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A herança do cristianismo

Não é a primeira vez que estou de acordo com o papa – não se pode esquecer a herança cristã na Europa. Seria preciso ignorar completamente a história. As guerras religiosas, a inquisição, as cruzadas, o ódio visceral à república e à democracia, a rejeição do humanismo e o combate à emancipação da mulher são património cristão assumido com júbilo por um guardião intolerante – o papa de Roma.

Recordar a herança cristã é também ter presente o ataque persistente à investigação científica e as alianças com os fascismos do séc. XX.

Não se pode, de facto, esquecer tal herança sob pena de não compreender a escravatura, o feudalismo e a perpetuação no poder de numerosos tiranos ungidos e apoiados pela ICAR.

A herança cristã está ainda presente na eliminação dos índios e no colonialismo. A evangelização foi um alfobre de santos e assassinos cujo proselitismo faz as delícias de JP2, ditador de serviço, instalado no Vaticano há um quarto de século.

O perigo é ver num déspota decrépito uma imagem de bondade e abnegação. É esquecer o ódio com que perseguiu teólogos progressistas, a ferocidade com que se opõe à igualdade entre os sexos, a obstinação com que recusa as experiências para descobrir novos medicamentos a partir de células embrionárias, a paranóia em relação à contracepção, a demência com que embirrou com o preservativo.

O cristianismo é insensível à bomba demográfica que diariamente ameaça o planeta, compromete a paz e é fonte de inenarráveis sofrimentos. O papa comporta-se como dono de uma arrecadação onde armazena grande quantidade de almas, com necessidade de nascimentos para promover o escoamento, insensível à fome, às doenças e à miséria.

Se o ayatollah do crucifixo pensasse um só momento na responsabilidade que lhe cabe na tragédia do desmembramento da ex-Jugoslávia morreria de vergonha ou de remorso. Mas a sua obsessão pela Croácia católica foi mais forte.

Pior do que a tirania do sagrado é a sagração de um tirano. A JP2 outro se seguirá.

Os crentes merecem respeito e os clérigos condescendência, mas as crenças exigem um combate persistente e sem tréguas.

Apostila – Conheço pessoas excelentes, cristãs, mas não compreendo como podem aceitar a autoridade de um papa medieval e caucionarem o embuste permanente dos milagres que adjudica para rubricar os alvarás dos santos que fabrica em doses industriais. Isto não é má fé, burla e obscurantismo?