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Mês: Maio 2006

9 de Maio, 2006 Ricardo Alves

A Noruega discute a separação entre Estado e Igreja

Na sequência das recomendações de um relatório de uma comissão governamental nomeada em 2002, a Noruega iniciou a discusão pública sobre a separação entre o Estado e a Igreja.

Neste país do norte da Europa, a Igreja Luterana Evangélica é, constitucionalmente, a igreja de Estado. A Constituição desta monarquia impõe também que o monarca e pelo menos metade dos membros do Governo professem a religião de Estado, sem que se saiba o que qualquer um deles deve fazer se perder a fé. Os membros do clero luterano são funcionários públicos e existe nas escolas públicas um curso obrigatório de «religião cristã», aliás já condenado pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos na sequência de queixas de ateus e muçulmanos.

Esta situação anacrónica está a tornar-se insustentável num país cada vez mais secularizado (descontando alguns fundamentalistas), em que um terço dos novos casais se casam em cerimónias civis. A prática religiosa é cada vez menor, enquanto a Associação Humanista Norueguesa conta já com quase 70 mil membros e celebra casamentos que têm efeitos legais desde 2004.

O lançamento da discussão na Noruega, conjugada com a separação entre Estado e Igreja que se efectivou na Suécia no ano ano 2000, comprova que a ideia de laicidade tem progredido na Escandinávia. Existem, no entanto, desenvolvimentos contrários noutros pontos do norte da Europa, por exemplo no Reino Unido, onde o Governo «desconta pontos» às escolas públicas que não realizem diariamente uma oração conjunta a que os alunos só podem escapar a requerimento dos pais, e onde os trabalhistas, telecomandados pelo Opus Dei, querem que o Estado integre escolas privadas confessionais abertamente sexistas, que boicotam a educação sexual e que muitas vezes ainda arranjam tempo para intoxicar os alunos com o obscurantismo criacionista.

A separação entre Estado e igreja na Noruega terá que ser confirmada através de votações em duas legislaturas consecutivas, e portanto acontecerá, se tudo correr bem, em 2014.
7 de Maio, 2006 Carlos Esperança

Justiça religiosa

As religiões pelam-se pela crueldade e pelo espectáculo público. O clero tende para o exibicionismo que a morbidez da fé exacerba.

A penitência é um deleite para o confessor. Depois de devassar a intimidade dos beatos que confiam no abutre que lhes espiolha a vida, embota a inteligência e aterroriza com as fogueiras do Inferno, convence os créus de que tem diploma para perdoar pecados.

Lembrar o espectáculo dos pios churrascos promovidos pelo Tribunal do Santo Ofício e o deleite beato com que se assistia à incineração de uma bruxa, judeu ou herege, é uma viagem ao mundo de horrores que deleitavam o Todo-Poderoso.

Os padres rejubilavam com a libertação das almas que fugiam do corpo a temperaturas indeterminadas e ficavam embevecidos com a devoção e gáudio com que os crentes esgotavam os lugares para assistir aos autos de fé.

Livrou-nos da insânia a luta contra a Igreja, o liberalismo e a Revolução Francesa. A secularização e o laicismo apararam as garras com que o clero dilacerava o corpo e o espírito dos livres-pensadores. Deus, na sua infinita crueldade e demência, foi sendo desmascarado e os padres, irados, assistiram ao triunfo da democracia e da liberdade.

Mas a tara não é apanágio do cristianismo e dos antros do clericalismo romano. No islão, uma forma grave de demência mística, cultivada com desvelo e crueldade, os patifes de Deus continuam a aplicar a justiça divina para gozo de Maomé.

Na Somália, o tribunal islâmico de Mogadíscio condenou à morte o assassino de outro homem e ordenou a um rapaz de 16 anos, filho da vítima, que o espancasse até à morte.

É esta a justiça que os crentes praticam em nome de um Supremo Facínora, a pedagogia cívica que exercem em nome da fé, a crueldade que justam às cinco orações diárias.

É esta demência mística, esta violência religiosa, esta crueldade tribal que em nome da Declaração Universal dos Direitos Humanos nos cabe denunciar e combater.

7 de Maio, 2006 Palmira Silva

Opus Dei: Estratégia de poder

«Obedecer… – Caminho seguro. Obedecer cegamente ao superior » (Caminho, 914)

«Não desaproveites a ocasião de abater o teu próprio juízo: – Custa…, mas que agradável é aos olhos de Deus» (Caminho, 177)

Como bem escreve Alberto Dines, eleito como «A Personalidade da Comunicação» no Brasil em 2002, «A Opus Dei não é uma ordem, devoção ou confissão religiosa, é um projecto de poder político-financeiro-mediático que se desenvolveu na Espanha no período final do franquismo (quando chegou a ter 11 ministros e posteriormente 18) e, em seguida, espraiou-se pela América Latina».

