23 de Abril, 2012 Abraão Loureiro
Bill Maher refuta o argumento ‘Ateísmo é uma religião’ (Legendado)
http://www.youtube.com/watch?v=81IkXat-qsk&feature=related
http://www.youtube.com/watch?v=81IkXat-qsk&feature=related
O Alfredo Dinis continua a insistir que o «Equívoco fundamental» do ateísmo é o «maior drama [de] estar estruturalmente impedido de […] erradicar a religião»(1). Isto não só confunde equívoco com drama e impedimento como demonstra que o Alfredo ainda não percebeu aquilo que tenta criticar. O Alfredo tem a sua crença de cristão no centro da sua vida e na origem dos seus valores. Não admira que julgue dramático que outros rejeitem as hipóteses de haver vida eterna, criação inteligente ou um ser omnipotente que nos ama a todos. Mas o meu ateísmo não tem nada de fundamental. É apenas um efeito colateral de dois factores: a minha opção de formar opiniões que se conformem às evidências e a preponderância de evidências mostrando que não há um propósito inteligente para o universo nem vida depois da morte. Eu rejeito estas crenças do Alfredo tal como rejeito a crença em Osiris, no professor Karamba ou na astrologia. Sem drama, impedimento ou sequer grande preocupação com o que os outros acreditam. O que oponho nestas coisas das religiões, astrologias, homeopatias e tretas afins é apenas o seu impacto social negativo. Esse gostaria de ver desaparecer, admito, mas a minha incapacidade de atingir esse objectivo não constitui, por si, qualquer equívoco.
Neste episódio da sua série de equívocos, o Alfredo foca a resposta de Lawrence Krauss à questão «Porque existe algo em vez de nada?». Segundo o Alfredo, Krauss equivoca-se por querer substituir a definição filosófica de “nada” como “não-ser” por uma definição científica. Infelizmente, o Alfredo não explica porque é que isto é um equívoco, invocando apenas que «Os neopositivistas do Círculo de Viena já tinham transformado a filosofia numa ‘serva da ciência’», um salto particularmente confuso. Mas, para explicar a confusão, vou começar com exemplo mais fácil. O tempo.
Antes de Einstein a filosofia já tinha tentado definir este termo, dividindo-se em vários campos mas concordando que o tempo, fosse ideia ou real, fosse relacional ou absoluto, definia uma ordem única para os acontecimentos. Se A ocorresse antes de B, julgavam os filósofos, A ocorria antes de B em qualquer referencial e para qualquer observador. Mas Einstein notou que este conceito de tempo não correspondia à realidade e substituiu a definição filosófica por uma definição operacional. O tempo é aquilo que for medido por processos regulares que possam servir de relógio. Pela teoria da relatividade, é possível que A ocorra antes de B num referencial, B ocorra antes de A noutro referencial e ocorram em simultâneo noutro ainda. Hoje sabemos que até a ordem pela qual acontecimentos ocorrem depende do referencial.
Isto não é neopositivismo nem faz da filosofia uma serva da ciência. Ao contrário do que julgavam os positivistas, não se pode separar completamente os dados das teorias. Só se pode obter dados tendo teorias com que os interpretar, e é preciso filosofia para criar teorias antes de ter dados. Só que, sem dados, não se consegue convergir para as teorias certas. Isso faz-se com ciência, usando dados para testar especulações, rever conceitos e adaptar teorias às evidências. Ou seja, a filosofia e a ciência são apenas fases do mesmo processo contínuo de compreensão da realidade. É preciso que a filosofia especule, pois sem especular não se consegue sequer começar, mas é igualmente necessário que a ciência vá corrigindo e afinando essas especulações, pois sem isso não se sai da confusão inicial.
É isto que estão a fazer com a noção de “nada”. As definições filosóficas deram sentido ao termo recorrendo apenas a outros termos e conceitos. Por exemplo, o nada como não-ser. É o melhor que se consegue sem dados concretos que se possa usar. Mas, agora, a física pode dar uma definição operacional de “nada” que encaixa melhor com os dados que temos. É essa a definição que Krauss defende, e que parece ter escapado ao Alfredo: «o nada que normalmente chamamos espaço vazio. Ou seja, se tomar uma região de espaço e me livrar de tudo o que lá estiver – poeira, gás, pessoas e até radiação que passe por lá, absolutamente tudo de dentro dessa região…»(2). E o que sabemos agora mostra que desse nada pode, espontaneamente, surgir um universo. Já não precisamos de explicar porque há algo em vez de nada como faz a teologia, definindo “nada” como um não-ser vazio de tudo excepto um deus omnipotente desejoso de criar um universo. O mecanismo é bem mais simples. Basta o nada. Não o nada teológico ou filosófico, mas o nada real da física.
