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22 de Junho, 2006 jvasco

Onde está o sacrifício?

Jesus morreu pelos nossos pecados.
Morreu?

Segundo a Bíblia não, pois após 3 dias (ou menos…) andava por aí a falar com os discípulos, etc..

Nesse caso, onde está o sacrifício?
Ele não deu a vida pelos nosso pecados se, de facto, não a perdeu.
Como é que se dá a vida por algo, sabendo que se estará vivo e de boa saúde daí a 3 dias?

Onde está o sacrifício?

(nota: texto descaradamente baseado neste video)

22 de Junho, 2006 Carlos Esperança

Como se criam católicos

Nos primeiros dias de vida os pais entregam os neófitos ao padre, que lhes mergulha a fronha em água benta e os limpa do pecado original, quando ainda precisam de quem lhes mude a fralda.

Depois, crescem no temor de Deus, que se alegra quando comem a sopa e fica triste quando adormecem nas orações.

Aos seis anos de idade, com muitas ave-marias e padre-nossos rezados, para que o Deus cruel e apocalíptico os livre do Inferno, das perpétuas chamas e do azeite fervente, onde só há choro e ranger de dentes, as pias catequistas ensinam-lhes os mandamentos da Santa Madre Igreja e os do único Deus verdadeiro, à custa dos tempos livres.

Depois do exame de aptidão vem a confissão. Os pecados – ofensas feitas a Deus -, são ditos ao padre, punidos com penitência adequada e perdoados para poderem saborear o corpo de Cristo numa fina rodela de pão ázimo (sem fermento nem sal).

Com a missa semanal e a desobriga pela Páscoa da Ressurreição, como tarifa mínima, seguida de nova rodela mística, os cristãos ficam aptos para novos pecados que, de novo, serão perdoados e assim, sucessivamente, vão mantendo viva a fé na vida eterna.

A comunhão solene é um momento alto, com a família a alambazar-se em hidratos de carbono. Por pudor, a ICAR deixou de vestir de cruzados as crianças. A confirmação é imposta por um bispo que exibe o anelão de ametista e o faz oscular, indiferente aos micróbios que passa de boca em boca. O sinal da cruz é desenhado a óleo na testa do cristão pelo dedo do prelado ricamente paramentado e refastelado num cadeirão.

Nesta altura já as crianças de dez anos sabem que os judeus mataram Cristo, que a Santa ICAR está mais cheia de santos, mártires e bem-aventurados do que um autocarro da Carris em horas de ponta.

A xenofobia e o racismo estão na Bíblia. O dever de um cristão é converter quem está errado (os outros) à verdadeira fé, a que vem de Roma através de breves, bulas e encíclicas. O proselitismo é um dever e quem não quiser salvar-se deve ser obrigado.

Os créus querem esgotar a lotação do Céu e os ateus querem evitar que seja obrigatório.

21 de Junho, 2006 Ricardo Alves

«O Código Da Vinci» visto por um ateu

Sim, fui ver o filme. Na minha opinião, não é um manifesto anti-cristão, mas apenas um filme de entretenimento como muitos outros que todos os anos saem de Hollywood.

Quem gosta de filmes policiais, com perseguições de carro, pistolas apontadas, enigmas em série e actores competentes, não ficará decepcionado com «O Código Da Vinci». Quem é ateu e espera um manifesto anti-cristão (eu não esperava) sairá defraudado: perto do final, Robert Langdon diz algo como «não interessa se Cristo foi humano ou divino, o importante é que inspirou as pessoas», e recomenda os efeitos tranquilizantes da oração independentemente de se crer ou não. Pressiona ainda Sophie Neveu, que no início era ateia, a seguir esta espiritualidade, no fundo semelhante à de muitos grupos cristãos ditos «liberais», como os quakers ou os unitários. Tudo muito «cristianismo light», portanto.

Então, porquê a polémica? Pelo pouco que sei, por três razões. Primeira, o filme atribui uma descendência a dois personagens do Novo Testamento, «Jesus Cristo» e «Maria Madalena». Talvez por nunca ter sido cristão, não compreendo a aflição que a hipótese de que o semi-deus dos cristãos tivesse tido relações sexuais provoca. O «Deus» cristão em forma humana teria necessariamente que ser um castrado ou um impotente? Ou será a contradição com a misoginia doentia de Paulo de Tarso que incomoda?

Segunda razão para a polémica, o filme refere alguns factos históricos genuínos mas inconvenientes para a religião cristã, como a existência de evangelhos «não canónicos» que contradizem os evangelhos escolhidos no Concílio de Niceia, no ano 325 da nossa era, existência e escolha estas que são desconhecidas pela esmagadora maioria dos católicos. (Creio que o livro, que não li, se alarga mais sobre os evangelhos «não canónicos».)