No Brasil (e em toda a América Latina) os tentáculos da Opus Dei invadem os pontos fulcrais da sociedade. Infiltram o meio financeiro e infiltram especialmente os media. Na política, Geraldo Alkcmin, pré-candidato à presidência do país, é um dos políticos brasileiros que melhor ilustra não só as manobras políticas como também a estratégia de poder desenvolvida por esta sinistra organização.

O seu secretário da educação Gabriel Chalita, o tal que é uma das figuras centrais da programação da rede Canção Nova, uma sucursal da Fundação João Paulo II, conseguiu destruir o sistema público de ensino básico e secundário de São Paulo em tempo recorde. Destruição porque Chalita embora clamando uma diminuição do número de abandonos escolares e de reprovações, implementou reformas que conduziram à formação de «ovelhas» que ruminam sem digerir matéria mastigada por outrem e são incapazes de um pensamento ou análise crítica. Futuros cidadãos, completamente desprovidos de sentido crítico e com a capacidade de raciocínio ideal para serem alvos de proselitismo e lavagem cerebral, que engolirão sem pestanejar toda a «pia» matéria debitada pelos media controlados por esta organização!

Estratégia repetida nos países em que a Obra está instalada. Como o próprio Escrivá revelou «O fim específico [da Opus Dei] é trabalhar com todas as forças para que as classes dirigentes, principalmente os intelectuais, adiram aos preceitos [da Obra]» e passa por formar fanáticos, «Oxalá que o teu ‘fanatismo’ se torne cada dia mais forte pela Fé, única defesa da única Verdade» (Sulco, 933), que «libertem» a sociedade das ateias e blasfemas ameaças para a dita fé: «’liberdade’ que aprisiona; ‘progresso’ que faz regressar à selva; ‘ciência’ que esconde ignorância» (Sulco, 933).

Para este retorno aos gloriosos tempos da Idade Média e esplendor da Cristandade, sem qualquer contaminação da famigerada liberdade, progresso ou ciência, em primeiro lugar e principalmente, a Obra investe fortemente no recrutamento de intelectuais e dirigentes, aqueles que governam de facto o destino dos povos e, sobretudo, lhes ministram educação e cultura. Depois de terem operacionais em lugares chave, especialmente na educação, esses operacionais procedem a «reformas» que produzem massas amorfas incapazes de pensamento independente. O espírito crítico, extremamente nocivo à fé, deve ser combatido sem tréguas «É má disposição ouvir as palavras de Deus com espírito crítico» (Caminho, 945).

Assim, não é de estranhar que tantos ministros da Educação nos países em que a Opus Dei estendeu a sua teia de poder estejam ligados à Obra. Para além do exemplo já referido no estado de São Paulo ou de Ruth Kelly, a ministra da Educação Opus Dei de Tony Blair que se devota em destruir o sistema público de ensino britânico, não esqueçamos que foi Roberto Carneiro, mais a sua aberrante teoria que a Educação nacional deveria ser dirigida não para o desenvolvimento individual mas sim dirigida para formar «carneiros», mais concretamente deveria «Fomentar a integração da criança em grupos sociais diversos»*, quem despoletou o processo que conduziu o ensino nacional ao estado actual.

* é criada, para todos os alunos do ensino básico e secundário, a disciplina de Desenvolvimento Pessoal e Social …” (Dec.-Lei 286/89, artº 7 ponto 2.)

Estabelece o ponto 5 do artº 7º que é obrigatória esta formação «social» seja ela garantida pela disciplina de DPS – Desenvolvimento Pessoal e Social – ou pela disciplina de Educação Moral e Religiosa Católica ou de outras confissões pois que, obrigatoriamente, os alunos terão de optar por uma delas (ponto 4 do mesmo artigo 7º).

7 de Maio, 2006 Palmira Silva

Se o rídiculo matasse…

Um grupo cristão americano reuniu-se no passado dia 27 de Abril em Washington, D.C., em frente a uma estação de gasolina para rezar pela diminuição dos preços da gasolina. Os interessados que não se puderam deslocar a Washington para tão importante (e consequente) iniciativa fizeram-no via fibra óptica num site ao vivo e em real time ou usando uma linha telefónica grátis.

Num comunicado de imprensa o grupo Pray Live afirmou que muitas pessoas «se esquecem do poder da oração para resolver a crise energética». E que para além de a iniciativa ser uma mensagem para Deus (que devia ter colocado todo o petróleo do mundo em terras norte-americanas e não em terras de infiéis) é igualmente uma mensagem para a humanidade:

«É nossa esperança que ver e ouvir alguns dos mais poderosos pregadores reunidos em torno de uma estação de combustível e a capital dos Estados Unidos como cenário recorde a todos quem está de facto à frente do nosso Mundo – Deus».

