaços de liberdade: os 1100 ou 1200 centímetros cúbicos da minha caixa craniana. Mas qualquer ateu que não esconda o que pensa é uma ofensa ambulante para os islamistas.

A polémica actual foi originada por caricaturas que poderiam ser mais pertinentes (é pena que se limitem à violência terrorista de indubitável inspiração maometana, e não foquem as mutilações sexuais efectuadas a coberto de algumas tradições islâmicas, ou a opressão das mulheres justificada pelo Corão) e que foram publicadas num jornal tão «religiosamente correcto» que nem se atrevera a publicar cartunes anti-cristãos. No entanto, a polémica pôs a nu o fanatismo e o totalitarismo de alguns muçulmanos extremistas que desejam condicionar a liberdade de expressão (e o decorrente direito à blasfémia) de países em que não vivem e que talvez nem saibam situar no mapa. E desencadeou um debate sobre os limites da liberdade de expressão, no qual felizmente quase todos concordamos que o único limite consensual será a difamação, que se determina nos tribunais (embora existam bons argumentos a favor da ilegalização do incitamento à violência). Os que não concordam têm estado silenciosos, mas mais tarde ou mais cedo tentarão aproveitar a cobardia de alguns governos (incluindo o nosso) que não fizeram o que se requeria: afirmar que os cidadãos são livres de dizer disparates e de se insultarem uns aos outros, por muito gratuitas que algumas provocações pareçam, desde que assumam a responsabilidade pelo que fazem.

No Diário Ateísta, já levamos mais de dois anos em que temos blasfemado todas as semanas, senão mesmo todos os dias. Sempre o fizemos conscientes da distinção entre ridicularizar ideias e pessoas. As últimas merecem-nos respeito, entre as primeiras há as erradas (o criacionismo ou a ressurreição) e as liberticidas (a autoridade do clero em matérias políticas ou éticas, por exemplo). As reacções ao que escrevemos, pelo contrário, já passaram por insultos e ameaças, geralmente com aquela «coragem» que o anonimato confere (pela nossa parte, assinamos tudo o que escrevemos).

Acompanhámos cuidadamente, no Diário Ateísta, a lei sobre o «incitamento ao ódio religioso» no Reino Unido (a propósito: foi aprovada, com alterações, a semana passada). Demos conta do caso do livro que conta a vida de «Jesus Cristo» em banda desenhada, que foi proibido na Grécia (o autor chegou a ser condenado a uma pena de prisão). Noticiamos muitos outros casos de blasfémia. No entanto, nunca houve tanta agitação por um caso de blasfémia. Nem quando Hashem Aghajari foi condenado à morte no Irão, nem quando Younus Shaik esteve preso no Paquistão, nem quando um director de uma revista afegã foi preso. A presente crise internacional, que se deve a um punhado de cartunes, só é possível porque muitos muçulmanos ainda não compreenderam que a religião não pode ser critério englobante da vida social, e portanto tentam condicionar até sociedades em que os muçulmanos são uma pequena minoria. Se os muçulmanos se reduzissem a tentar limitar a liberdade de expressão nos países em que se crêem maioritários (como fazem os católicos, quase tão totalitários como os muçulmanos) não haveria escândalo. O total totalitarismo (passe o pleonasmo) e a violência, tornaram o Islão o maior problema internacional da actualidade.
9 de Fevereiro, 2006 Carlos Esperança

Fé e hipocrisia

Caricaturas de Maomé

O Islão não é a apenas a mais estúpida das religiões, consegue ser também a mais hipócrita.

A horda histérica que ulula contra a liberdade, que se prostra de joelhos cinco vezes ao dia e que jejua em público e come em privado, encontra-se possessa de Maomé, dependente da rede beata dos ayatollahs e mullahs e capaz de todas as ignomínias.

Acontece que as «caricaturas da ira» que os beatos cristãos acharam de mau gosto e, na sua vocação censória, entenderam que não deviam ter sido publicadas, já o tinham sido em outubro de 2005 no jornal egípcio Al Fagr, durante o ramadão.

Um blogger egípcio, «Sandmonkey» livre-pensador, lembrou-se do facto e resolveu denunciá-lo, afirmando que os manifestantes « provaram novamente que o mundo árabe é atrasado mental e não merece nada melhor que os líderes que têm».

O Jornal Globo Online, por sua vez acaba de anunciar o facto.

