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Dia: 6 de Agosto, 2012

6 de Agosto, 2012 Ludwig Krippahl

Treta da semana (passada): a posição oficial.

Há duas semanas mencionei o caso de Sanal Edamaruku, escrevendo apenas que «mostrou que a água milagrosa que brotava de uma estátua de Jesus não vinha de Deus mas sim de um cano entupido. Como a lei de lá pune quem “magoa sentimentos religiosos”, os bispos católicos querem mandá-lo já para a prisão enquanto aguarda julgamento»(1). Sem dar exemplos concretos, o Alfredo Dinis acusou «Os ateus de língua portuguesa» de relatar este episódio «pelo processo de copy-paste, sem […] confirmar a verdade do que copiam.»(2) Segundo o Alfredo, o exemplo de «incorrecções e inverdades que [os ateus] apresentam acriticamente como verdades» é, desta vez, dizermos que «De uma imagem de Cristo Crucificado saiam gotas de água, o que logo foi considerado como milagre pela Igreja Católica. Demonstrado porém por Sanal que se tratava de um fenómeno natural de infiltração de águas na estátua, logo a Igreja Católica o levou a tribunal.» O Alfredo dedica-se então a demonstrar que a Igreja Católica não tinha proclamado oficialmente o milagre. Para nada, porque nem vi alegarem que a Igreja Católica tinha oficializado o milagre nem é isso que importa.

Várias associações católicas acusam Sanal de «ferir deliberadamente sentimentos religiosos e tentar actos maliciosos visando ultrajar os sentimentos religiosos de uma classe ou comunidade», o que é crime na Índia(3). A posição oficial da Igreja Católica acerca do milagre é irrelevante. O que importa é quererem meter o homem na prisão por isto. Mas isso não vem nem no post do Alfredo nem na declaração do Bispo de Bombaim acerca do sucedido.

O Alfredo transcreve essa declaração do Bispo Agnelo Gracias. Explica que a Igreja não se pronunciou acerca do milagre, por isso é possível que a água gotejante tenha explicação natural, mas o Sanal fez três alegações que o Bispo considera falsas e pretende corrigir assim: primeiro, a Igreja não defende a veneração de imagens porque, segundo o Bispo, há uma grande diferença entre honrar e venerar; segundo, a Igreja não fez aquela estátua para ganhar dinheiro; finalmente, nem a Igreja nem o Papa são contra a ciência. Como o Sanal afirmou o contrário, escreve o Bispo, então tem de pedir desculpa.

Antes de abordar as alegações do Bispo, queria reiterar que o problema não é quererem que ele peça desculpa. Se este fosse apenas mais um caso de crentes a queixarem-se de ofendidos não teria a gravidade que tem. O problema, que gostava que o Alfredo abordasse, é quererem mandar o Sanal para a prisão por causa disto. É um problema que me toca pessoalmente.

Tal como o Sanal, eu também defendo que a religião é incompatível com a ciência. A fé, os argumentos de autoridade, as alegadas revelações por processos misteriosos e irreprodutíveis e a mitologia sobrenatural são tudo coisas que a ciência rejeita com boas razões. A distinção entre “honrar” e “venerar”, no contexto de ir uma carrada de gente em procissão atrás da estátua de Maria, fazer fila para beijar o Jesus na cruz ou rezar à figura do santinho, não passa de demagogia. Certamente que os doutos teólogos terão muito a apontar sobre a etimologia destas palavras e as várias interpretações filosóficas dos termos mas, para a massa associativa que suporta a religião, esta é uma distinção sem diferença. E eu também critico a atitude da Igreja Católica, e todo o complexo politico-económico da superstição, por se aproveitarem da credulidade de milhões acerca de milagres, aparições, santos e afins.

Por isso preocupa-me esta atitude do Alfredo. Eu defendo o direito do Alfredo dizer mal dos ateus sempre que quiser, mesmo achando que ele não tem razão. E se algum ateu se ofender será a infantilidade do ateu que criticarei. Mas, apesar do Alfredo me parecer uma pessoa decente, se a lei aqui me prendesse por dizer o mesmo que o Sanal disse, suspeito que o Alfredo não se iria preocupar com os meus direitos. Temo que a sua indignação se reduzisse a apontar alguma confusão acerca de uma “posição oficial”, mesmo que a alegada confusão fosse inventada na altura. Esta é uma grande diferença entre a crença pessoal e a religião.

