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5 de Julho, 2006 Carlos Esperança

As religiões e a democracia

As religiões do livro são incompatíveis com os direitos humanos. Não são as aldrabices que promovem a violência e a crueldade, é o poder dos clérigos que sufoca a liberdade e o livre-pensamento.

O clero considera-se detentor do alvará que permite a interpretação do livro sagrado. O desvario pode considerar uma abominação um copo de vinho, uma fatia de presunto ou um bocado de polvo.

Como é perigoso metermo-nos com doidos, a atitude mais prudente é ignorar a religião, como fazem os agnósticos. Mas é preciso contestá-los, se não queremos renunciar ao paradigma civilizacional em que vivemos. É essa a tarefa dos ateus.

Não é com fogueiras, torturas ou excomunhões que se divulgam ideias, é pela palavra e pelo exemplo, pelo exercício da democracia e da cidadania, defendendo a liberdade e o laicismo. As igrejas usam o medo e a repressão, o ateísmo limita-se ao esclarecimento.

Não há uma só das liberdades democráticas que tenha sido outorgada por uma religião. A própria democracia é filha do iluminismo e da secularização. As religiões só sabem proibir e condenar, em nome de um Deus obsoleto, intolerante e vingativo.

Deus é inimigo da liberdade e adversário da sexualidade que não vise a reprodução.

Deus foi a pior ideia que os homens tiveram. E a mais funesta.

5 de Julho, 2006 Ricardo Alves

Quem renuncia a quê?

Alguns religionários afirmam que quem não tem religião é um ser «incompleto» (quiçá «mutilado»), que está «fechado à dimensão transcendental» e a quem portanto «falta qualquer coisa». Compreende-se a intenção, pouco ou nada subtil: apresentar a religião como uma mais-valia pessoal e social e tentar menorizar quem aceita o universo tal como o conhecemos.

Todavia, é quem está «aberto» ao sobrenatural que se fecha à realidade, à lógica, ao rigor intelectual, ao conhecimento comprovado pela ciência e ao próprio bom senso. Acreditar em fantasmas, num «Deus» interventor ou na influência dos astros, se significa «abertura» a alguma coisa, é à fantasia e ao irracional.

Existem seres humanos que convivem bem com a certeza de que só existe o mundo natural (alguns até frequentam as igrejas). E existem seres humanos (que nem sempre frequentam as igrejas) que necessitam de acreditar que existe «mais alguma coisa», para além do universo observável ou para lá da morte. Mas a necessidade de conforto emocional do segundo grupo de pessoas não faz com que o universo deixe de ser o que é.
5 de Julho, 2006 Palmira Silva

Leitura recomendada

Um artigo absolutamente imperdível no Guardian sobre o cisma anunciado da Igreja Anglicana devido à ordenação de bispos no feminino ou homossexuais. Gosto especialmente da solução do autor, o ateu confesso Simon Jenkins, para acabar com a crise: a abolição dos bispos!

Alguns excertos:

«Como deve um ateísta reagir à última actividade sísmica dentro da Igreja de Inglaterra? Eu debato, tu escolhes argumentos mas os anglicanos têm cismas. (…)

«A fonte de todos estes problemas são os bispos. Os presbiterianos estavam certos. Os Bispos são um pestilência maçadora e burocrática. (…) Na Idade Mádia, em que todos eram supostamente cristãos activos, tinham de suportar 20 bispos, e apenas seis foram adicionados antes da era vitoriana. Em 1845 eram 30; em 1945 o seu número tinha aumentado para 90. Hoje temos 114 bispos e bispos auxiliares. (…) A Igreja Anglicana parece a marinha moderna, com mais almirantes que navios no mar. (…)

Para a maior parte das pessoas, mesmo para muitos anglicanos, isto parece a discussão do sexo dos anjos. A controvérsia acerca de bispos homossexuais ou mulheres é absurda. Que uma instituição do século XXI possa promover trabalhadores não com base no mérito mas com base em discriminação sexual não é matéria de discussão. Esta é uma Igreja em que os membros episcopais compreendem aqueles que apoiam a cadeira eléctica e a tortura militar: certamente que podem abranger a homossexualidade e a emancipação da mulher. (…)

O ateísmo não tem exércitos mas o cristianismo, judaismo, hinduismo e o Islão claramente têm. Nunca uma maior mentira foi dita que aquela que sustém que o Papa não tem divisões [militares].

Este não é o lugar para discutir se a religião promove ou simplesmente reflecte conflitos entre pessoas. É um dado na maioria das guerras modernas e, em muitas, o fundamentalismo e intolerância religiosos exacerbam em vez de diminuirem a ferocidade do conflito.»