Não se percebe muito bem se a solução pretendida pelos devotos cristãos para baixar o preço dos combustíveis é um milagre tipo transmutação de água em gasolina mas, não obstante todos os esforços envidados pelos cristãos de todos os «flavours» em descredibilizar a ciência, todo o mui cristão «relativismo nihilista» em relação à ciência, a única saída para a crise energética sairá da odiada e «ateia» comunidade científica.

Cientistas que há décadas vêm alertando o mundo e os políticos para a necessidade de se investir em soluções alternativas ao petróleo. O Deus, suposto omnisciente, a que rezam agora os «mais poderosos» pregadores americanos, os mesmos que passam a mensagem de que só a religião cristã é verdadeira e que a ciência é apenas um conjunto de «teorias» ateístas, não é solução para nada … a não ser para encher os bolsos dos seus «delegados» e a satisfazer a sua sede de poder!

6 de Maio, 2006 Carlos Esperança

O Deus dos cavalos

Se os cavalos, à semelhança dos homens, tivessem sido suficientemente burros para criar o seu Deus, ter-se-iam extinguido aos coices.

O Deus dos cavalos, feito à sua imagem e semelhança, teria nascido de égua virgem, com cascos de oiro, crinas de seda, estrela e beta.

Teria vivido no deserto, a reflectir, alimentado 40 dias de palha trilhada, caída do céu, enquanto reflectia no que ia relinchar quando voltasse à companhia dos cavalos seus discípulos.

O Deus-cavalo morreria exausto a fugir dos leões, a galope. Ressuscitaria ao terceiro dia e reapareceria a trote aos dilectos antes de subir ao céu mais veloz que o relâmpago.

Hoje o Deus-cavalo tinha um Cavalo de Deus que relincharia a sua vontade e diria quem era digno de viver a eternidade na sua companhia. Seria um cavalo selado a rigor, alimentado a palha escolhida por velhas éguas e a viver com vetustos cavalos dados à castidade e algum potro de estimação para as confidências.

No seu pio estábulo todos os solípedes se curvariam perante o Cavalo de Deus que, após a morte, teria solenes exéquias procedendo depois um grupo de provectos e destacados equídeos à eleição de um sucessor vitalício.

Se os cavalos fossem, à semelhança dos homens, suficientemente burros, ainda hoje se reuniriam em concílios para discutir se os póneis eram filhos dos cavalos e se as éguas poderiam ser iguais aos cavalos em dignidade como uma perigosa heresia sustentava.

Muitos cavalos morreriam mordidos e escoiceados na defesa da ortodoxia enquanto seriam excomungados os ímpios, execradas as éguas com cio e sangrados os muares do mesmo sexo que se envolvessem em brincadeiras suspeitas.

Assim, os cavalos mantêm o porte altivo e não andam de joelhos nem de rastos. Nem rezam.

6 de Maio, 2006 Carlos Esperança

Mau sinal – Barroso no Vaticano

Alexander Lukachenko, na Bielorrússia, e Bento 16, no Vaticano, são os dois últimos biltres que perseguem os adversários e se fizeram eleger em condições alheias às regras democráticas vigentes na Europa.

O Sapatinhos Vermelhos, além de interferir na vida interna dos países democráticos, é ditador vitalício, chefe de uma rede internacional de cardeais, bispos e outros clérigos disponíveis para trair os seus países em obediência à teocracia resultante dos acordos de Latrão, por vontade de Mussolini – um católico impoluto e ditador fascista.

O presidente da Comissão Europeia, entusiasta da invasão do Iraque, que garantiu a existência de provas de armas de destruição maciça, foi visitar o velho pastor alemão, sem uma palavra de censura pela ausência de uma Constituição democrática nem referência à luta que o ditador tem conduzido contra o preservativo no mundo infectado de SIDA.

José Manuel Barroso era um dos que exigia a referência ao cristianismo na Constituição Europeia, um dos que ignora que as referência confessionais são motivo de ódios entre pessoas e de quezílias entre as nações.

A visita ao ditador vestido de garridos trajos femininos não é um mero acto diplomático, é a manifestação de subserviência e falta de firmeza perante uma teocracia que fomenta a homofobia, o espírito misógino e o ódio à sexualidade.

Quem se ajoelha perante um déspota e é capaz de lhe lamber o anelão com ametista, não representa cidadãos, é um político que rasteja para gravitar em torno de um tirano.