9 de Fevereiro, 2006 Carlos Esperança

Cristo e Maomé

Naquele tempo o anjo Gabriel era o alcoviteiro de serviço. Foi ele que disse a Maria que estava grávida o que qualquer mulher teria percebido. Foi ele também que, seis séculos depois, se encontrou com Maomé para lhe dizer qual era a sua ? dele, Maomé -, missão.

Os anjos viviam muito tempo embora poucos conhecessem notoriedade, levando uma existência discreta e anódina. Gabriel distinguiu-se. Fora criado por judeus, que faziam anjos como o Papa JP2 faria santos, que acreditavam em milagres com a mesma fé com que alguns padres rurais acreditaram na existência de Deus.

Maomé nasceu em Meca durante o ano de 571 e viria a morrer em Medina em 632. O Corão e as agências de turismo fizeram santas as duas cidades e há períodos do ano em que uma chusma de fanáticos aí acorre, apesar dos perigos que os espreitam.

Muito parecidas com as largadas de touros, um espectáculo ainda em uso no concelho do Sabugal e noutras localidades portuguesas, as peregrinações têm perigos idênticos. O apedrejamento ao Diabo, um ódio transmitido de geração em geração, salda-se sempre por várias mortes enquanto o Diabo fica incólume, à espera do próximo apedrejamento.

Maomé teve uma vida pouco recomendável, um casamento com uma menina de nove anos, coisa que a Igreja católica também não via com maus olhos, e um casamento com a rica viúva Cadija cuja fortuna lhe permitiu dedicar-se à guerra, à religião e ao plágio do cristianismo.

Depois aconteceu-lhe o mesmo que a Cristo. Começou a ser adorado, correu o boato de que tinha nascido circuncidado, de que tinha ouvido Deus, de que foi para o Paraíso em corpo e alma, enfim, aquele conjunto de coisas idiotas que se dizem dos profetas.

Hoje já ninguém pergunta se tomavam banho, se sofreram prisão de ventre ou foram vítimas das salmonelas, se urinavam virados para Meca ou para o Vaticano, que hábitos sexuais ou manifestações de lascívia tinham.

Cristo e Maomé tornaram-se cadáveres adorados e os incréus cadáveres desejados.

9 de Fevereiro, 2006 lrodrigues

A Opção

A gerência do «Carrefour» decidiu colocar este aviso no seu hipermercado do Cairo:


«Caros Clientes:
Expressamos a nossa solidariedade com a comunidade egípcia e islâmica.
O Carrefour não vende produtos dinamarqueses».

Como é óbvio, a gerência dos hipermercados Carrefour é perfeitamente livre de fazer as opções e as escolhas que muito bem entender: comerciais e ideológicas.

E eu também:
A partir de hoje nunca mais na minha vida entrarei num hipermercado Carrefour.

(Publicado simultaneamente no «Random Precision»)

9 de Fevereiro, 2006 Palmira Silva

Uma religião de paz?

No que as autoridades paquistanesas pensam ser um ataque perpetrado por um bombista suicida morreram pelo menos 8 crentes shiitas (números não oficiais) que celebravam o festival de Ashura na cidade Hangu no norte do Paquistão. De acordo com algumas testemunhas, a multidão que recordava a morte do neto de Maomé, o imam Hussein, na batalha de Karbala (o evento que vincou a separação entre shiitas e sunitas) foi ainda alvo de atiradores desconhecidos.

De igual forma no Iraque as autoridades seguem medidas estritas de segurança para evitar ataques de sunitas aos shiitas que celebram a Ashura. O ano passado e há dois anos morreram, respectivamente, 55 e 170 shiitas numa série de ataques coordenados. Cerca de 10 000 agentes de segurança concentram-se em Karbala, o local onde Hussein foi morto pelos seguidores de Abu Bakr, o sogro de Maomé via a sua jovem (Maomé casou com esta quando ela tinha 6 anos e o profeta 54) mulher Aisha.

Em relação à «guerra dos cartoons», gostaria de recordar que os shiitas não têm a objecção dos sunitas em relação à retratação da figura humana, sendo abundantes as representações quer de Hussein quer do seu pai Ali, o marido da filha de Maomé, Fátima.

Assim não se percebe muito bem a reacção violenta do Irão em relação às caricaturas ou talvez se perceba se considerarmos que ontem em Teerão a embaixada inglesa foi atacada sob o pretexto das caricaturas, que não foram reproduzidas na imprensa britânica, na realidade pela oposição de Londres ao armamento nuclear por parte do Irão. Como dizia um dos manifestantes iranianos ontem «Estamos aqui para protestar o papel de Inglaterra em nos mandar para o Conselho de Segurança das Nações Unidas. Nós temos de defender o nosso direito a tecnologia nuclear».