4 de Julho, 2006 pfontela

Transhumanismo

Uma das ideias que surgiu das correntes de pensamento de inspiração materialista nas últimas décadas foi o transhumanismo. Este movimento define-se pelo apoio ao uso das novas ciências e tecnologias para o melhoramento físico e intelectual da humanidade além de suavizar os alguns dos efeitos negativos inerentes à condição humana actual, tal como o envelhecimento ou própria morte. O objectivo seria atingir um estado pós-humano. Aqui devemos definir esse estado como a situação em que a evolução ja não está nas mãos de mutações lentas e fora do nosso controlo e passa a existir uma evolução dirigida – sendo que por evolução dirigida é necessário entender que a livre vontade é um valor absoluto, só o indivíduo pode dispor sobre o seu material genético e sobre a sua existência em geral.

A história do movimento é bastante interessante mas não será esse o aspecto fundamental da minha abordagem. O movimento cultural e social do transhumanismo parece ter essencialmente duas bases: o individualismo e o materialismo. O individualismo porque o principal objectivo é melhorar o indivíduo, de acordo com a sua vontade pessoal (chegando ao extremo de se poderem redesenhar completamente a si mesmos, o que inclui em extremos teóricos, e puramente especulativos, o abandono de uma forma biológica) e o materialismo porque nada é tomado como um acto de fé, as suas aspirações não são depositadas numa promessa de uma vida posterior ou em conceitos intangíveis mas sim no presente e nas técnicas que sabemos serem eficientes.

Este conjunto de ideias parece ser simples em si mesmo mas a quantidade de críticas que recebe é algo absolutamente extraordinário. Regra geral os comentários mais negativos dividem-se em três sectores: os neo-luditas, os “realistas” e os distópicos.
Os neo-luditas partilham essencialmente de uma visão anti-ciência e anti-mudança, que visa impor o status quo como algo permanente – dentro deste grupo existem dois subgrupos importantes, os religiosos que consideram a elevação do homem através da técnica como blasfémia e os ecologistas que gostam de uma ideia a que chamam “natural” (que é um conceito extremamente discutível).
Os realistas são essencialmente pessoas que duvidam das capacidades técnicas da humanidade para poder alguma vez cumprir com as promessas do transhumanismo. Dados os saltos técnicos do último século e a natureza exponencial do progresso técnico (indicado no conceito de singularidade) as suas dúvidas parecem ser infundadas.
Por fim chegamos ao grupo com mais hipóteses de realmente ser um obstáculo para o transhumanismo: os distópicos (dos quais o conservador Fukuyama é o mais destacado representante). Um ciência avançada pode levar a dois tipo de cenários, um de utopia individualista de uma liberdade inimaginável pelo nosso standard actual ou a uma distopia que no pior dos casos leva à aniquilação da própria espécie.

Para atingir o seu notável conjunto de objectivos gerais os transhumanistas (entre os quais me incluo a mim) aceitam recorrer a várias tecnologias recentes. A que mais potencial apresenta a curto e médio prazo é sem dúvida a genética. A nanotecnologia também apresenta potencial mas num futuro talvez mais distante (e a carga de controvérsia que apresenta é significativamente menor que a da genética). Um bom primeiro passo para implementar um estado de espírito transhumanista entre mais pessoas seria combater a percepção generalizada que as técnicas médicas o científicas (algo tão complexo como terapia de genes ou tão simples como tomar medicação por via oral) são para ser utilizadas exclusivamente para corrigir deficiências – quando numa perspectiva muito mais interessante podem ser usados para aumentar o que é normal para um ser humano. Isto hoje em dia é complicado porque grande parte dos laboratórios não desenvolve testes da sua medicação em pessoas saudáveis e não o fazem porque o potencial uso para incremento de habilidades é muito pequeno já que em muitos países é ilegal publicitar efeitos que não sejam puramente terapêuticos – se não podem publicitar quer dizer que se investe dinheiro e tempo em testes sem ter um retorno significativo.

Outro ponto importante é o medo irracional à tecnologia que certos sectores (especialmente religiosos e ecologistas) querem incutir às pessoas, os neo-luditas que referi acima. O progresso tecnológico vai continuar com o sem a proibição de certas técnicas experimentais, mas no caso de haver uma proibição generalizada no Ocidente os resultados serão muito piores para os cidadãos comuns. Em primeiro lugar fora da Europa e da América do Norte as atitudes face às novas tecnologias são muito diferentes, enquanto que nos EUA cerca de 40%/50% das pessoas são contra o uso da ciência para melhorar humanos normais em certos países asiáticos (por exemplo a Tailândia) cerca 90% da populacao é a favor. O que isto nos diz é que se não aproveitarmos as oportunidades tecnológicas alguém o fará. A segunda consequência da proibição seria a criação de um mercado negro. Quem pode pagar terá acesso as tais técnicas (por meios ilegais ou indo a países onde se podem aceder legalmente) enquanto o cidadão comum não o poderá fazer.

