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Etiqueta: Laicidade

5 de Outubro, 2020 João Monteiro

O ateísmo e a República

Mensagem do Presidente da Associação Ateísta Portuguesa, a propósito do 110º aniversário da Implantação da República.

Sendo o ateísmo a ausência de crença em deus, então pressupõe-se que, em teoria, o ateísmo seja uma postura filosófica independente do regime político. Quero com isto dizer que uma pessoa pode ser ateísta independentemente de ser republicana ou monárquica, de esquerda ou de direita política.

Contudo, sabemos que, na prática, por motivos históricos, sociais e fenómenos de grupo, em Portugal, a direita e a monarquia encontram-se mais próximas da religião cristã. Por a crença, ou a ausência da mesma, ser uma postura individual, há exceções ao que mencionei (como ateus de direita e comunistas cristãos, por exemplo).

Olhado para a história do nosso país, e estando nós a celebrar hoje, a 5 de Outubro, os 110 anos da Implantação da República, gostaria de recordar brevemente a importância do movimento republicano para a discussão religiosa.

Um dos argumentos que justificava o elevado nível de crendice no final do século XIX, durante a monarquia liberal, era atribuído à elevada taxa de analfabetismo do povo e ao controlo social pelo clero nos meios rurais. Por isso, os republicanos insistiam na instrução popular, com a criação de escolas, recorrendo à propaganda ou até mesmo à criação de associações para esse fim. Recordamos por exemplo o papel da Liga de Instrução Popular ou da Sociedade Promotora de Escolas – detentora da Escola-Oficina Nº1, em Lisboa.

Mas não bastava aprender, pretendia-se que as pessoas deixassem de ser súbditos e passassem a ser vistos como cidadãos, com liberdade de pensar e agir por si mesmos, sem condicionalismos externos. A este respeito, relembro a importância da Associação para o Livre Pensamento.

Para combater o poder e contrariar o discurso do clero na sociedade, foram várias as vozes que se levantaram e várias mãos que escreveram denunciando o poder e as incongruências da Igreja enquanto instituição, a maioria deles republicanos apelidados de anticlericais.

110 anos depois da Implantação da República, constatamos que somos hoje herdeiros deste espírito republicano, defendendo ainda hoje a instrução, criticando o que está mal nas religiões, defendendo a laicidade e o livre-pensamento e sem esquecer os valores republicanos da Liberdade, Igualdade e Fraternidade, que esperamos que orientem a sociedade em direção a um mundo mais justo e solidário.

5 de Setembro, 2020 João Monteiro

Entidades Públicas e celebrações religiosas

Ontem partilhei aqui a notícia de que o bispo do Funchal, durante uma festividade em Agosto, atribuía a ausência de óbitos na Madeira à Nossa Senhora do Monte, padroeira da região, e apontei as várias falácias utilizadas pelo clérigo. Acontece que o evento em que o bispo interveio merece ser criticado por outra razão: a presença de Entidades Públicas numa celebração de cariz religioso.

Segundo a notícia do Observador, o evento “teve a presença do representante da República, Ireneu Barreto, do presidente da Assembleia Legislativa da Madeira, José Manuel Rodrigues, do presidente do Governo Regional, Miguel Albuquerque, e do presidente da Câmara Municipal do Funchal, Miguel Gouveia entre outras entidades civis e militares”.

Vivemos num Estado laico, em que há separação da Igreja e Estado. Assim, não deveriam ter estado presentes estas entidades públicas em representação oficial numa iniciativa religiosa. Em eventos deste tipo, podem estar presentes forças de segurança apenas no exercício da sua função, ou os detentores de cargos públicos a título individual e não oficial. E mais uma vez, apenas uma religião é beneficiada com estas representações.

Imagem de lininha_bs por Pixabay

17 de Julho, 2020 João Monteiro

Carta de protesto dirigida ao Conselho de Administração do CHVNG/E

A propósito de um convite feito pelo Conselho de Administração do Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia/Espinho para a realização de uma Missa, enquanto Presidente da AAP, escrevi uma carta dirigida à instituição a demonstrar o meu desagrado (ver abaixo). Assim, a AAP junta-se à Associação República e Laicidade, que também enviou um comunicado, para protestar contra um convite que consideramos ferir o princípio do Estado Laico.