Terceira razão de polémica (e talvez a mais importante), o filme mostra as auto-flagelações corporais praticadas no Opus Dei, embora com algum exagero (como as cicatrizes e o sangue a escorrer). No entanto, em boa verdade não se pode condicionar comunidades inteiras de pessoas numa cultura de auto-agressão e esperar que nem uma única pessoa exagere (particularmente quando circulam rumores, dentro da própria organização, de que Escrivá se flagelava até deixar as paredes da casa de banho esguichadas com sangue). Mas o nervosismo de certos sectores era desnecessário. Afinal, tanta publicidade até atraiu masoquistas à Obra…

Quanto aos «erros históricos», será verdade que no início do livro Dan Brown atribui uma data errónea (1099) à fundação do «Priorado de Sião», uma criação recente (século 20) de um grupo de brincalhões, e que inclui essa data num conjunto de afirmações apresentadas como «factos». Mas, das duas uma: ou é um recurso estílistico deliberado (muitas obras de ficção arrancam prometendo contar uma estória verídica) ou é efectivamente um erro do autor, que poderia ser corrigido em edições posteriores. Todos os anos são publicados romances históricos com «erros» (recordar «Equador», de Miguel Sousa Tavares), sem provocarem a fúria a que temos assistido. A razão real para a fúria católica deverá ser a ameaça que a narrativa «cristã alternativa» d´«O Código Da Vinci» representa para uma instituição habituada a ter o monopólio da fantasia e dos erros históricos e científicos (nascimentos a partir de virgens, a «ressurreição», a pretensamente incontroversa historicidade de «Jesus Cristo», a suposta fundação de uma nova igreja por «Jesus Cristo», etc.). Convém acrescentar que o filme «O Código Da Vinci» já foi visto por mais de meio milhão de portugueses, que assim têm acesso a factos, dúvidas e especulações que a ICAR lhes escondeu durante séculos, e que portanto lhes podem semear dúvidas…
Acrescente-se que existem centenas de filmes com «erros históricos», fantasias contraditas pela ciência e imprecisões várias. Encontrar «erros» em filmes é um pouco como encontrar pessoas na rua. Só choca quem não percebe que os filmes são ficção e que as pessoas circulam nas ruas. Dois exemplos: existe um filme com Marlon Brando em que os portugueses têm uma colónia nas Caraíbas («erro histórico»…) e oprimem os trabalhadores locais; existe um filme estado-unidense sobre Fátima em que se afirma, logo no início, que as igrejas em Portugal foram «mandadas fechar» em 1910 e que só em 1916 «reabriram algumas na província» («erro histórico» ideologicamente intencionado), e em que aparece uma «Virgem» suspensa no ar a falar à multidão (o que, sendo cientificamente disparatado, é uma fantasia habitual em filmes de ficção científica).
A terminar, é espantoso que ninguém tenha reparado que os países que proibiram a exibição de «O Código Da Vinci» são, salvo uma ou outra excepção, aqueles em que houve protestos violentos contra os cartunes dinamarqueses. A ICAR e o islão, com toda a coerência, são contra toda e qualquer crítica aos seus dogmas, e sabem cooperar quando necessário.
21 de Junho, 2006 Carlos Esperança

O Papa é um homem… para pior

É uma violência esperar de um homem normal a castidade absoluta, a vida sem alguém com quem trocar afecto, confiança e entrega. Mas o Papa ou o fez e mente, ou não o fez e violentou a sua natureza, ou ainda, talvez as duas coisas alternadamente.

O Papa não é apenas um algoz, frio e cruel, porque a vida e o múnus o conduziram a semelhante postura. É assim porque o sistema, a cujo vértice chegou, o exige.

Há no ditador vitalício do Vaticano atenuantes que as pessoas devem compreender. O frio inquisidor já foi jovem e teve, como todos, necessidades sexuais que realizou na clandestinidade ou reprimiu por medo. Hoje, transporta a culpa do pecado ou o trauma do desejo recalcado. O certo é que nunca amou.

Quem pode esperar compreensão, tolerância e bondade de quem sofreu humilhações, recalcamentos e frustrações. O camauro não sublima tendências no fim da vida, apenas vinga o passado.

O dever de ofício fá-lo fingir que acredita na Bíblia, ele que conhece as circunstâncias e finalidades com que as mentiras foram inventadas e velhos mitos reciclados, que sabe as semelhanças entre as várias religiões e como os homens as criaram.

