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Mês: Agosto 2010

10 de Agosto, 2010 Carlos Esperança

A fé, o proselitismo e a delinquência

Só o espírito totalitários das religiões, com mais ou menos conteúdo político associado, pode negar o direito de cada cidadão a qualquer crença, à descrença ou à anti-crença.  A liberdade religiosa é um direito consagrado na Constituição da República Portuguesa e na Declaração Universal dos Direitos do Homem. Pô-lo em causa é crime e um caso de polícia de for usada a violência.

Qualquer indivíduo pode acreditar na fábrica celeste que cria Anjos da Guarda pessoais, companhias que perseguem, invisíveis e distraídas, todos os mortais, que há virgens que saltitam nas azinheiras ou aparecem em grutas e que as orações são as prestações de um bilhete para o Paraíso. O que não pode é obrigar outros a comprar a passagem para um destino em que não acredita e para o qual não é emitido recibo nem indicado o meio de transporte.

Não importa que haja quem creia nas propriedades terapêuticas da água benta ou nas virtudes de uns sinais cabalísticos para transformarem no corpo de Cristo as rodelas de pão ázimo. O que não podem é impor aos outros as crenças com que foram intoxicados, nem o sistema de crenças que cada religião explora.

O ódio dos fundamentalistas é mais irracional do que a fé que praticam. Não os satisfaz o caminho do Paraíso, exigem que os outros os acompanhem. Tornam-se autómatos nas aulas de catequese, embrutecidos pelo medo do Inferno e da cólera do deus que o clero lhes impinge. Depois, parecem feras à solta a insultar incréus, a impedir a liberdade de expressão e a congeminarem vinganças enquanto ruminam ave-marias e salve-rainhas.

São assim os talibãs dos três monoteísmos abraâmicos.

9 de Agosto, 2010 Fernandes

Diálogos de um ateu

– Se temos que começar, eu quero deixar clara a diferença entre fé e razão. – diz o crente.

– A igreja católica, mesmo que você não acredite, nunca esteve contra a razão. E mais, num dos seus últimos concílios, proclamou que a razão pode demonstrar a existência de deus.

– E demonstrou-o?

– Que acha?

– Que quer dizer com essa pergunta?

– Quero dizer que a teologia dos seus correlegionários, é sempre a mesma, após séculos de demonstrações, desde Anselmo a Tomás de Aquino, vem agora dar razão à razão. Não lhe parece irónico?

– Irónico porquê?

– Porque as subtilezas dos teólogos são irónicas. Primeiro, e durante séculos, quiseram demonstrar a existência de deus. Depois, como essas demonstrações não demonstraram nada, decidem afirmar que a razão pode demonstrar a existência de deus. A mim dá-me riso.

– Riso? Não sei porquê, este é um assunto sério.

– Não duvido, mas a seriedade não consiste em dizer uma e outra vez, que a razão pode demonstrar a existência de deus, senão demonstrá-la de uma vez por todas. E eu continuo à espera.

– E continuará. Você não é crente!

– Deixe a crença de lado. Estamos a falar de razão.

– A fé pode ajudar a razão.

– Já tardava… você fala como o papa reinante; nada de raciocinar, deitar mão da fé para que a razão não se extravie, ou seja; deixai o cego como está mas dai-lhe uma tocha. Melhor ainda; deixai o cego como está, mas dai-lhe um Lázaro tonsurado que o leve pelo caminho certo.

– A fé e a razão não são opostas.

– Quantas vezes ouço essa frase. Não só são opostas, como nem sequer se parecem. Não são sequer da mesma natureza. Com a razão só se pode discutir; com a fé só se pode acreditar. Não se parecem em nada. Faça o teste, tente questionar a fé, e verá como a ela desaparece. Pelo contrário, se acreditar em vez de questionar, verá que desaparece a razão.

– Também não é assim como diz.

– Já começa você com trocadilhos.

– Trocadilhos? A que se refere?

– À arte dos trocadilhos, ou a arte de dizer que sim e que não ao mesmo tempo. Arte em que a igreja se especializou, e a que chamam teologia. O simples jogo de mudar o sentido das palavras para dizerem o que queremos que digam. Até agora a razão não conseguiu demonstrar a existência de deus, mas não importa, agora trata-se de dizer que sim, que pode demonstrá-la.

– E assim é!

– Não, não é assim, porque quando tentaram demonstrar não o conseguiram, afinal de que falam? De trocadilhos, de jogos de palavras, subtilezas que nem sequer o chegam a ser, basta olhá-las como são, como mentiras autorizadas, para que desapareçam.

– Mas …

– É verdade! Que fácil seria para a igreja aceitar que santo Anselmo ou Tomás, não conseguiram provar a existência de deus. Que também não o conseguiram a partir da razão. Mas não é preciso que o aceitem ou afirmem. Está à vista.