Exmo. Sr. Presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia/Espinho, Doutor Rui Nuno Machado Guimarães,

A Associação Ateísta Portuguesa, tendo conhecimento da realização de uma missa católica no Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia/Espinho, a ter lugar hoje, dia 17 de Julho, vem por este meio protestar por a mesma ter sido convocada pelo Conselho de Administração, em conjunto com a Capelania.

Esclarecemos que não está em causa a realização da missa ou ainda os vários direitos que assistem aos funcionários do Hospital, pacientes e familiares na participação do culto a título individual e no âmbito do exercício da sua liberdade religiosa. O que para nós está em causa, é que a mesma não deveria ter sido convocada pelo Conselho de Administração, uma vez que, como dita a Constituição da República Portuguesa, vivemos num país laico onde o Estado, e portanto os seus serviços, não pode privilegiar uma religião em particular.

Aproveitamos a oportunidade para relembrar a nossa oposição à remuneração pública dos sacerdotes das capelanias, resultado do acordo entre o Estado e a Igreja Católica, porque, uma vez mais, fere o princípio da Laicidade.

Com os melhores cumprimentos,

João Monteiro (Presidente da Direção)

Associação Ateísta Portuguesa

Lisboa, 17 de julho de 2020

Imagem de Peter H por Pixabay
25 de Outubro, 2019 Administrador

Reclamação ao Ministro da Educação

A seguir se transcreve a missiva que a AAP – Associação Ateísta Portuguesa enviou, ontem, ao Ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues.

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INÍCIO DE TRANSCRIÇÃO

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Exmo. Senhor Ministro da Educação

Prof. Dr. Tiago Brandão Rodrigues

Av. Infante Santo, n.º 2

1350-178 Lisboa

CC: Comissão da Liberdade Religiosa

Assunto: Reclamação.

Excelência:

A Associação Ateísta Portuguesa (AAP) acaba de tomar conhecimento de uma situação insólita que, a ser verdadeira, representa uma iniquidade intolerável e uma grave ofensa à Constituição da República Portuguesa, à escola pública, à liberdade religiosa e à laicidade.

Depois de um contacto prévio da visada com a AAP, um conhecido jornal nacional, edição de hoje, dá nota de que uma Educadora de infância foi penalizada por não ter participado numa atividade na igreja, ao recusar-se a receber aí o bispo católico; como antes já tinha recusado levar as crianças à missa, porque entende que não se deve misturar a escola com a religião.

A educadora Isabel Teixeira acabou punida, e o termo é adequado, pela diretora da escola, Ana Cristina Abreu, por se ter recusado a participar nessa atividade em que os alunos estiveram presentes.

É a própria diretora que especifica as razões da avaliação que a penaliza e que a AAP transcreve:

«A docente de facto participou nos diferentes projetos propostos no Plano Anual de Atividades, mas recusou-se a participar em algumas atividades, [sic] propostas pela diretora/parceiros e aprovadas por maioria em conselho escolar. Exemplificando: saída do Pão por Deus à Câmara, desfile de Carnaval, receção ao Sr. Bispo no adro da igreja», especifica a diretora.

As atividades propostas são já, no ponto de vista da AAP, claramente censuráveis e dignas da reclamação que ora faz a AAP, mas a punição, na avaliação, de quem cumpre o espírito e a letra da CRP é um ato discricionário e malévolo do foro disciplinar e indigno de quem tem responsabilidades educativas.

Assim, a AAP pede que seja rapidamente reavaliada a docente punida e que a Diretora da Escola seja imediatamente suspensa e sujeita ao processo disciplinar que avalie a gravidade da sua conduta.

Receosa do regresso aos tempos de Fátima, Futebol e Fado, a AAP considera ética e civicamente lamentável a promoção do ensino confessional por órgãos do Estado ou pelas escolas.

Em defesa da ética republicana e do carácter laico do Estado, a Associação Ateísta Portuguesa solicita ao senhor ministro da Educação que se digne mandar averiguar eventuais ilícitos na matéria exposta e proceder em conformidade.

Aguardando que V. Ex.ª se digne esclarecer esta Associação, apresentamos-lhe os nossos melhores cumprimentos e subscrevemo-nos,

Atenciosamente,

Carlos Esperança,

Presidente da Direção — 917 322 645

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O documento também pode ser consultado na página principal do nosso site.

