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Liberdade de expressão

A liberdade de expressão, pela palavra ou pela imagem, não pode estar condicionada a restrições nem deixar-se manietar pelo medo.

Após as manifestações de violência provocadas pela miséria, o atraso e a fé, elementos explosivos quando misturados, não faltaram piedosos censores de vários quadrantes, a invectivar os caricaturistas.

A liberdade não inclui «o direito de ferir os sentimentos religiosos dos outros» – foi a sentença do Vaticano que, se pudesse, restaurava a censura e impunha os valores do concílio de Trento.

No fundo, o Papa pensa que a liberdade ocupa um lugar subalterno em relação à fé, que o direito tem como limites a idiossincrasia beata, que não se podem beliscar os deuses que alimentam os clérigos espalhados pelo mundo.

Não se sabe o que pensa o toucinho de Maomé, sabendo-se o que este pensou daquele e sendo certo que nem um nem outro se encontram em condições de exprimir-se.

Os sentimentos religiosos são idênticos aos políticos, desportivos ou patrióticos. Quem define os limites do direito, estabelece a dimensão da ofensa ou mede o sofrimento?

Um adepto cujo clube perdeu, o político cujo partido foi batido nas urnas ou um sérvio que se viu espoliado do Kosovo, talvez sintam uma dor enorme, mas não lhes assiste o direito de queimar viaturas, apedrejar embaixadas ou assassinar cidadãos.

Se não resistirmos à violência religiosa, em breve o adultério, o divórcio e, sobretudo, a blasfémia voltarão a estar sob a alçada do código penal, na melhor das hipóteses, ou, na pior, ao arbítrio de uma santa Inquisição.

Pior que o máximo excesso que resulte da liberdade de expressão é a mínima limitação que possa ser imposta.

Os crentes não têm legitimidade para apresentar queixa das pretensas ofensas. Não são parte interessada. Apenas Moisés, Cristo ou Maomé o podem fazer ou alguém por eles mas com uma procuração presencial passada no notário. Fora disso não há legitimidade para julgar a blasfémia.