Entretanto em Kano, um dos estados da Nigéria que adoptou a Sharia em 2000 e onde se verifica um programa agressivo para forçar a lei islâmica (wahhabita) em todos os habitantes, a maioria dos quais é Sufi Qadiriyyai, as bandeiras dinamarquesa e norueguesa foram queimadas com pompa e circunstância no Parlamento local.

O «moderado» sheikh Yousef Al-Qaradhawi, presidente do Conselho Europeu para a Fatwa e Investigação, presidente ainda da Associação Internacional de Estudos Islâmicos (IAMS), e o guia espiritual de muitas organizações islâmicas (incluindo a Irmandade do Islão) exortou os fiéis a demonstrarem ao mundo a sua raiva pela publicação dos cartoons de Maomé. O sermão foi transmitido pela televisão do Qatar em 3 de Fevereiro, um pouco antes dos ataques às embaixadas dinamarquesa e norueguesa em vários locais do mundo islâmico… (excertos do sermão aqui).

O «moderado» sheikh exige ainda que a ONU passe uma resolução que proteja de qualquer crítica ou menção não só os profetas e lugares sagrados do Islão mas também os «mensageiros de Alá». Dado a profusão de sectos (e as guerras sangrentas entre estes) dentro do Islão, pergunto-me quem decide quem devem ser considerados mensageiros de Alá… Serão todos os que assim se auto-proclamam? Como não assisti a manifestações comparáveis de repúdio por parte dos muçulmanos à associação de violência ao Islão, bem pelo contrário, pelos ataques terroristas perpetrados em «nome de Alá» será que Osama bin Laden e afins devem ser assim considerados? Significa isso que este muçulmano «moderado» pretende dar carta branca a todos os fanáticos em nome de Alá?

8 de Fevereiro, 2006 jvasco

Comunicado da ARL

Recebi (por correio electrónico) o seguinte comunicado de imprensa da direcção da ARL (que responde às declarações do Ministro dos negócios estrangeiros):

1. A Associação República e Laicidade considera que o único dever das autoridades de um Estado laico e democrático na actual «polémica dos cartunes» é reafirmar o direito inalienável dos cidadãos ao exercício da liberdade de expressão, o qual inclui o direito à blasfémia. A Associação República e Laicidade não pode, portanto, deixar de lamentar e repudiar o comunicado do Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros datado de 7 de Fevereiro de 2006.

2. Contrariamente ao que sustenta aquele documento oficial, a presente crispação internacional não evidencia uma «guerra de religiões», mas sim o confronto entre laicidade e clericalismo. A liberdade de expressão, constitucionalmente garantida, é um direito fundamental que tem valor exactamente na medida em que não conhece excepções. Um alegado «dever de respeito» pelos «símbolos e figuras» religiosos não pode ser constituido em limite à liberdade de expressão, sob pena de destruir o debate livre e aberto que caracteriza as sociedades democráticas.

3. A Associação República e Laicidade – embora respeitando a legitimidade das crenças religiosas pessoais – considera também que quem exerce o cargo de Ministro do Governo da República Portuguesa não deve aduzir dogmas de fé (nomeadamente, a existência de um «profeta Abraão») como justificação de tomadas de posição políticas.

A bem da República.

Lisboa, 8 de Fevereiro de 2006

Luís Mateus ( presidente )
Ricardo Alves (secretário)

Novamente, verifico que estou completamente de acordo com a posição tomada pela ARL.

8 de Fevereiro, 2006 jvasco

Estaline, Mao e a Inquisição

Pessoalmente repudio Estaline e Mao. Entre outras coisas, a sua governação foi responsável por indesculpáveis atropelos à liberdade, e muitos, muitos mortos. O repúdio é tal que fico transtornado quando alguém sugere que essa violência foi perpetrada em nome do ateísmo.

Esta sugestão costuma surgir em resposta ao relembrar das atrocidades das cruzadas, da inquisição, da caça às bruxas, e muitas outras do tipo. Alguns crentes (católicos, em geral) afirmam que, tal como as primeiras atrocidades podem ser atribuídas a católicos, também estas últimas podem ser atribuídas a ateus.

Este raciocínio é falacioso, e passo a explicar porquê.

