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Mês: Novembro 2005

10 de Novembro, 2005 Carlos Esperança

As crenças e os crentes

Os que acreditavam que o Sol girava à volta da Terra não eram, por isso, malfeitores. A ignorância da física quântica ou da energia atómica não torna ninguém indigno ou mau.

Quem crê que a Virgem Maria saltitou de azinheira em azinheira à procura da Lúcia ou que a beata Alexandrina de Balazar passou anos sem comer nem beber, em anúria, a alimentar-se de hóstias consagradas, não comete um crime.

Quem reza a um patife de nome Josemaria Escrivá de Blaguer convencido de que o fascista virou santo com três milagres obrados pelo cadáver, pede uma Graça, não é um delinquente.

Entendamo-nos de uma vez por todas. Os crentes são pessoas iguais aos ateus. O direito a acreditar na virgindade de Maria ou na virtude da bruxa da Lousã é um direito que os ateus defendem. Não significa que a bruxa não deva responder por burla e a ICAR denunciada a uma associação de defesa dos direitos dos consumidores.

Estão em causa, e só, a publicidade enganosa que divulgam, as pressões psicológicas, os terrores que infundem, os ódios que acicatam, as guerras que fomentam. Ninguém no Diário Ateísta persegue os crentes, apenas combate o que julga ser mentira.

A minha posição para com os crentes é a mesma que tenho para com os drogados. Tolerante com estes e vigoroso contra os que produzem e traficam a droga.

As hóstias que cada um papa, as missas que consome, os terços que reza, as ladainhas que debita, o incenso que aspira ou a água benta com que se borrifa, são direitos que os países livres consagram e defendem. E defendem mais – o direito de mudar de religião e o de abdicar de qualquer uma.

As Igrejas não podem nem devem, na minha opinião, servir-se do aparelho de Estado, ameaçar, perseguir ou perturbar a opinião pública no seu proselitismo. E, naturalmente, têm o direito de combater o ateísmo, pela palavra, o mesmo que assiste aos ateus para desmascarar a burla religiosa.

É do confronto dialéctico de posições divergentes que nasce a luz, não é da palavra de Deus bolsada pela voz de clérigos ou vertida na violência dos livros sagrados.

9 de Novembro, 2005 Carlos Esperança

Insensibilidade católica

O acto de violação é um «crime horroroso», mas «praticar o aborto de um feto são, fruto, embora, de um acto abjecto, é fazer pagar a vítima inocente pelo criminoso».

A frase citada pertence ao médico Walter Oswald. Foram as palavras com que o director do Instituto de Bioética da Universidade Católica inaugurou as conferências do Congresso Internacional da Nova Evangelização a decorrer em Lisboa.

O referido médico é, há décadas, simultaneamente um dos mais influentes responsáveis das comissões nacionais de ética da Ordem dos Médicos e dos Hospitais portugueses.

Não vale a pena recordar o passado tenebroso de uma Igreja que gosta de se apresentar como campeã da defesa da vida. Não houve crime nem execração que não cometesse em dois mil anos.

Vale a pena reler a frase e ver a absoluta insensibilidade em relação à mulher violada, o desprezo que a Igreja, de que o referido médico é um dos leigos mais estimados, nutre pela mulher.

Não posso deixar de recordar João Paulo II, perante as gravidezes das freiras violadas por militares, no Kosovo. Pô-las perante a alternativa de darem os filhos para adopção ou abandonarem o convento.

Eis a moral e a sensibilidade de recalcados sexuais que desenvolveram uma mentalidade misógina nas piedosas leituras dos Evangelhos.

9 de Novembro, 2005 Carlos Esperança

Um encontro de crentes

Esta foto é dedicada aos novos leitores do Diário Ateísta que desconhecem a cumplicidade da ICAR com Hitler.

8 de Novembro, 2005 Carlos Esperança

E Deus criou o Mundo…

Quando Deus era um anacoreta sombrio, farto de Paraíso e da solidão, matutou em seu pensamento apanhar o barro que, em dias de chuva, se colava às botas e lhe borrava a oficina.

Recolheu a argila, amassou-a e começou a dar-lhe forma. Percorreu-a com as mãos e moldou o boneco que a água do lago lhe reflectia, nas raras vezes que ia tomar banho.

De vez em quando regressava ao lago para recordar a face. O corpo ia-o esculpindo a olhar para o seu, embevecido como todos os narcisos. Quando acabou, tal como fazia com outras peças, pressionou o indicador sobre a estátua e fez o umbigo.

