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Categoria: Mundo

28 de Julho, 2025 Onofre Varela

A FOME COMO ARMA DE GUERRA

Há dias foi divulgado que “Reino Unido, França e Alemanha pediram ao governo israelita que suspenda imediatamente as restrições à distribuição de ajuda e permita urgentemente que a ONU e as ONGs humanitárias realizem o seu trabalho de combate à fome. A declaração dos três governos lembrou a Israel que deve cumprir as suas obrigações segundo o Direito Internacional Humanitário”. Parece que parte do mundo [a Europa civilizada] acordou para a realidade e reivindicou o fim da guerra genocida. 

Netanyahu comete atrocidades em Gaza de acordo com um plano que idealizou no sentido de promover a fome naquela região da Palestina, não permitindo a distribuição de comida ao povo nos lugares onde está, estabelecendo três centros distribuidores de água e alimento perto da fronteira do Egipto, obrigando à deslocação dos palestinos esfomeados que, assim, deixam o território deserto à mercê da ocupação facilitada dos israelitas, para que possam concretizar mais facilmente a terraplanagem de acordo com o projecto de transformação daquela faixa em estância balnear para ricos. Penso que tal intenção imobiliária não será concretizada porque, ao fazê-lo, Israel desrespeitaria a propriedade territorial da Palestina, o que será ilegal à luz do Direito Internacional. 

IMAGEM GERADA POR IA.

Neste momento Israel promove uma guerra com o apoio de Trump, negando todos os direitos dos palestinos espezinhados por um exército de malfeitores instruídos por Netanyahu para destruírem e matarem indiscriminadamente, incluindo o assassínio de povo indefeso que pede comida. A fome que Netanyahu decretou na Palestina é usada para tentar eliminar o povo palestino num genocídio idêntico ao que Hitler usou com os judeus, mas substituindo as câmaras de gás por fome, levando crianças à morte por inanição. 

Os colonos israelitas radicais dispersos pela Cisjordânia ajudam no arrasar da Palestina. A atrocidade de se reter alimento e água – incluindo comida para bebés – com a intenção de se deixar a população palestina morrer à fome, faz parte do projecto genocida de Netanyahu. 

O jornalista israelita Gadi Algazi conta no jornal El País (20/7/2025) que o plano genocida foi iniciado há pouco tempo e os resultados já são dramáticos. Todo o mundo já viu fotos de “esqueletos com pele” que são as crianças desnutridas. Gadi Algazi, que é historiador israelita, fundador do grupo de jovens soldados que se negaram a prestar serviço militar nos territórios ocupados – pelo que foi condenado a um ano de cadeia – diz que Israel aproveitou as atrocidades do grupo Hamas, a 7 de Julho de 2023, para ter a oportunidade de pôr em prática dois grandes projectos: 

“O primeiro é imperialista, no sentido de conseguir a hegemonia regional, do qual fazem parte os ataques militares ao Líbano, à Síria e ao Irão. O segundo é um projecto colonialista contra os palestinos, não só os de Gaza, mas também os que vivem na Cisjordânia debaixo da ocupação militar israelita que protege os colonos, transformando os palestinos em cidadãos de segunda classe mediante a erosão dos seus direitos civis”.

E o mundo assiste a este horror… e deixa!

9 de Julho, 2025 Onofre Varela

A guerra de Trump contra o mundo incidindo no desprezo pelas crianças

Segundo a Organização Mundial da Saúde, os casos de poliomielite que condenavam os menores à paralisia, ou mesmo à morte, retrocederam 99% desde 1988. É a segunda grande doença infecciosa que se pode extinguir, depois da erradicação da varíola em 1980. Outras doenças, como o sarampo e a difteria, também foram limitadas drasticamente à medida em que foi aumentando a imunidade colectiva graças às vacinas e aos programas de vacinação elaborados pelas entidades sanitárias em cada país. 