Basta a mentira do livro sagrado, a falsificação da história da ICAR e o negócio das relíquias e indulgências para envergonhar um Papa. Não precisava da homologação de milagres que de todo o lado lhe solicitam para fabricar beatos e santos numa competição a que JP2 abriu as portas e a que o ridículo e a vergonha já não conseguem pôr cobro.

B16 é, pois, mais uma vítima da trama de interesses da multinacional da fé sediada num bairro de 44 hectares donde se prega uma moral anacrónica e se vive a obsessão do sexo que não se pratica ou se pratica em ansiedade e com sentimentos de culpa.

É por isso que os inveterados celibatários pregam a castidade com uma obsessão que, a ser aceite, levaria em breve à extinção da espécie humana.

21 de Junho, 2006 Palmira Silva

Mulher à frente da Igreja anglicana nos Estados Unidos

Katharine Jefferts Schori, bispo do Nevada e cientista antes da sua ordenação, foi eleita para dirigir a Igreja Episcopal americana na convenção dos bispos anglicanos deste país, eleição realizada no domingo passado.

As relações entre a Igreja mãe e a delegação americana, especialmente tensas depois da ordenação do bispo abertamente homossexual Gene Robinson, agudizaram-se com a eleição de Katharine, uma liberal firmemente defensora do evolucionismo e que apoia quer o casamento homossexual quer a consagração de bispos homossexuais. O Bispo de Rochester, Michael Nazir-Ali, afirmou que nesta altura um cisma na Igreja Anglicana é um sério risco:

«Ninguém quer uma separação mas se pensarmos que praticamente temos duas religiões na mesma Igreja, algo tem de ceder em algum momento».

O risco de cisma é ainda acrescido pelo facto de que a Igreja Católica já fez saber, pela voz do Cardeal Walter Kasper, presidente do Conselho Pontifício para a Promoção da Unidade dos Cristãos (CPPUC), que ordenar mulheres como bispos tornará a unidade entre ambas as Igrejas «inalcançável». Nesse sentido, o Cardeal Kasper exortou o líder da Igreja Anglicana e Arcebispo da Cantuária, Rowan Williams, a não realizar a ordenação episcopal de mulheres sem o apoio das Igrejas Ortodoxa e Católica (apoio que não se prevê nos próximos séculos).

Kasper acrescentou que o diálogo ecuménico entre as duas igrejas «mudará de tom» se a Igreja Anglicana não acabar com a «abominação». E avisou que esta «abominação» pode mesmo ameaçar a continuidade da Igreja Anglicana já que «Sem identidade, nenhuma sociedade, e muito menos uma igreja, poderá sobreviver».

Aparentemente o dignitário de Roma considera que a ordenação de mulheres é «uma perda da identidade» cristã, o que não está longe da verdade uma vez que a identidade do cristianismo assenta na misoginia.

Já no ano passado ano passado a Igreja de Roma tinha debitado um documento oficial de 10 páginas em que condenava a decisão da Igreja Anglicana não só em ordenar mulheres mas, especialmente, em elevá-las à posição de bispo, e em que avisava que consagrar mulheres «é um risco tremendo e intolerável» que pode causar «danos irreparáveis» dentro e fora da Igreja Anglicana.

E de facto, Katharine Jefferts Schori, que advoga abertamente o uso da razão e que afirma «Não usar os nossos cérebros para perceber o mundo que nos rodeia parece um pecado capital», é um «risco tremendo» para a Igreja de Roma…

20 de Junho, 2006 fburnay

A Raiz de Todo o Mal?

É o título de um documentário da BBC em que Richard Dawkins, o biólogo britânico ateu, mostra como o «processo de não-pensar», a fé, está na origem de crenças literais em mitologias que desafiam a Razão e nas certezas inabaláveis dos crentes que matam em nome da sua religião. Para ver os dois episódios, basta seguir os links:

The Root of All Evil? – Part 1
The Root of All Evil? – Part 2

20 de Junho, 2006 Ricardo Alves

O grau zero da liberdade religiosa

No Portugal anterior à revolução republicana de 1910, o culto religioso não católico era tolerado aos estrangeiros, e em espaços privados «sem forma exterior de templo». No entanto, antes de 1820, nem o culto privado praticado por estrangeiros era permitido. Os residentes do reino português ou se conformavam com a religião oficial do Estado, ou iam aquecer os pés (e o resto) nas fogueiras da Inquisição.

