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Categoria: Não categorizado

30 de Dezembro, 2006 Ricardo Alves

Vítimas do clericalismo contemporâneo(2): Itália

Em Itália, o juiz Luigi Tosti foi condenado, em dezembro de 2005, a uma pena de prisão (suspensa) de sete meses, e à suspensão de funções durante um ano, sem remuneração. O seu crime? Ter-se recusado a presidir a uma audiência numa sala de tribunal decorada com um crucifixo. Um ano depois, o Conselho Superior de Magistratura afirma que, considerada a laicidade do Estado italiano, o acto «criminoso» do juiz Tosti foi plenamente justificado pela Constituição italiana (que revoga a circular fascista que mandara colocar os crucifixos).

Ouçamos o comentário deste juiz livre pensador: «se a motivação do Conselho Superior de Magistratura me reconforta e reconcilia com a Justiça italiana, não me reconforta de todo constatar que o único juiz que teve, em Itália, a coragem e a determinação de se recusar a pisar a seus pés a Constituição e de defender os direitos à liberdade religiosa e à não-discriminação religiosa de todos os cidadãos italianos e, em particular, dos não católicos e dos não crentes, tenha sido condenado, como um criminoso, a sete meses de prisão e tenha sido afastado da Magistratura com ignomínia».

Embora esta resolução páre os procedimentos disciplinares, não tem consequências sobre os procedimentos judiciais. Para defender a sua liberdade de consciência (e a de todos nós…), o juiz Tosti poderá ter que levar o seu caso até ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.
30 de Dezembro, 2006 Ricardo Alves

Vítimas do clericalismo contemporâneo(1): Espanha

  1. Os professores da escola Hilarion Gimeno, de Saragoça, construíram um saite na inter-rede para combater a «manipulação jornalística» e as «mentiras» transmitidas pela imprensa clerical (em Portugal, o Público reproduziu unicamente as «informações» do lado cristão da polémica). Insistem em repor a verdade sobre a «não celebração» do «festival de natal»: não estava previsto no plano de activividades anual; não tem nada que ver com religião; o local não oferece condições de segurança e o ano passado houve pais que não conseguiram entrar (exiguidade das instalações); foram os encarregados de educação que votaram contra a realização de uma festa alternativa ou de troca de prendas… Protestam ainda contra o aproveitamento político-mediático da situação, e testemunham que se celebrou o natal nas aulas(!). Reafirmam que nunca invocaram o laicismo, mas apenas «razões pedagógicas». Nada disto interessará aos colaboradores do Público que tomaram como verdadeiras pseudo-informações deliberadamente parciais e incompletas.
  2. A directora da escola de Las Lagunas, em Mijas (Málaga), será levada a tribunal por ter retirado de uma sala de aula um presépio de cartolina. É acusada de «maus tratos psíquicos e ofensa ao sentimento religioso», e foi pedida contra ela uma «ordem de afastamento», para que não se possa aproximar de algum «crente de menor idade»(!). A Junta da Andaluzia apoia a professora, e argumenta que o presépio se encontrava «num local desadequado» sem «consulta nem autorização» do conselho escolar. As religiões, como sabemos, jamais ofenderam seja quem for: nem os ateus, nem as mulheres, nem as minorias sexuais…
29 de Dezembro, 2006 Ricardo Alves

A verdadeira guerra dos cristãos

  1. As companhias italianas de televisão RAI e Mediaset foram multadas em 100 000 euros, por comentários «blasfemos» feitos por participantes no programa «Big Brother».

    Comentário: a laicidade significa liberdade religiosa para quem tem religião, e liberdade de expressão para quem a quer criticar. Não somos livres se não podemos dizer o que pensamos.

  2. Uma clínica madrilena onde se fazem IVG´s foi apedrejada e pichada com frases como «aborto é assassinato». No dia 28 de dezembro do ano passado, passara-se quase o mesmo, numa data que os cristãos acreditam estar relacionada com o mito do Herodes genocida.

    Comentário: será que, para os cristãos, a propriedade alheia não tem que ser respeitada se lá se passar algo que as suas autoridades eclesiais não aprovem?

  3. Existe um saite espanhol (http://www.hostia.org/) dedicado a promover o uso da palavra hóstia «de uma forma que não magoe as outras pessoas». O grupo que o promove gasta 1 500 euros por mês em publicidade para defender o uso religiosamente correcto da palavrinha.

