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11 de Dezembro, 2004 Carlos Esperança

Não à chantagem religiosa

A intolerância religiosa que aflora um pouco por toda a Europa é um vírus que urge ser debelado. Não se trata de um epifenómeno exclusivo de grupos minoritários ou de uma única religião, começa a ser uma pandemia que alastra a todos os credos e compromete largas camadas de crentes.

Diariamente chegam ecos de violência religiosa, de comportamentos perversos oriundos de guetos «comunitaristas» onde, a coberto da cultura e da tradição, se cometem os mais infames atropelos aos direitos humanos, especialmente contra mulheres. Desde a excisão aos assassinatos em nome da honra, conceitos tribais fazem escola numa Europa cuja secularização parecia ter vencido os preconceitos medievais.

A própria ICAR, que desde 1961 deixou de actualizar o Índex (catálogo de livros cuja leitura interdita), voltou a recorrer à obsessão demente de influenciar a legislação dos países onde tem expressão, tentando impor a crentes e não crentes os seus preconceitos.

No Reino Unido um grupo islâmico ordenou a morte de Terrence McNally, autor da peça «Corpus Christi», por apresentar Cristo como homossexual e alcoólico. Acresce tratar-se do fundador de uma seita concorrente que, para os muçulmanos, não passa de um profeta de segunda categoria. Aos ateus pouco interessa a vida sexual de Cristo e, muito menos, a quantidade de copos que ingeria, mesmo que algumas das suas máximas se afigurem proferidas sob o efeito do álcool.

Na peça, Cristo aparece seduzido por Judas e crucificado por ser homossexual. Se esta versão correspondesse à verdade só havia que respeitar a orientação sexual do «divino mestre» e repudiar a crueldade e injustiça do castigo, desse ou doutro qualquer. Permitir ameaças de morte a quem exerce a liberdade de expressão, por quem defende a pena de morte para o adultério e a blasfémia, é resignarmo-nos ao regresso à barbárie, ao retrocesso da civilização, à renúncia aos direitos, liberdades e garantias que a democracia conferiu aos homens e mulheres dos países civilizados.

11 de Dezembro, 2004 Mariana de Oliveira

Parabéns renófilos

Renas e Veados

O Renas e Veados festeja hoje o seu aniversário. O Diário Ateísta felicita toda a equipa renófila pela sua obra que muito tem contribuído para uma maior iluminação da sociedade portuguesa.

11 de Dezembro, 2004 pfontela

«Cristianovitimização»

Desde há uns tempos para cá o Vaticano anda a fazer pressões mais ou menos discretas para conseguir aprovar dentro das instituições internacionais, como a ONU, um novo termo: a «cristianofobia».

Achando que o facto de o judaísmo e o islamismo terem referências específicas na lista da ONU era uma espécie de tratamento preferencial, o Vaticano exige a igualdade com as outras religiões do livro.

Há vários aspectos interessantes nesta exigência:

– O Vaticano não consultou nem os ortodoxos nem os protestantes sobre esta medida, sendo que está a fazer a campanha por conta própria, falando por todos os cristãos do mundo (como nos bons velhos tempos) – mas apesar de não terem sido consultados os protestantes americanos mostram-se muito satisfeitos pois, como bem sabemos, o meio rural americano é intrinsecamente agressivo ao cristianismo.

– Ao mesmo tempo que quer negar direitos a outros (o caso mais escandaloso é o das minorias sexuais), fazendo pressões e acordos (com o diabo?) para que as votações vão no sentido que lhe interessa, exige os mesmos direitos para si mesmo, arrogando-se de minoria em vias de extinção.

Eu sou pela liberdade da e de religião, acho que todos devem poder adorar quem e o que quiserem, e entendo que em certos países (como a Índia ou a China) ser cristão não é fazer parte do status quo e que tais medidas podiam ter um efeito positivo, mas o que eu acho revoltante, e não posso de forma alguma tolerar, é que um grupo que discrimina e promove o abuso de outros tenha o descaramento de vir propor tal medida. Antes de reclamarem protecção internacional se calhar era boa ideia deixar a hipocrisia de lado e olhar para o próprio umbigo.

11 de Dezembro, 2004 Mariana de Oliveira

Os bons samaritanos

No próximo dia 17 de Dezembro, o Vaticano apresentará uma nova fundação, denominada «O Bom Samaritano», cujo objectivo é ajudar os doentes mais necessitadozinhos, especialmente os que têm sida.

A Santa Sé quer uma instituição aberta a todos os que pretendem ajudar os doentes com sida em África. «Queremos que seja uma instituição que englobe toda a Igreja católica permanecendo fiéis aos nossos ideais prioritários em relação à doença, que são antes de tudo a prevenção e a assistência ao doente», disse o cardeal Lozano Barragán, presidente do Conselho Pontifício para a Pastoral da Saúde.