Existe, ainda hoje, pelo menos um país em que a situação é rigorosamente esta: o Islão é a religião oficial do Estado, os nacionais são legalmente obrigados a ser muçulmanos, e os estrangeiros nem na privacidade das suas casas têm liberdade religiosa. É a Arábia Saudita.

No dia 9 de Junho, a polícia saudita invadiu uma casa particular onde cerca de cem cristãos se encontravam em oração. No final da cerimónia, prendeu os quatro líderes cristãos que se encontravam no local. À semelhança de ocasiões anteriores, imagina-se que o seu destino seja a prisão, possivelmente a tortura, e finalmente a deportação.

A Arábia Saudita alberga neste momento sete milhões de imigrantes, nem todos originários de países muçulmanos. Residem no país de Meca e Medina quase um milhão de cristãos (sobretudo filipinos mas também etíopes e eritreus) e um número considerável de hindus (principalmente indianos).

Os xiitas sauditas (quase dois milhões de pessoas), apesar de serem muçulmanos são oficialmente discriminados no acesso às universidades e aos empregos públicos, e enfrentam restrições à abertura de mesquitas.

É normal serem conduzidas orações pedindo a morte dos judeus e dos cristãos, mesmo nas grandes mesquitas de Meca e Medina, devendo notar-se que os imãs que conduzem estas orações são (como todos os imãs sunitas do reino) salariados pelo Estado. A polícia religiosa (os mutawwa’in) prende e agride pessoas de minorias religiosas rotineiramente, e detém também muçulmanos sunitas que não se vistam de forma suficientemente conservadora ou que se desloquem acompanhados de pessoas de outro sexo que não sejam familiares.

E não há qualquer perspectiva de melhorias na situação lastimável do reino saudita.
20 de Junho, 2006 Palmira Silva

Violência em Teerão

Foto de Arash Ashoorinia. Mais fotos aqui e aqui.

Na passada segunda-feira em Teerão a polícia dispersou violentamente uma manifestação em defesa dos direitos da mulher, que acabou com inúmeras mulheres brutalmente espancadas – incluindo idosas – e cerca de 70 manifestantes (números oficiais) na cadeia.

A manifestação, a segunda consecutiva desde a revolução islâmica de 1979, tinha como objectivo o protesto pelas anacrónicas leis vigentes no Irão que, como em todos os países onde o fundamentalismo religioso (qualquer) é transcrito na letra da lei, manifestam um total desrespeito pelos mais elementares direitos da mulher.

Concretamente eram pedidas alterações nas seguintes leis: fim da poligamia (permitida por lei); direitos iguais no divórcio; direitos iguais na custódia dos filhos; direitos iguais no casamento; passagem da idade adulta para 18 anos (de acordo com a lei actual as raparigas são consideradas adultas aos 9 anos – os rapazes aos 15 anos- podendo a partir desta idade ser julgadas como um adulto ou dadas em casamento pelos pais); reconhecimento igual em tribunal do testemunho de uma mulher e de um homem e fim da exclusividade masculina em algumas profissões (a carreira da magistratura, por exemplo, é destinada apenas a homens).

De acordo com as autoridades iranianas as 42 mulheres e 28 homens detidos foram já libertados, com excepção de um homem que permanece na prisão, muito provavelmente o activista dos direitos humanos, presidente da Alumni Organization of Iran e ex-deputado reformista Ali Akbar Mousavi Khoini.

19 de Junho, 2006 Carlos Esperança

À conversa com o pregador João César das Neves

A homilia, de hoje, do santo pregador católico, João César das Neves, é portadora de avanços teológicos (V/ Diário de Notícias) no que diz respeito ao domicílio do Inferno (sito no Céu em regime de sublocação).

JCN – Vivemos numa daquelas raras épocas que não sabe bem o que pensar acerca do Céu e do Inferno – diz com a sabedoria dos eleitos, do Papa e da irmã Lúcia. Deixa-nos a convicção de que sabe muito bem, não por ouvir dizer, mas, tal como Bush, por falar com Deus.

Diário Ateísta: (em pensamento) O raio dos alcalóides!

JCN – O segundo elemento desta questão é que Deus nos ama apaixonadamente, a todos e a cada um, porque «Deus é amor» (1 Jo 4, 8 e 16). Assim, na Sua própria natureza, Deus quer a total felicidade para qualquer pessoa. Isso significa que Deus não condena ninguém. Ele leva sempre todos para o Céu.

D. A. – Com a paixão, Deus manda guerras, terramotos, maremotos, epidemias, pragas e outras manifestações da sua infinita bondade para mais depressa chamar as pessoas ao gozo da sua divina companhia.

JCN – Deus quer a total felicidade para qualquer pessoa. Isso significa que Deus não condena ninguém. Ele leva sempre todos para o Céu.