É milenar a luta do Ser Humano contra as doenças, especialmente aquelas que se manifestam nas crianças. Porém, contra tudo quanto a história da luta médica em favor da saúde recomenda, hoje assiste-se a um retrocesso em todo o mundo, como se a experiência não nos ensinasse nada e regredíssemos no tempo, negando a ciência médica. Pior do que isso é termos orgulho de retrocedermos nas boas práticas médicas e científicas, mesmo condenando à morte ou à invalidez centenas ou milhares de crianças em todo o mundo. 

Um estudo médico publicado na revista “The Lancet” no último mês de Junho alerta para o retrocesso das práticas médicas que permitem a sobrevivência às doenças que podem ser evitadas pela vacinação, especialmente em crianças. O estudo em causa foi elaborado com base em dados recolhidos em cerca de 200 países (praticamente todo o planeta). 

É uma péssima notícia para todos nós. E o que é mais grave, é que o problema vai acentuar-se nos próximos anos. Na base de tal gravidade está a ordem de Donald Trump para se cancelar a ajuda dos EUA ao desenvolvimento da vacinação em dezenas de países, pondo fim ao progresso conseguido até aqui, condenando à morte, ou ao sofrimento crónico, milhões de crianças. 

Gerado por IA

A cimentar tal desfecho, que contraria todo o humanismo que já conseguimos na prevenção e eliminação das doenças, está o problema (crescente em todo o mundo) da desinformação massiva acerca das vacinas, como consequência do ataque à Ciência feito através das redes sociais. É conhecido o resultado trágico dos efeitos do COVID no Brasil dirigido por Bolsonaro, e do mesmo efeito nos EUA durante o “primeiro acto” da dramática presença de Trump na Casa Branca, com os malefícios da recusa dos conselhos médicos, substituindo-os por pseudoterapia sem qualquer base científica. 

A prevenção do contágio de doenças epidemiológicas requer a participação de todos e a ajuda técnica e económica dos governos realmente interessados na saúde pública. As muitas décadas de trabalho entre as autoridades e os cidadãos, reduziram para valores mínimos as doenças infecciosas que no princípio eram letais. Recordar este avanço das ciências médicas é fundamental para todos termos a noção da necessidade de continuarmos no bom caminho da prevenção. 

O pior de tudo isto são os ouvidos surdos dos responsáveis que preferem ficar na História da Humanidade como os monstros defensores de uma economia gananciosa, quase criminosa, em desfavor da economia socialmente responsável, como se verifica no “segundo acto” do dramático desempenho da presidência de Trump.

9 de Junho, 2025 Onofre Varela

O Papa na Geopolítica

Há quem recorde uma frase do Papa Francisco quando lhe ofereceram um livro onde o autor narra as campanhas organizadas contra si a partir dos círculos ultraconservadores dos Estados Unidos da América (EUA). Bergóglio terá dito: “Para mim é uma honra ser atacado por americanos”. 

O novo Papa, Leão XIV (de seu nome Robert Francis Prevost), enquanto americano pode falar com Trump usando estatuto de “cidadão americano” para “cidadão americano”, sem que o presidente dos EUA se coloque em bicos de pés sobre a sua nacionalidade que imagina superior à de qualquer outro cidadão do mundo. 

Notícias de Vila Real

Têm, ambos, histórias familiares idênticas. O papa nasceu nos EUA, sendo filho de pai com ascendência francesa e italiana, e de mãe com ascendência espanhola. Por sua vez, Donald Trump também nasceu nos EUA, sendo filho de pai descendente de imigrantes alemães, e de mãe escocesa. Trump expulsa imigrantes que procuram melhorar a sua vida buscando trabalho nos EUA, esquecendo a sua origem idêntica à daqueles que expulsa. 