Na Europa medieval, praticamente todos os monarcas eram cristãos. Houve, durante a idade média, centenas de guerras, batalhas, mortes. Mas não há praticamente ninguém que se lembre de culpar o cristianismo por estas mortes. Por estes milhões e milhões de mortos. E porquê?

Porque é que se tratam os crimes da inquisição de forma diferente dos crimes de qualquer monarca medieval? Porque é que ninguém culpa a Igreja por estes últimos?

Porque uma coisa é um cristão matar alguém em nome de Deus. Outra coisa diferente é um indivíduo matar outro porque quer terra, ouro, vingança, ou por outra razão qualquer, e vir-se a verificar que o assassino é cristão.

Ninguém culpa a Igreja Católica por todos os crimes que os católicos cometeram. Mal seria! Mas a Igreja teve culpa da Inquisição. Teve culpa das Cruzadas. Teve culpa da caça às bruxas. Teve culpa e até teve o bom senso de pedir desculpas.

Mao e Estaline não mataram ninguém para implementar o ateísmo. Nunca existiu uma «igreja ateísta» que matasse em nome do ateísmo, e não me parece que algum dia apareça. Mao e Estaline mataram em nome do comunismo (embora muitos possam afirmar que mataram em seu nome, por ambição, ganância, e medo de perder o poder). O ex-seminarista Estaline perseguia as pessoas por serem inimigas do seu regime, e não por acreditarem nesta ou naquela superstição.

Os crimes de Mao e Estaline são análogos aos crimes dos monarcas medievais, e de muitos outros cristãos que, no poder, foram responsáveis por incontáveis mortes. Ninguém culpa a Igreja por estes crimes, e com razão.

Mas a Igreja Católica foi responsável por horríveis atrocidades. Em nome de Deus. E para estas (Inquisição, Cruzadas, Caça às bruxas) o ateísmo nunca teve o seu análogo.

8 de Fevereiro, 2006 Carlos Esperança

Liberdade de expressão

A liberdade de expressão, pela palavra ou pela imagem, não pode estar condicionada a restrições nem deixar-se manietar pelo medo.

Após as manifestações de violência provocadas pela miséria, o atraso e a fé, elementos explosivos quando misturados, não faltaram piedosos censores de vários quadrantes, a invectivar os caricaturistas.

A liberdade não inclui «o direito de ferir os sentimentos religiosos dos outros» – foi a sentença do Vaticano que, se pudesse, restaurava a censura e impunha os valores do concílio de Trento.

No fundo, o Papa pensa que a liberdade ocupa um lugar subalterno em relação à fé, que o direito tem como limites a idiossincrasia beata, que não se podem beliscar os deuses que alimentam os clérigos espalhados pelo mundo.

Não se sabe o que pensa o toucinho de Maomé, sabendo-se o que este pensou daquele e sendo certo que nem um nem outro se encontram em condições de exprimir-se.

Os sentimentos religiosos são idênticos aos políticos, desportivos ou patrióticos. Quem define os limites do direito, estabelece a dimensão da ofensa ou mede o sofrimento?

Um adepto cujo clube perdeu, o político cujo partido foi batido nas urnas ou um sérvio que se viu espoliado do Kosovo, talvez sintam uma dor enorme, mas não lhes assiste o direito de queimar viaturas, apedrejar embaixadas ou assassinar cidadãos.

Se não resistirmos à violência religiosa, em breve o adultério, o divórcio e, sobretudo, a blasfémia voltarão a estar sob a alçada do código penal, na melhor das hipóteses, ou, na pior, ao arbítrio de uma santa Inquisição.

Pior que o máximo excesso que resulte da liberdade de expressão é a mínima limitação que possa ser imposta.

Os crentes não têm legitimidade para apresentar queixa das pretensas ofensas. Não são parte interessada. Apenas Moisés, Cristo ou Maomé o podem fazer ou alguém por eles mas com uma procuração presencial passada no notário. Fora disso não há legitimidade para julgar a blasfémia.

7 de Fevereiro, 2006 Carlos Esperança

Padre católico assassinado na Turquia

Tal como o álcool passou a ser factor agravante nos acidentes de automóvel, também a religião devia merecer igual tratamento nos crimes cometidos sob o efeito da fé.

A demência da fé, a insensibilidade do fanatismo e o ódio que as religiões fomentam não podem absolver ou constituir atenuante para os crimes.

O sacerdote católico italiano Andrea Santoro foi baleado por um jovem turco que emitiu o grito selvagem «Deus é grande».

O Diário Ateísta lamenta mais uma vítima e combaterá com firmeza os crimes que a fé estimula.