    Comentário: não será isto patrulhamento da linguagem? Em bom espanhol diz-se «me cago en la hostia»… querem multar quem blasfema?

29 de Dezembro, 2006 Carlos Esperança

O Natal e o comércio

O Natal está para os negócios como a Primavera para as sementeiras. É o tempo de arrotear e adubar os terrenos para semear a fé, a altura propícia para atrair indiferentes à recreação litúrgica e ao rebanho dos fiéis.

Sai uma missa cantada para o cavalheiro que troca a casa de alterne pela ida ao templo, uma confissão bem feita para a jovem que se excedeu nas carícias ao namorado com quem rompeu e exibe-se o presépio a quem desistiu da ida à discoteca.

Os padres não têm mãos a medir: remexem a vida íntima dos penitentes que ousam a confissão, abençoam os fracos que se ajoelham, borrifam de água benta os clientes que aturam a homilia e impregnam de incenso os que se demoram na igreja.

Não há tempo para o breviário, é altura de despachar as hóstias que criavam mofo, de animar os incautos a cantar hossanas ao patrão e dar o óbolo aos empregados, enquanto agitam o turíbulo e incitam os fregueses a atacar o cantochão.

O Natal é uma festa para todos. Das pastelarias saem bolos recheados de creme, das lojas embrulhos para todos os gostos e das igrejas bênçãos para todas as carências.

Na febre do consumo secam pias de água benta à entrada dos templos, esgotam as velas no supermercado, fazem fila os crédulos a caminho do confessionário, viajam de joelhos os beatos, em direcção ao altar, e até os padres fingem acreditar em Deus.

Passada a euforia, voltam os penitentes aos pecados do dia-a-dia, regressam os padres à ociosidade e ao breviário, encostam-se os bispos ao báculo com as orelhas debaixo da mitra e o Papa continua a uivar contra o preservativo e as uniões de facto, a vociferar contra os casamentos dos homossexuais e o divórcio e a querer queimar mulheres que interrompem a gravidez.

Depois do Natal, arrumam-se cálices e patenas, despejam-se turíbulos, põe-se naftalina nos paramentos, desmancham-se os presépios e guardam-se os animais na sacristia com o Menino, a Virgem, o acompanhante, os reis magos e os adereços que hão-de servir para o ano que vier.

Depois de empanturrarem os crentes no divino, os padres aguardam uma nova onda de piedade para voltar ao proselitismo. Mantêm os fregueses habituais que servem de lastro para aguentar abertos os templos.

28 de Dezembro, 2006 Palmira Silva

Diálogo inter-religioso

À esquerda, estátua de Averrois em Córdoba; à direita estátua de Maimonides na mesma cidade.

Como já referi diversas vezes, as bases para a revolução intelectual no Ocidente situam-se na Espanha do século XII, à época ainda um importante centro da ciência árabe, e entre os seus principais mentores encontra-se o cordobês Averrois. De facto, o califado de Córdoba estabeleceu na Andaluzia uma sociedade cosmopolita, elegante e educada – com uma comunidade judaica muito importante de que se destaca um dos seus mais prestigiados filósofos, Maimonides (1135-1204)- em que se privilegiava a ciência e a difusão de conhecimento. Nomeadamente recordo que a biblioteca de Córdoba, fundada em 965, constituiu a terceira biblioteca do mundo islâmico. E foi a semente para a recuperação da ciência proscrita e para o despertar da Europa das longas trevas intelectuais impostas pelo cristianismo.

Catedral de Córdoba

De facto, o contacto com esta civilização cultural e cientificamente muito mais avançada imposto pela Reconquista aos incultos cristãos, não obstante os denodados esforços inquisitoriais da Igreja da Roma, propiciou o Renascimento e o despertar da Europa da longa noite de milénio e meio de obscurantismo.