Os seus progenitores tiveram a sorte de ser recolhidos pela mesma América… mas de outro tempo e com outro presidente. Agora a Igreja Católica tem um Papa dos EUA, mas que também é sul-americano como era o seu antecessor. Dos EUA porque nasceu em Chicago… e sul-americano porque viveu o seu sacerdócio no Peru, adquiriu a nacionalidade peruana e conhece a realidade social dos povos mais pobres do continente, sempre tão desprezados pelos poderosos da Economia dos EUA. 

Leão XIV tem um trunfo para jogar com Trump: a sua autoridade moral… coisa que Trump nem imagina o que seja. 

O clérigo Francis Prevost não é um intruso para os americanos… é “um deles”! E para os Sul-americanos também é “um deles”. Trump não pode rotulá-lo de “perigoso marxista” como a extrema-direita internacional apoucava o Papa Francisco. 

Agora há um rosário de perguntas que todo o mundo espera ver respondidas pelas acções de Leão XIV: como serão as suas relações, enquanto referência moral, com Donald Trump? E com a China, a Rússia, a Ucrânia, Israel, o mundo árabe e os povos latino-americanos? 

Respostas difíceis de encontrar, mas que deixam esta preocupação no ar: “o Papa nunca devia ser um natural da primeira potência mundial”. 

Espera-se um grandioso trabalho da máquina diplomática do Vaticano e da sua secretaria de estado. Hoje, o Vaticano é mais do que um estado e uma religião num mundo semeado de estados e de religiões. No mundo actual é inevitável um choque cultural, político e moral com epicentro na sua polarização. 

Trump, com a sua arrogância, representa um populismo desrespeitador de valores humanos, seguido também por Giorgia Meloni, de Itália, por Viktor Orban da Hungria, pelo Vox de Espanha e pelo seu correspondente Chega, de Portugal. Políticos que, hipocritamente, rezam ao mesmo Deus de Leão XIV… mas com os quais a Igreja não pode pactuar, sob pena de degradar a sua imagem, que foi tão bem retocada e polida por Jorge Mario Bergoglio. 

18 de Maio, 2025 Onofre Varela

O que é defender a Paz?

As convulsões sociais constituem sempre um excelente pretexto para os credos religiosos, que se dizem defensores do bem contra o mal e da harmonia entre os povos, virem a terreiro deixar a sua palavra em defesa da paz e da concórdia. A defesa da Paz não é tomada, apenas, pela Igreja. Também partidos políticos a defendem (aliás, essa é uma das suas principais obrigações).

Habitualmente estas religiosas e políticas intenções moralizadoras, são inoperantes porque a moral é coisa que os fazedores da guerra não têm, nem querem ter… se a tivessem, não faziam guerras! Não esqueçamos que fazer a guerra não é a atitude do invadido… o invadido não faz guerra… apenas se defende do invasor… e este, sim, é quem faz a guerra! O recurso às armas para nos defendermos do invasor não é o mesmo que usarmos armas para invadir. A diferença entre as duas atitudes é abissal.

Acredito que para as mentes religiosas apregoadoras da paz para a Ucrânia, seja um acto salvador quando um bispo demonstra fraternidade por aquele sofrido Povo Ucraniano, num discurso pretensamente redentor… mas acredito ainda mais que, em termos práticos, em termos da vida real, da realidade que faz a guerra… tais actos redentores saídos dos púlpitos… não valem mais do que zero!… Estão distantes da realidade por viverem na fantasia religiosa. 

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Não só neste momento de guerra na Ucrânia, mas também na nossa realidade política e económica caseira de todos os dias, em momentos de convulsões sociais, às vezes os bispos juntam-se ao coro de protestos dos povos, alertando os governos para práticas políticas ou económicas que, na óptica da Igreja, prejudicam os cidadãos dos países em conflito. Muitos desses discursos soam a falso… apenas são beatos e inoperantes.

Estou a lembrar-me do apelo que o Papa Francisco fez a Zelensky no dia 20 de Março de 2024, ao pedir ao Governo ucraniano que tenha  “a coragem da bandeira branca e de negociar” com a Rússia, numa declaração que foi interpretada como um apelo à rendição do país perante a invasão russa, merecendo a crítica da Polónia que, então, sugeriu ao Papa que “encoraje Putin a retirar o seu Exército da Ucrânia”. 