E quais serão as actividades promovidas pela fundação? A habitual educação aos valores cristãos de fidelidade, com grande relevo para a castidade, a fidelidade conjugal e a abstinência sexual.

Não há quaisquer informações sobre se a fundação irá canalizar alguns dos recursos da ICAR para a investigação científica de uma possível cura ou vacina definitivas contra esta doença ou mesmo para uma educação isenta e correcta que permita aos indivíduos evitarem o contágio.

11 de Dezembro, 2004 Palmira Silva

Panaceias e sicofantas

A Athenaeum Pontificium Regina Apostolorum vai oferecer aos padres católicos um curso especial «teórico e prático» em satanismo e exorcismo, de forma a melhor os equipar para o que é descrito pela Igreja como um interesse preocupante no oculto demoníaco.

A descoberta há uns meses dos corpos de dois membros da banda «Beasts of Satan», assassinados no que foi descrito como um rito satânico foi assim convenientemente aproveitada pela santa Igreja para corroborar a sua pretensão da existência real do Mafarrico. De facto, o ritual exorcista foi alterado em 1999, pela primeira vez desde os velhos tempos da Inquisição, em 1614.

A Igreja de Roma tenta assim perpetuar o Senhor das Trevas, a sua invenção mais bem conseguida no passado para dominar os fiéis através do medo e para justificar as mais abjectas práticas, que reclamavam ser dirigidas não a pessoas mas a servos do Demo.

Como nota para meditar, a Regina Apostolorum é uma instituição, dita universitária, privada, sustentada pelos Legionários de Cristo e pela Regnum Christi, fundadas pelo padre mexicano Marcial Maciel Degollado, uma «máquina» de angariação de fundos para a Igreja de Roma, sobre o qual pendem há décadas inúmeras acusações de abuso sexual de menores. Todas elas ignoradas pelo Vaticano, que não quer hostilizar uma das suas mais bem conseguidas fontes de rendimento. Em vez de se preocupar com demónios imaginários, a ICAR devia reflectir sobre o «demónio» bem real da pedofilia no seu seio!

Sobre Maciel ler «Vows of Silence: The Abuse of Power in the Papacy of John Paul II», de Jason Berry e Gerald Renner e uma análise do livro no National Catholic Reporter.

10 de Dezembro, 2004 Carlos Esperança

Religião combate a liberdade

Como já hoje foi assinalado pela Palmira, os muçulmanos, à semelhança do que nos habituou a ICAR, já se atrevem a combater a liberdade de expressão na Dinamarca, em nome da defesa dos seus ideais religiosos. Desta vez o pretexto é a «afronta» ao Islão pela transmissão do filme «Submissão» do assassinado realizador Theo van Gogh que pagou com a vida a denúncia que fez da violência islâmica sobre as mulheres.

Na Suíça, quarenta deputados federais assinaram uma petição pedindo ao governo para adoptar medidas de segurança e vigilância junto aos imãs que pregam uma leitura literal do Alcorão. Acontece que um dos dirigentes islâmicos, que garante a bondade da religião, declarou numa entrevista que não se pode opor ao apedrejamento de uma mulher adúltera pois esse é o ensinamento do livro sagrado, como se os livros sagrados, todos juntos, valessem mais do que a «Declaração Universal dos Direitos do Homem» cujo aniversário hoje se comemora.

Na Holanda, na Bélgica e na Alemanha a inquietação cresce contra o fascismo islâmico. Curiosamente, em vez de se limitar o poder organizado das Igrejas, há quem proponha limitações à liberdade de expressão, para não «provocar» os crentes. Em vez de se defender a liberdade, pactua-se com o medo, em vez de se insistir no laicismo, acentua-se a submissão aos delírios místicos. E os cristãos mais radicais, para quem a liberdade causa urticária, corroboram esse procedimento. Não há democracia sem laicismo.

Num artigo muito oportuno, a propósito das eleições do Iraque, Vital Moreira afirma hoje no Causa Nossa, no texto «Democracia» que os chiitas apresentaram a constituição de listas para as eleições no Iraque e tece considerações pertinentes sobre o perigo do voto religioso, para terminar com uma afirmação que merece profunda reflexão:

«Uma democracia não equivale à tirania de uma facção religiosa, por mais maioritária que seja. Numa sociedade dividida, reduzir a democracia ao triunfo da maioria eleitoral, ainda por cima com base numa hegemonia religiosa, pode ser a receita para o desastre».

10 de Dezembro, 2004 Carlos Esperança

A ICAR é notícia

O «Público de ontem dedicou à ICAR grande parte das páginas 28 e 29. Há uma foto enorme de duas Excelências Reverendíssimas, com as piedosas cabeças enfiadas num adereço com o formato da parte mais saborosa das galinhas, e a «Rosa de Ouro», uma das mais altas distinções papais, que foi conferida à Basílica do Sameiro, em Braga.