As crenças pessoais são um direito e, normalmente, são inofensivas. Seja no Jesus, no Joseph Smith, no SLB ou no pastel de Belém, uma pessoa boa e decente, deixada à vontade com as suas crenças, naturalmente as adapta aos seus valores e continua boa e decente. Mas o empacotamento de crenças em religiões, regulamentadas por autoridade e burocracia, tem este efeito perverso que o Alfredo, inadvertidamente, ilustra. A indignação que uma pessoa decente como o Alfredo devia sentir perante esta injustiça que é condenar o Sanal à prisão morre soterrada em dogmas, autoridade e “posição oficial”.

As atrocidades da Igreja Católica estão no passado. Hoje é mais o Islão que maltrata, tortura e mata quem discordar. Mas todas as religiões tentam recuperar a velha glória porque, ao contrário do que alguns julgam, o problema não é haver gente pérfida a deturpar a religião. A maior parte das pessoas é decente, se as deixarem com a sua consciência. É a institucionalização das crenças em “posições oficiais” que leva milhões de pessoas, de outra forma decentes, a cometer ou permitir tanta barbaridade.

«Religion is an insult to human dignity. With or without it you would have good people doing good things and evil people doing evil things. But for good people to do evil things, that takes religion.» (Steven Weinberg)

1- Treta da semana: o que eles querem sei eu.
2- Alfredo Dinis, Ateísmo (em) português (2)
3- Change.org, We call on the Catholic Archdiocese of Bombay to encourage the withdrawal of complaints against Indian Rationalist Sanal Edamaruku

Em simultâneo no Que Treta!

6 de Agosto, 2012 Carlos Esperança

O Vaticano e os negócios

Banco do Vaticano é o principal acionista da maior indústria de armamentos do mundo, a Pietro Beretta

Talvez poucas pessoas saibam que a fábrica de armas Pietro Beretta Ltda. (a maior indústria de armas no mundo) é controlada pela Holding SpA Beretta e que o acionista majoritário da Holding SpA Beretta, depois de Gussalli Ugo Beretta, é o IOR (Instituto para Obras de Religião) [comumente conhecido como Banco do Vaticano], instituição privada, fundada em 1942 pelo Papa Pio XII e com sede na Cidade do Vaticano.

6 de Agosto, 2012 Abraão Loureiro

6 de Agosto, 2012 Carlos Esperança

No Islão Deus manda matar

Por

ONOFRE VARELA

O Jornal de Notícias do último dia 4 de Agosto, noticiou que, em Inglaterra, um casal matou a filha por crime de honra (!).
O referido casal, de origem paquistanesa, confessou em tribunal ter morto a própria filha, em 2003, por asfixia, lançando o cadáver a um rio. Shafilea Hamed tinha 17 anos e foi morta pelos pais porque eles consideraram que ela “desonrou a família por ter comportamentos culturais do ocidente”.

Isto de “matar por honra”, como que se alguém, no seu perfeito juízo, se sinta honrado por matar, tem as suas bases em princípios religiosos milenarmente sedimentados em raciocínios que, para um ocidental actual serão, no mínimo, desrespeitadores da vontade do outro, imorais e criminosos.

O que são comportamentos culturais do ocidente?
Ir ao cinema? Ao teatro? A um bar beber um copo com amigos ou com o namorado?! Sim. Tudo isto é considerado, pelos fundamentalistas islâmicos, crimes de honra, que só podem ser remediados com a morte violenta daquela mulher (só as mulheres é que são acusadas destes crimes. Os homens nunca desonram a família!) que namorou, que foi ao cinema ou que bebeu um copo em companhia de alguém que não fosse um macho da hierarquia familiar!

Há cerca de uma dúzia de anos, na Turquia, uma rapariga de 14 anos cometeu a imprudência de ir ao cinema sem a prévia permissão da sua família. Em reunião caseira de machos foi sentenciada a pena capital para a “portadora da vergonha familiar”, e um sobrinho da jovem, também menor, foi encarregado de executar a “justiça”. Sem pestanejar nem se interrogar por que haveria de fazê-lo, o moço aceitou, naturalmente, a incumbência como um rito a ser cumprido sem questionamento, e até se sentiu honrado por ter sido escolhido para aquela missão que lhe daria mais valia curricular de macho.

Nessa conformidade, saiu da sala, passou pela cozinha onde pegou uma faca, foi-se à tia… e degolou-a! Ainda está na memória de todos nós aquela dramática imagem divulgada pelas televisões de todo o mundo, e com chamada de capa em todos os jornais, que mostrava uma jovem envergando uma camisola vermelha, a ser apedrejada até à morte num ritual público que durou 30 minutos.

Ela era curda, tinha 17 anos e apaixonara-se por um rapaz que não professava a sua religião xiita. Por isso, um grupo de várias dezenas de homens, entre os quais se contavam familiares seus, matou-a no cumprimento da tradição de punir um “crime de honra”.