Extasiado na contemplação, continuou a aperfeiçoar o corpo, deteve-se num empenho devoto no baixo ventre e, de tanto insistir, a estátua ganhou vida.

Estava feito o homem à imagem e semelhança do oleiro.

Como ocorre com artistas em início de carreira, Deus não sabia que tinha feito a obra da sua vida embora o pressentisse pela afinidade que lhe encontrava.

Foi então que resolveu retirar algum barro e, com o que lhe sobrara, fazer outro corpo, ainda mais belo, onde reflectiu a geografia do Paraíso com vales acolhedores e montes suaves. Tinha criado a mulher e, sem o saber, dado início ao Mundo.

Então o velho cenobita, arrependido, desatou aos berros, praguejou, ameaçou e proibiu. Como tinha a paranóia das metáforas disse-lhes que não se aproximassem da árvore do conhecimento, isto é, um do outro, uma ordem que a natureza rebelde das criaturas não poderia acatar.

E, assim, de mau humor, enquanto expulsava Adão e Eva para a Terra, ficou a ruminar castigos, a congeminar torturas e medos para aterrorizar a humanidade. Demorou quatro mil anos – Deus é lento a reflectir -, e mandou-lhes a religião.

Moisés, Jesus e Maomé são os jagunços de Deus que assustam a humanidade e o ganha-pão de parasitas que dividem o tempo a dar Graças, a ameaçar os pecadores e a vender bilhetes para o Paraíso.

7 de Novembro, 2005 fburnay

Momento Zen de Segunda-Feira

João César das Neves presenteou-nos novamente com um número literário.
Escreve João César das Neves no DN de hoje:

«[…] eu sei que é difícil, mas suponha por momentos que Cristo não está vivo. Suponha por um instante que Jesus não ressuscitou, que não é o filho de Deus […]»

Não sei porquê mas não me parece lá muito difícil. Porque difícil, mesmo difícil, é acreditar que:

1) Jesus é filho de Deus e Deus ao mesmo tempo;
2) Jesus morreu e ressuscitou três dias depois, tendo subido para o céu onde sobreviveu em carne e osso mais de dois mil anos;
3) Jesus ressuscitou mortos, curou leprosos, cegos, paralíticos, multiplicou pães e peixes e transformou água em vinho;
4) A mãe dele deu à luz sem ter tido relações sexuais, morreu há dois mil anos e não obstante apareceu umas tantas vezes empoleirada em azinheiras ali para os lados da Cova da Iria;
5) A hóstia e o vinho transubstanciam-se no corpo e sangue de Jesus;
6) A Bíblia faz sentido;
7) A ICAR é uma instituição benemérita;
8) O cidadão Joseph Ratzinger é infalível e representa o criador do Universo.

Mas que grande sapo…

7 de Novembro, 2005 Ricardo Alves

Tentai evangelizar-me e eu vos responderei à letra

Caros católicos que tão devotamente ledes o Diário Ateísta,
chamo-vos a atenção para a prova gritante de «secularismo agressivo e intolerante» que os meios de comunicação social, inclusivamente os estatais, nos deram no passado fim de semana, e que ameaça repetir-se nos próximos dias. Efectivamente, nos espaços de emissão confessionais e nos programas noticiosos ou temáticos, nos intervalos e até, quiçá, nos programas de desporto ou de culinária, tem sido promovida uma campanha católica de proselitismo agressivo e fanático denominada «Congresso Internacional para a Nova Evangelização». O monopólio ateísta é de tal modo forte que os media, mesmo os estatais, não têm dado (nem se prevê que venham a dar) qualquer espaço para que os ateus ou agnósticos exerçam o direito ao contraditório que é reconhecido em todas as áreas à excepção da religião.
Esta operação de propaganda, para além de ser apoiada pelos mesmos media que daqui a uma semana voltarão a promover programas «imorais» e «desavergonhados», é apoiada por pelo menos duas autarquias locais de um Estado supostamente laico (a de Lisboa e a da Amadora), e promete importunar os cidadãos incautos em todo e qualquer espaço público da cidade de Lisboa, incluindo as praças principais e os centros comerciais mais frequentados, pressionando-os a voltarem a frequentar um culto que abandonaram de livre vontade, ou que jamais frequentaram.
Evidentemente, estou ciente de que os católicos, assim como as testemunhas de jeová e os seguidores da cientologia, têm legalmente o direito de ir pela rua fora tentando convencer as pessoas a mudarem as ideias religiosas que têm. Todos temos esse direito, aliás, embora eu e outros ateus prescindamos habitualmente de o exercer. Porém, já avisei publicamente aqui neste blogue, há mais de um ano, que sou ateu e que tenciono continuar a sê-lo até ao ocaso da minha consciência. Se me quiserdes bater à porta ou abordar na rua, ficais desde já prevenidos que vos convidarei a abandonar a vossa religião, que farei troça das aldrabices de Fátima e que criticarei o apoio público de que o vosso proselitismo, escandalosamente, beneficia.
7 de Novembro, 2005 Carlos Esperança