Consta que cerca de 50 mil pessoas se extasiaram com a celebração dos 150 anos do dogma da Imaculada Conceição (aquela obrigação católica de acreditar que a virgindade pós-parto passou de mãe para filha). Estiveram presentes quase todos os bispos portugueses, o legado papal, o núncio apostólico e o patriarca Policarpo, além de numerosos cónegos, monsenhores e padres. Foi uma orgia de fé testemunhada por uma multidão de clérigos.

Arreliador, para os cristãos, foi o presépio exibido no Museu de Cera de Madame Tussaud, em Londres, onde o casal Beckham, David e Vitória, representavam respectivamente S. José e a Virgem Maria. Que Tony Blair, G. W. Bush e o duque de Edimburgo fizessem de reis magos talvez não fosse tão grave como Vitória Beckham fazer de virgem, com uma anatomia de fazer corar a Virgem Maria legítima e de fazer pecar por pensamentos metade do mundo católico.

Mas o mais grave de tudo foi a indemnização recorde paga pela diocese católica de Orange City, na Califórnia, 75 milhões de euros para 87 vítimas de abuso sexual. A ICAR aguenta-se bem com os escândalos, onde tem uma larga experiência, mas dá-se mal com as indemnizações onde só recentemente começou a sentir quanto doem.

Finalmente sabe-se que a Obra da Casa do Gaiato não acredita nos relatórios demolidores dos inspectores da Segurança Social e, para restaurar o prestígio e responder às acusações, encomendou um estudo isento à…Universidade Católica.

10 de Dezembro, 2004 Palmira Silva

Direitos Humanos

Faz hoje 56 anos que a Assembleia Geral das Nações Unidas proclamou a Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Infelizmente, mais de meio século passado, os considerandos desta declaração, que todos consideraríamos de senso comum, consensuais e indiscutíveis, não permearam indelevelmente as sociedades do século XXI. Em boa parte porque o espectro das religiões voltou a assombrar a humanidade com o concomitante ressurgimento de intolerâncias religiosas que ameaçam os mais fundamentais direitos humanos. Os fundamentalismos que eclodem em todos os pontos do globo, mesmo nos mais improváveis, se não forem eficazmente combatidos, corresponderão a uma regressão civilizacional imprevísivel há escassos anos. Quando todos desconsiderávamos a questão religiosa, acreditando serem crimes em nome de qualquer Deus algo de um passado que não se repetiria… Infelizmente a História recente provou o nosso engano e espero que nos tenha despertado da atitude complacente em relação às religiões e acordado para a ameaça latente que estas constituem para o modelo de sociedade preconizado na supracitada Declaração.

10 de Dezembro, 2004 Palmira Silva

Submissão

Um grupo de muçulmanos na Dinamarca apresentou queixa oficial às autoridades competentes contra uma emissora pública de televisão dinamarquesa, acusada de incitar ao ódio ao Islão.

A afronta ao Islão cometido pela Danmarks Radio reside na transmissão do filme «Submissão» do assassinado realizador holandês Theo van Gogh. O presidente da comissão de imprensa da Sociedade da Religião Islâmica, Kasem Said Ahmad, afirmou à revista Politiken que «Queremos enviar uma mensagem política aos muçulmanos da Dinamarca de que este é o caminho a ser tomado com estas coisas e aos dinamarqueses de que não desejamos que nossa religião seja ridicularizada assim.»

Depois da proibição de um número da Newsweek no Paquistão, continua a polémica associada ao filme concebido pela deputada holandesa Ayaan Hirsi Ali, natural da Etiópia e de origem muçulmana.

A Holanda foi um dos poucos países no mundo a permitir a exibição do filme de Jean-Luc Godard, «Salve Maria», considerado pelo Vaticano nos anos 80 como uma blasfémia. Blasfémia continuada pelo lançamento recente, na Holanda, do livro «Judas«, por Walter Kamp. O escritor holandês argumenta que Jesus era homossexual num livro de ficção que aqueceu ainda mais os debates sobre tolerância e liberdade de expressão num país que se orgulha da sua longa tradição de ambas.

9 de Dezembro, 2004 Mariana de Oliveira

O subsídio

A Comissão dos Orçamentos, presidida pelo polaco e democrata-cristão Janusz Lewandowski, adoptou, numa primeira leitura, uma emenda que concede um subsídio de 1 500 000 euros à Igreja Católica para as Jornadas Mundiais da Juventude de Colónia, a realizar em 2005.

A União Europeia, como organização de Estados de Direito pluriculturais, tem obrigatoriamente de seguir determinados princípios de Direito que, actualmente, se consideram fundamentais: o princípio democrático, o princípio da igualdade e o princípio da laicidade. Ora, havendo um órgão daquela organização, presidido por uma personalidade assumidamente religiosa, que autoriza a subvenção de um encontro de derminada religião, cujas instituições estão longe de uma situação de falência, subvertem-se todos aqueles valores que devem imperar nos dias que correm.