Tal como a Igreja, também há partidos políticos que enchem a boca com a palavra Paz, mas não definem o que pretendem dizer com ela. Esta atitude obriga-me a interrogar: o que é a Paz? É o invadido render-se ao invasor? É deixar de lutar pela liberdade e pela independência, aceitando a invasão e a opressão? Se a Ucrânia entregar à Rússia (como Putin e Trump querem) as partes do território ocupadas pelo exército russo, os ucranianos vão, a partir desse dia, viver em paz? 

Evidentemente que não. O mais certo será terem a bota militar do Kremlin a persegui-los e a esmagá-los por toda a vida. Neste caso da Ucrânia, a palavra Paz só pode significar “vencer Putin”… e nunca submeter-se-lhe. Qualquer outro final diferente desta matriz é a continuação da guerra (a um nível mais benéfico para Putin) e da opressão de um ditador sobre a população de um país vizinho que, até então, foi democrático e legal perante a lei internacional… e que deixará de o ser! 

21 de Abril, 2025 Onofre Varela

5 de Abril, 2025 Onofre Varela

A importância do Humor nas nossas miseráveis vidas…

«Se o homem não compreende a graça, está perdido! Deixa de ser verdadeiramente inteligente, mesmo que tenha todos os talentos».

Estas palavras do grande escritor russo Anton Tchekov são frequentemente citadas como prova de que o sentido de humor é um elemento importante da inteligência.

Quando alguns políticos e religiosos (principalmente estes… de entre outras castas de “gentinha”) se insurgem contra considerações bem humoradas sobre os seus actos cometidos em sociedade, estão a sublinhar a imensa falta que têm da inteligência referida por Tchekov.

Uma das principais funções do humor consiste em garantir-nos a estabilidade psicológica nas situações difíceis. É isto mesmo que se observa hoje com tantas piadas nas redes sociais referindo a actuação política do perigoso, patético, piadético, bobo, ignorante, estulto, estúpido, fátuo, idiota, imbecil, inepto, lerdo, néscio, palerma, parvo e tolo, também reconhecido pelo nome aproximado a um desenho animado de Walt Disney; Donald Trump… à frente da governação da maior potência do mundo, para cuja função usa um minúsculo resquício de massa cinzenta mal amanhada, que foi o que lhe calhou no refugo da sorte do seu nascimento, nivelando-o pelo pensamento mais irracional de líderes tribais mais rascas e fatelas, oriundos de países da profunda África mais selvagem, ou de perdidas ilhas polinésias para lá do cu do mundo!

Para que um caricaturista, cartunista ou sátiro das personalidades públicas, consiga desempenhar o seu papel de crítico social, ele tem de saber apreciar correctamente os acontecimentos… mas, logo a seguir, terá de se desligar deles ou procurar um ponto de observação suficientemente distanciado para não ser maleficamente atingido pelos actos que lhe vão merecer a crítica que escreve ou desenha.

Só assim se consegue reestruturar o sentimento e ultrapassar as emoções desagradáveis, tornando-nos capazes de sorrir com aquilo que, ainda há poucochinho… nos dava vontade de chorar.

Há uma extensa literatura publicada sobre Bernard Shaw, o ilustre autor dramático irlandês, cujo sentido de humor o tornou lendário. Um dos vários casos que lhe são atribuídos, conta assim:

«Um dia, o escritor, então já de idade bastante avançada, foi atirado ao chão por um ciclista demasiado impetuoso. Por felicidade, nada de mais grave aconteceu. Quando o culpado do acidente, confuso, pediu desculpas, Bernard Shaw interrompeu-o: “Você tem realmente pouca sorte. Com um pouco mais de energia, teria entrado na História como o meu assassino».

