Segundo a Organização Mundial da Saúde, os casos de poliomielite que condenavam os menores à paralisia, ou mesmo à morte, retrocederam 99% desde 1988. É a segunda grande doença infecciosa que se pode extinguir, depois da erradicação da varíola em 1980. Outras doenças, como o sarampo e a difteria, também foram limitadas drasticamente à medida em que foi aumentando a imunidade colectiva graças às vacinas e aos programas de vacinação elaborados pelas entidades sanitárias em cada país.
É milenar a luta do Ser Humano contra as doenças, especialmente aquelas que se manifestam nas crianças. Porém, contra tudo quanto a história da luta médica em favor da saúde recomenda, hoje assiste-se a um retrocesso em todo o mundo, como se a experiência não nos ensinasse nada e regredíssemos no tempo, negando a ciência médica. Pior do que isso é termos orgulho de retrocedermos nas boas práticas médicas e científicas, mesmo condenando à morte ou à invalidez centenas ou milhares de crianças em todo o mundo.
Um estudo médico publicado na revista “The Lancet” no último mês de Junho alerta para o retrocesso das práticas médicas que permitem a sobrevivência às doenças que podem ser evitadas pela vacinação, especialmente em crianças. O estudo em causa foi elaborado com base em dados recolhidos em cerca de 200 países (praticamente todo o planeta).
É uma péssima notícia para todos nós. E o que é mais grave, é que o problema vai acentuar-se nos próximos anos. Na base de tal gravidade está a ordem de Donald Trump para se cancelar a ajuda dos EUA ao desenvolvimento da vacinação em dezenas de países, pondo fim ao progresso conseguido até aqui, condenando à morte, ou ao sofrimento crónico, milhões de crianças.
A cimentar tal desfecho, que contraria todo o humanismo que já conseguimos na prevenção e eliminação das doenças, está o problema (crescente em todo o mundo) da desinformação massiva acerca das vacinas, como consequência do ataque à Ciência feito através das redes sociais. É conhecido o resultado trágico dos efeitos do COVID no Brasil dirigido por Bolsonaro, e do mesmo efeito nos EUA durante o “primeiro acto” da dramática presença de Trump na Casa Branca, com os malefícios da recusa dos conselhos médicos, substituindo-os por pseudoterapia sem qualquer base científica.
A prevenção do contágio de doenças epidemiológicas requer a participação de todos e a ajuda técnica e económica dos governos realmente interessados na saúde pública. As muitas décadas de trabalho entre as autoridades e os cidadãos, reduziram para valores mínimos as doenças infecciosas que no princípio eram letais. Recordar este avanço das ciências médicas é fundamental para todos termos a noção da necessidade de continuarmos no bom caminho da prevenção.
O pior de tudo isto são os ouvidos surdos dos responsáveis que preferem ficar na História da Humanidade como os monstros defensores de uma economia gananciosa, quase criminosa, em desfavor da economia socialmente responsável, como se verifica no “segundo acto” do dramático desempenho da presidência de Trump.
“A quem te bater na face direita, dá-lhe também a esquerda” (Mateus, 5: 39-42). Esta frase evangélica foi escrita num tempo em que a lei era “Olho por olho e dente por dente”. Convenhamos que a moral contida em Mateus é bastante mais positiva e pacífica do que o conflito que emerge da frase que então fazia lei e mandava tirar os olhos a quem cegasse alguém. As frases moralistas que podem ser encontradas nos Evangelhos têm de ser entendidas à luz do tempo em que foram registadas. Dois mil anos depois de Jesus Cristo (JC), as sociedades evoluíram, os Códigos Comportamentais também, e nós… bem… nós continuamos a ser os mesmos animais de sempre!
A nossa mentalidade pouco mudou com o decorrer dos séculos! Em termos de consciência, somos, hoje, os mesmos homens que escreveram a Bíblia e os Evangelhos. A técnica evoluiu; na escrita passamos das placas de barro para o papiro, deste para o pergaminho, depois para o papel e a seguir para o computador, mas a nossa mente bélica continua a mesma. Somos a última experiência da Natureza na vida do planeta. Temos menos de 200.000 anos… somos primitivos por mais evoluídos que, por vaidade, nos consideremos. Quando oferecemos “a outra face” a quem nos bate, partimos do princípio que o outro vai entender a nossa posição e sentir-se envergonhado por nos ter agredido. A nossa atitude pacífica contrasta de tal modo com a do agressor que, este, se for inteligente e sensível, vai sentir-se mal e pedir perdão pelo seu acto hostil, abandonando as suas incorretas atitudes. É esta a intenção da frase evangélica atribuída a JC e escrita por Mateus.
Mas… e os ditadores? São inteligentes e sensíveis? NÃO!… Se o fossem não seriam ditadores. É no quadro evangélico que eu entendo a frase do Papa Francisco I (F1) quando, há cerca de um ano, pediu ao governo ucraniano que tenha “a coragem da bandeira branca e de negociar com a Rússia”, acrescentando que “a palavra «negociar» é uma palavra corajosa […] quando percebemos que estamos derrotados e que as coisas não estão a correr bem, é preciso ter a coragem de negociar”. Obviamente, os ucranianos ficaram indignados ao interpretarem o discurso de F1 como um apelo à rendição do país perante a invasão russa. Putin regozijou-se com o apelo do Papa por o sentir do seu lado e fez saber que está disponível para negociações com a Ucrânia, numa atitude de exploração do mais fraco no conflito.
Neste caso, eu só posso pensar o contrário do ditador e de F1! Quem tem de terminar a guerra é o país invasor que a começou… e não o país invadido que não faz guerra e apenas se defende! Sublinhando a sua maldade de invasor, Putin acrescentou ao seu discurso de “paz”, este “pacífico” recado dirigido a todo o mundo: “a Rússia está pronta para uma guerra nuclear”.
F1 (que considero ser o melhor Papa de todos quantos no último século se sentaram na cadeira de S. Pedro) tem de perceber que as frases evangélicas são para consumo caseiro dos fiéis cristãos, mas nunca serão consumidas, nem entendidas, pelo mau vizinho que é Putin (nem as entende Trump). Em resposta, a Polónia sugeriu a F1 que “encoraje Putin a retirar o seu exército da Ucrânia”. Por seu lado, Zelensky pediu ao Papa para apoiar o plano de Paz ucraniano onde se reitera a restauração da integridade territorial da Ucrânia, a retirada da tropa russa e a cessação das hostilidades. Este plano não está aberto a negociações, disse ele… e eu assino por baixo.
Vamos lá a ver, leitor. Raciocine comigo: o seu vizinho destrói-lhe a casa que é sua e mata a sua família. Depois quer que você “negoceie” com ele de acordo com a vontade dele, que nunca é a sua; ele propõe que você fique com o anexo do fundo do quintal, e ele ficará com tudo o resto que é seu. Só assim o seu vizinho lhe “garante” a Paz. Você aceita?… EU NÃO ACEITARIA! A “Paz” alcançada deste modo não é Paz; é um conflito latente e interminável. Não é por eu “dar a outra face” que vou viver bem e que o meu vizinho jamais me incomodará!… Este vizinho nunca retirará a sua bota do meu pescoço. Vamos aceitar “ultimatums” de todos os bandidos que nos invadem a casa e que nos matam a família? O que fazemos com um psicopata assassino? Ajoelhámo-nos perante ele, ou enclausurámo-lo?
Espero que o Mundo nunca deixe de se unir em favor dos invadidos e condene os invasores. O mesmo penso de Israel; terá de reconstruir a Palestina para os palestinos. Netanyahu merece ser preso… e Trump também!
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