Queixa-se também o Alfredo de que Krauss «decidiu transformar as questões que começam por ‘Porquê?’ por questões que começam sempre por ‘Como?’ […] Como se um sociólogo pudesse proceder ao estudo sociológico do suicídio estudando simplesmente os diversos modos como as pessoas se suicidam.» Esta analogia é errada porque, por definição, o suicídio é um acto intencional. Obviamente, nesse caso não podemos excluir a motivação que levou o falecido a terminar a sua vida deliberadamente. Mas seria um erro do sociólogo estudar todas as mortes assumindo sempre haver motivação e intenção inteligente. Acidentes, doenças, velhice, tudo isso pode levar à morte por um “como” sem qualquer “porquê”, neste sentido de intenção e propósito. Enquanto que “Como?” é sempre uma pergunta válida, cuja resposta atenta e fundamentada pode, se for caso disso, suscitar um “Porquê?”, é um erro começar pelo “Porquê?” antes de perguntar “Como?”, porque essa pergunta assume logo à partida haver propósito e inteligência. No caso da origem do universo, essa premissa é mera especulação sem fundamento e é um equívoco começar por aí quando a melhor resposta ao “Como?” não indica qualquer “Porquê”.
1- Alfredo Dinis, Grandes equívocos do ateísmo contemporâneo
2- Lawrence Krauss, A Universe from Nothing.
Em simultâneo no Que Treta!
A bom ritmo, como não podia deixar de ser, promove-se o obscurantismo. Desta vez, são os “rituais de magia negra”. Naturalmente, no chamado “Portugal profundo”, desta vez com uma parceria “bruxo-autarca”.
Em pleno Século XXI.
Faz hoje 506 anos.
O dia 19 de Abril de 1506 amanheceu pacífico e soalheiro.
Na igreja de São Domingos, em Lisboa, a missa dessa manhã decorria provavelmente com a calma modorra do costume.
Mas, de súbito, a placidez da missa foi interrompida por um estranho fenómeno que se oferecia perante os olhos de todos os fiéis: a imagem do Cristo pregado na cruz que se encontrava sobre o altar estava iluminada por uma estranha e misteriosa luz.
A superstição e a exacerbada crença dos fiéis imediatamente os fez acreditar estar na presença de um milagre: a imagem do Cristo parecia até que irradiava luz própria.
Todos se ajoelharam em fervorosas preces, em êxtase perante aquele milagre que se lhes oferecia, ali mesmo, à frente dos seus olhos.
Mas há sempre um desmancha-prazeres em histórias como estas: um dos fiéis mais afoitos logo se apressou a explicar aos seus colegas de missa que a luz nada tinha de misteriosa, pois provinha simplesmente do reflexo de uma candeia de azeite que estava ali próxima.
E pronto! Caiu o Carmo e a Trindade!
A primeira coisa que alguém descobriu foi que o chico-esperto era um cristão novo, um judeu convertido à pressa mas, pelos vistos, demasiado depressa.
Foi o suficiente para logo dali o arrastarem pelos cabelos para o adro da igreja, onde foi imediatamente chacinado pela multidão dos fervorosos tementes a Deus, e o seu corpo queimado no local.
O êxtase místico da multidão logo se propagou a toda a cidade.
Lisboa parecia ter ela própria enlouquecido.
Respeitáveis representantes do clero católico saíram dos seus pacatos refúgios de oração e percorriam as ruas de um lado para o outro empunhando crucifixos e gritando: «Heresia! Heresia!».
A multidão depressa foi engrossando e, ajudada até por marinheiros holandeses e dinamarqueses que se encontravam no porto, iniciou uma gigantesca rusga por toda a cidade.
Para evitar o caos e a anarquia, sempre más conselheiras, os padres e frades dominicanos tomaram a piedosa responsabilidade de organizar convenientemente o tumulto: judeu ou cristão-novo que era identificado ou apanhado, era imediatamente preso e levado para o Rossio e ali era queimado em gigantescas fogueiras que os escravos municiavam ininterruptamente de lenha.
Os judeus e os cristãos novos, homens e mulheres, que se refugiavam em casa eram arrancados à força dos seus esconderijos. Até as crianças de berço eram fendidas de alto a baixo ou esborrachadas de encontro às paredes.
Como mesmo nestas coisas da fé é sempre bom juntar o útil ao agradável, o misticismo assassino daqueles fervorosos e bons católicos não os impediu de pilhar as casas por onde passavam e de ajustar velhas contas com inimigos que muitas vezes nada tinham a ver com o judaísmo.
Mesmo os que se refugiavam nas igrejas e se agarravam desesperadamente às imagens dos santos eram levados e arrastados à força para o Rossio e queimados vivos.
A chacina durou dois dias e só terminou por puro cansaço da populaça.
Relatos da época falam no sangue que escorria pelas ruas abaixo no Bairro Alto ou na Mouraria.
Calculam os historiadores que nesta matança em nome dos mais sagrados princípios e da pureza do catolicismo morreram mais de 4.000 pessoas.
Tudo, claro, em nome dessa coisa extraordinária que algumas pessoas têm e que tanto se orgulham de ter, que se chama «Fé».
Tudo feito por bons católicos.
Tudo em nome de Deus.
Os candidatos do PS e do PSD para o Tribunal Constitucional (TC) são membros do Grande Oriente Lusitano, a obediência mais influente da maçonaria.