15 de Abril, 2016 Administrador

Reacção de Carlos Esperança na rádio Paivense FM

Carlos Esperança, Presidente da Direcção da AAP – Associação Ateísta Portuguesa, reage, na “Paivense FM”, ao atropelo à laicidade cometido numa escola pública de Castelo de Paiva. A AAP já questionou o Ministro da Educação sobre mais um episódio que põe em causa valores fundamentais da Constituição da República Portuguesa.

Clique para ouvir:

Reprodutor de áudio

15 de Abril, 2016 Administrador

Carta ao Ministro da Educação.

Assunto: Atropelo à laicidade em escola de Castelo de Paiva.
 
Tiago Brandão Rodrigues
Ministro da Educação
Senhor Ministro,
A Associação Ateísta Portuguesa (AAP) tomou conhecimento da passagem, por Castelo de Paiva, da «Imagem Peregrina de Nossa Senhora de Fátima» [sic] e da iniciativa da diretora do Agrupamento de Escolas de Castelo de Paiva (AECP), Maria Beatriz Moreira Rodrigues e Silva, que, a “convite do Reverendo Padre F. Sérgio”, solicitou aos encarregados de educação autorização para que os alunos se pudessem deslocar, ao largo do conde, entre as 10 e as 11 horas do dia 13 de abril, acompanhados de professores e funcionários, para participarem na receção à referida imagem, se possível, trazendo uma “camisola/t-shirt / casaco branco.” (Ver anexo)
 A AAP, considerando o atropelo grosseiro à laicidade e um desafio à separação Estado / Igrejas, constitucionalmente consagrado, na defesa da laicidade da escola pública, pede a V. Ex.ª se digne mandar esclarecer o seguinte:
a)      Se há alguma legitimidade ou utilidade na suspensão das aulas para participação de alunos do segundo e terceiro ciclos na cerimónia religiosa;
b)      Se aos alunos que eventualmente se recusaram a participar na referida cerimónia (difícil perante a militância pia da diretora) foram asseguradas aulas;
c)      Se as aulas sacrificadas pela devoção do órgão diretivo tiveram compensação;
d)      Se os alunos, professores e funcionários foram abrangidos por qualquer seguro e lhes foi facilitado transporte do Agrupamento até à Igreja Matriz e regresso, ou foram obrigados a deslocar-se a pé.
e)      Finalmente, se a laicidade da República Portuguesa, no caso da Escola Pública, é acautelada pelo Ministério da Educação e que providências serão tomadas para que outras escolas públicas não reincidam em semelhante prevaricação.
Aguardando a resposta que V. Ex.ª tiver por conveniente,
Apresentamos-lhe os nossos melhores cumprimentos,
Carlos Esperança,
Presidente da Direção.
14 de Fevereiro, 2011 Raul Pereira

Uma nova Irlanda

O papa vai ser oficialmente notificado de que a sua igreja tem cerca de cinco a dez anos para evitar que esta se reduza à insignificância, na República da Irlanda.

Quem diria que a toda-poderosa Igreja estaria em perigo no país verde. A sucursal romana de Armagh, que manipulou vergonhosamente o Estado (enfraquecido após o processo de independência), para se apoderar do ensino e da saúde, que pregou a moral bacoca, que apoiou a censura até bem dentro do século XX, que congregou os exércitos beatos para pugnar contra leis dignificadoras do bem-estar humano (proibição constitucional do aborto em 1983, p.ex.) e pela a lei, bastante recente, de criminalização da blasfémia, levou a machadada final com os escândalos de ocultação de pedofilia que viram a luz do dia nos últimos anos.

Com tudo isto, conseguiu que os irlandeses sentissem no âmago que a sua consciência nacional, supostamente católica, tinha sido brutalmente traída. Descobriram que, se as bases que a sustentavam eram assim tão anacrónicas, ignaras e frágeis e isso não os tornava menos irlandeses, então é porque, na realidade, não precisavam delas para nada.

Pedindo emprestada uma expressão ao meu colega Ludwig, as últimas décadas, que aproximaram a Irlanda da Europa laica e levaram o desenvolvimento e o progresso ao país, mostraram também aos irlandeses que tinham sido dominados tempo demais por uma série de «tretas». Felizmente, agora dizem «basta» ou, simplesmente, ignoram o que é perdigotado da catedral de St. Patrick.

«Se a Irlanda se quiser tornar numa nova Irlanda, ela tem primeiro que se tornar europeia», escreveu James Joyce. Se o escritor a pudesse ver agora…

Outra religião abandonada
Fotografia de nznomad, sob licença CC