Córdoba foi berço de intelectuais que marcaram a História – para além dos referidos Averrois e Maimonides, Séneca, Abraham Cohen de Herrera e Marcus Annaeus Lucanus ou Lucan, que Dante no seu Inferno coloca ao lado de Virgílio, Homero, Horácio e Ovídio – e era a maior cidade do mundo no início do segundo milénio. O seu monumento mais importante – numa cidade de que o geógrafo Ibn Hawkal em 948 gabava as suas mais de 1000 mesquitas e 600 banhos públicos – era sem dúvida a Mezquita ou a mesquita Aljama (em tempos a terceira maior mesquita do mundo) cuja construção se iniciou no século VIII e foi transformada num templo cristão, a catedral de Córdoba, quando em 1236 o rei Fernando III de Castela conquista esta cidade aos mouros.

Em 2004, durante o papado de João Paulo II, um grupo de muçulmanos espanhóis enviou uma petição ao Vaticano para que, num gesto simbólico de reconciliação entre as duas religiões, fosse possível aos muçulmanos locais rezar na actual Catedral. Apesar dos esforços muçulmanos, o Vaticano na altura rejeitou o pedido através do arcebispo Michael Fitzgerald, então presidente do Conselho Pontifício para o Diálogo Inter-religioso.

A Junta Islâmica espanhola resolveu repetir o pedido ao novo papa, solicitando a Bento XVI que os muçulmanos pudessem compartilhar com os cristãos as orações na Catedral para «despertar as consciências» de ambas as confissões religiosas e «enterrar confrontos passados».

Mais uma vez o pedido foi negado, desta vez pela voz de Juan José Asenjo, bispo de Córdoba, que afirmou que «esta partilha não contribui para a convivência pacífica dos diferentes credos».

Afinal parece que é apenas em questões mediáticas que são necessários «diálogo inter-religioso genuíno» e «gestos concretos de reconciliação». Ou apenas quando é necessário apaziguar embaixadores muçulmanos irados com Paleólogos sortidos – Paleólogo significa «da razão antiga», um excelente cognome para Ratzinger – se fala em ser «imperativo que cristãos e muçulmanos trabalhem em conjunto».

Excluindo, claro, o «monólogo inter-religioso genuíno» a que corresponde uma união em causas comuns – como sejam a condenação da laicidade, do reconhecimento dos direitos da mulher e de homossexuais!

28 de Dezembro, 2006 Ricardo Alves

A União dos Tribunais Islâmicos abandonou Mogadíscio

O governo da «União dos Tribunais Islâmicos», que se instalara na capital da Somália em Junho, abandonou Mogadíscio durante as últimas horas. A capital está agora a ser ocupada por tropas da Etiópia e dos seus aliados somalis. A ofensiva-relâmpago etíope iniciara-se no fim-de-semana, e põe fim a um governo considerado próximo da Al-Qaeda, em defesa do qual se ouviram apelos à jihad. O governo islamista aplicava a chária e era extremamente repressivo, tendo chegado ao ponto de proibir o visionamento do mundial de futebol. O novo governo interino foi criado pela ONU em Baidoa, há mais de dois anos, mas a sua imposição pela Etiópia poderá criar resistências. A Somália é um dos países mais pobres do mundo e não tem governo reconhecido no exterior desde 1991.
28 de Dezembro, 2006 Palmira Silva

A Guerra ao Natal


Sam Seder da Air America Radio confronta (o ano passado) Bob Knight, director do Culture and Family Institute, (mais) uma instituição teocrata americana, sobre a imaginada e imaginária Guerra ao Natal. A transcrição do debate pode ser encontrado aqui.

De notar o recurso ao reductio ad Hitlerorum pelo cruzado Knight – secundando O’Reilly na falácia -, mais uma vez um tiro no pé já que se em vez de usar o filme «Música no Coração» como manual de História tivesse investigado minimamente o tema, teria verificado que o Natal era a grande celebração da Alemanha nazi, a Volksweihnachten que introduziu muitos dos rituais natalícios que ele lamenta estarem agora sob ataque dos radicais laicistas.

A Guerra ao Natal foi uma invenção velha de dois anos da Fox News, mais concretamente os seus generais contra um exército imaginário foram John Gibson, autor de «The War on Christmas: How the Liberal Plot to Ban the Sacred Christian Holiday Is Worse Than You Thought» e Bill O’Reilly, ambos figuras conhecidas da Fox News, ou, como começa a ser conhecida nos Estados Unidos, a Faux (falsa) News.