*Ignacio Ferreras, Juan. – Diálogos del Ateo.

9 de Agosto, 2010 Carlos Esperança

Em nome de Deus, o misericordioso…

Uma viúva afegã foi executada publicamente a tiro por um grupo de talibãs. Depois de ser acusada de adultério no nordeste do Afeganistão, segundo denunciou hoje à agência Efe uma fonte da Comissão Afegã independente de Direitos Humanos.

A mulher, acusada de adultério, foi presa durante três dias e recebeu 200 chicotadas antes de ser fuzilada.

Nota: Os que defendem o respeito da tradição e «cultura» islâmica são cúmplices destes trogloditas de Deus.

9 de Agosto, 2010 Carlos Esperança

Padre Rui vai ser pai

Casal que esteve fugido em Espanha já regressou à Caniçada, em Vieira do Minho, onde a população começa a aceitar a decisão.

Fátima, a namorada do padre Rui Pedro, o pároco que abandonou o sacerdócio e fugiu para Espanha, está grávida, noticia na edição de hoje o jornal ‘Correio da Manhã‘.

Comentário: O padre Rui deixou de poder transformar a água vulgar em benta mas aprendeu a amar. Parabéns.

8 de Agosto, 2010 Carlos Esperança

Carta ao DN sobre as afirmações de um bispo…

… que atira a pedra e esconde a mão.

Exmo. Senhor
– DN Gente –
Avenida Liberdade, 266
1250-149 LISBOA

Exmo. Senhor:

Na sequência da entrevista concedida pelo bispo Carlos Azevedo à jornalista Patrícia Jesus, [DN – Gente, de 31 de Julho de 2010], a Associação Ateísta Portuguesa (AAP) ficou perplexa com as referências feitas a esta associação.

Transcreve-se o último parágrafo: Outro dos seu traços marcantes é a frontalidade. Que às vezes lhe vale a colagem a uma ala mais fundamentalista da Igreja. Recusa o rótulo. “Da primeira vez que a Associação Ateísta se meteu comigo, escrevi-lhes uma carta. Acho que ficaram surpreendidos. Sou frontal mas com uma abertura enorme. Gosto do diálogo, fruto de ter crescido com nove irmãos. E admiro todas as pessoas que são verdadeiras na sua busca.”
Além da referência à Associação Ateísta Portuguesa aparecer como Pilatos no Credo, sem qualquer nexo, a AAP nega que se tenha «metido» alguma vez com o Sr. Bispo e lamenta nunca ter recebido qualquer carta sua. A AAP não pode assim confirmar essa frontalidade e abertura que o Sr. Bispo alega. Também nos foi até agora impossível aproveitar a admiração do Sr. Bispo pelas pessoas que são verdadeiras na busca do diálogo pois, após várias críticas à AAP e ao seu presidente num matutino onde é colunista, jamais aceitou o direito ao contraditório.

Na esperança de termos sido privados da tal carta, apenas por um percalço postal, e de não terem sido publicadas as nossas respostas somente por falta de espaço no matutino onde o Sr. Bispo escreve, pedimos-lhe que revele a data e o conteúdo da carta mencionada e que encete finalmente connosco o diálogo que diz admirar.

Por exemplo, sobre a peregrinação a Fátima organizada a 13 de Maio de 2008 «contra o ateísmo na Europa», comandada pelo cardeal Saraiva Martins, então chefe da Repartição do Vaticano onde se rubricam milagres e criam beatos e santos. Uma peregrinação a favor da fé pareceria mais de acordo com a abertura que o Sr. Bispo apregoa, se bem que, admitimos, uma cruzada contra o ateísmo possa ter toda a frontalidade de uma carga de cavalaria.

Ou sobre as palavras do Sr. Patriarca Policarpo que, no mesmo ano, considerou o ateísmo como o «maior drama da humanidade», maior ainda que a fome, as doenças, as guerras, as catástrofes naturais, a pedofilia e o terrorismo religioso. Seria outro tema digno de diálogo entre pessoas como aquelas que o Sr. Bispo diz admirar, as que são verdadeiras na sua busca.

A AAP reconhece, e defende, o direito do Sr. Bispo de não gostar de ateus e de manifestar o azedume que a associação lhe tem causado, em pouco mais de dois anos de existência, com esta direcção que iniciou o seu segundo mandato em 27 de Março último. Sabemos como reagiu mal, no matutino onde escreve, ao comunicado da AAP sobre a canonização de Nuno Álvares Pereira, que não merecia tal desrespeito, e à denúncia de a ICAR ter transformado em colírio um herói nacional a quem a sua Igreja atribuiu a cura do olho esquerdo da D. Guilhermina de Jesus, queimado com salpicos ferventes de óleo de fritar peixe.
Aceitamos também a frontalidade com que o Sr. Bispo Carlos Azevedo e os seus colegas João Alves e António Marcelino se exprimiram em artigos de opinião, respectivamente no Correio da Manhã, no Diário de Coimbra e no Soberania do Povo, de Águeda, criticando a AAP e o seu presidente. Sabemos que não são imunes à pressão mediática a que a Igreja católica tem sido submetida, pelas piores razões, desde o encobrimento de crimes de pedofilia ao branqueamento de capitais no I.O.R., como documenta o livro «Vaticano, S. A.».