Em abono da verdade, e para terminar esta introdução, convém dizer que o movimento transhumanista é extremamente diverso, incluindo até crentes – que obviamente encaram a sua transformação em pós-humanos de forma bastante diferente – mas estes são uma minoria quando comparados com o número de ateus e agnósticos.

4 de Julho, 2006 Palmira Silva

Rapariga apedrejada até à morte

Uma raparga de 20 anos foi apedrejada até à morte em Izom, perto de Minna, a capital do estado de Niger na Nigéria, por uma multidão de jovens enraivecidos.

A jovem assassinada tinha distribuído panfletos com «material não reprodutível», em que denunciava más acções de Maomé, Cristo e outros pastores vivos e mortos. O estado do Niger tem uma população igualmente dividida entre cristãos e muçulmanos.

Aparentemente não foram efectuadas detenções pelo assassinato da jovem, descrita como «louca», e não se detectam quaisquer intenções das autoridades locais, num estado em que vigora a Sharia, para acusar alguém pela morte da jovem.

4 de Julho, 2006 Palmira Silva

Curiosidades históricas

Vin Mariani era um vinho tonificante comercializado a partir de 1863 por Angelo Mariani. O vinho era obtido por decocção de folhas de coca em vinho Bordeaux, ou seja, continha um elevado teor de cocaína, extraída pelo álcool, cerca de 211 mg de cocaína por litro. Quer Leão XIII quer Pio X eram ambos apreciadores (e consumidores) do Vin Mariani. Leão XIII, que aparece neste poster promovendo a bebida, atribuiu-lhe uma medalha de ouro do Vaticano.

3 de Julho, 2006 Ricardo Alves

Os oxímoros como sinal de desespero argumentativo

Existem crentes que, quando em desespero argumentativo, declamam extravagâncias sobre «a religião do ateísmo» ou «os dogmas da ciência» (outros clássicos são «a anti-religião do laicismo» e «a ciência é uma tradição»).

Quem se compraz com estes oxímoros, fá-lo por se sentir encurralado. Como não temos religião alguma, não podem acusar-nos de seguir a religião errada, e por isso preferem renunciar ao rigor conceptual e proclamar que não ter religião é uma religião. Não compreendem que é um perfeito absurdo chamar fé à ausência de fé, como é outro disparate dizer que rejeitar a tradição é uma tradição, ou que a saúde é uma doença.

3 de Julho, 2006 Carlos Esperança

B16 – O sempiterno ódio à liberdade

O pontificado de B16 ficará na história pela intolerância, intransigência doutrinária e conservadorismo teológico. A fraterna e entusiástica recepção aos excomungados fiéis da Sociedade S. Pio X (SSPX), filhos pródigos de pendor fascista e anti-semita, é a marca de água de um frio pontífice fascinado pelo poder absoluto.

B16 é demasiado inteligente e arguto para acreditar na existência de Deus, na verdade dos evangelhos ou no negócio dos milagres, mas sabe que a multinacional da fé a cujos destinos preside só sobrevive com mão de ferro e inflexibilidade ideológica.

Sagra bispos e cria cardeais de acordo com a intransigência intelectual e o proselitismo de que deram provas; fabrica santos e beatos segundo as necessidades do mercado e os interesses das sucursais que esportulam os devidos emolumentos.

O apego de B16 ao Opus Dei, Comunhão e Libertação, Legionários de Cristo, SSPX e outras seitas prosélitas de pendor fortemente reaccionário, é uma estratégia de combate ao islão, ao laicismo e ao ateísmo. O que fascina B16, é a liderança do obscurantismo e a hegemonia no mercado da fé.

Engana-se quem julga B16 um clérigo arcaico, deslumbrado pelo fausto e mordomias da cadeira de Pedro, como acontecia com o supersticioso antecessor. Este é muito mais sofisticado e melhor estratego. Usa a influência e dinheiro das ordens e movimentos que dirige e dos políticos que infiltra nos Estados.

A ICAR abomina a democracia. O ódio de Pio IX consta da matriz genética dos seus sucessores. B16 recusa a liberdade individual em nome da vontade do Deus de que se diz intérprete. A ordem e a autoridade são valores a que apela com o zelo dos fanáticos e a crueldade dos algozes.

B16 abomina todas as liberdades: desde a liberdade de expressão à liberdade religiosa ou da descrença, do livre-pensamento ao direito de crítica, da prática da sexualidade sem fins procriativos à eutanásia. B16 e os seus sequazes só apreciam regimes políticos que se submetam às sotainas e acolham os ditames dessa obscura ditadura sediada num bairro de Roma mal frequentado – o Vaticano.