Poucos são aqueles que saberiam manter o sangue frio em tal situação e debitar um discurso de humor em vez de recorrer à raiva, ao insulto e a recriminações perfeitamente inúteis para aquele acontecimento específico e naquele dado momento.

Portanto, fique-se com esta, prezado(a) leitor(a): uma das funções do sentido de humor consiste em assegurar um estado de espírito equilibrado em situações que, de satisfatório… nada têm!

Não há nada melhor do que aprendermos a rir e nós próprios, em vez de nos considerarmos os mais certos e seguros de tudo quanto é coisa ou é gente neste mundo… ou no outro!… 

30 de Março, 2025 Onofre Varela

Indemnizações da Igreja às vítimas de pedofilia

Leio (em notícia divulgada pelo jornal Público na edição do último Domingo, 30 de Março) que a Igreja não garante indemnizações às vítimas de abuso sexual, perpetrado por sacerdotes católicos, até ao fim do corrente ano de 2025. Informa-se, ainda, que “as comissões de instrução têm sofrido atrasos e só metade das 69 pessoas que pediram indemnizações foi ouvida”… e que a Igreja está aberta a novos pedidos. 

Afigura-se-me estranho que a Igreja se afirme “aberta a novos pedidos” se não consegue resolver os pedidos que já tem em carteira desde que se iniciou o processo da possibilidade de indemnizar as suas vítimas!

Recorde-se que foi em 2013 que o Papa Francisco criou uma comissão especial no sentido de proteger as crianças vítimas de pedofilia por parte do clero. Foram registados casos e feitas denúncias de abusos sexuais em várias partes do mundo, de cuja lista fazem parte países como: Portugal, Brasil, Alemanha, Austrália, Espanha, Bélgica, França, Reino Unido, Irlanda, Canadá e Estados Unidos da América. As investigações não se limitam à Igreja Católica. Também se contam escândalos de abusos sexuais noutras religiões e cultos, como a Convenção Baptista, Igreja Episcopal dos Estados Unidos, Testemunhas de Jeová, Igreja Luterana, Igreja Metodista, Judaísmo Ortodoxo e Ultra-ortodoxo, Islão, várias escolas budistas e tibetanas, grupos de yoga e outros. Como se sabe, até no seio das famílias se contam crimes sexuais cometidos com crianças.

A “Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica” iniciou os seus trabalhos em 2022, coordenados pelo pedopsiquiatra Pedro Strecht, investigando casos acontecidos desde 1950, que recomendou à Igreja “o reconhecimento da existência e extensão do problema e o seu compromisso na adequada prevenção futura, nomeadamente através do cumprimento do conceito «tolerância zero» proposto pelo Papa Francisco”.

Gerado com IA.

Esta Comissão Independente cessou funções com a “sensação de dever cumprido, mas também com a ideia certa de que este não é bem um final, porque mesmo tendo sido abertas algumas portas, interessa começar hoje mesmo um novo tempo de abertura em relação ao tema de abusos sexuais de crianças no seu todo”. De entre as vítimas de abusos sexuais pelo clero, confirmaram-se sete suicídios. “Quase metade dos inquiridos nega a existência de consequências físicas, mas 21,6% dos casos reportam-nas. Destes, verifica-se que grande parte tem origem emocional, perturbações de ansiedade e de humor depressivo, implicando alterações do sono, do padrão alimentar e da imagem do corpo e da vivência da própria sexualidade”.

Catarina Vasconcelos, membro da Comissão Independente, declarou que “não foi fácil escutar, registar e ler os relatos das vítimas”. Estima-se que 4303 crianças foram alvo de abusos sexuais na Igreja, para além das 512 que testemunharam, o que faz um total de 4815. Destas, 77% dos abusadores eram padres. Após ser extinta a Comissão Independente, a responsabilidade na continuação dos estudos sobre a pedofilia na Igreja e suas consequências, passou para a própria Igreja que, para o efeito, criou o Grupo VITA em 26 de Abril de 2023. É a partir da actuação desta nova organização (que por trás de si tem a Igreja Católica) que se espera a resolução da política de indemnizações… mas não se vislumbra o fim!