O que a AAP não aceita, por amor à verdade, é a referência a um diálogo que não existiu e a cartas que a AAP não recebeu. Por isso, a AAP gostaria que o Sr. Bispo Carlos Azevedo esclarecesse este mal-entendido, indicando a data e o teor da carta que alega, na entrevista ao DN, ter escrito à AAP, e que demonstre de uma forma mais visível que o diálogo frontal que defende não é apenas um monólogo sem direito de resposta.

Cumprimentos.

Associação Ateísta Portuguesa – Odivelas, 1 de Agosto de 2010

Nota: Esta carta, cuja não publicação compreendemos, por questões de espaço, só hoje é revelada.

6 de Agosto, 2010 Fernandes

Quem está errado?

Quando eu era novo íamos à missa todos os domingos. Nunca sabia a que igreja iria. Íamos a uma diferente todas as semanas, principalmente porque o meu pai adorava ouvir música. Sempre me espantaram as semelhanças na forma como cada igreja via o amor, a bondade, a unidade. Mas também me entristecia a separação. Eu perguntava ao meu pai – porque é que há tantas igrejas diferentes? Ele respondia – porque o homem tem o hábito de pensar que ele e só ele distingue o certo e o errado, e quem não concorde, está errado!

– Quem detém a verdade sobre o certo e o errado? Você? A igreja? Os seus pais? A ciência?

As religiões começaram com ideias do tipo dualista, com Deus lá em cima e nós peões cá em baixo. Em certos aspectos, a igreja tentou controlar todas as formas de empreendimento humano. Não apenas a ciência mas também as artes. Até a ciência provar que estavam errados – e então a única solução encontrada foi fazer uma divisão. Deus e companhia ficam com o espírito; a ciência com a matéria. E não é uma ironia que tenha sido essa divisão que levou a ciência tão longe?

Já acabou o divórcio? Qual é o acordo? É um divórcio quântico? Quem é que fica com as igrejas e quem fica com os laboratórios? Quem traiu quem? Quem foi traído? A culpa é de quem?

Jeffrey Satinover disse: «existe o método científico, que é especificamente o de minimizar a influência do preconceito», vivemos num mundo estilhaçado pelas crenças onde nos tentam convencer que até as nossas acções sem significado nem propósito são julgadas por um deus, e que embora não tenham significado, o nosso passeio na eternidade depende inteiramente delas.

A religião transforma-nos em ovelhas temerosas, à espera que o julgamento nos caia em cima. Mas as religiões com a pretensão de inspiração divina, são na realidade administradas por humanos. E a triste história das guerras santas, perseguição de bruxas, queima de livros e sistema de castas para mencionar apenas algumas, não é propriamente uma imagem de “orientação divina”.

O problema das religiões é que ficaram atoladas no que é a “verdade”. A saída não é atacar as religiões mas controlá-las de modo a que a humanidade possa evoluir. Não nos livramos das guerras livrando-nos das religiões, mas condicionando a sua actuação, evitando a sua tentativa de estagnação, mostrando-lhes o outro lado da moeda – a ciência – e aprender com o que a ciência tem de fantástico. O que falta é estar disposto a errar na procura das novas soluções.

Um dos dogmas do cristianismo é a noção de que “Jesus irá salvar-me”. E de facto, não tenho qualquer esperança de o fazer eu próprio, sendo um pecador nascido do pecado e lixado logo à partida. É difícil imaginar uma ideia mais incapacitante. Se alguém me salvar sempre, nunca chego a assumir a responsabilidade de nada, é a clássica mentalidade da vítima. De facto, muitas destas ideias têm “vítima” estampado no rosto.

JZ Knight diz o seguinte: «Agradar a Deus liberta-nos do fardo de viver. Quer dizer; o facto de termos alguém a morrer pelos nossos pecados é um bocado extorsão, não? Penso que todos deveríamos ter o privilégio de viver os nossos próprios pecados e enriquecer em sabedoria e em virtude dessa experiência. Só então teremos atingido realmente a sabedoria que nos permite compreender o mundo». –  A ironia é que são esses erros, decisões ignorantes, “pecados”, que nos fazem evoluir para estados mais elevados. Não vejo como possamos crescer e tornarmo-nos seres extraordinários de outra forma.