Naquele tempo…

Naquele tempo, Deus não era ainda o mito. Era apenas um mitómano a gabar-se de ter feito o Mundo em seis dias, há quatro mil anos, nem mais, nem menos, e ter descansado ao sétimo.

Era um celibatário inveterado que inadvertidamente criara Adão e Eva no Paraíso, onde vivia e tinha a oficina. Fez o homem à sua imagem e semelhança e a mulher a partir de uma costela do primeiro.

Preveniu-os de que não se aproximassem da árvore do conhecimento, advertência que a Eva logo desprezou, tentada por um demónio que por ali andava. O senhor Deus logo os expulsou do Paraíso, recriminando a malvada e com pena do imbecil que se deixou tentar.

Entretanto, na Terra, local de exílio, o primeiro e único casal logo descobriu um novo e divertido método de reprodução que amofinou o Senhor e multiplicou a espécie.

Deus era bastante sedentário mas as queixas que lhe chegaram pelos anjos, um exército de vassalos hierarquizados, levaram-no a deslocar-se ao Monte Sinai onde ditou a Moisés as suas vontades. Ensandecido pelo isolamento e pela castidade veio exigir obediência e submissão aos homens e fazer ameaças.

Após algum tempo, vieram profetas – vagabundos que prediziam o futuro -, lançando o boato de que o velho, tolhido pelo reumático, enviaria o filho para salvar o Mundo. Foi tal a ansiedade entre as tribos que alguns viram no filho da mulher de um carpinteiro de Nazaré o Messias anunciado.

Com a falta de emprego, algum pó e líquidos capitosos à mistura, inventaram a história do nascimento do pregador com jeito para milagres e parábolas.

Puseram a correr que Maria fora avisada pelo anjo Gabriel, um alcoviteiro de Deus, de que, sem ter fornicado, estava prenhe de uma pomba chamada Espírito Santo.

Nascido o puto, que nunca mijou, usou fraldas, fez birras ou fornicou, cedo se dedicou aos milagres e à pregação falando no pai e na obrigação de todos irem e ensinarem as sandices que debitava. Acabou mal e deitaram as culpas aos judeus, desde então os suspeitos do costume. Claro que JC também era judeu mas isso não quer dizer nada.

Sabe-se que foi circuncidado, que era um monoglota exímio em aramaico, língua em que discutiu com Pôncio Pilatos, que só sabia latim, sem necessidade de intermediário.

Quando se lixou, crucificado, esteve três dias provisoriamente morto e, depois, subiu ao Céu levando o prepúcio que tantas discussões teológicas havia de gerar. Os judeus ainda hoje são odiados porque o mataram mas há quem diga que isso foi uma calúnia dos que se estabeleceram com a nova religião e queriam substituir a antiga.

6 de Novembro, 2005 Mariana de Oliveira

Tentativa de um acordo frustrado

A semana passada, a Conferência Episcopal Espanhola declarou a inexistência de um acordo sobre o tratamento da religião no projecto para a Lei Orgânica da Educação e a manutenção do apoio à manifestação convocada para Madrid, no dia 12 de Novembro. Anteontem, foi a vice-presidente do governo espanhol, María Teresa Fernández de la Vega, que assegurou que o acordo «não foi possível e lamentamo-lo».

Ao que parece, o governo socialista mostrava-se disposto a inserir nos currículos escolares a disciplina de História das Religiões, dentro da nova área de Educação para a cidadania, e a manter a obrigatoriedade da educação religiosa, embora como matéria opcional e não computável.