D. A. – Então o Inferno está às moscas!?

JCN – Tal significa que há zonas do Céu em que o egoísmo elimina o amor, em que a violência e o prazer são os objectivos, em que o orgulho expulsa o próprio Deus. A essas zonas do Céu chama-se Inferno.

D. A. – (verificando que Deus se converteu à economia de mercado e aproveita o direito de sublocação) – Então o Diabo existe?

JCN – Claro que existe.(…) De facto, quando deixámos de acreditar nessa personificação maléfica, baixámos as defesas e passámos a tolerar algumas das suas manifestações mais horríveis. Aborto, depravação, pornografia, gula, arrogância, e muitas outras, são hoje vistas como anedotas, expressões de personalidade, traços culturais, comportamentos excêntricos. Por isso o Diabo nunca foi tão visível como desde que deixámos de falar dele.

D. A. – Ah! E isso do lago do fogo, do Juízo final, dos condenados?

JCN (com evangélica paciência) – Trata-se simplesmente de uma forma sugestiva e colorida de dizer o mesmo, como uma mãe que assusta o filho com o papão se ele mexer em fósforos ou fichas eléctricas. O nosso tempo age como o rapazola insolente que, descobrindo que não há papões, vai meter os dedos na tomada de corrente.

Nota: As frases de JCN e algumas do Diário Ateísta são da homilia de hoje – «Ideias claras sobre o essencial».

19 de Junho, 2006 pfontela

Declaração de Guerra

Há quem se ofenda com a forma como muitos autores deste espaço tratam a religião organizada, considerando que estamos aqui a destilar veneno por puro prazer. A realidade da situação é bastante mais complicada que isso. Posso estar à vontade para dizer que o meu ateísmo nada tem de emocional, não me tornei ateu porque senti uma grande injustiça no mundo ou porque tive uma vida difícil e ninguém atendeu as minhas orações; Tornei-me ateu pelo empirismo, pela impossibilidade de aceitar dogmas, sejam eles de que natureza forem. Só os factos e indícios importam.

Mas isso por si só não chega para entender a minha participação neste espaço, muitos dos meus posts têm um teor que mais que ateu é 100% anti-clerical. E isso justifica-se com poucos argumentos: se o empirismo é a base do meu ateísmo o conservadorismo, obscurantismo e, acima de tudo, o ódio negro que vejo a grandes religiões organizadas debitar sem qualquer pudor ou bom senso tornaram-me ferozmente anti-clerical, e como cresci em Portugal sou principalmente anti-católico. Não tenho que me envergonhar das posições que tomo! Como cidadão da República estou a cumprir o meu dever cívico ao lutar para que o ódio religioso se extinga e que a manipulação política do estado por parte de organizações religiosas chegue ao seu fim.

Reconheço a boa vontade daqueles que tentam chegar a uma posição intermédia e que pensam ainda ser possível chegar a um acordo com as formas mais violentas de crença e clericalismo, mas também sei ver a sua ingenuidade. Há príncipos que não se podem negociar já que ao fazê-lo estamos a comprometer tudo o que somos (ex: não podemos ceder a pressões religiosas para suprimir vozes críticas ou regressaremos ao jogo do gato e do rato com uma censura religiosa imposta por meia dúzia de fanáticos que gostam de brincar aos inquisidores).

Não negociarei a liberdade (minha ou dos outros). Não negociarei a genuína dignidade humana (aquela que deriva do uso da razão – e não a falsificação que Roma nos quer impingir). Não renegarei o meu legado iluminista! Nao haverá “paz” entre os dois lados enquanto:

– Organizações religiosas abusarem do seu estatuto legal e da sua plataforma pública para lançar a ataques à razão e atiçar ódios ancestrais.
– Os abusos religiosos (camuflados enquanto liberdades religiosas) continuarem impunes.
– Todos os campos da ciência e da técnica não forem completamente liberados de amarras religiosas.
– Todas fés não renunciarem a todos os projectos de natureza política.
– As religiões tentarem mascarar os seus ódios e vicios com falsas virtudes.
– A religião não for totalmente confinada à esfera pessoal, que é a sua única posição possível numa sociedade livre.

Isto é um conflicto entre duas formas de ver o mundo, em que a negociação está fora de questão. Para o indivíduo, enquanto ser livre, poder prosperar e atingir os seus objectivos é necessário que a divisão que separa a política, a ciência e a lei da religião seja a mais forte possível. Sobre este ponto todos os defensores da laicidade têm a obrigação de travar o seu último combate – se tal for necessário.