Será que ela existe para branquear os crimes sexuais da Igreja, encobrindo-os com a névoa do esquecimento?!… Esta organização não deveria de, obrigatoriamente, ser independente da Igreja?

16 de Março, 2025 Onofre Varela

Humor e Fé (3 e Fim)

Os religiosos que se sentem ofendidos com uma comédia quando ela brinca com elementos da sua crença, devem protestar nos locais próprios que os regimes democráticos têm para esse fim. No caso do atentado brasileiro (comentado no último artigo) duvido do sentimento cristão do grupo de criminosos-nacionalistas, cuja reacção foi atacar à bomba!… Este acto poderia estar relacionado com o regime político de então, que permitia (ou instigava?) a violência, e tinha gente da IURD sentada no Parlamento, sendo que o próprio presidente (Bolsonaro) era afecto a essa seita dita evangélica, e por muitos apontada como criminosa. 

Os extremistas muçulmanos também reagiram com metralha contra o jornal satírico Charlie Hebdo, em 2015, matando 12 jornalistas-cartunistas, só porque não gostaram de uma crítica a Maomé! Os extremistas religiosos e patrióticos não pensam para além do tabu sacramental de Deus e da Pátria. Não têm sentido de humor, nem nenhum outro sentimento que não seja o da vingança estúpida e violenta. A interpretação que fazem dos textos religiosos é programada pelos gurus das seitas, e não pela sua capacidade de entendimento. 

Euronews

No caso da comédia brasileira, aludindo uma hipotética homossexualidade de Jesus, ressaltam alguns condicionamentos mentais dos crentes que os levaram à irritação, à fúria e ao crime. Desde logo, temos a própria homossexualidade que é condenada por si só e que os crentes rotulam de “pecado”. E depois… não lêem a Bíblia! Dizem ser o seu livro sagrado, mas não fazem a mínima ideia do seu conteúdo! 

No Novo Testamento (João: 13; 21-30) é narrada uma cena incluída no capítulo onde se encontra a célebre frase de Jesus: “Na verdade vos digo que um de vós me há-de trair”. Perante esta denúncia, os seus discípulos olharam-se, perplexos com o que o Mestre lhes dizia. A parte curiosa desta narrativa está nesta frase: “um dos seus discípulos, aquele a quem Jesus amava, estava reclinado no seio de Jesus”. 

Quer dizer que Jesus só amava um dos discípulos (ou amava-o mais, ou de modo diferente, do que a todos os outros?), que por acaso era aquele que se encontrava ao seu colo, na posição de reclinado… isto é, deitado… o que presumia alguma intimidade para além da amizade. Simão Pedro fez sinal a esse jovem a quem Jesus amava, para que perguntasse ao Mestre quem era aquele que o haveria de trair. O jovem aproximou a sua boca do rosto de Jesus e perguntou: “Senhor, quem é?”. 

Segundo esta narrativa, aquele a quem Jesus amava e que se reclinava sobre o seu seio, era seu confidente e porta-voz. Através dele os outros discípulos dirigiam-lhe as questões e ouviam a resposta (pelo menos naqueles versículos assim é). A interpretação desta passagem bíblica pode ser variada… e uma das variações, tão válida como qualquer outra, pode ser entendida como havendo uma relação íntima entre aqueles dois homens. 

Não é à toa que os autores teatrais tratam os assuntos históricos ou míticos. Eles lêem, estudam e investigam, para poderem fundamentar as suas estórias que passam em palco, na televisão ou no cinema. Ao contrário, os fundamentalistas bíblicos só têm uma interpretação – a radical – e baseados nela arrogam-se o direito de lançar bombas contra aqueles que, dando cumprimento ao seu trabalho de criar rábulas teatrais (ou cartunes, ou textos…), atingem um nível de raciocínio que está vedado aos agressores. Por isso se radicalizam… e Jaír Bolsonaro alimentou essa radicalização e apoiou tais actos!… 

Termino transcrevendo uma frase do meu camarada cartunista Zé Oliveira: “Produzir humor é um acto de inteligência. Produzir terror é um acto de estupidez bárbara”.

