Paul Marcinkus[BE1] , o enorme arcebispo de 1,94 metros e cem quilos de peso, responsável dezoito anos pelas finanças do Vaticano, não foi apenas o infeliz «banqueiro de Deus» que ajudou à falência do Banco Ambrosiano.
Ele dizia que «não se pode gerir a igreja a poder de Ave-Marias» e foi coerente com esta verdade comprovada desde a mercearia até à Microsoft.
Quando aceitou a presidência do IOR (banco do Vaticano) que tinha implícito o barrete cardinalício, uma mordomia substituta da comparticipação de lucros, declarou que, até aí, só tinha como experiência de gestão financeira a colecta dominical a seguir à missa.
Os desfalques foram em nome de Deus mas o Vaticano perdeu 500 milhões de dólares e enlameou-se. Não se soube o destino dos 1.300 milhões de dólares que levaram o Banco Ambrosiano à falência. O director, Roberto Calvi, foi encontrado enforcado numa ponte de Londres e Michele Sindona, outro amigo do arcebispo, foi envenenado na prisão.
Mas o pio bispo, amigo de vários papas, impedido de ser julgado por JP2 (os subsídios ao sindicato Solidariedade não caíram do Céu) recolheu aos EUA em 1990, reformado.
Foi pai solteiro. Deixou um filho único e um escândalo do tamanho da ICAR.
[BE1]Expresso de 25/2/2006 pg. 22
No livro que viu estrategicamente a luz do prelo uns dias antes do concílio que rapidamente o elegeu, «Values in Times of Upheaval» (Valores em tempos de crise), Ratzinger expressava as suas preocupações sobre o futuro de uma Europa sob a ameaça da laicidade e do Islão. Em que basicamente advoga que a laicidade, a exclusão de Deus da vida pública, nos impede de responder convenientemente à ameaça islâmica.
Segundo Ratzinger «Para sobreviver a Europa precisa de uma aceitação crítica da sua cultura cristã» e, fazendo as delícias dos grupos de extrema-direita, referindo-se ainda à baixa taxa de natalidade europeia e à necessidade de mão de obra imigrante afirmou que «Na hora do seu maior sucesso a Europa parece ter ficado vazia interiormente, paralizada por uma crise que lhe ameaça a vida e dependente de transplantes».
Preocupações que foram ainda alvo de uma alocução, igualmente estratégica, que proferiu no convento da Saint Scholastica em Subiaco, Itália, na véspera da morte anunciada de João Paulo II, no primeiro de Abril de 2005.
Alocução em que Ratzinger identifica o racionalismo iluminista, herança da Renascença que retirou «Deus» (isto é a Igreja de Roma) do centro de decisões na Europa, como o grande perigo. Assim, afirmou que «de acordo com a tese do iluminismo e cultura secular da Europa, apenas as normas e conteúdos do iluminismo são passíveis de determinar a identidade europeia» o que tem como consequência que «esta nova identidade, determinada exclusivamente pela cultura iluminista, implica igualmente que Deus não participa de todo na vida pública e nos alicerces do Estado».
Em resumo, segundo Ratzinger a cultura do iluminismo é execrável porque pondo a sua tónica nos direitos humanos e não na «vontade» divina (interpretada e debitada pelo Vaticano), explicando cientificamente o mundo sem necessitar de Deus, desenvolvendo uma ética e uma moral à revelia do emanado de Roma, é a causa última dos problemas com que a Europa se debatia (e debate), nomeadamente a ameaça islâmica.
Como corolário da sua mensagem, o na altura Cardeal clamou que a sociedade ocidental assente nos direitos humanos era um erro que nos tinha conduzido ao «abismo» actual. Afirmando que «Uma ideologia confusa de liberdade leva ao dogmatismo» – em que esta ideologia «confusa» envolve, p.e., o fim da discriminação da mulher, divinamente ordenada, e da homossexualidade, uma «desordem objectiva» – Ratzinger urgiu a necessidade de todos, crentes e não crentes, viverem e regerem a sua vida como se Deus existisse, veluti si Deus daretur, ou seja, subordinados aos ditames e dogmas do Vaticano.
Ou seja ainda, aproveitando habilmente a conjuntura actual, Ratzinger decretou a falência dos valores de tolerância e respeito pelos direitos do homem, os responsáveis pela crise actual, e advogou que a única resposta ao fundamentalismo islâmico só pode ser o retorno à cristandade, a supremacia da religião sobre todos os aspectos da vida, isto é, ao fundamentalismo cristão!
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