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Religião e terrorismo

Fez na sexta-feira um ano que quatro bombistas suicidas mataram 52 pessoas em Londres. Nesse 7 de Julho de 2005, foi divulgado um comunicado de proveniência pouco clara em que uma «Organização Secreta da Al-Qaeda na Europa» se vangloriava pela «vingança contra o governo cruzado e sionista britânico em retaliação contra os massacres que a Grã-Bretanha está a cometer no Iraque e no Afeganistão». Esse comunicado começava «Em nome de Deus…» e terminava com uma citação do Corão.

Posteriormente, foi divulgado em Setembro um vídeo em que Sidique Khan (o líder dos bombistas do 7 de Julho), clarificava que «a nossa motivação principal não vem das comodidades tangíveis que este mundo tem para oferecer. A nossa religião é o Islão, obediência ao único Deus verdadeiro, Alá, e seguir no caminho do profeta final e seu mensageiro, Maomé».

Mais recentemente, a Al-Qaeda reclamou explicitamente a autoria dos atentados de 7 de Julho, num vídeo em que Al-Zawahiri afirma que Shehzad Tanweer e Sadique Khan receberam treino com explosivos em campos da Al-Qaeda. Os objectivos da Al-Qaeda são globalmente religiosos: conseguir que os EUA retirem da Arábia Saudita (por causa dos «lugares santos» de Meca e Medina), esmagar Israel (por ser um Estado judaico mantido «com apoio de Cruzados») e derrubar os regimes árabes que não sejam suficientemente islâmicos.

E no entanto, apesar de toda a evidência de que os terroristas do 7 de Julho, como anteriormente os do 11 de Março e os do 11 de Setembro, como outros islamistas que partilham da ideologia integrista da Irmandade Muçulmana, são todos homens profundamente religiosos que dificilmente matariam se não estivessem convencidos de que existe justificação religiosa para os seus actos, a maior parte da opinião pública persiste em negar a dimensão religiosa quer dessa ideologia integrista quer desses actos terroristas. Essa visão angélica da religião, que resiste a aceitar que se mate acreditando cumprir um dever religioso, é incongruente com uma Europa que sofreu séculos de guerras religiosas, contou milhões de mortos nas inquisições, iniciou Cruzadas e também teve os seus terroristas religiosamente justificados.

A utilização de uma ideologia religiosa para fomentar o ódio de grupo e convencer a matar é, porém, uma constante da história da humanidade. Compreende-se que assim seja: as religiões reveladas autorizam os crentes a imaginarem-se num plano ético superior aos seus semelhantes, e criam a ilusão de que estão integrados numa «ordem cósmica» unindo o natural e o sobrenatural, a vida e a morte, o passado e o futuro. Quando vividas em comunidade, podem até tornar «glorioso» o sacrifício do indivíduo a favor do grupo. A religião pode assim desculpabilizar aquilo que a maioria das pessoas, e até a maioria dos crentes, consideraria, noutras circunstâncias, repulsivo.