O diálogo com o governo, segundo os bispos espanhóis, «não deu os frutos esperados» e as negociações precipitaram-se face à iminente manifestação contra a nova Lei Orgânica da Educação, onde não está excluída a presença de alguns membros da hierarquia da ICAR.

Depois do conselho de ministros do passado dia 4, a vice-presidente explicou que o governo de Espanha teria gostado de ter chegado a um acordo, mas que tal não tinha sido possível. Apesar de se mostrar aberta a um novo acordo, María Teresa de la Vega entende que «francamente, vejo-o muito difícil, não acredito, inclino-me mais a pensar o contrário». Acerca da manifestação do próximo dia 12 e da presença de padres, afirmou: «não é a primeira vez que alguns bispos apelam à participação numa manifestação contra o governo, e não o digo com alegria, mas também considero que são eles que se devem explicar aos cidadãos».

Até agora, alguns bispos – como os de Tarazona e Huesca – anunciaram a sua presença na manifestação que pretende evitar a marginalização do ensino da religião (católica, claro) e a deterioração da situação laboral dos seus professores. Assim, o bispo auxiliar de Madrid, Fidel Herráez, enviou uma carta a todos os sacerdotes, que contém uma nota do Conselho de Laicos onde se convoca a manifestação e se recorda que «ao cardeal Rouco pareceu oportuno enviar esta carta às paróquias». Por seu turno, o delegado diocesano do ensino de Madrid, Avelino Revilla, expediu uma missiva a todos os directores de colégios e aos professores de religião, onde lhes diz que «nos colocaram numa situação difícil e o mínimo que podemos fazer é levantar a nossa voz como cidadãos e manifestarmo-nos contra um modo de legislar que não tem em atenção o bem comum e os direitos fundamentais do indivíduo». Aqui, onde se lê «bem comum» e «direitos fundamentais do indivíduo», deverá ler-se «bem comum aos católicos» e «direitos fundamentais do indivíduo católico».

Numa sociedade que se quer pluralista e num ensino público que pretende ser coerente com esse mesmo pluralismo, não pode nem deve haver lugar ao favorecimento de uma religião face às outras ou face a nenhuma. Devemos defender a liberdade de religião, que só será verdadeiramente atingida se não for imposta o ensino de uma religião aos alunos independentemente da sua vontade, isto porque aquela liberdade tem um sentido positivo e também um sentido negativo igualmente essencial.

6 de Novembro, 2005 Carlos Esperança

Europa, escuta…o Vaticano está em luta…

Bento XVI lança Igreja na luta contra a secularização da Europa

Nas alfurjas do Vaticano ouvem-se latidos contra o laicismo. O pastor alemão mostra os dentes, afia as garras e vocifera em latim. Saem-lhe santas imprecações em forma de oração, por hábito e contenção beata.

Quando o paramentam para os rituais, enquanto sente as mãos macias do sacristão e as sedas que lhe moldam a pele, B16 cisma vingar-se contra a Europa indiferente a que as pessoas da Santíssima Trindade sejam três ou trezentas, os mandamentos da lei de Deus sejam dez ou cem e os milagres necessários para criar um santo sejam dois ou duzentos.

B16 não palra e crocita, grunhe e uiva. Como cabo de um exército de sotainas convocou as hostes para anunciar o Evangelho, aqueles 4 livros cheios de contradições e violência que se juntaram ao Antigo Testamento, por ordem de Constantino, escolhidos entre muitos outros ainda mais contraditórios e inverosímeis.

Ao pedir aos bispos «um testemunho claro, público e corajoso», B16 não manda ensinar padre-nossos ou treinar beatos a ruminar ave-marias, usa um eufemismo para lançar a cruzada, faz uma declaração de guerra com palavras melífluas, incita os bispos a brandir o báculo e a arremeter contra Governos que se neguem a esportular o óbolo, a fazer a genuflexão e a dificultar o proselitismo.

Para B16 a liberdade é a «ditadura do relativismo», o respeito pelos Mandamentos de Deus (interpretados pela Mafia que dirige) deve ser imposto e não admite que «desapareça a identificação com o Magistério da Igreja», isto é, a subserviência à tiara.

B16 exorta os Bispos a que «exponham a Palavra de Deus com toda a clareza, mesmo os pontos que, muitas vezes, são escutados com menos vontade ou que provocam reacções de protesto ou mesmo de deserção». É a ordem de marcha, em beata cruzada contra os infiéis, réprobos, apóstatas e ateus.