A informação é avançada pelo “Público”, que lembra que a escolha destes dois maçons para o Constitucional surge poucos meses depois da controvérsia originada por um relatório do PSD que designava a maçonaria como “grupo de pressão”, “influente” e capaz de afectar a “credibilidade” dos serviços secretos.
Nós já sabemos qual é a base das estatísticas: se eu comer um frango e tu não comeres nenhum, comemos, em média, meio frango cada um. No entanto, e como não sou especialista em estatísticas, deixo esta a quem souber mais do que eu.
Principalmente, se for católico.
Faço notar que o estudo é da insuspeita Universidade Católica.
Dizer que o ateísmo é um fenómeno contemporâneo, é uma ideia falsa, que um adjectivo pode tornar verdadeira. O ateísmo data de há pelo menos dois mil cento e cinquenta anos, mas o ateísmo militante, tem apenas um século e meio.
A negação da existência de Deus já estava presente na Grécia e na India no primeiro milénio Antes da Nossa Era. No tempo de Buda (agnótisco mas não ateu), a India tinha os seus materialistas que, através do seu mestre pensador, Ajita Keshakambala, negavam a ideia de reincarnação em função dos méritos: Os cépticos, discípulos de Sanjaya Belatthaputta, achavam impossível (tal como os seus homólogos na Grécia) ter uma certeza do que se passava no “lado de lá”. Os hebreus também tinham os seus ateus. «não existe Deus», diziam os homens «presunçosos» ou «loucos» (Salmos 10,4 e 14,1). mas talvez estes ateus fossem apenas fiéis de um ídolo porque «pregam sobre os não-deuses» (Jeremias 5,7) e renegam o Deus de Israel.
A questão da existência de Deus está ligada, no mundo antigo e no moderno, à recompensa do Bem e à punição do Mal. A partir da época (século VI, A.N.E.) em que se expande, tanto na India como no Próximo Oriente, a crença numa vida futura melhor para os justos e não tão boa para os maus, as injustiças deste mundo deixam de estar automaticamente na origem de uma atitude de incredulidade. Muitos são, no entanto, os que continuam a desejar uma retribuição na terra, como os sábios da Bíblia, Job e Qohélet, que confundiam a dúvida com a fé e vêem no triunfo do Mal a vaidade do mundo e a vacuidade do Bem. O Corão associa igualmente a existência de Deus à recompensa dos crentes: «Não há dúvida quanto a isso mas uma parte não sabe… Dizem: a única vida que existe é a actual» (salmo 45,24). Estes não-crentes podem ser «idólatras» (são mais heterodoxos do que os ateus) mas também muçulmanos cépticos, leia-se ímpios. No século XII, o poeta iraniano Omar Khayyam escreveu: «No xadrez da existência, somos votados aos nossos jogos para cairmos no vazio de um baú.» Entre os amores interditos e a proibição do álcool, muitos poetas árabes ou persas confundem descrença com libertinagem.
Esta mistura é também denunciada na França de Luís XIV por vários predicadores e, sobretudo, por Bossuet: «Il y a un atheísme caché dans tous les coeurs qui se répand dans toutes les actions» (Pensées détachées). «Les athées et les libertins… disent ouvertement que les choses vont au hasard et à l`aventure, sans ordre, sans gouvernement, sans conduit superieure.» Mas falar abertamente pode conduzir à morte: em 1776, o cavaleiro de La Barre, de desanove anos, foi decapitado em Paris por não ter descoberto a cabeça à passagem de uma procissão. O medo do martírio sustém os ateus, porventura mais numerosos do que os raros «espíritos fortes» que confessam a sua não-crença.
O século XIX assiste ao nascimento de um ateísmo menos centrado na moral que no social, resumido na frase do socialista Blanqui: «Nem Deus nem mestre.» O ateísmo “militante” dos tempos modernos, por oposição ao ateísmo “pessoal” das épocas anteriores, toca o coração das multidões «supersticiosas» em que se transformaram as massas trabalhadoras. Estas são levadas a questionar os religiosos ociosos, imorais porque associais. Quanto à libertinagem de antanho, classificamo-la menos como ateísmo do que como hedonismo. Pode dizer-se que ela suscita mesmo uma nostalgia do ideal ateu e da sua moral laica. Entre a esperança e a desilusão, estes homens lúcidos são a um tempo crentes e ateus. Como se em cada crente houvesse um ateu incrédulo disfarçado.
*adaptado: Odon Vallet. Pequeno livro das ideias falsas sobre as religiões.
O Mané é o autor da lei. Provavelmente analfabeto pois não sabe ler a constituição do seu país.
O Diário de uns ateus é o blogue de uma comunidade de ateus e ateias portugueses fundadores da Associação Ateísta Portuguesa. O primeiro domínio foi o ateismo.net, que deu origem ao Diário Ateísta, um dos primeiros blogues portugueses. Hoje, este é um espaço de divulgação de opinião e comentário pessoal daqueles que aqui colaboram. Todos os textos publicados neste espaço são da exclusiva responsabilidade dos autores e não representam necessariamente as posições da Associação Ateísta Portuguesa.