6 de Maio, 2006 Palmira Silva

Cristocracia no Ohio

«Um governo arbitrário é aquele em que as pessoas têm homens que os governam … Só Deus tem essa prerrogativa … por isso homens usurparem essa autoridade é tirania e heresia» John Winthrop (1588 – 1649)

Na passada quarta-feira, sem grandes fanfarras na imprensa, o secretáro de Estado J. Kenneth Blackwell ganhou as primárias do GOP (o partido republicano) para a governação no Ohio. Se Blackwell, conhecido por levar uma Bíblia para todos os eventos a que se desloca, ganhar as eleições para governador do Estado Novembro próximo, como tudo indica, será o primeiro governador negro do Ohio. Será também o governador mais abertamente teocrata nos Estados Unidos desde que John Winthrop governou a colónia de Massachusetts Bay assumindo-se como a mão direita de Deus. Blackwell, a quem se deve a vitória de Bush neste estado em 2004, é igualmente considerado para vice-presidente republicano nas próximas eleições presidenciais.

A relação demasiado íntima (e possivelmente ilegal) de Blackwell com dois megamercados da fé cristã do Ohio já mereceu a atenção do programa Now da PBS. E constitui material que merece uma atenção redobrada.

De facto, duas mega-igrejas do Ohio, a World Harvest Church e a Fairfield Christian Church, esta última dirigida pelo pastor Russell Johnson que está igualmente à frente da Ohio Restoration Project, uma organização cristã cujo objectivo é eleger candidatos que transcrevam nas leis do Estado as aberrações cristãs em matéria de direitos individuais, fizeram campanha activa por Blackwell.

O secretário de estado do Ohio, membro do painel nacional da Juventude por Cristo (Youth for Christ), analista político da Heritage Foundation em Washington, D.C e um comentador muito activo da Salem Communications, participando em programas nas mais de 90 estações desta emissora cristã, pretende, no caso de ser eleito, proceder à «Renovação cívica» deste Estado, isto é, pretende impôr um regime dominionista puro e duro! O que o torna extremamente atraente aos teocratas americanos que, como declarou Rod Parsley, co-fundador com Johnson da Ohio Reformation Movement, pretendem transformar o Ohio em «um campo de treino que lançará uma reforma nacional». Reforma nacional que consiste na abolição da «ateia» democracia uma vez que «Os americanos devem ser cristocratas – cidadãos em simultâneo do seu país e do reino de Deus. E isso não é uma democracia, é uma teocracia».

Os detalhes de como Blackwell usou e usa politicamente (algo que é proíbido nos Estados Unidos em que para beneficiarem de isenção de impostos as igrejas não podem intervir directamente em política) as mega-igrejas e os chamados «pastores patrióticos», nomeadamente Johnson que afirmou serem as próximas eleições de Novembro «um choque apocalíptico entre a cristandade virtuosa [Blackwell] e os fazedores do mal que se opõem aos valores da cristandade [e querem «impôr» a ímpia democracia]», podem ser apreciados num programa recente da PBS, reproduzido aqui.

5 de Maio, 2006 Ricardo Alves

As virgens terão que esperar

Zacarias Moussaoui é um desgraçado. Em 2001, deixou-se apanhar com o passaporte caducado algumas semanas antes do 11 de Setembro. Os seus dezanove amigos conseguiram capturar quatro aviões comerciais, despenhar dois deles contra edifícios de Nova Iorque e outro contra o Pentágono, e apenas perder o controlo do último dos quatro aviões, todavia perpetrando o maior ataque terrorista de sempre.

Reduzido a contemplar, da prisão, o sucesso da conspiração em que participara, Zacarias gritou «Deus é grande», mas é crível que tenha tido alguma inveja. Na religião com que o iludiram, não apenas se acredita numa «vida eterna» posterior à morte, mas também que morrer matando os inimigos da fé garante a maior das glórias nessa «vida depois da morte», em algumas versões garante mesmo umas dezenas de donzelas virgens. Devido ao seu próprio desleixo, Zacarias falhara a ida para este «paraíso das virgens».

Não tem sido devidamente sublinhado que o 11 de Setembro só foi possível porque há pessoas, na Europa e noutros continentes, que vendem a ilusão de que existe uma «vida depois da morte», e que se apresentam como únicas conhecedoras do caminho para essas maravilhas póstumas. Em Portugal, a maioria desses charlatães são muito respeitados, e a ilusão que vendem raramente é criticada em público. Mas é essa ilusão que permite o bombismo suicida.

Zacarias Moussaoui teve azar. O tribunal não o condenou à morte, que ele acha que ainda seria consideravelmente gloriosa e que lhe abriria o caminho, acredita ele, para a «glória eterna». Foi uma decisão humanista do tribunal, mas foi também a segunda desilusão de Zacarias Moussaoui. Esperemos que tenha agora tempo para compreender que foi enganado, e que a vida vale muito mais do que a morte, mesmo sem «paraíso» nem «virgens».