29 de Maio, 2025 Onofre Varela
Tomás da Fonseca e o Anticlericalismo
O termo Anticlericalismo já foi pronunciado como insulto. Houve tempo em que rotular alguém de “anticlerical” era apelidá-lo de “mal comportado”, na definição mais suave do termo. Um anticlerical era o demónio em pessoa e não merecia mais do que ter a alma a arder no Inferno! Para além deste folclore de crendice direi que, hoje, em Portugal, não há Anticlericalismo pela simples razão de não haver Clericalismo! (Ou há?!…) O Anticlericalismo só existe na razão directa do Clericalismo que quer combater. É como um antivírus que só existe porque há o vírus. Não existindo este, não há razão para existir aquele.
O Anticlericalismo em Portugal existiu com uma força feroz num tempo em que havia um Clericalismo igualmente feroz. Penso que o último Anticlericalista Português foi Tomás da Fonseca (1877-1968), detentor de uma forte personalidade invulgar que o enviou para a cadeia diversas vezes por razões políticas. Na Primeira República foi chefe de gabinete de António Luís Gomes, que era ministro do Fomento do Governo Provisório, e ocupou o mesmo cargo ao serviço do primeiro-ministro Teófilo Braga. Foi eleito deputado à Assembleia Constituinte em 1911 pelo círculo de Santa Comba Dão, e em 1916 foi eleito senador por Viseu. Atento aos aspectos mais negativos da Igreja de então, numa intervenção que fez em 1912, denunciou casos de padres pedófilos… problema que, como se vê, não é só de hoje!
Os regimes ditatoriais mereciam-lhe o maior repúdio, e por isso foi preso em 1918 por se opor à ditadura de Sidónio Pais. Voltou à cadeia dez anos depois, em Coimbra, e tornou a ser preso em 1947 por ter protestado contra a existência do Campo de Concentração do Tarrafal, em Cabo Verde, para onde Salazar enviava presos políticos.
As razões de Tomás da Fonseca tinham uma causa histórica, e para a compreendermos temos de recuar no tempo. A 8 de Dezembro de 1854 o Papa Pio IX proclamou o dogma da Imaculada Conceição, a cuja cerimónia assistiu o cardeal-patriarca de Lisboa, D. Guilherme Henrique de Carvalho, que conseguiu apoio papal para construir o templo do Sameiro, em Braga, dedicado a “Maria que engravidou sem mácula”.
Por todo o reino a coroa ofereceu património à Igreja, o que se reflectiu no sentimento religioso das populações que rejubilaram com os novos templos e recintos religiosos. Ao mesmo tempo reforçava-se a concórdia existente entre o Reino e a Igreja.
Na sequência disto, no tempo de Tomás da Fonseca (já adulto) clamava-se por mais intervenção do poder eclesiástico na vida social. Era impossível para o pensador, democrata e republicano Tomás da Fonseca, assistir àquela “bagunça-político-religiosa” e ficar calado!…
(O autor não obedece ao último Acordo Ortográfico)