(Fim)

(O autor não obedece ao último Acordo Ortográfico)

4 de Março, 2025 Onofre Varela

Humor e Fé (1)

Estamos a viver tempos perigosos a nível mundial. O desrespeito pelo próximo parece ser lei, e a opinião pública é intoxicada por ideais extremistas escurecendo o futuro de cada um de nós, desrespeitando, totalmente, o Humanismo que devia fazer lei nas relações humanas e entre Estados. 

As actuais políticas económicas e de expansão territorial, estão, filosoficamente, muito perto das tristemente célebres “Cruzadas” que, entre os anos 1095 e 1291 (durante dois séculos) tiveram a missão de reconquistar Jerusalém (denominada “Terra Santa”) do domínio muçulmano, e cujo resultado redundou em morte e destruição. 

O que nos vai salvando os dias é a capacidade que todos nós temos de rir, e muitas vezes rimo-nos do nosso próprio infortúnio. Rir é um bom remédio para qualquer mal (tal como na tropa os comprimidos LM [Laboratório Militar] eram receitados para todos os males). 

Já li opiniões de agentes religiosos defendendo o sentido de humor, considerando-o, até, divino! Mas também já me deparei com opiniões de outros religiosos atacando o humor, considerando-o um sentimento menor, do qual as “pessoas de bem” se devem distanciar. 

Na minha juventude, integrado num grupo da JOC (Juventude Operária Católica) participei em diversões e actividades de palco no Patronato de Rio Tinto, Gondomar (muitos anos depois destruído para dar lugar ao Lar Paroquial da Terceira Idade), que tinha uma boa sala de espectáculos por onde passaram vários actores, de entre os quais recordo Mena Matos, um excelente humorista e imitador, que fazia as vozes de todas as personalidades públicas da época, apresentando-as não só em palco, mas também aos microfones da rádio no programa de humor (e crítica social camuflada por causa da Censura) “A Voz dos Ridículos”. 

A minha participação era de cariz humorístico, fazendo “Stand up Comedy”, modalidade que hoje está na moda, mas que, na época, nem sequer existia com tal designação. Lembro que no final de um desses espectáculos, de sala cheia com aplausos e gargalhadas, o padre lá do sítio subiu ao palco para agradecer a músicos e cantores, mas com reservas para “o contador de anedotas”! 

Com um sorriso beato afivelado no rosto, aquele membro da Igreja elogiou os meus companheiros de palco e agradeceu as suas prestações no espectáculo, mas sublinhou “a indelicadeza do humor” naquele espaço paroquial. Ouvi-o, e ri. Naquele tempo (fins da década de 1960, ainda a meia dúzia de anos de acontecer o 25 de Abril) pouco mais podia fazer perante um discurso beato, que não fosse rir! 

Garanto que o meu humor, apresentado sob a designação de “anedotas”, não tinha nada a ver com as anedotas do meu amigo, e nosso comediante actual, Fernando Rocha, que usa o vernáculo para provocar o riso, e de quem muitos gostam e outros tantos detestam por não tolerarem o palavrão que ele usa como marca distintiva do seu humor. 

Mas o palavrão existe, faz parte da linguagem do nosso Povo e funciona bem em determinados palcos e públicos por retratar os discursos de todos nós. É um humor perfeitamente lícito, e a visibilidade do palco e da televisão acaba por ser entendida como destruidora da clandestinidade, aferindo a legitimidade de se dizer palavrão em público (o que todos nós fazemos em privado) no sentido de fazer rir.