Pela invenção da Guerra ao Natal a Fox News foi agraciada pelo meu apresentador norte-americano favorito, Keith Olbermann da MSNBC, com vários prémios:

27 de Dezembro, 2006 Carlos Esperança

O Natal e o marketing

Da escalada de proselitismo contra a secularização do Natal fica o azedume de Bento 16, as diatribes das homilias, em missas com fregueses de ocasião, e a ruminação beata de alguns jornalistas avençados.

A ICAR, que confiscou a festa que precedeu o mito cristão, quer agora registar a marca e vender um cadáver coroado de espinhos como único pretexto genuíno dos desmandos gastronómicos do solstício de Inverno.

Ninguém é contra o Natal. Apenas a Igreja católica é contra as celebrações profanas do solstício e afadiga-se a confiscar o espaço público para expor a estrela da Companhia – o Cristo -, acompanhado da virgem que o pariu, do inocente pai, da vaca, do burro, dos reis magos e de outros animais que compõem o parque zoológico do presépio.

A prova de que o Natal é popular está na ostentação com que os autarcas de todo o País enchem de luzes, que apagam e acendem, os votos de «Feliz Natal», inúmeras Virgens de cores variadas e os milhares de Meninos Jesus que dormem em berços de lâmpadas com estrelas a vigiar o sono.

Vale-nos a mentira milenar e a encenação para que o Menino não corra o risco de ser electrocutado pelo desvelo beato dos vendedores de ilusões. Pior sorte têm os operários que fazem as decorações. No meu bairro, o electricista que procedia às decorações natalícias caiu da escada e foi hospitalizado. É falsa a religião. Assim o fosse a lei da gravidade.

27 de Dezembro, 2006 Ricardo Alves

ARL na RTP-N

O presidente da Associação República e Laicidade, Luis Mateus, estará hoje numa mesa-redonda na RTP-N, às 23 horas. O debate será, presumivelmente, sobre a famigerada «guerra ao natal» e sobre a laicização das escolas públicas.
26 de Dezembro, 2006 Palmira Silva

Pizza infernal agita a Nova Zelândia


Hell pizza, onde os mínímos detalhes são… divinais. Gosto especialmente do pequeno caixão «para os seus restos» que o picotado da caixa revela. Em relação às pizzas, acho que voto na «Underworld».

A Hell Pizza, que comercializa, entre outras receitas deliciosas, os sete pecados mortais, resolveu promover a Luxúria, uma pizza para amantes de carne, distribuindo 170 000 preservativos em caixas com o logotipo da empresa.

A campanha do Inferno não caiu bem nos meios católicos neo-zelandeses, que seguem à risca as instruções papais e consideram o preservativo uma emanação demoníaca. Assim, ainda não refeitos do episódio Bloody Mary da série South Park, que passou na Nova Zelândia não obstante as denodadas tentativas católicas para a sua proibição, não só apelaram aos católicos locais para boicotarem os produtos infernais como apresentaram 600 queixas à Autoridade que regula a publicidade.

Kirk MacGibbon da Cinderella Marketing, a empresa publicitária do Inferno, não está muito preocupado com o boicote católico:

«Não estou muito certo quantos católicos fariam compras no Inferno, de qualquer forma» e por outro lado, uma vez que o objectivo da campanha era igualmente a sensibilização do público para as elevadas taxas de gravidez adolescente e DSTs na Nova Zelândia considera que «São pessoas como a Igreja Católica que dizem que os preservativos não funcionam como protecção de doenças sexualmente transmíssiveis e que a melhor forma de as evitar é a abstinência. Isso é um monte de disparates».

É sempre interessante confirmar que os católicos, que gritam perseguição e inventam guerras ao Natal e outros disparates sem qualquer fundamento, se acham no direito de obrigar os outros a agirem de acordo com os preceitos da sua religião. E não estou a falar do boicote, aliás adoraria que a Igreja e seus representantes apenas apelassem ao boicote, seria divertido ver quantos crentes responderiam a esses (muitos) boicotes.

Estou a falar das queixas, das tentativas de proibição de «blasfémias» e «pecados», da exigência de pedidos de desculpa a professores que «atacam» a fé dos alunos por as respectivas aulas incluirem Nietzsche, etc..

Nunca conseguirei perceber os católicos que, como alguns dos nossos leitores, consideram «ataques» à religião a mera existência de pessoas que agem e pensam de forma diferente da deles…