A 27 de Outubro de 2008 um caso idêntico foi notícia. Na Somália executou-se uma criança por apedrejamento. Tinha acabado de completar 14 anos mas os “justiceiros” declararam ter 24. Foi lapidada em público num campo de futebol na cidade de Kismayo. De seu nome Asha, a menina foi violada por três homens de um poderoso clã. Estava só. O pai vivia num campo de refugiados no sul do Kénia desde 1992 — onde
ela nasceu em 1995 —, fugindo aos actos terroristas de Mogadíscio. Ia de viagem, integrada num grupo, tentando chegar a casa da avó. Os três violadores apanharam-na numa noite e conduziram-na a uma praia onde consumaram as violações. Chorosa, telefonou ao pai que a aconselhou a dirigir-se à polícia. Ela assim fez e os violadores foram presos.

Os familiares dos três homens procuraram a queixosa e convenceram-na a retirar a queixa. Prometeram-lhe muito dinheiro e que a colocavam na casa da avó. Era esse o seu desejo, por isso aceitou a promessa e retirou a acusação. De imediato foi presa como prostituta, bígama, adúltera e acusada de tentar extorquir dinheiro aos três homens… que
foram libertados! No dia seguinte Asha foi levada ao campo de futebol. Amarrada, foi enterrada até à altura do peito, cobriram-lhe a cabeça com um capuz, e um grupo de homens iniciou o arremesso de pedras até que sucumbisse.

A fé religiosa é, também, um elemento cultural identificativo de um povo… mas isso não quer dizer nada mais para além disso mesmo, e a sua importância cultural é relativa. Um povo pode estagnar na fé ou dar saltos evolutivos na procura do saber. Cada cultura tem as suas próprias características que marcam as diferenças e as semelhanças perante as outras, e que se manifestam em pormenores por vezes difíceis de imaginar. Por exemplo: quando se pede a alguém para que alcance um objecto colocado no princípio da prateleira, esta simples tarefa não é executada do mesmo modo em todas as culturas. Para um ocidental, o princípio da prateleira é o lado esquerdo, enquanto que para um árabe será o lado direito, já que a indicação de “princípio”, enquanto localização, é interpretada como “sentido da leitura” e, como se sabe, os árabes lêem da direita para a esquerda.

Os princípios culturais não desculpam crimes contra a Humanidade.
O Vaticano promoveu crimes idênticos na sua época áurea de séculos, quando detinha o poder máximo na Europa, e ainda hoje andamos a pagar a factura. A ICAR hoje não mata… mas mói!… Domina o pensamento da maioria parlamentar e interfere na política que nos tortura.

Quanto mais religioso for um povo, mais ignorante ele é. A ignorância cria prepotência e a “religião maioritária” acaba por esmagar um povo.

De facto, Deus foi a pior, e a mais tenebrosa, invenção do Homem. Sem o conceito de Deus o mundo seria melhor.

6 de Agosto, 2012 Carlos Esperança

Domingo de verão (Crónica)

Veio ameno este primeiro domingo de agosto com os corpos a aliviarem-se da roupa e dos preconceitos, mais recetivos às hormonas do que aos pios ensinamentos da Igreja.

As praias regurgitam de gente que, adorando o sol, procuram a sombra, divinizando a virtude se entregam ao vício, fazendo a apologia dos bons costumes se dão à relaxação, procurando nos corpos apetecidos o êxtase que o tato, a visão e o paladar propiciam.

Não há conselhos pios, homilias devotas, jejuns ou penitências que refreiem a louca sofreguidão do amor, rolando por entre rochas através da areia, corpos fundidos num arrebatamento, línguas sequiosas em busca da transfusão de saliva que, em vez de os aquietar, excita, partindo em busca de outras descobertas e novos fluidos.

Andam os padres um ano inteiro a pregar a castidade, as delícias do Céu e os castigos de Deus e vêm as hormonas, como tsunami fortuito, a ofender a moral e os bons costumes. Ficam as sotainas a apanhar mofo com padres dentro, desertas as sacristias com a água benta a cultivar bactérias e as igrejas abandonadas ou como meros adereços para fotos de casamentos.

As religiões inventaram deuses avessos ao prazer, alérgicos ao sexo e à carne de porco, seres misóginos que desconheciam a psicologia humana e o êxtase dos sentidos. É por isso que cobrem de ridículo os seus padres, a pregarem a moral para maiores de oitenta anos, enquanto nos cafés, esplanadas, jardins, campos e praias, corpos à solta partem em busca de outros, com mãos ágeis, fino olfato, olhos vivos e paladar guloso, percorrendo a geografia do prazer numa louca correria de quem sabe que a vida é breve e irrepetível.