Há quem não goste!… Paciência… eu também não gosto de marisco… mas há quem diga que é muito bom!… 

Aqui chegado, também apelo à paciência dos meus leitores para esperarem pelo resto da prosa… é que este meu espaço tem limite, e já cheguei ao fim… na próxima semana continuarei o mesmo discurso. Até lá, façam por rir… e riam muito (vejam e oiçam o Fernando Rocha… ou discursos políticos!…).

(Continua)

29 de Dezembro, 2024 Onofre Varela

FakeNews: política, telenovelas e Bíblia

As notícias falsas (Fake News) estão tão enraizadas na sociedade que é difícil saber-se o que é verdadeiro e falso numa campanha eleitoral, numa mensagem publicitária ou numa discussão parlamentar. As Fake News são uma espécie de “informação” criada com o propósito de desinformar, de enganar quem as toma por verdadeiras. Divulgam mentiras por verdades, intoxicam a opinião pública e induzem “as suas vítimas” a pensarem e a fazerem como os seus promotores querem que elas pensem e façam. 

Neste momento temos nas Fake News (FN) criadas pela extrema-direita, a difusão da ideia de que os imigrantes são bandidos que infestam as ruas das nossas cidades, matam velhinhas e comem crianças ao pequeno almoço. As FN são usadas com fins políticos ou económicos para benefício de alguém ou algo. Todos nos lembramos da garantia que Cavaco Silva deu de o BES não ter problemas financeiros, que estava com os cofres cheios de dinheiro e os seus clientes podiam confiar na seriedade do banqueiro!… Quem discordaria da opinião avalizada de um economista de tal gabarito?!… E foi o que se viu! 

Foto de Jorge Franganillo na Unsplash

As Fake News foram usadas nos EUA em benefício de Donald Trump nas eleições de 2016 (e de 2024), e de Jair Bolsonaro no Brasil em 2018, recorrendo a mensagens divulgadas massivamente nas redes sociais dizendo “cobras e lagartos” dos seus opositores, acenando o espantalho do comunismo. 

Para que as Fake News atinjam o alvo com eficácia, têm de ter algo de verdadeiro à mistura… algo que interesse à maioria de nós, levando-nos a aceitar todo o discurso como verdade, só porque uma parte dele é (ou parece ser) verdadeiro. Repare-se nos enredos das telenovelas. Aquilo é ficção, mas retrata a vida social como nós a conhecemos, e muitos dos conflitos narrados nos episódios já nós os vivemos de algum modo ou sabemos de quem os tenha vivido… mas é tudo mentira! 

É esta semelhança com a realidade que faz o interesse dos telespectadores. Esta artimanha de misturar realidade com ficção não é nova. As Fake News são velhas como o mundo, e a Bíblia é uma colecção enorme delas. À mistura com nomes de personalidades que a História nos diz terem existido, e de localidades reais, os Judeus construíram narrativas falsas afirmando-se “o Povo eleito de Deus”. Como se não bastasse a mentira histórica, ainda lhe acrescentam o maior embuste, que é a de terem sido ditadas por um deus inexistente!… 

Exemplo: Moisés é personagem do Antigo Testamento a quem se atribui o Êxodo (a retirada do povo hebreu do Egipto) e a espectacularidade das dez pragas que fizeram a rendição do faraó Ramsés II. A última delas foi a morte do próprio filho do faraó, o que nos mostra Deus como um ser infame, despótico e cruel. 

O problema desta narrativa está no facto de tais casos nunca terem existido!… Êxodos de hebreus, houve muitos… e as dez pragas narradas são tão espectaculares que teriam de fazer parte da História do Egipto… que não as regista!… A existência de Moisés não está provada pela História, e o que se conta de, em bebé, ter sido recolhido de uma cesta abandonada no rio Nilo, é cópia da história de vida que se conta de Sargão I, rei da Suméria, que viveu 600 anos antes de Ramsés II e de Moisés.

(O autor não obedece ao último Acordo Ortográfico)